terça-feira

FANTASMAS DO PASSADO

 


FANTASMAS DO PASSADO (Ghosts of Mississippi, 1996, Columbia Pictures, 130min) Direção: Rob Reiner. Roteiro: Lewis Colick. Fotografia: John Seale. Montagem: Robert Leighton. Música: Marc Shaiman. Figurino: Gloria Gresham. Direção de arte/cenários: Lilly Kilvert/Karen A. O'Hara. Produção executiva: Charles Newirth, Jeffrey Stott. Produção: Nicholas Paleogolos, Rob Reiner, Andrew Schneiman, Frederick Zollo. Elenco: Alec Baldwin, Whoopi Goldberg, James Woods, Craig T. Nelson, Virginia Madsen, Diane Ladd, Susanna Thompson, William H. Macy, Jerry Levine, Terry O'Quinn, James Pickens Jr., Lucas Black, Jerry Hardin. Estreia: 20/12/96

2 indicações ao Oscar: Ator Coadjuvante (James Woods), Maquiagem

Quando "Fantasmas do passado" chegou aos cinemas, em dezembro de 1996, fazia apenas dois anos e meio que sua história havia tido seu desfecho. O  terceiro julgamento de Byron de la Beckwith pelo assassinato do líder negro Medgar Evers em 1963 - depois de dois outros anulados por uma série de circunstâncias que beneficiavam o réu  - tornou-se assunto dominante em Jackson, Mississippi no começo de 1994 e sua versão cinematográfica aproveitou-se da energia de revolta local para tentar transmitir ao espectador toda a força dos acontecimentos que foram um marco na luta pelos direitos civis na sociedade norte-americana. Não conseguiu completamente. A bilheteria pouco expressiva e a receptividade morna da crítica acabaram por relegar o filme a uma espécie de limbo na carreira do diretor Rob Reiner, apenas um meio-termo entre o sucesso de "Conta comigo" (1986), "Harry & Sally: feitos um para o outro" (1989), "Louca obsessão" (1990) e "Questão de honra" (1992) e o fracasso comercial de "O anjo da guarda" (1994) e "Alex & Emma: escrevendo sua história" (2003).  Mesmo assim, chamou a atenção o suficiente para render a James Woods uma indicação ao Oscar de ator coadjuvante - a segunda de sua carreira.

Woods - na pele do venal Byron de la Beckwith - é o destaque absoluto do filme de Reiner. Mesmo com poucos minutos em cena, seu desempenho consegue eclipsar tanto a potente atuação de Whoopi Goldberg (tentando dar consistência às falas clichês de sua personagem) quanto o esforço de Alec Baldwin, ainda não exatamente reconhecido como o ator de respeito que se tornaria com o passar dos anos. Fugindo da tentação de fazer de Beckwith um vilão humanizado (basta ver entrevistas reais para perceber que isso é impossível), o veterano ator dá o seu melhor para transmitir, em cada aparição, todo o ódio e o desprezo que move o movimento supremacista do sul dos EUA - e do resto do mundo. Sempre que surge na tela, seu olhar maligno e sua expressão de desprezo pela justiça tornam impossível ignorar seu minucioso trabalho - algo que nem mesmo a maquiagem exagerada (inexplicavelmente indicada ao Oscar) consegue atrapalhar. Lamentável que o roteiro não lhe dê mais espaço e se concentre naquele que talvez seja o grande problema do filme: a figura do criticado white savior - termo que caracteriza, normalmente de forma pejorativa, uma pessoa branca que se torna o herói em uma luta racial. Ok, o advogado que levou Beckwith aos tribunais em 1994,Bobby DeLaughter, é branco. Mas fica, mesmo assim, a sensação de um foco inadequado a uma trama tão nitidamente específica.


 

Apesar de dar a Whoopi Goldberg o importante e crucial papel de Myrlie Evers, a viúva do ativista pelos direitos civis Medgar Evers (vivido no filme por James Pickens Jr., de "Grey's Anatomy"), o roteiro de "Fantasmas do passado" se concentra basicamente em Bobby DeLaughter, promotor do Mississipi que entra, quase por acaso, no caso do terceiro julgamento de um racista radical acusado pelo assassinato. Casado, pai de dois filhos e parte de uma família tradicional e respeitada, Bobby se deixa convencer pela persuasiva Myrlie de que trinta anos já é tempo suficiente para tentar novamente a condenação do homem que matou seu marido. Para conquistar sua confiança, o promotor põe em risco seu casamento, sua carreira e até mesmo sua vida. Sem o apoio daqueles que o rodeiam - todos profundamente enraizados nos preconceitos sulistas - e questionado até mesmo por Myrlie, ele descobre, no processo rumo ao tribunal, que condenar um homem tão abertamente preconceituoso e intolerante não é tarefa fácil, especialmente em seu contexto geográfico e social.

Assumindo um papel que foi cogitado para ser de Tom Cruise ou de Tom Hanks - ambos com potencial comercial bem maior -, Alec Baldwin sofre com a direção quase mecânica de Rob Reiner e com o roteiro esquemático e quase frio. Ao tentar evitar o sentimentalismo inerente à história, Reiner nega à plateia o tom emocional que poderia fazer de seu filme uma produção marcante e relevante. Lançado no mesmo ano do sucesso "Tempo de matar" e do fiasco "O segredo" - ambos com temática semelhante, ainda que relatos de ficção baseados em livros de John Grisham -, "Fantasmas do passado" passou praticamente em branco nos cinemas e dificilmente é lembrado mesmo nas filmografias de seus atores principais. Não deixa de ser uma injustiça: mesmo longe de ser um dos melhores filmes do diretor ou até mesmo sobre o tema, é um entretenimento decente - ainda que seu foco seja um tanto problemático.

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