quinta-feira

JÁ ESTOU COM SAUDADES


 JÁ ESTOU COM SAUDADES (Miss you already, 2015, 5 Films/New Sparta Films/The Salt Company International, 112min) Direção: Catherine Hardwicke. Roteiro: Morwenna Banks. Fotografia: Elliot Davis. Montagem: Phillip J. Bartell. Música: Harry Gregson-Williams. Figurino: Claire Finlay. Direção de arte/cenários: Amanda McArthur/Celia de La Hey. Produção executiva: Morwenna Banks, Jerome Booth, Sheryl Crown, Catherine Hardwicke, Nicki Hattingh, Jamie Holt, Samantha Horley, Lisa Lambert, Cyril Megret, James Norne, Celina Rattray, Anne Sheehan, Barnaby Southcombe, Trudie Styler, Paul Andrew Williams. Produção: Christopher Simon. Elenco: Toni Collette, Drew Barrymore, Dominic Cooper, Paddy Considine, Jacqueline Bisset. Estreia: 12/9/15 (Festival de Toronto)
 

Filmes a respeito da amizade entre mulheres já constituem, de certa maneira, quase um novo gênero cinematográfico - principalmente quando a relação descamba para a tragédia como forma de incrementar o roteiro. É dessa safra que saíram "Amigas para sempre" (1988) - estrelado por Bette Midler e Barbara Hershey -, o sensível "Tomates verdes fritos" (1991) - que contava não apenas uma, mas duas histórias de cumplicidade entre mulheres -, o já clássico "Thelma & Louise" (1991), que rendeu indicações ao Oscar para Susan Sarandon e Geena Davis - e o moderno "Somente elas" (1995), que estendeu sua sororidade à trilha sonora composta apenas por intérpretes femininas e colocou na estrada uma cantora lésbica (Whoopi Goldberg), uma silenciosa soropositiva (Mary-Louise Parker) e uma maluquete grávida do namorado violento (Drew Barrymore). Barrymore, aliás, é uma das duas estrelas de mais uma produção semelhante: pouco visto e pouco comentado, "Já estou com saudades" pouco acrescenta à lista de filmes afins, mas é simpático o bastante para sustentar uma sessão descompromissada - e muito disso se deve às presenças de suas atrizes centrais, Toni Collette e a mesma Drew Barrymore de "Somente elas". Talentosas e carismáticas, elas carregam o filme nas costas e conseguem até mesmo deixar suportáveis toda a previsibilidade do roteiro.

Barrymore, aliás, só acabou no elenco do filme depois de duas desistências. Primeiro foi Jennifer Aniston quem pulou fora, devido ao adiamento das filmagens; depois, foi a vez de Rachel Weisz abandonar o projeto e abrir vaga para a ex-atriz mirim. Talvez tenha sido para o bem: com sua personalidade vibrante, Barrymore é o contraponto perfeito para o talento à flor da pele de Collette, e o encontro de duas energias tão díspares é que faz com que a trama funcione, deixando pouco espaço para os coadjuvantes - um time que inclui até mesmo a veterana (e ainda belíssima) Jacqueline Bisset. Com ares de adaptação de romances água-com-açúcar, "Já estou com saudades" é, surpreendentemente, um roteiro original (ou quase isso: é a adaptação de uma peça radiofônica escrita pela mesma Morwenna Banks, autora de roteiros para séries de televisão britânicas), e acompanha a trajetória de duas amigas de infância que tem suas vidas transformadas por situações que fogem de seu controle - e põe a relação em xeque. Como era de se esperar, o roteiro não se aprofunda em questões psicológicas e tampouco vai além do já visto em outras produções afins. Mas há como resistir a suas protagonistas e a uma trilha sonora que dá destaque à atemporal "Losing my religion", do R.E.M.? 

Milly (Toni Collette) tem uma vida de sonhos, com um emprego que a satisfaz e uma rotina doméstica das mais felizes, que inclui o marido, Kit (Dominic Cooper), e dois filhos adoráveis. Jess (Drew Barrymore) já é menos completa - apesar do carinho do namorado, Jago (Paddy Considine), seu trabalho não é dos melhores, vive em um trailer desconfortável e sofre com as tentativas sem sucesso de engravidar. As duas são amigas íntimas desde que eram crianças, e apesar de suas diferenças (ou talvez por causa delas) se completam e não conseguem ficar separadas por muito tempo. A relativa paz da relação é abalada quando ambas se descobrem diante de situações catalisadoras: Jess finalmente fica grávida, e Milly é diagnosticada com câncer - o que altera substancialmente sua personalidade e a põe em rota de colisão com a amiga e o próprio marido. Para ajudar Milly em sua recuperação, Jess deixa sua vida de lado - mas será que a ligação entre as duas sobreviverá a uma prova tão dura?

A diretora Catherine Hardwick tem em seu currículo o excelente "Aos treze" (2003), que marcou a estreia de Evan Rachel Wood no cinema, mas é mais lembrada pelo tenebroso "Crepúsculo" (2008), o primeiro capítulo de uma das sagas mais constrangedoras do cinema americano das últimas décadas. Para sorte dos espectadores, "Já estou com saudades", apesar de não ser exatamente criativo e seguir à risca uma série de clichês, está menos para o romance vampiresco adolescente e mais para o drama familiar que deu à Holly Hunter uma indicação ao Oscar de coadjuvante. A cineasta acerta em deixar que suas atrizes comandem o show, mas peca ao não evitar o melodrama sentimental que domina a segunda metade do filme. Ainda bem que, apesar de suas personagens não sejam complexas como deveriam, Toni Collette e Drew Barrymore sustentam a produção sem muito esforço - e podem levar o público mais sensível às lágrimas. Não é um filme inesquecível, nem um ponto alto da carreira de ninguém envolvido, mas consegue cativar pelas quase duas horas de sessão. Tem tudo para virar um frequentador habitual das sessões da tarde na televisão aberta - e isso é bem mais do que muitos congêneres conseguem.

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