sexta-feira

BAGDAD CAFÉ


BAGDAD CAFÉ (Bagdad Cafe, 1987, Palemele Film/Pro-jetc Filmproduktion, 95min) Direção: Percy Adlon. Roteiro: Percy Adlon, Eleonore Adlon. Fotografia: Bernd Heinl. Montagem: Norbert Herzner. Música: Bob Telson. Figurino: Regine Batz, Elizabeth Warner. Direção de arte/cenários: Bernt Amadeus Capra/Byrnadette DiSanto. Produção: Percy Adlon, Eleonore Adlon. Elenco: Marianne Sagebrecht, CCH Pounder, Jack Palance, Christine Kaufmann, Monica Calhoun. Estreia: 12/11/87

Indicado ao Oscar de Canção Original ("Calling you")

Premiada no Festival Internacional de Cinema do Rio em 1988, a comédia dramática "Bagdad Café" tornou-se, com o passar do tempo, um cult movie por excelência e o mais duradouro e aplaudido cartão de visitas de seu diretor, Percy Adlon. Terceiro filme do cineasta alemão que ficou conhecido no Brasil por seu "Estação Doçura" (1984), a história da inusitada amizade entre duas mulheres com muito mais em comum do que as aparências mostram em um primeiro olhar conquistou as plateias internacionais e chegou a concorrer a um Oscar - o de melhor canção, quando a bela "Calling you" perdeu para a popular e deliciosa "Let the river run", de Carly Simon, tema do filme "Uma secretária de futuro". De narrativa simples, ainda que permeado de alguns lances visuais criativos e que apontam para um estilo próprio, o filme de Adlon pode soar estranho a uma plateia acostumada com as produções hollywoodianas, mas bastam poucos minutos para que seu universo atípico envolva o espectador de forma calorosa e inevitável.

A estranheza já começa nos primeiros momentos, quando a protagonista, Jasmin (Marianne Sagebrecht, parceira do diretor em três produções) é abandonada pelo marido no meio do deserto do Arizona, de mala, cuia e completa desorientação geográfica e física. O público não entende os motivos da briga e nem como o casal de alemães foi parar no caminho para Las Vegas - com o tempo, isso nem irá ter muita importância - e logo se vê também diante de outra personagem feminina forte mas aparentemente oposta - Brenda (CCH Pounder) é forte, determinada e irascível, e aprendeu na marra a sobreviver a um mundo pouco hospitaleiro a mulheres, especialmente negras pouco dispostas a seguir mansamente as regras impostas pelo patriarcado. Brenda acaba de expulsar o marido do posto-motel que administra na beira da estrada, o Bagdad Cafe, e passa os dias lidando com os hóspedes desajustados - em especial o pintor e hippie Rudi Cox (Jack Palance) e a tatuadora Debby (Christine Kaufman) - e os três filhos, que lhe dão problemas o bastante. A mais velha, Phyllis (Monica Calhoun), é uma adolescente que se envolve com os caminhoneiros que passam pelo local; o do meio, Sal (Darron Flagg), passa os dias praticando música no piano (e irritando aos menos pacientes); e o bebê de colo, a quem precisa dar atenção constante. Logo de cara Brenda não simpatiza com Jasmine, uma hóspede de modos estranhos e pouco comuns, mas conforme o tempo vai passando surge uma relação inesperada entre elas: com seu jeito de ser afável, Jasmine rompe a bolha raivosa de Brenda e conquista todos a seu redor.

 

A forma com que Adlon narra a transformação do tedioso e melancólico hotel de Brenda em um local festivo e repleto de calor humano é um dos maiores destaques de "Bagdad Café". O roteiro não se satisfaz em apenas mostrar o gradativo descobrimento das semelhanças entre suas duas protagonistas através de suas vidas sofridas e/ou difíceis - cada uma dentro de seu espectro social, racial e cultural. De maneira inteligente, a trama vai se desdobrando diante do espectador com seu ritmo quase contemplativo, mergulhando-o em um cotidiano modorrento e sem grandes lances dramáticos, até que seja quase impossível abandoná-lo. Ao lançar um olhar poético e carinhoso até mesmo a situações problemáticas (como os romances fugazes de Phyllis com homens mais velhos), o filme permite ao público que goste inclusive de personagens pouco simpáticos, oferecendo a eles a oportunidade de mostrar suas qualidades mais recônditas. É assim com a agressiva Brenda - que, conforme a história avança, revela um lado menos bruto de sua personalidade - e até com a dócil Jasmine - cuja inteligência em lidar com as adversidades irá salvá-la da solidão e empurrá-la em direção a relacionamentos mais saudáveis e completos. É através de um show de mágicas (uma solução lúdica e emocionante) que a forasteira misteriosa - ao menos para aqueles que se conhecem há muito tempo e convivem sem maiores sobressaltos - irá unir os hóspedes e clientes do posto/café, e transformá-los em uma uma grande família (a ponto de uma hóspede preferir ir embora a ter de viver "com tanta harmonia").

"Bagdá café" não chega a aprofundar-se em questões que futuramente seriam cruciais em histórias essencialmente femininas - violência doméstica, machismo, abandono parental, prostituição - ou universais - racismo, xenofobia -, mas acerta em cheio ao apostar na sororidade e identificação entre duas protagonistas ao mesmo tempo distantes e tão próximas. Para isso, conta com as atuações iluminadas de Marianne Sagebrecht (de "Estação Doçura" e "Rosalie vai às compras", ambos de Percy Adlon, e que fez pouca coisa em Hollywood, sendo relegada a segundíssimo plano em "A guerra dos Roses", de 1989) e CCH Pounder (cujo currículo inclui sucessos de bilheteria, como "Avatar" e "A órfã"): juntas, elas transformam a experiência de se assistir ao filme de Adlon um passatempo ao mesmo tempo agradável e de uma profundidade emocional que justifica seu êxito internacional. Além disso, a produção ainda conta com a luxuosa participação especial do veterano Jack Palance antes de seu Oscar de coadjuvante e em um papel completamente destoante da persona violenta que criou em sua longa carreira. Um triunfo delicado e sutil

Um comentário:

Paulo Alt disse...

<3 (que ela fez Avatar é algo novo pra mim :P)

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