terça-feira

NASCE UMA ESTRELA

 


NASCE UMA ESTRELA (A star is born, 2018, Warner Bros, 136min) Direção: Bradley Cooper. Roteiro: Bradley Cooper, Eric Roth, Will Fetters, estória de William Wellman, Robert Carson, roteiros de Moss Hart (1954), John Gregory Dunne, Joan Didion, Frank Pierson (1976). Fotografia: Matthew Libatique. Montagem: Jay Cassidy. Figurino: Erin Benach. Direção de arte/cenários: Karen Murphy/Ryan Watson. Produção executiva: Basil Iwanyk, Sue Kroll, Niija Kuykendall, Ravi Mehta, Heather Parry, Michael Rapino. Produção: Bradley Cooper, Bill Gerber, Lynette Howell Taylor, Jon Peters, Todd Phillips. Elenco: Lady Gaga, Bradley Cooper, Sam Elliott, Rafi Gavron, Anthony Ramos, Ron Rifkin. Estreia: 31/8/201 (Festival de Veneza)

8 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Ator (Bradley Cooper), Atriz (Lady Gaga), Ator Coadjuvante (Sam Elliott), Roteiro Adaptado, Fotografia, Canção Original ("Shallow"), Mixagem de Som

Vencedor do Oscar de Canção Original ("Shallow")

Vencedor do Golden Globe de Canção Original ("Shallow")

A trama de "Nasce uma estrela" fascina Hollywood - e o público - desde 1937, quando o filme estrelado por Janet Gaynor e Fredric March estreou (e ganhou o Oscar de melhor roteiro). De lá pra cá, outras  versões da trágica história de amor entre dois artistas  - ele decadente; ela em plena ascensão - povoaram a mente e o coração de diferentes gerações, sempre com sucesso de crítica e bilheteria. E levando-se em conta de que era praticamente tradicional que surgisse um novo remake a cada duas décadas, até que demorou para que o século XXI apresentasse a sua própria visão do tema. Tudo bem que projetos já existiam há tempos - e até nomes como Steven Spielberg e Clint Eastwood estiveram ligados a ele em determinados momentos -, mas foi somente em 2018 que finalmente o quarto "Nasce uma estrela" chegou às telas. A demora, no entanto, revelou-se uma bênção: tivesse sido realizado antes, o filme não teria contado com seu maior trunfo - a presença luminosa e potente de Lady Gaga. Uma das maiores estrelas pop surgidas nos anos 2000, Gaga foi, provavelmente, o maior chamariz da produção, e não apenas foi a principal responsável pelos mais de 400 milhões de dólares coletados pelo filme nas bilheterias: premiada com o Golden Globe e indicada ao Oscar de melhor atriz, ela tornou-se a imagem mais potente do filme, que lhe rendeu a estatueta de melhor canção original (situação que espelha o que aconteceu com Barbra Streisand em 1976).

A presença de Gaga no papel central de "Nasce uma estrela" deve-se muito aos esforços do ator/diretor/roteirista/produtor Bradley Cooper, que insistiu em sua escalação a despeito da resistência da Paramount Pictures, pouco confiante no talento e no poder de fogo da cantora - conhecida por suas apresentações excêntricas que flertavam abertamente com o bizarro e a ruptura do status quo. Para o papel, que exigia dotes musicais além do corriqueiro, o estúdio preferia nomes menos polêmicos, como Beyoncé, Jennifer Lopez, Shakira, Rihanna e até Selena Gomez, mas Cooper, certo de que a escolha de Gaga era a mais certeira, lançou mão do mais velho dos truques, filmando a si mesmo e à cantora em cenas escritas por ele mesmo e o corroteirista Will Fetters: diante do resultado final, com o sucesso estrondoso do filme e o arrastão de prêmios da temporada (com oito indicações ao Oscar, incluindo melhor filme), dificilmente os executivos se arrependeram da decisão. Mesclando inocência, garra, paixão e força, Lady Gaga engole o filme toda vez que está em cena, mesmo ao lado de um Bradley Cooper no melhor momento de sua carreira.

 

Gaga interpreta (com segurança de veterana) a garçonete Ally Campana, que sonha em ver reconhecido seus talentos de cantora e compositora. Recém saída de um relacionamento tóxico, ela vê sua vida mudar radicalmente quando conhece Jackson Maine (Bradley Cooper), astro da música country que a descobre em um bar de drag queens e lhe oferece a chance de cantar com ele em um show. Maine está passando por um longo período de batalha contra as drogas e o álcool, mas isso não o impede de encantar-se com a jovem e convidá-la a juntar-se a ele em uma turnê. Aos poucos o relacionamento profissional evolui para um apaixonado romance, mas enquanto Ally começa a tornar-se mais e mais reconhecida por seus dotes musicais - a ponto de suplantá-lo em sucesso comercial e prestígio -, Maine se afunda progressivamente em sua doença. Brigado com o irmão mais velho, Bobby (Sam Elliott), e com a carreira ameaçada, o outrora celebrado cantor tenta sobreviver à ideia de ficar à sombra da mulher que ama, mas seus demônios interiores crescem à medida em que ela atinge o ápice de sua carreira.

Sem abrir mão de momentos clássicos das versões anteriores da trama - como o clássico momento em que Jackson invade, bêbado, a cerimônia de consagração de Ally -, o remake 2018 de "Nasce uma estrela" consegue o feito raro de modernizar o enredo original sem precisar desrespeitar seus antecessores. Em seu primeiro trabalho como diretor, Bradley Cooper equilibra com destreza as sequências musicais (dentre as quais destaca-se a bela "Shallow", premiada com o Oscar) e os dramas pessoais de seus protagonistas, com uma embalagem visual atraente e um ritmo adequado às plateias de seu tempo. Se Judy Garland estava no auge de sua carreira quando estrelou a versão de 1954 e Barbra Streisand já era uma atriz e cantora de prestígio em 1976, Lady Gaga surpreende ao demonstrar uma segurança ímpar na construção de sua Ally Campana mesmo em sua estreia no cinema. Dona de um carisma irresistível, Gaga bate de frente com o experiente Cooper em cenas de alta carga dramática e, se o público não consegue resistir às lágrimas em seu final, muito se deve à sua dedicação ao papel e ao apelo universal (e atemporal) da história, adaptada (felizmente) sem muitas invenções. Com uma produção caprichada - fotografia deslumbrante, a trilha sonora marcante, edição ágil - e uma direção precisa, "Nasce uma estrela" não decepciona frente a seus irmãos mais velhos e se apresenta como um dos filmes essenciais do gênero.

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