terça-feira

A ÚLTIMA NOITE

A ÚLTIMA NOITE (The 25th hour, 2002, Touchstone Pictures, 135min) Direção: Spike Lee. Roteiro: David Benioff, romance de sua autoria. Fotografia: Rodrigo Prieto. Montagem: Barry Alexander Brown. Música: Terence Blanchard. Figurino: Sandra Hernandez. Direção de arte/cenários: James Chinlund/Ondine Karady. Produção executiva: Nick Weschler. Produção: Julia Chasman, Jon Kilik, Spike Lee, Tobey Maguire. Elenco: Edward Norton, Philip Seymour Hoffman, Barry Pepper, Brian Cox, Rosario Dawson, Anna Paquin. Estreia: 19/12/02

Desde que surgiu no cenário hollywoodiano, com seu genial trabalho em "As duas faces de um crime", que lhe deu uma merecida indicação ao Oscar de ator coadjuvante, Edward Norton teve uma trajetória exemplar. Trabalhou com cineastas acima de qualquer suspeita, como Woody Allen, Milos Forman e David Fincher, assumiu a cadeira de diretor com o simpático "Tenha fé" e entregou no mínimo uma atuação inesquecível, como o skinhead arrependido de "A outra história americana", de 1998. Depois de alguns filmes que não exploraram todo o potencial de seu talento - entre eles "Dragão vermelho", terceiro filme estrelado por Hannibal Lecter - ele voltou a encantar seu público com "A última noite", um potente e polêmico drama dirigido pelo não menos controverso Spike Lee.

Realizado sob a tensão pós-11 de setembro, "A última noite" é baseado em um romance de David Benioff, também autor do belo roteiro, que discute preconceito, lealdade, diferenças sociais e a força da amizade sem soar piegas ou condescendente. Contando com um protagonista falível e um time de coadjuvantes interessantes por si mesmos, é um filme que foge do panfletarismo barato que caracteriza a obra de seu diretor, atingindo seu público justamente por ser honesto em suas discussões e seu amor incondicional por Nova York e suas idiossincrasias culturais e sociais.

Quando o filme começa, o protagonista Monty Brogan (Edward Norton, ótimo) está às vésperas de ir para a cadeia, condenado a sete anos de prisão por tráfico de drogas. Sua última noite de liberdade será passada ao lado da namorada, Naturelle (Rosario Dawson) e dos melhores amigos, o yuppie Frank (Barry Pepper, excelente) e o professor de Literatura Jacob (Philip Seymour Hoffman). Enquanto se sente angustiado com a possibilidade de ter sido denunciado pela mulher que ama, Monty encara suas últimas horas de liberdade como uma espécie de despedida de uma vida com certo conforto e tranquilidade e questiona o estado em que está a cidade que ama após os atentados cometidos por Osama Bin Laden. Nesse meio-tempo, Frank tenta convencê-lo de que o ajudará após a temporada na prisão e Jacob foge da tentação sexual representada por uma aluna adolescente, Mary (Anna Paquin).



Apesar de sua trama ter elementos policiais - tráfico de drogas, traição - "A última noite" é, acima de tudo, um drama familiar (sendo o núcleo familiar tradicional subsituído pelos amigos) que retrata com acuracidade diferentes estilos de vida americanos. Frank é o arrogante executivo das finanças que se acha mais importante que os amigos porque tem um salário muito maior que o deles; Jacob é o professor solitário e idealista que se deixa seduzir por uma aluna que precisa de boas notas; e Monty representa o tipo de gente que se deixa levar pelo caminho mais fácil de atingir o sucesso, vendendo drogas a estudantes e tornando-se um traficante conhecido e bem-sucedido. Apesar de suas diferenças, eles tem uma convivência pacífica e quase terna, só abalada pela presença de Naturelle, uma presença dúbia e sexy que tanto pode ser a mulher confiável em que Monty acredita plenamente ou a traidora que seus amigos pintam.

Dirigido com fúria contida por um Spike Lee discreto mas eficaz em sua maneira pungente de fazer cinema, "A última noite" se beneficia amplamente de seu elenco, composto por atores em seus melhores dias. Se Norton e Seymour Hoffman não precisam provar nada a ninguém, a surpresa maior fica por conta de Barry Pepper, que por pouco não rouba as cenas em que aparece, em uma interpretação inspirada e sutil que vai se avolumando até estourar nas suas últimas cenas, em que precisa espancar o melhor amigo para ajudá-lo a sobreviver na prisão. E na pele de James, o calejado pai de Monty, o onipresente Brian Cox brinda o público com um trabalho delicado e emocionante.

Um dos filmes mais subestimados da temporada 2002, "A última noite" é fascinante, forte, impactante e comovente na medida certa. Um belíssimo filme, feito para adultos que gostam de cinema com consistência.

Um comentário:

renatocinema disse...

Quero muito ver o filme.

Norton merece todos elogios.

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