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IMPRÓPRIO PARA MENORES


IMPRÓPRIO PARA MENORES (Noises off, 1992, Touchstone Pictures, 101min) Direção: Peter Bogdanovich. Roteiro: Marty Kaplan, peça teatral de Michael Frayn. Fotografia: Tim Suhrstetd. Montagem: Lisa Day. Figurino: Betsy Cox. Direção de arte/cenários: Norman Newberry/Jim Duffy. Produção executiva: Peter Bogdanovich, Kathleen Kennedy. Produção: Frank Marshall. Elenco: Michael Caine, Christopher Reeve, Denholm Elliot, Carol Burnett, John Ritter, Julie Hagerty, Marilu Henner, Nicolette Sheridan, Mark Linn-Baker. Estreia: 20/3/92

Crítico, historiador de cinema e diretor de alguns filmes indispensáveis do começo dos anos 1970, como "A última sessão de cinema" (1971) - que lhe rendeu duas indicações ao Oscar -, "Essa pequena é uma parada" (1972) e "Lua de papel" (1973), Peter Bogdanovich nunca recuperou, nas décadas seguintes, o mesmo prestígio e o mesmo sucesso de bilheteria. Com exceção de "Marcas do destino" (1985) - que deu a Cher o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes -, seus trabalhos pareciam ter perdido a conexão com as plateias, e nem mesmo "Texasville" (1990), que revisitava os aclamados personagens de "A última sessão", conseguiu reverter esse quadro. Foi nesse período de declínio profissional que ele tentou voltar às comédias, com a adaptação da peça teatral "Noises off", indicada ao Tony de melhor espetáculo de 1984. Não reencontrou seu público, mas demonstrou que sua segurança em lidar com os mecanismos do humor anárquico/caótico ainda se mantinha intocável. Contado com um elenco heterogêneo e um texto preciso e inteligente que homenageia o teatro (e por consequência tudo que o cerca), "Impróprio para menores" é um filme que lembra o melhor de Woody Allen - que evocaria o mesmo universo em seu "Tiros na Broadway" dois anos depois.

"Impróprio para menores" é contado, como uma peça de teatro, em três atos bem definidos, unidos por uma narração em off do diretor Lloyd Fellowes (Michael Caine), que sofre com a possibilidade de sua montagem da comédia "Nothing on" ser um fracasso monumental. A trama da peça - um vaudeville ligeiro e popular - gira em torno de um chalé no campo visitado por dois casais que não deveriam estar lá, uma empregada pouco confiável, um ladrão de residências e um sheik árabe interessado na compra do imóvel. Mas se no palco a confusão é generalizada, nos bastidores as coisas são ainda mais complicadas: o ator Gary Lejeune (John Ritter) tem um caso com a colega Dotty Ottley (Carol Burnett), significantemente mais velha; o galã Frederick Dallas (Christopher Reeve) é abandonado pela esposa poucas horas antes da estreia; o veterano Selsdon Mowbray (Denholm Elliott) está entregue ao vício da bebida e está a cada dia mais surdo; e o próprio diretor está envolvido em um triângulo amoroso com a bela Brooke Ashton (Nicolette Sheridan) e a assistente de palco Poppy Taylor (Julie Hagerty). No período que antecede a estreia do espetáculo na Broadway - quando o grupo viaja por várias cidades do interior como forma de fortalecer sua união e a qualidade das apresentações -, as situações vão ficando mais e mais absurdas, o que ameaça a continuidade da temporada.

 

Contado como uma peça de teatro em três atos - o primeiro antes da estreia em um teatro de Iowa, o segundo em uma caótica apresentação em Miami, e o terceiro na Broadway em si -, "Impróprio para menores" explora os mais variados tipos de humor. Da comédia de erros de seu primeiro capítulo ele se transforma em um espetáculo de quase cinema mudo (com uma precisão de movimentos que ecoa a própria peça que se desenrola como pano de fundo), e Bogdanovich mostra que ainda domina o tempo cômico que apresentou em "Essa pequena é uma parada". Para isso, ele tem a sorte de contar com atores que entendem totalmente o espírito do projeto e alguns (como Christopher Reeve) surpreendem com um inesperado talento para a comédia. Carol Burnett - especialista no gênero - nem precisa se esforçar muito para imprimir sua marca, e Michael Caine de certa forma surge como o mais equilibrado da trupe, oferecendo a seu Lloyd Fellowes um misto de tranquilidade externa e turbilhão interior a que apenas a plateia tem acesso. E Caine, com sua generosidade, foi o responsável por um dos grandes acertos do filme: a escalação do ator Denholm Elliott.

Amigo de Michael Caine desde que contracenaram em "Como conquistar as mulheres" (1966), o britânico Elliott havia descoberto pouco tempo antes que era portador do vírus da AIDS - uma doença ainda cercada de extremo preconceito no começo dos anos 1990. Sabendo da situação do amigo, e de sua potencial dificuldade em encontrar trabalho a partir dali, Caine - que já o havia derrotado na disputa pelo Oscar de coadjuvante de 1986 - condicionou sua participação em "Impróprio para menores" à contratação do colega para o papel que John Gielgud havia recusado. Condição aceita, Elliott entregou uma performance inspirada que seria a sua última: ele morreu meses depois da estreia do filme e Caine, por sua vez, entraria em um período prolífico da carreira a partir de seu segundo prêmio da Academia, por "Regras da vida" (1999). Peter Bogdanovich, por sua vez, jamais recuperaria seu status de grande diretor, acumulando uma sucessão de fracassos até sua morte, em janeiro de 2022.

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