terça-feira

MELINDA E MELINDA


MELINDA E MELINDA (Melinda and Melina, 2004, Fox Searchlight Pictures, 99min) Direção e roteiro: Woody Allen. Fotografia: Vilmos Zsigmond. Montagem,: Alisa Lepselter. Figurino: Judy Ruskin Howell. Direção de arte/cenários: Santo Loquasto/Regina Graves. Produção executiva: Stephen Tenenbaum. Produção: Letty Aronson. Elenco: Radha Mitchell, Chloe Sevigny, Jonny Lee Miller, Will Ferrell, Amanda Peet, Wallace Shawn, Brooke Smith, Steve Carrell, Chiwetel Ejiofor, Josh Brolin. Estreia: 17/9/2004 (Festival de San Sebastian)

A carreira de Woody Allen é repleta de altos e baixos. Para cada "Noivo neurótico, noiva nervosa" e "Crimes e pecados", ele entrega produções pouco memoráveis como "Trapaceiros" e "Dirigindo no escuro" - que, por mais simpáticas que sejam, estão longe de seu auge criativo. "Melinda e Melinda", lançado em 2004, infelizmente faz parte do rol de seus trabalhos menos brilhantes. Com um roteiro pouco inspirado (escrito em um mês) e um elenco de bons atores subaproveitados, seu 33° longa falha tanto no drama quanto na comédia - e sim, sua estrutura é totalmente baseada nessa dicotomia que é, a rigor, o centro da obra do cineasta nova-iorquino. Prejudicado ainda pela falta de carisma de Radha Mitchell - que substituiu Winona Ryder em um momento complicado junto aos investidores -, o filme foi solenemente ignorado pelas cerimônias de premiação e, apesar do potencial de sua ideia central, é frustrante e apático (o que raramente pode ser dito de uma produção do diretor).

Como em quase todos os filmes de Allen, "Melinda e Melinda" usa e abusa de diálogos rápidos, com personagens que transitam no sofisticado mundo cultural e social de sua filmografia - mas que aqui soa um tanto pedante, sem a autocrítica de seus melhores trabalhos. O ponto de partida da trama é uma discussão aparentemente banal a respeito da superioridade do drama em relação à comédia - talvez uma cutucada do cineasta quanto à sempre relevante polêmica que relega produções mais leves ao limbo das premiações e do prestígio da indústria. Max (Larry Pine) é um dramaturgo especializado em tragédias e seu amigo, Sy (Wallace Shawn), é famoso por suas comédias. Durante um jantar ao lado de outros amigos, surge a questão sobre qual dos gêneros teatrais melhor sintetiza a natureza humana. Como uma espécie de exercício de imaginação, Al conta ao grupo a história de Melinda Robicheaux (Radha Mitchell), uma mulher problemática que surge inesperadamente à porta de um casal de amigos durante um importante jantar de negócios. Separada do homem por quem terminou um casamento e com um histórico de tentativas de suicídio, Melinda transforma, mesmo involuntariamente, a vida daqueles que entram em seu caminho, e não é diferente em sua nova fase. 

 

A chegada de Melinda ao lar de Laurel (Chloe Sevigny) e Lee (Jonny Lee Miller) acontece durante um jantar oferecido a um produtor teatral que pode escalar o jovem para uma de suas próximas peças. Passando a morar com o casal, Melinda tenta firmar-se na vida procurando emprego e um novo amor - que pode surgir na figura do músico Ellis Moonsong (Chiwetel Ejiofor), caso a própria Laurel não se descubra interessada no rapaz. Em outra versão da história, Melinda interrompe o jantar de seus vizinhos Hobie (Will Ferrell) e Susan (Amanda Peet) - uma cineasta que busca investidores para seu novo filme, no qual ela espera poder empregar o marido. Passando por uma crise no casamento, Hobie se vê atraído por Melinda - que, por sua vez, vê no bem-sucedido Greg Earlinger (Josh Brolin) a última chance de uma vida relativamente normal. Enquanto a primeira Melinda tem sua história contada por um viés dramático, a segunda é apresentada com um tom de humor - ainda que bastante sutil.

O principal problema de "Melinda e Melinda" é sua incapacidade de criar qualquer tipo de empatia por sua personagem central - uma questão que mina completamente sua ambição de emocionar ou fazer rir. Apesar de escolhida pelo próprio Woody Allen depois de seu trabalho em "Ten tiny love stories" (2002), Radha Mitchell não encontra o tom certo em seu desempenho, não oferecendo diferenças entre a Melinda dramática e a cômica - mesmo contando com atores como Will Ferrell e Steve Carell, seu timing de comédia fica muito aquém do esperado, o que torna sua personagem apenas desinteressante e cansativa. Conhecido também por conceber personagens coadjuvantes marcantes - e frequentemente premiados ou indicados ao Oscar -, dessa vez Allen falhou em criar papéis fortes o bastante para sustentar uma história frágil por si só. Para sua sorte (e dos fãs), seu projeto seguinte seria o extraordinário "Match point: ponto final", que lhe devolveria o prestígio e o sucesso de seus melhores filmes.

 

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MELINDA E MELINDA

MELINDA E MELINDA (Melinda and Melina, 2004, Fox Searchlight Pictures, 99min) Direção e roteiro: Woody Allen. Fotografia: Vilmos Zsigmond....