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EM RITMO DE FUGA

EM RITMO DE FUGA (Baby driver, 2017, TriStar Pictures, 113min) Direção e roteiro: EdgarWright. Fotografia: Bill Pope. Montagem: Jonathan Amos, Paul Machliss. Música: Steven Price. Figurino: Courtney Hoffman. Direção de arte/cenários: Marcus Rowland/Lance Totten. Produção executiva: James Biddle, Liza Chasin, Adam Merims, Rachel Prior, Edgar Wright, Michelle Wright. Produção: Tim Bevan, Eric Fellner, Nira Park. Elenco: Ansel Elgort, Kevin Spacey, Jamie Foxx, Jon Hamm, Eiza González, John Bernthal, Lily James. Estreia: 11/3/2017 (South by Southwest Festival)

3 indicações ao Oscar: Montagem, Edição de Som, Mixagem de Som

Em Hollywood nem tudo caminha com velocidade. Que o diga o cineasta/roteirista britânico Edgar Wright: foi em 1995 que ele começou a trabalhar no roteiro de um filme que misturava policial, romance e uma trilha sonora que, combinada com as sequências mais alucinantes, praticamente transformava o produto final em uma espécie de policial musical. De lá até o começo das filmagens, em 2016, Wright firmou seu nome em comédias como "Todo mundo quase morto" (2004), "Chumbo grosso"(2007) e "Scott Pilgrim contra o mundo" (2010), que brincavam com gêneros consagrados do cinema comercial - a saber, filmes de zumbis, tramas policiais e adaptações de HQ, respectivamente. Nesse meio tempo, sua ideia inicial foi transformada (ao menos sua primeira sequência) em um videoclipe de "Blue sky", da banda inglesa Mint Royale, em 2003, e somente em 2017 finalmente saiu do papel - quase uma década depois de ter recebido o sinal verde para tocar o projeto adiante - e chegou às telas como "Em ritmo de fuga", um dos melhores filmes da temporada, reconhecido com uma bilheteria inesperada de mais de 100 milhões de dólares no mercado doméstico (contra um custo baixo de pouco menos de 35 milhões) e três merecidíssimas indicações ao Oscar, que reconheceram algumas das maiores qualidades do filme - edição de som, mixagem de som e montagem.

A dupla de editores (Jonathan Amos e Paul Machliss) podem ter perdido o Oscar para "Dunkirk" (2017) - também um filme cuja edição é fator preponderante -, mas tiveram melhor sorte em outras disputas, como o BAFTA (o Oscar britânico) e as associações de críticos de Las Vegas, Los Angeles, São Francisco e Chicago. Não foram prêmios de consolação. A montagem de "Em ritmo de fuga" é das mais empolgantes realizadas em Hollywood em muito tempo - e não apenas porque é ágil e de tirar o fôlego do espectador, mas também (e principalmente) porque se utiliza de todos os elementos à sua disposição sem que se deixe deslumbrar pela forma em detrimento do conteúdo. A trama pode até parecer banal, mas Wright consegue a façanha de fazer com que soe extremamente original ao inserir um elemento crucial em seus momentos de mais adrenalina: ponto essencial para a narrativa de "Em ritmo de aventura", a música assume papel crucial na trajetória dos personagens (e, como forma de respeitá-la em absoluto, a própria edição se utiliza dela como base e ritmo). Por quase duas horas, o público é brindado com uma mistura exata entre músicas de primeira, perseguições milimetricamente calculadas pelo cineasta, personagens carismáticos e um tom que, mesmo diante da violência, nunca se torna sombrio em demasia. Ou seja, "Em ritmo de fuga" é o que se convenciona chamar de "filme de verão" do mercado norte-americano, mas está muitos degraus acima da média graças ao casamento perfeito entre suas partes.


Baby, o protagonista do filme, é um exímio motorista que, para pagar uma dívida contraída com um chefão do crime (interpretado por Kevin Spacey pouco antes de sua queda em desgraça na comunidade cinematográfica por acusações de assédio sexual), trabalha em assaltos planejados por ele: dotado de um talento preciso para fugas em alta velocidade, ele é o homem de confiança para tais eventos criminosos, mesmo que não seja um entusiasta a respeito. Enquanto se prepara para uma última missão antes de finalmente quitar seu débito, Baby se apaixona pela garçonete Debora (Lily James em papel que só não ficou com Emma Stone porque ela foi fazer "La La Land: cantando estações", que lhe rendeu o Oscar de melhor atriz). Debora acaba se tornando o principal motivo pelo qual Baby deseja abandonar de vez seu "emprego", mas, como normalmente acontece, o jovem se vê arrastado para um assalto que dá muito errado - em parte graças ao pouco confiável Bats (Jamie Foxx) - e precisa salvar a própria pele, assim como livrar sua namorada e seu pai adotivo da rota de vingança do violento Buddy (Jon Hamm, da série "Mad Men"). Se a trama parece derivativa, basta conferir como o roteiro de Wright consegue jogar com todos os clichês e torná-los parte de uma produção caprichadíssima e emocionante.

O principal mérito de "Em ritmo de fuga" - cujo título original, "Baby driver", soa muito melhor - é, além do roteiro esperto e de sua união perfeita de elementos simples, a escolha de seu ator principal. Revelado no romântico "A culpa é das estrelas" (2014), o jovem Ansel Elgort está absolutamente perfeito no papel do complexo Baby. Dono de características próprias - sofre de um problema de audição causado por um acidente que vitimou seus pais, mora com um pai adotivo surdo-mudo, é monossilábico quando em ação e costuma gravar as reuniões de "trabalho" para remixar com suas músicas preferidas -, Baby é o herói que todo espectador pediu a Deus. Carismático, competente e cheio de boas intenções (ainda que soterradas por um currículo pouco recomendável), é ele quem conduz a plateia por vibrantes fugas - todas filmadas em Atlanta e quase sem auxílio de CGI - e rege uma sinfonia de velocidade capazes de deixar qualquer um de queixo caído. Envolto em uma embalagem atraente até mesmo para o público mais jovem - e mais atraído por continuações e adaptações de quadrinhos -, "Em ritmo de fuga" é o entretenimento mais que perfeito, e que será, sem dúvida, reconhecido no futuro como uma das pequenas obras-primas de sua geração.

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