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ENCAIXOTANDO HELENA

 


ENCAIXOTANDO HELENA (Boxing Helena, 1993, Mainline Pictures/MGM Pictures, 107min) Direção: Jennifer Chambers Lynch. Roteiro: Jennifer Chambers Lynch, estória de Philippe Caland. Fotografia: Bojan Bazelli, Frank Byers. Montagem: David Finfer. Música: Graeme Revell. Direção de arte/cenários: Paul Huggins/Sharon Braunstein. Produção executiva: James R. Schaeffer, Larry Sugar. Produção: Philippe Caland, Carl Mazzocone. Elenco: Julian Sands, Sherilyn Fenn, Bill Pullman, Art Garfunkel, Betsy Clark, Kurtwood Smith. Estreia: Janeiro/93 (Festival de Sundance)

Antes mesmo de chegar às telas - o que aconteceu no Festival de Sundance de 1993 -, o filme de estreia da diretora Jennifer Lynch já estava nas páginas das publicações sobre cinema. Nem tanto pela curiosidade a respeito do primeiro trabalho da filha do prestigiado David Lynch mas sobretudo a respeito dos problemas de bastidores, que incluíam um clamoroso processo contra a atriz Kim Basinger  e a escolha por um elenco sem grandes astros depois da possibilidade de contar com Ed Harris ou John Malkovich no principal papel masculino. Fracasso de bilheteria que dividiu a crítica e comprometeu a nascente carreira da cineasta - que assinou alguns longa-metragens de pouca repercussão antes de dedicar-se à televisão -, "Encaixotando Helena" esbarrou principalmente na indecisão entre ser uma perturbadora história de amor ou um filme de suspense erótico: não agradou a nenhum público-alvo e entrou para a história mais como curiosidade do que exatamente por suas qualidades artísticas.

Segundo a própria Jennifer, seu roteiro foi escrito em dois meses quando ela tinha apenas dezenove anos. Não é de duvidar, a julgar pela superficialidade da trama e pela construção de seus personagens repleta de clichês. O protagonista, Nicholas Cavanaugh (Julian Sands) pode até carregar traumas de infância causados pelo excesso de sensualidade de sua mãe - algo que atrapalha sua relação com a colega de profissão, Anne Garret (Betsy Clark), disposta a um compromisso mais sério -, mas tais sentimentos jamais ultrapassam o óbvio. A bela Helena (Sherylin Fenn), apesar de demonstrar uma personalidade forte e uma certa prepotência em seu relacionamento com Ray O'Malley (Bill Pullman), não repete tais atitudes quando confrontada com um destino pouco feliz nas mãos de Nicholas. E toda a tensão sexual fetichista advinda da situação central não consegue escapar de um tom de fantasia machista, prejudicado pela estética pouco sofisticada e pela trilha sonora invasiva de Graeme Revell. O fato de Lynch ter recebido o aval do produtor Carl Mazzocone para assumir a direção do filme para que ele tivesse um olhar feminino não altera a percepção de que, apesar das intenções, "Encaixotando Helena" não passa de uma tentativa mal-sucedida de mesclar horror gótico, romance e sexo.


 

A trama engendrada por Jennifer Lynch gira em torno de Nick Cavanaugh, um médico bem-sucedido profissionalmente, atormentado por lembranças de uma infância dominada pela sensualidade avassaladora da mãe. Com a morte da matriarca, ele se transfere para a isolada mansão da família e se entrega a uma obsessão por Helena, por quem se apaixonou perdidamente depois de um breve encontro. Nem mesmo seu namoro hesitante com uma colega de trabalho, Anne, o afasta dos pensamentos constantes de reconquistar a bela e sedutora jovem, que simplesmente ignora suas tentativas de aproximação e o trata com um desprezo quase debochado. A relação entre eles sofre uma reviravolta, no entanto, quando um acidente de carro joga Helena nos braços de Nick - depois de amputar as duas pernas de sua musa, ele a esconde em sua propriedade e começa um intensivo jogo de sedução, com o objetivo de convencê-la de seu amor e dedicação. A princípio chocada com sua nova situação, Helena aos poucos vai percebendo que não há maneira de fugir de sua triste sina.

Helena, a heroína trágica criada por Jennifer Lynch, parecia, no começo dos anos 1990, por pouco não caiu nas mãos de Madonna, então em sua cruzada sensual que incluía o álbum "Erotica" e o livro de fotografias "Sex". A saída da estrela pop do projeto abriu espaço para outro símbolo sexual inquestionável do momento, Kim Basinger, parte do inconsciente popular masculino desde suas aventuras ao lado de Mickey Rourke no cult movie "9 1/2 semanas de amor" (1986). Basinger chegou a se comprometer com a produção até que, inesperadamente, abandonou o barco, para fúria dos produtores, que foram à justiça e a condenaram ao pagamento de uma multa de nove milhões de dólares. A saída, tanto de Madonna quanto de Basinger, alterou o tom de "Encaixotando Helena", que tornou-se mais explícito com a chegada de Sherilyn Fenn, cujo rosto angelical já havia sido explorado pelo pai de Jennifer, David, em sua série de televisão "Twin Peaks". Deslumbrante, mas sem alcance dramático o bastante para driblar as falhas do roteiro e a insegurança da direção, Fenn faz pouco mais do que enfeitar a tela, deixando o esforço maior para Julian Sands, que tenta ao máximo extrair verossimilhança em uma trama que, apesar da ousadia de sua premissa, se acovarda em um final decepcionante. Prometendo muito mais do que entrega (em termos de trama e resultado final), "Encaixotando Helena" pode até lembrar, em sua atmosfera onírica, a obra de David Lynch. Mas a estreia de Jennifer ficou muito aquém do que o DNA poderia sugerir.

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