quarta-feira

DÁLIA NEGRA

DÁLIA NEGRA (The Black Dahlia, 2006, Universal Pictures, 121min) Direção: Brian DePalma. Roteiro: Josh Friedman, romance de James Ellroy. Fotografia: Vilmos Zsigmond. Montagem: Bill Pankow. Música: Mark Isham. Figurino: Jenny Beavan. Direção de arte/cenários: Dante Ferretti/Elli Griff. Produção executiva: Boaz Davidson, Rolf Deyhle, Danny Dimbort, James B. Harris, Henrik Huydts, Josef Lautenschlager, Trevor Short, Andreas Thiesmeyer, John Thompson. Produção: Rudy Cohen, Moshe Diamant, Avi Lerner, Art Linson. Elenco: Josh Hartnett, Aaron Eckhart, Scarlett Johansson, Hilary Swank, Mia Kirschner, Mike Starr, Fiona Shaw, Patrick Fishler. Estreia: 30/8/06 (Festival de Veneza) 

Indicado ao Oscar de Fotografia

Em 1997, o filme "Los Angeles, cidade proibida" deixou de quatro a indústria cinematográfica, o público, a crítica e até a Academia - que lhe deu dois Oscar e só não foi além porque um tal "Titanic" estava fazendo estragos na bilheteria e no coração dos espectadores. Baseado em um extenso e complexo romance policial de James Ellroy ambientado na terra do cinema nos dourados anos 50, o filme de Curtis Hanson estabeleceu um novo parâmetro para o gênero noir, lançou a carreira de Russell Crowe, mostrou que Kim Basinger poderia ser convincente como atriz e, de quebra, surpreendeu a plateia com uma trama intrincada, repleta de personagens fascinantes e um desfecho mais do que satisfatório. Quase uma década depois, Brian De Palma - um cineasta propenso tanto a obras geniais como "Os intocáveis" quanto a bombas homéricas como "Olhos de serpente" - tentou repetir o feito com "Dália negra". A fórmula era quase a mesma: um livro de Ellroy, dois policiais machões liderando a investigação de um assassinato (que aconteceu na vida real), mulheres fatais, corrupção policial e um período histórico mais do que apropriado a todos esses elementos (a dura, porém romântica, década de 40). Por que é, então, que, ao contrário da obra de Hanson, "Dália negra" resultou em um filme tão, mas tão ruim?


Na verdade, várias respostas podem ser dadas - e todas elas estarão certas. Aqueles que culparem a escolha de Josh Hartnett para liderar o elenco no papel crucial do jovem policial e boxeador Bucky Bleichert, não poder ter mais razão, já que Hartnett nunca apresentou sequer uma atuação decente na carreira - e não faz diferente no filme de DePalma, com uma interpretação pífia e risível, que jamais permite ao espectador envolver-se nos dramas de seu personagem. A parcela que apontar os dedos para o equívoco da escalação de Hilary Swank para o crucial papel da femme fatale Madeleine Linscott terão carradas de razão - boa atriz ela é, mas totalmente inadequada como uma socialite sexualmente voraz (e que o roteiro insiste em dizer que é parecida com a personagem-título, vivida por Mia Kirschner, uma atriz sem semelhança física alguma com ela). Até mesmo os mais gentis, que podem questionar a necessidade de Scarlett Johansson de tentar ser sexy em toda e qualquer cena - mesmo que ela a principio não peça tal característica - não estão errados, principalmente quando se sabe que, posteriormente, Johansson exploraria esse seu discutível talento em absolutamente todos os filmes que fez. Mas, mesmo com todos esses defeitos gritando diante da audiência, o que há de mais fatal nas pretensões de "Dália negra" em ser um filme memorável positivamente é seu roteiro: sem a inteligência de Curtis Hanson e Brian Elgeland de enxugar a trama, modificar o que deveria e não confundir o foco da narrativa, Josh Friedman (também autor da versão spielberguiana de "Guerra dos mundos") entregou a De Palma uma obra sem personalidade, confusa, sem um centro narrativo e, mal dos mares, chata de doer.



Restou ao cineasta o desafio de transformar a mixórdia de Friedman em um filme minimamente interessante, coisa que nem mesmo suas décadas de experiência foram suficientes para lhe ajudar. Tudo bem, DePalma ainda deve ser aplaudido por algumas sequências visualmente empolgantes - duas, para ser mais exato - mas sempre que tenta sair de sua zona de conforto e buscar um algo a mais em termos dramáticos, esbarra em uma trama mal costurada que tenta dar conta de várias histórias e termina por não ser bem-sucedida em nenhuma delas. Nem mesmo a presença do competente Aaron Eckhart é o bastante, já que nem mesmo o melhor ator do mundo seria capaz de consertar tantos erros juntos - que conseguem contaminar até a normalmente eficiente Fiona Shaw, que, na pele da mãe de Hilary Swank na tela, protagoniza uma das cenas mais constrangedoras de sua carreira. É de se pensar - e suspirar tristemente - nas misérias que David Fincher faria à frente do projeto que, sim, esteve em suas mãos, mas do qual desistiu depois de perceber que suas ideias (um longa em preto-e-branco com três horas de duração) jamais conseguiriam ser aceitas pelo estúdio - que deve ter ficado extremamente arrependido com o fato, já que gastou 50 milhões de dólares em um filme que, merecidamente, não rendeu nem metade disso nas bilheterias.


Mas, afinal, qual é a história de "Dália negra"? A princípio - e a julgar pelo título - poderia-se dizer que é a investigação da polícia de Los Angeles do brutal assassinato de uma jovem aspirante a atriz, morta em 1947 e jogada com o corpo partido ao meio em um terreno baldio da cidade. Porém, no filme, tal investigação (de um crime real, cujos culpados - um dos quais matou também a mãe do escritor Jams Ellroy - só foram descobertos em 2003) é apenas incidental: o roteiro concentra-se principalmente no quadrilátero amoroso formado pelos policiais Bucky Bleichert (Josh Hartnett e sua total falta de talento) e Lee Blanchard (Aaron Eckhart, o melhor do elenco), a jovem Kay Lake (Scarlett Johansson com seus tiques habituais) e a misteriosa socialite Madeleine Linscott (Hilary Swank, totalmente fora de tom). Esses quatro personagens são a base do roteiro de Friedman, mas não conseguem sustentar sua esquizofrenia generalizada - eles entram e saem de cena sem a menor sintonia e sem propósito aparente, em cenas que soam extremamente aleatórias. Restam apenas a atmosfera bem criada pela fotografia do veterano Vilmos Zsigmond (indicada ao Oscar) e a reconstituição de época cuidadosa. Muito pouco para um filme que tinha grandes ambições. Uma pena.

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