A PAIXÃO DE CRISTO (The passion of the Christ, 2004, Icon Productions, 127min) Direção: Mel Gibson. Roteiro: Benedict Fitzgerald, Mel Gibson. Fotografia: Caleb Deschanel. Montagem: John Wright. Música: John Debney. Figurino: Maurizio Millenotti. Direção de arte/cenários: Francesco Frigeri/Carlo Gervasi. Produção executiva: Enzo Sisti. Produção: Mel Gibson, Bruce Davey, Stephen McEveety. Elenco: Jim Caviezel, Monica Bellucci, Maia Morgenstern, Christo Jivkov, Francesco De Vito, Luca Lionello. Estreia: 25/02/04
3 indicações ao Oscar: Fotografia, Trilha Sonora Original, Maquiagem
Filmes com temática religiosa tiveram sua glória no auge do sistema dos estúdios, nos anos 50, graças a diretores como Cecil B. de Mille, que utilizava de uma megalomania a toda prova para criar apoteoses cinematográficas que agradava em cheio ao público. Cineasta de grandes produções, De Mille provavelmente ficaria apoplético se chegasse a assistir a “A paixão de Cristo”, em que o ator Mel Gibson – em seu terceiro trabalho atrás das câmeras – recria as últimas horas de Jesus antes de sua morte e ressurreição. O tema até poderia ser atraente ao veterano cineasta – criador de, ente outros, “Os dez mandamentos” com Charlton Heston – mas a maneira encontrada por Gibson para voltar os olhos de um público pouco afeito a temas bíblicos para seu filme pode ser tudo, menos sutil. Violento até mesmo para fãs de filmes de terror, perturbador e chocante, “A paixão de Cristo” não deixa de ser também um grande trabalho de um diretor plenamente ciente de seus objetivos.
O mais rentável filme independente da história do cinema – quase 400 milhões de dólares arrecadados somente nos EUA – é também um filme bastante polêmico. Além das cenas em que o protagonista – vivido por um ótimo Jim Caviezel – é espancado com uma agressividade que deixou muita gente ultrajada e ofendida, o roteiro, escrito pelo próprio Gibson em parceria com Benedict Fitzgerald, arrumou encrenca das feias com a comunidade judaica, uma vez que, seguindo fielmente as Escrituras Sagradas, coloca a culpa da crucificação no povo judeu. Acusado de anti-semita, o astro da série “Máquina mortífera” não arredou pé de suas convicções, o que provavelmente lhe arrumou grandes antipatias e custou algumas indicações ao Oscar – vale lembrar que grande parte dos eleitores da Academia (e da indústria do cinema em si) é formada por judeus. Ainda assim, aceitou não legendar algumas falas mais provocativas para evitar mais ódio da parte de grupos neo-nazistas que poderiam, no mínimo, encontrar um motivo para seus ataques.
Na verdade, “A paixão de Cristo” merece aplausos entusiasmados devido a suas inúmeras qualidades cinematográficas, independente de seu valor religioso e/ou espiritual. A fotografia espetacular de Caleb Deschannel, a trilha sonora discreta de John Debney e a maquiagem realista foram merecidamente indicadas ao Oscar. A decisão de Gibson de escalar um elenco sem nomes conhecidos – com exceção de Caviezel e da bela italiana Mônica Belucci como Maria Madalena – colaborou com a atmosfera realista imposta pela produção, que ainda por cima teve a suprema ousadia de ser falada em aramaico, latim e italiano – é sabido que filmes legendados afugentam platéias americanas. Ao fugir conscientemente do tradicional idioma inglês, o roteiro ganha em substância, densidade e verossimilhança. A idéia original de Gibson, de apresentar o filme sem legenda alguma, para que as imagens falassem por si mesmas felizmente foi abandonada, mas assistir a um filme falado na língua original de seus personagens não deixa de ser um prazer cada vez mais raro. E se não bastasse tudo isso, o cineasta premiado com o Oscar por “Coração valente” ainda mostra uma sensibilidade única ao criar cenas pesadas com um fundo espiritual que foge admiravelmente dos clichês – a figura do Diabo, por exemplo, é um primor de criação, visual e psicologicamente.
Independente da crença religiosa da platéia, - e vários membros da equipe do filme se converteram ao Cristianismo após as filmagens - “A paixão de Cristo” não deixa de ser uma poderosa experiência visual e emocional, que leva seus espectadores a duas horas de cinema de qualidade tanto em termos técnicos quanto em questões emocionais. As cenas de Cristo e sua mãe (vivida com uma competência inegável pela romena Maia Morgenstern, meros seis anos mais velha do que Jim Caviezel) atinge qualquer um com um mínimo de sensibilidade. O filme de Gibson pode ser violento, cruel e sufocante, mas é também um dos filmes essenciais de seu tempo.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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