AVALON (Avalon, 1990, TriStar Pictures, 128min) Direção e roteiro: Barry Levinson. Fotografia: Allen Daviau. Montagem: Stu Linder. Música: Randy Newman. Figurino: Gloria Gresham. Direção de arte/cenários: Norman Reynolds/Linda DeScenna. Produção: Mark Johnson, Barry Levinson. Elenco: Armin Mueller-Stahl, Joan Plowright, Aidan Quinn, Elizabeth Perkins, Kevin Pollack, Elijah Wood. Estreia: 19/10/90
4 indicações ao Oscar: Roteiro Original, Fotografia, Trilha Sonora Original, Figurino
"Cheguei na América em 1914..." Mais do que a abertura de "Avalon", a frase dita pelo patriarca Sam Krichinsky no filme de Barry Levinson serve como uma espécie de mantra, uma lembrança constantemente repetida através dos anos como forma de reafirmar uma identidade nacional ameaçada pela modernidade e pela imersão em uma cultura estrangeira. Inspirado na trajetória da família do diretor e roteirista, o primeiro filme de Levinson depois da chuva de Oscar por "Rain Man" (1988) é, também, um dos filmes mais pessoais do cineasta, repleto de calor humano, personagens dolorosamente reais e momentos da mais pura magia cinematográfica. Sem apelar para o sentimentalismo barato - ainda que não evite a emoção - e com um elenco preciso, formado por atores (e não astros de ego inflado e atuações excessivas), "Avalon" se destaca na carreira do realizador justamente por nadar contra a corrente e entregar ao espectador uma deliciosa e nostálgica crônica familiar, injustamente esquecida pela Academia de Hollywood em um ano cujo maior sucesso foi o soporífero e superestimado "Dança com lobos": indicado a apenas quatro estatuetas (indicações que sublinham algumas de suas maiores qualidades), o filme é uma joia das mais preciosas, uma carinhosa ode à família e à pátria - mas sem exagero no açúcar ou no ufanismo barato.
Interpretado por Armin Mueller-Stahl com generosas doses de sensibilidade, Sam Krichinsky não é exatamente o protagonista - ao menos não o único: ao optar por uma narrativa quase episódica, Levinson espalha o protagonismo por vários membros da família, especialmente no filho de Sam, Jules (Aidan Quinn), um jovem ambicioso e empreendedor que se torna, mesmo que de forma não intencional, o responsável pela separação do núcleo familiar. Em busca de independência, Jules rompe simbolicamente com as raízes polonesas (a simplificação do sobrenome é quase um golpe de morte em seu pai) e foge da tradição profissional de gerações ao sonhar (e realizar) um negócio próprio e então inovador. Ao lado do primo, Izzy (Kevin Pollack) - também pouco arraigado a tradições que considera não práticas - e da esposa, Ann (Elizabeth Perkins), Jules representa a chegada do progresso, da tecnologia (a TV surge como catalisador de outras mudanças na rotina da casa) e de uma nova forma de enxergar o mundo e os rituais antes considerados intocáveis. Não à toa, Levinson se utiliza de eventos familiares para sublinhar as profundas transformações (igualmente representativo é o fato de que é o Dia de Ação de Graças, uma data tipicamente norte-americana, o cenário para tais momentos de humor e/ou emoção). O roteiro equilibra com maestria humor e drama - nos dois casos com parcimônia e delicadeza - e consegue, de maneira admirável, valorizar o amor à terra natal e louvar as oportunidades de um novo mundo. É comovente e lindamente fotografada a sequência de abertura, em pleno 4 de julho, quando Sam fica abismado com as luzes e o colorido de seu novo país, como o auspício de um futuro tão brilhante quanto a noite de independência.
É difícil escolher a melhor cena de "Avalon", repleta de momentos tão verdadeiros e emocionantes que soam familiares até mesmo para quem não é de descendência judaica-polonesa. Todos os encontros do clã são recheados de calor humano, humor e verossimilhança. Sam Krichinsky e sua amada Eva (Joan Plowright, excelente) são os avós que todos gostariam de ter - assim como a infância do pequeno Michael (Elijah Wood ainda criança mas já bastante expressivo), inundada de amor e aventuras que beiram o perigo. Levinson conduz o espectador por uma viagem no tempo, enfatizando aqui e ali situações corriqueiras mas que, iluminadas por seu olhar carinhoso, se tornam maiores que a vida. Amor, amizade, vida, morte, alegrias e tristezas são iguais em importância diante do cineasta - que faz, à sua maneira, uma homenagem das mais brilhantes a suas origens familiares. Sem escorregar no sentimentalismo mas investindo com inteligência no que qualquer personagem tem de mais humano, ele criou um dos melhores filmes da década de 1990, infelizmente pouco conhecido do grande público.
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