ASSASSINATO SOB CUSTÓDIA (A dry white season, 1989, MGM Pictures, 106min) Direção: Euzhan Palcy. Roteiro: Colin Welland, Euzhan Palcy, romance de André Brink. Fotografia: Pierre-William Glenn, Kelvin Pike. Montagem: Glenn Cunningham, Sam O'Steen. Música: Dave Grusin. Figurino: Charles Knode. Direção de arte/cenários: John Fenner/Peter James. Produção executiva: Tim Hampton. Produção: Paula Weinstein. Elenco: Donald Sutherland, Susan Sarandon, Marlon Brando, Janet Suzman, Zakes Mokae, Jurgen Prochnow, Winston Ntshona. Estreia: 10/9/89 (Festival de Toronto)
Indicado ao Oscar de Ator Coadjuvante (Marlon Brando)
No final dos anos 90, Hollywood parecia ter despertado para a questão do apartheid na África do Sul. Na época, Nelson Mandela ainda cumpria pena, mas filmes como "Um grito de liberdade" (87), de Richard Attenborough - que deu a primeira indicação ao Oscar a Denzel Washington - e "Um mundo à parte" (88), de Chris Menges - prêmio de melhor atriz em Cannes para Barbara Hershey - lidavam abertamente com questões ligadas ao tema. O final dessa trilogia informal, "Assassinato sob custódia", foi lançado em 1989, depois de um processo de produção de cerca de cinco anos, que incluiu uma troca de estúdio (a Warner abandonou o projeto, que foi parar na MGM), a negociação de pagamento mínimo aos atores do elenco (Marlon Brando entre eles) e boatos de espionagem por parte do governo da África do Sul durante as filmagens no Zimbabue. Primeiro filme de um grande estúdio a ser dirigido por uma mulher negra (Euzhan Palcy, nascida na Martinica), a adaptação do romance do sul-africano André Brinks, lançado em 1979 e banido em seu país de origem, é um filme intenso e doloroso, mas que esbarra em um ritmo irregular. Mesmo assim, é de suma importância política e social, ao retratar, sem meias-palavras, a crueldade do regime e a conivência da justiça em um período de extrema violência e preconceito racial.
Lançado no Festival de Toronto de 1989, "Assassinato sob custódia" conquistou elogios calorosos e teve, a seu favor, a publicidade em torno do retorno de Marlon Brando ao cinema, nove anos depois do malfadado "A fórmula" (80). Trabalhando quase de graça, o veterano ator não apenas chamou a atenção do público - ávido por voltar a vê-lo - como também conquistou uma indicação ao Oscar de coadjuvante (a única do filme). Seu desempenho é curto, mas crucial para a trama, apesar de ter sido filmado em apenas oito dias e ter dado trabalho à diretora: não apenas os dois entraram em conflito em razão de uma cena que acabou cortada da montagem final, como Brando alegou ter reescrito algumas cenas e as dirigido pessoalmente. Além disso, deu declarações contrárias à MGM pelo corte final do filme, que, segundo ele, passa a impressão de que "o apartheid é coisa de um passado muito remoto e não atual e presente". Problemas à parte, a presença de Marlon Brando no elenco do filme é apenas uma de suas várias qualidades - e vale mais por sua estatura icônica dentro da indústria do que por seu tempo de tela. O real protagonista é Ben Du Toit, um professor sul-africano, de olhos azuis e de classe média interpretado por Donald Sutherland em registro discreto mas eficiente - mas antes que surja a reclamação de mais um white savior em filmes do gênero, é bom que se destaque que, apesar de ser os olhos da plateia, Ben é apenas uma peça em uma engrenagem de homens e mulheres em busca de justiça - sejam eles brancos ou negros.
Du Toit é jogado em meio à tragédia do apartheid menos velado quando o filho de onze anos de idade de seu jardineiro, Gordon (Winston Ntshona), é sequestrado pelas forças policiais do governo. Em sua trajetória para localizar o menino, Gordon acaba sendo assassinado - tendo sua morte ocultada pelos meios oficiais e declarada natural. Indignado, Ben se une à jornalista britânica Melanie (Susan Sarandon) para tentar jogar luz nas reais condições das prisões do país, onde tortura e assassinato são acontecimentos triviais. Um velho amigo de Gordon, Stanley (Zakes Mokae), é seu guia pelos meandros da sociedade dividida da África do Sul - e irá lhe servir também de apoio quando outras mortes começam a acontecer a seu redor e até sua família, amigos e colegas de trabalho resolvem lhe virar as costas. Em sua descida rumo ao desconhecido, ele conta com seu apego à verdade e à certeza de estar lutando do lado certo da batalha. Seu maior empecilho nisso é o Capitão Stoltz (Jurgen Prochnow), que não mede esforços ou estratégias para apagar os vestígios de seus crimes de ódio.
Assim como "Um grito de liberdade" tratava dos desdobramentos da morte do ativista Steve Biko, "Assassinato sob custódia" se utiliza de um crime bárbaro para mergulhar o espectador em um mundo onde as leis e a igualdade racial só existem na teoria. Durante a primeira metade do filme, a diretora conta sua história com placidez, ainda que revoltosa, como se preparando o público para sua metade final. A partir daí, quando Du Toit e Stanley percebem que a única maneira de desvendar toda a lista de atrocidades que os cerca é jogando com armas menos leais e claras, o filme acelera o ritmo, engrena uma sucessão de sequências impactantes e passa a revelar o caráter real de alguns de seus personagens, conduzindo a um final realista e triste. Pontuado pela bela trilha sonora de Dave Grusin e valorizado por um elenco coadjuvante formado por atores sul-africanos que dão um tom de veracidade ainda maior à trama, o filme de Euzhan Palcy - que posteriormente dedicou-se mais à carreira de documentarista - é um petardo emocional verdadeiro e pungente. Apesar de parecer, em alguns momentos, um telefilme, é um prato cheio para aqueles que gostam de unir o útil ao agradável e procuram entretenimento com substância. Um filme subestimado e muito importante, lançado, ironicamente, na mesma temporada em que "Conduzindo Miss Daisy" - criticado por seu retrato romantizado do racismo - ganhou o Oscar de melhor filme. A Academia, como sempre, perdendo o trem da história!
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