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ANASTASIA: A PRINCESA ESQUECIDA

ANASTASIA: A PRINCESA ESQUECIDA (Anastasia, 1956, 20th Century Fox, 105min) Direção: Anatole Litvak. Roteiro: Arthur Laurents, peça teatral de Marcelle Maurette, Guy Bolton. Fotografia: Jack Hildyard. Montagem: Bert Bates. Música: Alfred Newman. Figurino: Rene Hubert. Direção de arte/cenários: Andrei Andrejew, Bill Andrews/Andrew Low. Produção: Buddy Adler. Elenco: Ingrid Bergman, Yull Brinner, Helen Hayes, Akim Tamiroff, Martita Hunt, Ivan Desny. Estreia: 13/12/56

 2 indicações ao Oscar: Atriz (Ingrid Bergman), Trilha Sonora
Vencedor do Oscar de Melhor Atriz (Ingrid Bergman)
Vencedor do Golden Globe de Melhor Atriz/Drama (Ingrid Bergman) 

Em 1949, já com um Oscar de melhor atriz no currículo (pelo suspense "À meia-luz", de 1944) e uma carreira consolidada em Hollywood, Ingrid Bergman resolveu que queria trabalhar com o cineasta Roberto Rossellini, cujo "Roma: cidade aberta" havia lhe tocado profundamente. O resultado artístico foi o elogiado "Stromboli", lançado em 1950, mas o que realmente deixou a situação marcada indelevelmente na história do cinema foi o escândalo nos bastidores. Mesmo casada durante as filmagens, Bergman se apaixonou pelo diretor italiano e abandonou marido e filha para ficar com ele na Europa, ao descobrir-se grávida. Os puritanos de plantão não deixaram barato e, com a ajuda da imprensa marrom e da Igreja, iniciaram uma campanha contra a atriz. Segura de si e de seu amor pelo novo marido, ela permaneceu na Itália, fez mais cinco filmes com Rossellini, teve mais duas filhas, gêmeas (uma delas a também atriz Isabella Rossellini) e seguiu a vida. Foi somente em 1956, quase uma década mais tarde, que seu talento venceu o preconceito: por "Anastasia: a princesa esquecida", Bergman levou sua segunda estatueta do Oscar - mas, como forma de pouco caso ou orgulho, nem se deu ao trabalho de comparecer à cerimônia da Academia, onde foi representada pelo amigo Cary Grant.

Motivos não faltavam para que a 20th Century Fox tivesse dúvidas quanto à escalação de Bergman para o papel principal do filme, dirigido por Anatole Litvak. Não apenas o presidente do estúdio tinha sérias dúvidas a respeito da reação da plateia ao retorno de Bergman à Hollywood - e preferia Jennifer Jones na liderança do elenco - como também havia a questão de idade: aos 40 anos, a atriz sueca teria de convencer como uma mulher de 25, e por mais talento e beleza que tivesse, Bergman teria um desafio bem grande à sua frente nessa questão. Resolvido o primeiro problema - graças à intervenção do produtor Darryl Zanuck - o segundo acabou por desaparecer como por mágica. Basta que Bergman entre em cena para que o público fique completamente envolvido por seu carisma e deixe de lado as contas matemáticas: ali está, diante de seus olhos não mais a atriz que fez o mundo suspirar em "Casablanca" (41) ou viveu a guerrilheira criada por Ernest Hemingway em "Por quem os sinos dobram" (43), mas sim Anna Koreff, a mulher que pode ser a única sobrevivente dos Romanov, a família real russa, assassinada na revolução de 1918 - e que, tida como desaparecida, é a herdeira de uma fortuna estimada em dez milhões de libras.


É de olho nesse dinheiro que está o empresário russo Sergei Bounine (Yull Brinner) - que sabe a seu respeito, mas precisa, para por as mãos nele, de alguém que se faça passar pela princesa desaparecida há dez anos. Koreff, uma jovem de instintos suicidas e com remotas lembranças de um passado trágico e pouco claro, acaba sendo seu maior trunfo. Ajudado por uma dupla de sócios, Bounine, que vive em Paris depois de abandonar o exército do czar Nicholas, convence a desmemoriada sem-teto de que ela é, realmente, a princesa Anastasia, e passa a ensiná-la tudo o possível sobre os hábitos da família, a etiqueta real e a história do governo russo. Sua intenção é convencer a única pessoa que pode ou não reconhecer Anastasia: sua avó, a Imperatriz Marie (Helen Hayes), que não acredita mais nas mulheres que volta e meia surgem lhe afirmando ser sua neta. Quando Anne chega até ela, porém, as coisas se tornam diferentes, já que a velha Imperatriz e o jovem Príncipe Paul (Ivan Desny) - antigo noivo da princesa - passam a acreditar na história contada por Bounine. Resta apenas à pretensa herdeira lembrar-se ou não de seu passado (se é que ela realmente é quem dizem ser).

Yull Brinner, que no mesmo ano levou o Oscar de melhor ator por "O rei e eu", está à vontade como Sergei Bounine, e sua química com Ingrid Bergman valoriza cada cena dos dois juntos. O diretor, russo de nascimento - e com o ótimo suspense psicológico "Uma vida por um fio" (48) no currículo - explora com elegância a bela fotografia colorida de Jack Hildyard e a reconstituição de época caprichada, assim como a trilha sonora impressionante de Alfred Newman. O roteiro demora um pouco a engrenar - é baseado em uma peça teatral da francesa Marcelle Maurette, adaptada para a Broadway por Guy Bolton em 1954 - e o romance entre Anna e Bounine soa um tanto artificial, mas a exuberância dos cenários, a trama intrigante e a volta por cima de Bergman valem o espetáculo. A título de curiosidade, porém, vale lembrar que, apesar da história da princesa desaparecida ser real (a peça foi inspirada em uma personagem verdadeira, que foi descartada como sendo Anastasia somente através de DNA, décadas mais tarde), tanto Bounine quanto seus comparsas são criação fictícia, inserida na trama apenas para efeito dramático. Mesmo assim, é um clássico dos bons, com o melhor que Hollywood podia oferecer nos anos 50.

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