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BRINQUEDO ASSASSINO

BRINQUEDO ASSASSINO (Child's play, 1988, United Artists, 87min) Direção: Tom Holland. Roteiro: Don Mancini, Tom Holland, John Lafia, estória de Don Mancini. Fotografia: Bill Butler. Montagem: Roy E. Peterson, Edward Warschilka. Música: Joe Renzetti. Figurino: April Ferry. Direção de arte/cenários: Daniel A. Lomino/Cloudia. Produção executiva: Barrie M. Osborne. Produção: David Kirschner. Elenco: Chris Sarandon, Catherine Hicks, Alex Vincent, Brad Dourif, Dinah Manoff. Estreia: 09/11/88

Antes de tornar-se vítima de uma série sofrível de filmes que apelavam para o humor trash, o boneco Chucky teve seus momentos de glória: sua estreia nas telas, "Brinquedo assassino", que custou menos de dez milhões de dólares, rendeu quatro vezes isso pelo mundo e o transformou, de imediato, um ícone do cinema de terror. Concebido como uma crítica ao consumismo infantil e ao marketing direcionado às crianças, o filme logo transformou-se em um violento conto sobrenatural, protagonizado por um boneco homicida e seu dono, um menino solitário que precisa provar aos adultos que sua imaginação infantil não chegaria ao ponto de inventar uma história tão bizarra - enquanto corpos vão sendo acumulados pelo caminho. Dirigido por Tom Holland, experiente cineasta que já havia conquistado os fãs do gênero com "A hora do espanto" (1985), "Brinquedo assassino" pode não ter chegado às telas da forma como inicialmente imaginado - mais um suspense psicológico do que um filme de terror despretensioso -, mas conquistou o público justamente por buscar o susto mais simples ao invés da sofisticação dramática. Não à toa, Chucky já faz parte do panteão reservado a nomes célebres como Leatherface, Freddy Krueger e Jason Vorhees.

A trama de "Brinquedo assassino" é simples como convém: durante uma perseguição policial, o homicida Charles Lee Ray - assim batizado em "homenagem" a criminosos famosos, como Charles Manson, Lee Harvey Oswald e James Earl Ray - é atingido pelo detetive Mike Norris (Chris Sarandon) e, antes de morrer, apela a um ritual de magia e passa sua alma para um boneco extremamente popular entre as crianças, o Good Guy. Esse mesmo brinquedo, chamado Chucky,  acaba parando nas mãos do menino Andy (Alex Vincent), que nem de longe imagina que seu novo amiguinho é capaz dos crimes mais cruéis em sua tentativa de tomar seu corpo. Quando finalmente percebe que Chucky não é tão inocente quanto tenta parecer para os adultos, Andy descobre que a verdade dificilmente será aceita pela polícia e até por sua mãe, Karen (Catherine Hicks): sua missão passa a ser, então, impedir novos assassinatos e destruir seu presente de aniversário, cada vez mais independente e violento.


É claro que a ideia de juntar brinquedos homicidas e crianças inocentes não poderia passar sem levantar polêmicas junto ao público mais conservador dos EUA: piquetes em frente aos estúdios da MGM exigiam que o filme fosse cancelado, para impedir que incentivasse a violência infantil. Logicamente suas reivindicações não foram acatadas e o filme estreou mesmo envolvido em debates a respeito do assunto. Não foi de nenhuma ajuda o fato de que, algum tempo depois do lançamento do filme, uma gangue juvenil estuprou e matou uma adolescente de 16 anos de idade enquanto seu líder declamava frases do roteiro. Tal controvérsia - que na verdade surge sempre que alguma produção flerta com a violência e é escolhida como bode expiatório - não impediu que "Brinquedo assassino" se tornasse um sucesso de bilheteria e até de crítica: o respeitado Roger Ebert, que não era um apreciador de produções do gênero, foi bastante generoso em sua avaliação e ofereceu um inesperado prestígio ao trabalho de Holland. É de imaginar se o conceito original criado pelo roteirista Don Mancini - que, segundo ele mesmo, usou apenas 50% do que havia imaginado - teria melhor recepção: na versão original, o sangue de Andy e Chucky se misturava e o boneco mataria todas as pessoas de quem o menino porventura pudesse desgostar por alguma razão.

De uma forma ou outra, "Brinquedo assassino" encontrou seu lugar junto aos admiradores dos filmes de terror, um status que nem mesmo as duas continuações diretas - lançadas em 1990 e 1991 - e a série de produções que apostavam no trash e no humor sombrio conseguiram. Transformando o sinistro boneco em praticamente uma piada, "A noiva de Chucky" (1998), "O filho de Chucky" (2004), "A maldição de Chucky" (2013) e "O culto de Chucky" (2017) levaram o personagem a um caminho praticamente sem volta, que nem mesmo um remake do original, lançado sem muito sucesso em 2019, conseguiu reverter. Mesmo que depois de trinta anos os sustos proporcionados pelo primeiro filme soem datados e mais risíveis do que assustadores, nada justifica a humilhação a que o pequeno e sádico boneco foi obrigado a passar. O melhor mesmo é ficar com o original apesar de seus defeitinhos e curtir uma boa e nostálgica sessão de terror.

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