sexta-feira

MENINOS NÃO CHORAM


MENINOS NÃO CHORAM (Boys don't cry, 1999, Fox Searchlight Pictures, 118min) Direção: Kimberly Peirce. Roteiro: Kimberly Peirce, Andy Bienen. Fotografia: Jim Denault. Montagem: Tracy Granger, Lee Percy. Música: Nathan Larson. Figurino: Victoria Farrell. Direção de arte/cenários: MichaelShaw/Shawn Carroll. Produção executiva: Caroline Kaplan, Pamela Koffler, Jonathan Sehring, John Sloss. Produção: John Hart, Eva Kolodner, Jeffrey Sharp, Christine Vachon. Elenco: Hilary Swank, Chloe Sevigny, Peter Sarsgaard, Brendan Sexton III, Alicia Goranson, Jeanetta Arnette, Matt McGrath. Estreia: 22/10/99


2 indicações ao Oscar: Atriz (Hilary Swank), Atriz Coadjuvante (Chloe Sevigny)
Vencedor do Oscar de Melhor Atriz (Hilary Swank)
Vencedor do Golden Globe de Melhor Atriz/Drama (Hilary Swank)


Às vezes histórias trágicas, brutais e inacreditáveis fazem com que as pessoas acordem de uma letargia, mesmo que seu despertar – oriundo de um baque – não tenha força de mudar coisa alguma. E às vezes essas mesmas histórias sangrentas e desesperançadas podem virar pérola em mãos de talento. É isso que acontece em “Meninos não choram”, uma história trágica, brutal e inacreditável... mas que infelizmente aconteceu de verdade.

A jovem Teena Brandon (vivida com uma visível determinação pela ótima Hilary Swank) sofre de transtornos sexuais. Incapaz de aceitar o fato de que é uma mulher, ela vive sob o pseudônimo de Brandon Teena, um rapaz tímido e sedutor constantemente envolvido em pequenas contravenções. Vivendo nesse seu universo paralelo ela chega a uma cidadezinha qualquer dos EUA e, depois de fazer amizade com uma dupla de ex-presidiários (os assustadores Peter Saarsgard e Brendon Sexton III) se apaixona perdidamente por Lana (Chloe Sevgny), uma jovem ambiciosa e perdida em seus sonhos de abandonar sua vida tediosa. O romance engrena mesmo com a mentira de Teena / Brandon entre as duas. No entanto, uma hora a verdade vem à tona e, sentindo-se enganados e traídos os violentos amigos de Lana partem para uma vingança cruel e estúpida.



“Meninos não choram” saiu do nada para a glória. Estréia da diretora Kimberly Peirce, feito com apenas 2 milhões de dólares e sem nenhum astro em seu elenco, o filme começou a chamar a atenção graças ao espetacular trabalho de Swank, que a despeito de sua participação em filmes constrangedores como “Karatê Kid IV”, mostrou que sabe como poucas agarrar com unhas e dentes uma chance promissora e de quebra levou o Globo de Ouro e o Oscar de melhor atriz – um prêmio merecido e devidamente louvado. Na pele de Teena Brandon, ela consegue despertar a simpatia até mesmo do público mais conservador e o leva com ela por seu calvário em busca da aceitação e da felicidade ao lado da mulher que ama, vivida com ar blasé por Chloe Sevigny, que faz o que pode com sua personagem igualmente complexa – uma mulher disposta a mentir para si mesma para fugir de uma vida infeliz.

Contra elas, Peter Saarsgard constrói seu Paul de maneira visceral, quase psicótica em seu amor obsessivo. Seu olhar de ódio e desprezo diz mais sobre a maldade intrínseca no ser humano do que milhares de páginas de discursos políticos. Somada à quantidades industriais de cerveja – que parece exalar da tela tamanha a veracidade da seca fotografia, sua raiva e inveja da felicidade alheias causam desgraças como a que vitimou a protagonista do filme, que sim, é trágica, brutal e inacreditável. Mas também um alerta contra a intolerância, tão chocante e cru quanto necessário.

Em um tempo onde a intolerância e a ignorância ainda insistem em se insinuar apesar dos avanços, "Meninos não choram" é um filme obrigatório. É impossível não se impactar com tamanha tragédia, mesmo que, como dito no início do texto essa indignação despertada nunca ultrapasse a janela de nossas casas. Mas só por sacudir e fazer pensar a obra de Pierce já é de vital importância para a discussão dos direitos humanos e para a luta pela igualdade. E ajuda bastante o fato de ser um filme de grande qualidade.

3 comentários:

renatocinema disse...

Esse filme marcou minha vida.

Primeiro pela força de sua narrativa dramática que me tocou a alma e o coração.

Atuações perfeitas e marcantes.

Disse e assino embaixo: saiu do nada para a glória.

Comparo a atuação de Hilary Swank, merecedora do Oscar, com a de Natalie Portman esse ano com Cisne Negro.

Imperdíveis, marcantes e tocantes.

Belo texto.

Alan Raspante disse...

É um excelente filme e que eu preciso rever. Lembro que gostei bastante, mas tinha ficado, na época, com a impressão de que "poderia" ter sido melhor. Quero dizer, faltou algo... sabe?

Mas, enfim, preciso rever!

Cristiano Contreiras disse...

Um filme forte, denso e impactante. Esse Oscar de Hilary foi mais merecido que o seu segundo, e convenhamos, o filme merecia indicação pra Saarsgard também, ele está visceral no filme e é o contraponto perfeito em cenas de maior densidade emocional.

Um dos melhores filmes de todos os tempos.

Ótimo seu texto!

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