AMARGO REGRESSO (Coming home, 1977, Jerome Hellman Productions,
127min) Direção: Hal Asbhy. Roteiro: Waldo Salt, Robert C. Jones,
estória de Nancy Dowd. Fotografia: Haskell Wexler. Montagem: Don
Zimmerman. Figurino: Ann Roth. Direção de arte/cenários: Michael
Haller/George Gaines. Produção: Jerome Hellman. Elenco: Jane Fonda, Jon
Voight, Bruce Dern, Penelope Milford, Robert Carradine. Estreia:
15/02/78
8 indicações ao Oscar: Melhor Filme,
Diretor (Hal Asbhy), Ator (Jon Voight), Atriz (Jane Fonda), Ator
Coadjuvante (Bruce Dern), Atriz Coadjuvante (Penelope Milford), Roteiro
Original, Montagem
Vencedor de 3 Oscar: Ator (Jon Voight), Atriz (Jane Fonda), Roteiro Original
Vencedor de 2 Golden Globes: Ator/Drama (Jon Voight), Atriz/Drama (Jane Fonda)
Aguerrida militante contra a Guerra do Vietnã - o que lhe causou sérios problemas com o FBI, como ela mesma conta em sua autobiografia "Minha vida até agora" (Ed. Record) - a atriz Jane Fonda não apenas visitou o país como forma de entender os detalhes do sangrento conflito como empenhou-se em uma campanha para divulgar a maneira desumana com que os veteranos eram tratados pelo governo norte-americano. De inúmeras conversas com homens que voltaram aos EUA mutilados, paraplégicos e com sérios problemas psicológicos, surgiu a ideia de um filme que atingisse o público não através de discursos, mas de uma história dramática sobre pessoas comuns, que poderiam morar na casa ao lado do espectador. Sua tentativa de conscientizar a plateia - que contou com a ajuda de um ex-soldado chamado Ron Kovic, que estava tentando levar suas experiências para as telas em um filme chamado "Nascido em 4 de julho" - deu muito mais certo do que ela poderia imaginar. No mesmo ano em que outro filme sobre o Vietnã, "O franco-atirador", com uma visão mais conservadora da guerra, arrebatou os principais Oscar (filme e diretor para Michael Cimino), "Amargo regresso" saiu da festa da Academia com três estatuetas bastante importantes: ator, atriz e roteiro original. Era a prova inconteste de que o público americano estava mais do que disposto a ouvir e questionar um de seus maiores fracassos.
A ideia original de Fonda era contar com a direção do britânico John Schlesinger, que declinou do convite por considerar (acertadamente) que somente um cineasta norte-americano poderia contar a história explorando todas as suas nuances críticas e sentimentais. Entra em cena, então, Hal Ashby, dono de uma sensibilidade única, capaz de iluminar temas sombrios - como "Ensina-me a viver" (71), bizarra história de amor entre um adolescente e uma idosa - e criticar as instituições tradicionais - como visto em "A última missão" (73), estrelado por Jack Nicholson e que mirava a Marinha americana. Ciente das intenções sociopolíticas do roteiro desenvolvido por Waldo Salt e Robert C. Jones, Ashby abdicou da ironia característica de seus filmes anteriores para contar uma história de amor intensa e delicada, sem medo de expor com crueza e realismo todos os ângulos possíveis da trama, desde seu pacifismo explícito até seu foco na sexualidade de veteranos da guerra, algo até então nunca mostrado no cinema hollywoodiano. De forma poética e adulta, "Amargo regresso" conseguiu romper paradigmas e se tornou, com justiça, um dos filmes mais aclamados sobre o assunto, mostrando que Jane Fonda, mais do que uma militante de plantão, como a acusavam alguns detratores da época, ainda era uma atriz capaz de atrair público para as salas de cinema, mesmo em filmes com assuntos indigestos.
Em um grande momento da carreira, Fonda interpreta Sally Hyde, a esposa de um capitão do Exército americano que, sozinha em casa depois que o marido volta ao Vietnã, inicia um trabalho como voluntária em um hospital de veteranos. Chocada com a forma como muitos deles são tratados - praticamente ignorados pelo governo que os havia mandado para o conflito - ela reencontra, dentre os pacientes, um antigo colega de escola, Luke Martin (Jon Voight), paralisado da cintura para baixo e revoltado com sua situação. Convivendo com a jovem Violet (Penelope Milford, em papel oferecido à Meryl Streep e indicada ao Oscar de atriz coadjuvante) - namorada de um soldado e irmã de um rapaz com sérios problemas psicológicos depois de ter voltado da Ásia - e tomando consciência de uma realidade que conhecia apenas pelos olhos miltaristas do marido (Bruce Dern, indicado ao Oscar de ator coadjuvante), Sally acaba se apaixonando por Luke, iniciando um romance a que ela sente-se incapaz de resistir.
Em um papel oferecido a Sylvester Stallone, Jack Nicholson e Al Pacino, o ator Jon Voight tem o grande momento de sua carreira, com uma interpretação onde mescla indignação e doçura com uma maestria poucas vezes vista. Sua transformação no decorrer da trama - de veterano furioso a homem apaixonado e consciente de sua importância para evitar que seu drama se repita com outros jovens - é fascinante, e encontra eco em um desempenho tocante de Jane Fonda. Com uma atuação discreta e eficiente, ela faz jus a seu segundo Oscar - o primeiro foi consequência de seu trabalho em "Klute, o passado condena" (71) - sem precisar apelar para a lágrima fácil. Assim como acontece com o personagem de Voight, sua Sally Hyde passa por profundas mudanças do início ao fim do filme, e poucas intérpretes seriam capazes de apresentar tantas alterações de maneira tão sutil quanto Fonda, que transmite em cada cena a importância da mensagem pacifista da história contada. Quando estão juntos em cena, Fonda e Voight soltam faíscas - e sua cena de sexo, bem dirigida e de extremo bom-gosto, é daquelas de ficar para sempre na memória do espectador. Bonito, relevante e sensível, "Amargo regresso" é mais um marco na brilhante trajetória de Jane e um dos filmes mais importantes de sua época.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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