segunda-feira

WALL STREET: PODER E COBIÇA

 


WALL STREET: PODER E COBIÇA (Wall Street, 1987, 20th Century Fox, 126min) Direção: Oliver Stone. Roteiro: Oliver Stone, Stanley Weiser. Fotografia: Robert Richardson. Montagem: Claire Simpson. Música: Stewart Copeland. Figurino: Ellen Mirojnick. Direção de arte/cenários: Stephen Hendrickson/Leslie Bloom, Susan Bode. Produção: Edward R. Pressman. Elenco: Michael Douglas, Charlie Sheen, Daryl Hannah, Martin Sheen, Hal Holbrook, Sean Young. Estreia: 11/12/87

Vencedor do Oscar de Melhor Ator (Michael Douglas)
Vencedor do Golden Globe de Melhor Ator/Drama (Michael Douglas)

Logo depois de ter feito a festa na cerimônia do Oscar 1987 com seu "Platoon", que recebeu as estatuetas de melhor filme e diretor - além de outros prêmios técnicos -, Oliver Stone resolveu voltar suas lentes para um outro tipo de batalha, menos sangrento mas igualmente nocivo. Das selvas do Vietnã ao centro nervoso do mercado financeiro dos EUA, o polêmico cineasta fez uma longa viagem, mas não abandonou seu olhar aguçado e crítico. "Wall Street: poder e cobiça" pode não ter causado o mesmo impacto popular do filme anterior de Stone, mas mostrou a seus detratores que nem só de controvérsias era feita sua carreira, deu a Michael Douglas o Oscar de melhor ator e rendeu um personagem icônico (que voltou às telas em 2010, em uma sequência inesperada), dono de uma das frases mais memoráveis do cinema (a famigerada "greed is good"). Dedicado ao pai de Stone, corretor na bolsa de valores durante a Depressão, e inspirado em escândalos com títulos de alto risco e informações privilegiadas dos anos 1980, "Wall Street" estreou no auge do conservador governo Reagan, e com sua feroz crítica ao capitalismo e à ganância desenfreada, tornou-se um dos retratos mais fiéis de um período centrado no hedonismo e nos excessos de todos os tipos. Filmado às pressas para escapar de uma então iminente greve de diretores e - segundo o cineasta - lançado com pouco caso por seu estúdio (a 20th Century Fox), que preferiu apostar suas fichas em "Nos bastidores da notícia", "Wall Street" acabou rindo por último: enquanto a comédia dramática de James L. Brooks não conseguiu converter nenhuma de suas sete indicações ao Oscar, o filme de Oliver Stone saiu da cerimônia com a única estatueta a que havia sido indicada.

"Wall Street" se passa na primeira metade da década de 1980 e acompanha o caminho do jovem Bud Fox (Charlie Sheen), que trabalha como corretor na bolsa de valores de Nova York e tem como principal objetivo na vida chegar ao topo da pirâmide financeira e social. Disposto a qualquer artimanha para alcançar suas metas pessoais, ele trabalha incansavelmente para conquistar a atenção de um dos maiores especuladores do país, o ganancioso Gordon Gekko (Michael Douglas). Conhecido no mercado por seus métodos pouco ortodoxos (quando não criminosos), Gekko acaba por colocar Fox sob suas asas e, com o tempo, a explorar suas informações privilegiadas para obter vantagens. Mergulhado em um mundo sofisticado que contrasta com sua vida até então de poucos recursos, Fox passa a conviver com gente como a decoradora Darien (Daryl Hannah) - com quem se envolve romanticamente - e uma série de outros tubarões pouco afeitos à ética. Conforme vai subindo na vida, porém, o jovem vai se distanciando do universo classe média de seu pai, Carl (Martin Sheen), funcionário de uma empresa de aviação comercial que, devido às maquinações de Gekko, entra no caminho da falência.

Apesar de hoje em dia Michael Douglas ser considerado o intérprete ideal de Gordon Gekko - com uma atuação antológico que marcou definitivamente sua carreira -, seu nome não foi o primeiro a ser pensado para o papel (inclusive havia o temor, que mostrou-se infundado, de que ele poderia, devido a sua experiência como produtor premiado, tentar interferir nos bastidores). Antes que Douglas assumisse o desafio, astros consagrados como Al Pacino, Jack Nicholson, Robert DeNiro e Warren Beatty estiveram na mira de Stone (que pensou até mesmo em Richard Gere, conhecido mais como galã do que por seus dotes de ator sério). A escolha de Douglas, no entanto, foi o tiro mais certo da produção: até então mais respeitado como produtor (vencedor do Oscar por "Um estranho no ninho", de 1975), astro de produções comerciais como "Tudo por uma esmeralda" (1984) e "A joia do Nilo" (1985) e filho de Kirk Douglas, Michael aproveita cada momento em cena para demonstrar uma persona radicalmente oposta àquela que, no mesmo ano, havia oferecido às plateias como o adúltero atormentado pela ex-amante no sucesso "Atração fatal" - filmado concomitantemente e indicado a seis Oscar: cínico, amoral e por vezes cruel, Gordon Gekko encontrou nele sua mais perfeita tradução, a ponto de eclipsar o verdadeiro protagonista do filme, o jovem Bud Fox, cujo pacto mefistofélico é a base da narrativa e a fonte da moral da história - interpretado por um jovem Charlie Sheen, que ficou com um papel ambicionado por um então ascendente Tom Cruise.

Antes de consagrar-se com o papel principal de "Nascido em 4 de julho" (1989), também dirigido por Oliver Stone, Cruise demonstrou interesse em interpretar Bud Fox, mas acabou preterido por Charlie Sheen, cuja rigidez juvenil serviu como uma luva para as intenções do roteiro em retratar o personagem como alguém preso entre a ambição de tornar-se um milionário do mundo das finanças e os valores ensinados por seu pai sindicalista e de rígida moral (vivido pelo pai de Charlie, o veterano Martin Sheen). Mas se Charlie foi capaz de utilizar-se de sua quase inexperiência para atingir o objetivo de Stone o mesmo não pode ser dito de parte do elenco escolhido pelo cineasta (e que deu origem a dores de cabeça nos bastidores): tanto Daryl Hannah quanto Sean Young foram alvos de severas (e justas) críticas por parte da imprensa, que percebeu em ambas uma sensação de insegurança e deslocamento a ponto de terem suas cenas diminuídas na montagem final. Young - conhecida por ser de difícil convivência e pouco respeitada como atriz - queria o papel de Hannah e nunca fez questão de esconder seu desejo, tornando as filmagens um campo de batalha silencioso e tenso: sua relação difícil com Charlie Sheen não deixou as coisas melhores e seu comportamento pouco profissional acabou por eliminar uma trama paralela que ampliaria a importância de sua personagem. Não é de admirar, portanto, o quão pouco desenvolvidos são os papéis femininos na trama.

Um dos filmes mais representativos da sociedade dos EUA da era Reagan, "Wall Street: poder e cobiça" não foi exatamente um sucesso popular, mas revelou em Oliver Stone um cineasta atento à sua época e inteligente na forma de explorar as ferramentas narrativas a seu dispor - é brilhante, por exemplo, o modo como utiliza a fotografia para estabelecer a diferença de ritmo e intenções quando retrata a quase violência da bolsa de valores (na pele de Fox e seus colegas) e a serenidade do caráter incorruptível de Carl. Parte de um período prolífico e elogiado na carreira do diretor, o filme rendeu a única continuação em seu currículo - e apesar do tema difícil e pouco atraente, é um ponto alto em sua filmografia.

WALL STREET: PODER E COBIÇA

  WALL STREET: PODER E COBIÇA (Wall Street, 1987, 20th Century Fox, 126min) Direção: Oliver Stone. Roteiro: Oliver Stone, Stanley Weiser. ...