segunda-feira

ABRAÇOS PARTIDOS


ABRAÇOS PARTIDOS (Los abrazos rotos, 2009, El Deseo SA, 127min) Direção e roteiro: Pedro Almodovar. Fotografia: Rodrigo Prieto. Montagem: José Salcedo. Música: Alberto Iglesias. Figurino: Sonia Grande. Direção de arte/cenários: Antxón Gómez/Marta Blasco, Pilar Revuelta. Produção: Agustin Almodovar, Esther García. Elenco: Penelope Cruz, Lluis Homar, Blanca Portillo, Tamar Novas, Angela Molina, Lola Dueñas, Rossy de Palma. Estreia: 17/3/09 (Barcelona)

"Abraços partidos", o 18º longa-metragem de Pedro Almodovar  proporciona a seu público um fato até então inédito em sua vitoriosa carreira: a autocitação. Não que isso seja um defeito, até porque qualquer citação de Almodovar sempre será bem-vinda, mas é que, quando se assiste às cenas de "Garotas e maletas" - o filme dentro do filme - dá uma saudade tremenda da época em que o diretor espanhol não se levava tão a sério e, mesmo não sendo tão respeitado como passou a ser depois de obras mais "maduras", fazia rir diante dos absurdos de seus roteiros e suas personagens iconoclastas e neuróticas. Talvez como forma de mostrar que por detrás do diretor sóbrio de "Fale com ela" e "Volver" ainda existe um enfant terrible, Almodovar encerra seu filme com sorrisos, depois de mais de duas horas de uma trágica história de amor que trai sua adoração e respeito pelo melodrama - já explícita em "A flor do meu segredo".

Como raríssimas ocasiões na carreira do cineasta, o protagonista é um homem. No caso, um roteirista cego chamado Harry Caine (que soa como hurricane - ou furacão) que vê seu passado literalmente bater-lhe à porta na figura de Ray X (Rubén Ochandiano), um aspirante à cineasta que quer contratar-lhe para escrever um roteiro. Caine recusa a oferta sem saber que o jovem tem uma forte ligação com a trágica história de seu torturado relacionamento com a bela Lena (Penelope Cruz, linda como nunca), a esposa de Ernesto Martel (José Luis Gómez), um empresário milionário que também foi o produtor de seu último (e inacabado, ao menos para ele, filme). Para saciar a curiosidade de Diego (Tamar Novas), filho de sua assistente Judit (Blanca Portillo), Caine passa a narrar os fatos que o levaram à cegueira e à aposentadoria como cineasta.


Contando sua história basicamente em flashbacks, Pedro Almodovar apresenta à sua audiência uma história de amor que difere em muito de tudo que ele mesmo contou anteriormente. Substituindo o sarcasmo e a ironia pela melancolia, ele se aproxima muito mais de "Fale com ela" do que "Mulheres à beira de um ataque de nervos" (inspiração para "Garotas e maletas"). Poucas vezes na obra do diretor o amor foi retratado de maneira tão séria e avassaladora, sem espaços para piadas ou até mesmo para sexo: talvez este seja seu filme menos calcado na sexualidade, um dos pilares de sua obra até então. O que pode afastar seu público fiel, portanto - as características marcantes de sua filmografia - pode aproximá-lo daqueles que ainda não se deixaram seduzir pela perfeição de seus filmes de 1998 pra cá, quando ele aprimorou seu estilo com inteligência e sensibilidade. "Abraços partidos", não fosse a presença de Penelope Cruz e a presença afetiva de Angela Molina, Lola Dueñas e Rossy de Palma (todas ex-colaboradoras de Pedro), poderia tranquilamente se passar por um filme de qualquer diretor, tamanha a neutralidade imposta por Almodovar na maior parte de suas duas horas de duração.

Essa neutralidade, porém, não quer dizer, de modo algum, que "Abraços partidos" não tenha personalidade. Pedro Almodovar sabe como ninguém utilizar as ferramentas à sua disposição para criar imagens e personagens que ficam para sempre na mente do espectador. Aqui, ele cria duas sequências antológicas: a hilariante cena em que o milionário Ernesto Martel descobre, através de uma dubladora, que sua amada Lena está tendo um caso com seu diretor e a belíssima tomada que mostra o casal em uma praia deserta, abraçados e totalmente inocentes da tragédia que viria a mudar suas vidas em pouco tempo. Se não fosse o bastasse a forma mágica como o cineasta conta sua história - seduzindo a plateia aos poucos - essas duas cenas (e "Garotas e maletas", é claro) já valeriam o espetáculo. Mas um Almodovar nunca oferece poucas sensações.

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