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LONGE DESTE INSENSATO MUNDO

LONGE DESTE INSENSATO MUNDO (Far from the Madding Crowd, 2015, Fox Searchlight Pictures, 119min) Direção: Thomas Vinterberg. Roteiro: David Nicholls, romance de Thomas Hardy. Fotografia: Charlotte Bruus Christensen. Montagem: Claire Simpson. Música: Craig Armstrong. Figurino: Janet Patterson. Direção de arte/cenários: Kave Quinn/Niamh Coulter. Produção executiva: Christine Langan. Produção: Andrew MacDonald, Allon Reich. Elenco: Carey Mulligan, Matthias Schoenaerts, Michael Sheen, Tom Sturridge, Juno Temple, Jessica Barden. Estreia: 15/4/15

Não é a primeira vez que "Longe deste insensato mundo" é adaptado para o cinema. Publicado pela primeira vez em 1874, o romance do inglês Thomas Hardy chegou às telas pela primeira vez em 1915, ainda durante a era do cinema mudo, e de lá pra cá a história teve outras versões, estreladas por Julie Christie (em 1967) e Paloma Baezza (em 1998). Por que, então, mais um remake? A resposta é dada em cada cena do primeiro filme do dinamarquês Tomas Vinterberg - de "Festa de família" e "A caça" - em inglês: belamente fotografado, dotado de ritmo, emocionalmente compensador e com um elenco impecável, a quarta encarnação da obra de Hardy é a prova cabal de que uma história, quando dotada de bons personagens e uma boa trama, sobrevive ao tempo e a quaisquer visões de roteiro e direção. Estrelado pela ótima Carey Mulligan - escolhida a dedo pelo diretor - e pelo belga Matthias Schoenaerts - recomendado pela própria Mulligan depois de vê-lo em "Ferrugem e osso" -, "Longe deste insensato mundo" é um sucesso artístico e surpreendentemente romântico em se tratando de um sujeito tão pouco crente no lado bom do ser humano como Vinterberg. Com uma heroína forte e desprezo por sentimentalismos vazios, a história de amor contada pelo autor britânico é ainda mais valorizada pela seriedade e respeito demonstrados pelo roteiro de David Nicholls - o escritor por trás do delicioso romance "Um dia", adaptado para o cinema em 2011.

Com alma de escritor, Nicholls dá importância extrema aos diálogos e à construção dos personagens, o que fica evidenciado na condução de seu roteiro - em que cada cena tem motivos específicos e cruciais para o desenvolvimento emocional e orgânico da trama. São duas horas de projeção sem tempos mortos ou sequências desnecessárias - e o que é melhor, com um ritmo agradável e cadenciado, que ainda dá espaço para o elenco brilhar sem precisar apelar para longos discursos ou catarses exageradas. A confiança do diretor e do roteirista na história e nos personagens é tanta que nem mesmo o fato de o desfecho ser conhecido há mais de um século foi motivo para qualquer alteração no desenvolvimento do enredo, situado no interior da Inglaterra vitoriana: é lá que vive Bathsheba Everden (Carey Mulligan), uma jovem determinada e batalhadora que chama a atenção do jovem fazendeiro Gabriel Oak (Matthias Schoenaerts) a ponto de ser pedida em casamento por ele. Sentindo que seus sentimentos pelo rapaz ainda não são suficientes a ponto de assumir um compromisso tão sério, ela recusa a oferta e só vai voltar a encontrá-lo algum tempo depois, em circunstâncias diferentes: herdeira de uma fazenda, ela vê sua propriedade ser salva do fogo justamente por Oak - que perdeu tudo que tinha em um trágico acidente com seus animais. Agradecida, ela o contrata para trabalhar a seu lado, confiando plenamente em sua capacidade como administrador e deixando de lado seu passado quase romântico.


Com o tempo, Bathsheba torna-se referência com sua propriedade, o que desperta mais que a admiração de um vizinho, o maduro e racional William Boldwood (Michael Sheen), que também não resiste à força da jovem e propõe casamento: novamente ela declina, não sentindo por ele atração ou qualquer coisa que justifique uma união. Para surpresa de muitos, porém, ela acaba nos braços do Sargento Frank Troy (Tom Sturridge), um soldado com um dramático passado e pouco confiável, que a conquista pela audácia e ousadia. O casamento, porém, já não começa bem, e logo a fazendeira se virá novamente disputada por dois homens de temperamento e comportamento opostos - e sempre colocando em primeiro lugar sua independência e o controle de sua propriedade. Como legítima pré-feminista, ela não se vê aceitando dividir a vida com um homem pelos motivos errados: ela não quer viver com alguém por precisar dele, por mais surpreendente que isso possa parecer à sociedade de sua época.

Emprestando ares modernos e resilientes à Bathsheba Everden, a atriz Carey Mulligan dá seguimento à sua galeria de jovens e determinadas heroínas, que já conta com a adolescente à frente de seu tempo em "Educação" (2009) e a lavadeira que batalha pelo voto feminino em "As sufragistas" (2014). Talentosa e sensível, Mulligan é a escolha perfeita para o papel, equilibrando com sutileza todas as nuances de sua personagem: doce, batalhadora, romântica, sensual e intransigente sempre que a necessidade pede. Sua química com Matthias Schoenaerts - um dos mais promissores atores a surgir nos últimos anos - é admirável, assim como a direção discreta e eficiente de Tomas Vinterberg, que deixa de lado qualquer artifício narrativo para dedicar-se apenas a contar sua (boa) história. A bela reconstituição de época, a trilha sonora competente de Craig Armstrong e a edição concisa de Claire Simpson (indicada ao Oscar por "O jardineiro fiel") complementam o belo trabalho do cineasta, pela primeira vez mostrando traços otimistas e menos sombrios. Uma bela surpresa!

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