quarta-feira

A CASA DOS ESPÍRITOS


A CASA DOS ESPÍRITOS (The house of the spirits, 1993, Costa do Castelo Filmes, 140min) Direção: Bille August. Roteiro: Bille August, romance de Isabel Allende. Fotografia: Jorgen Persson. Montagem: Janus Billeskov Jansen. Música: Hans Zimmer. Figurino: Barbara Baum. Direção de arte/cenários: Anna Asp/Soren Gam. Produção executiva: Edwin Leicht, Dieter Meyer, Mark Rosenberg, Paula Weinstein. Produção: Bernd Eichinger. Elenco: Jeremy Irons, Meryl Streep, Glenn Close, Winona Ryder, Antonio Banderas, Vanessa Redgrave, Armin Mueller-Stahl, Teri Polo, Vincent Gallo, Maria Conchita Alonso. Estreia nos EUA: 01/4/94

Demorou anos até que o best-seller da escritora chilena Isabel Allende chegasse às telas. E eis que finalmente, chegou, nas mãos do cineasta Bille August, mas pasteurizado, simplificado e até mesmo decepcionante para quem leu sua obra-prima. Quem não passou os olhos pelo longo romance, no entanto, pode gostar do filme e até se emocionar, graças ao grande e competento elenco, que passa por cima dos defeitos da adaptação simplista feita pelo próprio diretor. "A casa dos espíritos", o filme, não chega aos pés do romance que lhe deu origem, mas não chega exatamente a destruí-lo.

Sobrinha do ex-presidente Salvador Allende, Isabel utilizou em seu romance elementos sobrenaturais que lembrava a prosa realista-fantástica de Gabriel García Marquez, mas que, em formato áudio-visual, são apenas detalhes quase insignificantes em meio à longa saga da família Trueba. Tudo bem que condensar décadas da vida de uma família em pouco mais de duas horas de duração não é tarefa das mais fáceis, principalmente levando-se em conta que a autora mistura mediunidade com política, amores proibidos e psicologismos freudianos e que dar profundidade a isso em um único longa-metragem é um esforço hercúleo e normalmente inglório. Mas August, diretor do belo "Pelle, o conquistador", vencedor do Oscar de filme estrangeiro em 1989 poderia ter sido menos acadêmico no que é seu trabalho mais ambicioso comercialmente.

A história começa quando o pobre mas ambicioso Esteban Trueba (Jeremy Irons, que convence de jovem a idoso) pede a mão da bela Rosa (Teri Polo) a seus cuidadosos pais (Armin Mueller-Stahl e Vanessa Redgrave, subaproveitados). Querendo enriquecer o mais rapidamente possível, ele vai trabalhar em uma mina de diamantes, mas quando retorna para a mulher que ama, a encontra morta, vítima de um atentado político contra seu pai. Desesperado de dor, ele se refugia no trabalho de construir a Fazenda Três Marias ao lado da irmã solteirona Ferula (Glenn Close), que passou a vida cuidando da mãe doente. Depois de vinte anos, Esteban pede em casamento a irmã de Rosa, Clara (Meryl Streep), uma médium que vive em seu próprio mundo e que adota Ferula como sua irmã de coração.

É a saga da família Trueba que é contada no romance e no filme. Décadas depois de seu casamento com Clara, Esteban vê Blanca (Winona Ryder) sua única filha dentro do casamento - a despeito de no mínimo um filho bastardo ressentido contra a própria pobreza - envolver-se romanticamente com Pedro (Antonio Banderas), líder sindicalista que prega melhores condições de trabalho na fazenda dos Trueba e que passa a ser perseguido depois do golpe militar do início dos anos 70 - que depôs, inclusive, o tio da escritora.

O roteiro de August concentra-se bem mais nos problemas políticos e sociais da história do que em seus elementos sobrenaturais - o que faz com que o título soe meio deslocado. Se acerta por um lado, deixa fãs inconsoláveis de outro. Acerta em deixar o rojão maior nas mãos competentes de Jeremy Irons, mas não aproveita como deveria a dupla Meryl Streep e Glenn Close, que, embora menos exploradas do que deveriam, nunca deixam de dar seu show particular: nas cenas em que qualquer uma delas está presente, o filme cresce emocionalmente - tome-se como exemplo a cena em que Clara beija Ferula no rosto, em um restaurante, e ela chora dizendo que nunca foi querida por ninguém. Também é comovente o encontro entre Blanca, à beira da morte depois das torturas impostas pelos militares, com o espírito de sua mãe, que a convence a permanecer viva.

Ainda que não consiga atingir todas as nuances do belo romance de Allende - passando muito superficialmente por temas espinhosos, como o amor que Ferula sente pela cunhada e a relação entre Trueba e as empregadas que ele violentava - a adaptação de "A casa dos espíritos" para o cinema consegue ser interessante o bastante para segurar a audiência na poltrona. Mas, perto da obra-prima que poderia ser, não deixa de ser decepcionante. Felizmente o elenco salva miraculosamente o resultado final.

6 comentários:

renatocinema disse...

Raros são os filmes melhores que os livros. Como eu não li a obra, apenas assisti o filme, o que ocorreu muitos anos atrás, gostei bastante.

Mas, sem ter a visão literária da obra realmente é complicado eu poder comparar.

Ricardo Morgan disse...

Também não li o livro, mas adorei o filme! Um clássico dos anos 90!

Mateus Denardin disse...

Você escreveu "obra-prima que poderia ser", mas às vezes literaturas excelentes realmente não conseguem ter o mesmo poder nas telas, o que pode ser devido a uma má adaptação ou, mais importante, pelas particularidades que cada meio (literário e cinematográfico) guarda. Não li o livro, mas achei o filme chatíssimo e considero um dos elencos mais desperdiçados que já vi numa produção.

Fernando disse...

Não li o livro, mas pretendo fazê-lo. Enquanto isso, considero o filme muito bom!

DEIDIANE SILVA SIQUEIRA disse...

Comecei assistir esse filme anos atrás eu devia ter uns 10 anos de idade, não terminei, pois como eu era criança fui surpreendida pela chegada de meu pai de viagem que logo desligo a TV e me mandou dormir, rrsr. Agora depois de muitos anos ja com 34anos de idade, eu encontrei o filme novamente, nem acreditei que agora assistiria o restante. E o resultado foi surpreendente, esse filme tem minha admiração. Recomendo.

Clenio disse...

Oi, Deidiane. Eu gostaria de saber como é a percepção de um espectador que não leu o livro, que é uma obra-prima e um dos meus preferidos. Como já fui assistir ao filme com essa bagagem eu me decepcionei, mas acredito que sem a leitura ele pode soar melhor. Obrigado pelo comentário - e tente ler o livro. Vc vai amar.

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