GREY GARDENS (Grey Gardens, 2009, HBO Films, 104min) Direção: Michael Sucsy. Roteiro: Michael Sucsky, Patricia Rozema, estória de Michael Sucsy. Fotografia: Mike Eley. Montagem: Alan Heim, Lee Percy. Música: Rachel Portman. Figurino: Catherine Marie Thomas. Direção de arte/cenários: Kalina Ivanov/Norma Jean Sanders. Produção executiva: Lucy Barzun Donnelly, Rachel Horovitz, Michael Sucsy. Produção: David Coatsworth. Elenco: Jessica Lange, Drew Barrymore, Daniel Baldwin, Jeanne Tripplehorne, Ken Howard, Kenneth Welsh, Arye Gross, Justin Louis. Estreia: 18/4/09
Vencedor de 2 Golden Globes: Melhor Minissérie ou Filme para Televisão, Atriz em Minissérie ou Filme para Televisão (Drew Barrymore)
Milionárias falidas, parentes próximas de Jacqueline Kennedy Onassis, beldades decadentes, mulheres presas a um passado glamoroso e personagens de nada menos que duas produções retratando sua vida, as protagonistas de "Grey Gardens", realizado pela HBO em 2009, parecem obra da mais tresloucada ficção. Mas não são. Objetos de um documentário lançado em 1979 e posteriormente personagens de um telefilme dirigido por Michael Sucsy que retratava sua produção, Edith Bouvier Beale e sua filha, Edie, são figuras únicas, que encontraram nas telas a forma indelével de passar à história após sua derrocada financeira e sua decadência psicológica. Interpretadas com genialidade por Jessica Lange e Drew Barrymore - de longe no melhor desempenho de sua carreira, premiado merecidamente com o Golden Globe e o Emmy - as duas fascinantes personagens encontram respaldo na direção sensível de Michael Sucsy (que mais tarde faria o romântico "Para sempre", com Channing Tatum e Rachel McAdams) e emocionam o público com uma história de cortar o coração que jamais apela para o sentimentalismo.
O roteiro, coescrito pelo diretor e Patricia Rozema, aproveita-se do documentário por David e Albert Maysles como ponto de partida para contar sua história. Primeiramente pensando em focar seu filme na trajetória de Jackie, os dois irmãos acabam fascinados por um outro lado da família da ex-primeira dama quando conhecem sua tia, Edith (Jessica Lange), e sua prima, Edie (Drew Barrymore), que vivem isoladas em uma mansão caindo aos pedaços e dominada pela sujeira feita pelos gatos e por sua absoluta falta de capacidade de manter a salubridade do local. Excêntrica e extrovertida, Edie é quem se torna a estrela do documentário, enquanto à sua mãe resta apenas pontuar a narrativa com suas lembranças de tempos mais fartos. O filme de Sucsy conta a trajetória de mãe e filha através de flashbacks, que começam em 1936 e se estendem até os anos 70, mostrando como a promissora Edie, que sonhava com uma carreira de atriz, e sua mãe - que levava uma vida de luxo e conforto, cercada por gente da alta sociedade e demonstrava talento como cantora - acabaram por tornar-se duas mulheres praticamente enterradas vivas em sua propriedade, outrora motivo de orgulho da família.
Apesar da excentricidade das protagonistas parecer quase exagerada, "Grey Gardens" jamais cai na armadilha de fazer delas motivos de caricatura ou humor proposital. Tratando com respeito e quase carinho de suas personagens, Michael Sucsy apresenta ao público uma história a respeito de sonhos despedaçados, ambições destruídas e uma relação no limite da codependência. Sufocada pela super-proteção familiar - disfarçada de amor e carinho - a jovem Edie se vê impedida de realizar todo o potencial que acredita ter e acaba se deixando envolver pela solidão da mãe, que, infeliz, consegue até mesmo interferir em seu romance (malfadado, é verdade, mas ainda assim um romance) com um homem casado por quem ela se apaixona e que acredita poder lhe fazer feliz. Drew Barrymore brilha tanto na pele da jovem e esperançosa Edie quanto em sua versão mais velha, a um passo do colapso mental e tão crente em seus talentos artísticos que vê no documentário a chance de ser descoberta pelo mundo. Seus embates com Jessica Lange - fantástica em um papel de mãe dominadora que aos poucos vai murchando, conforme percebe os rumos que sua vida vai tomando - são excepcionais, sofrendo alterações com o passar do tempo até chegar a um misto de ressentimento velado e afeto genuíno (ou dependência psicológica). Com a preciosa ajuda da maquiagem - que as envelhece com perfeição - as duas atrizes estão em um momento especial de suas trajetórias, com uma invejável química e trejeitos que lembram em detalhes as verdadeiras protagonistas (quem duvida pode procurar o documentário e conferir: a semelhança é impressionante!).
Comprovando a excelência da HBO na produção de telefilmes que fogem das limitações do gênero, "Grey Gardens" funciona em todos os níveis imagináveis: é dirigido com sutileza, escrito com respeito às personagens e interpretado com extrema inspiração. É impossível não se deixar conquistar pelas duas protagonistas e seus dramas pessoais e familiares - com direito até a uma intervenção de Jackie Kennedy em pessoa, na pele da atriz Jeanne Tripplehorne. Imprimindo um tom leve a uma história que poderia facilmente descambar para o soturno ou o trágico, Michael Sucsy acerta em cheio, evitando tanto o dramalhão rasgado quanto a comédia de humor negro que poderiam diluir a força do roteiro e das personagens, tão incríveis que chega a ser difícil de acreditar que não saíram da mente de um escritor mais criativo. No fim das contas, "Grey Gardens" é um belo filme, com grandes atuações e uma história fabulosa. Imperdível!
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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