quarta-feira

SEM SAÍDA

SEM SAÍDA (No way out, 1987, Orion Pictures, 114min) Direção: Roger Donaldson. Roteiro: Robert Garland, romance "The big clock", de Kenneth Fearing. Fotografia: John Alcott. Montagem: William Hoy, Neil Travis. Música: Maurice Jarre. Direção de arte/cenários: Dennis Washington/Bruce Gibeson. Produção executiva: Mace Neufeld. Produção: Robert Garland, Laura Ziskin. Elenco: Kevin Costner, Gene Hackman, Sean Young, Will Patton, Howard Duff, George Dzunza, Iaman, Jason Bernard, David Paymer. Estreia: 14/8/87

Em Hollywood poucas coisas são mais valorizadas do que saber a hora certa de lançar um filme. Às vezes pequenas obras-primas são prejudicadas por estratégias equivocadas de lançamento, enquanto em outras ocasiões filmes medíocres são alçados ao posto de campeão de bilheteria simplesmente porque estrearam na hora certa. Um exemplo de como esse posicionamento comercial pode definir a sorte de um produto - um filme, um astro, uma marca - pode ser encontrado claramente em "Sem saída", eficiente thriller de espionagem dirigido por Roger Donaldson. Pronto desde 1986, ele foi segurado por seu estúdio - a Orion Pictures - até o segundo semestre de 1987. A razão? Eles queriam aproveitar o sucesso que previam para a superprodução "Os intocáveis", de Brian DePalma - que realmente foi muito bem-sucedido nas bilheterias - para capitalizar em cima do astro de ambos os filmes, o então recém-descoberto Kevin Costner. Deu certíssimo - para eles e para Costner. Não só seu filme rendeu mais que o dobro do seu custo como confirmou o status de astro ascendente do ator, que em poucos anos até diretor vencedor do Oscar se tornaria (antes de afundar-se no egocentrismo de filmes catastróficos como "Waterworld" (95) e "O mensageiro" (97)). Mas o melhor de tudo é que, sem essa visão mercadológica, era bem possível que, mesmo com a presença de Gene Hackman no elenco, "Sem saída" acabasse passando em branco, o que seria uma tremenda injustiça com um filme que merece o sucesso que fez.

Uma espécie de precursor das adaptações cinematográficas de Tom Clancy e John Grisham, "Sem saída" é envolvente e surpreendente, com reviravoltas em número o suficiente para prender a atenção até mesmo do público mais descolado do gênero - além de apresentar Costner em cenas bastante ousadas com Sean Young, antes de tornar-se o queridinho bem-comportado da América (e depois ver esse titulo escorrer pelo ralo pelos escândalos de traições conjugais). Ele vive Tom Farrell, um oficial da Marinha americana que é escalado por um antigo colega, Scott Pritchard (Will Patton) para trabalhar no Pentágono ao lado do Secretário de Defesa, David Brice (Gene Hackman) - que quer sua ajuda para obter informações a respeito da construção de um caríssimo submarino que ele acredita ter mais conotações políticas do que necessárias. Não demora muito para que Farrell descubra que a mulher por quem está apaixonado - a sexy e desinibida Susan Atwell (Sean Young) - também tem um caso antigo com Brice, o que o coloca em rota de colisão com seu chefe. A situação fica ainda mais complicada quando uma tragédia muda o curso da história e Farrell precisa utilizar-se de trapaças e mentiras para sair com vida de uma conspiração que envolve até mesmo um suposto espião russo infiltrado no Pentágono.

Narrado sem pressa por Donaldson, que conta com um roteiro de pedigree literário, já que é inspirado livremente no romance "The big clock", de Kenneth Fearing (por sua vez já havia sido adaptado com mais fidelidade em um filme de 1948 estrelado por Ray Milland e Charles Laughton, mas sem conotações políticas), "Sem saída" muda drasticamente de tom em sua segunda metade, quando o idílico e romântico começo dá espaço a uma corrida desesperada contra o relógio. Acusado de um crime que não cometeu, Farrell precisa provar sua inocência e desmascarar os reais responsáveis por sua desesperada situação, tendo sua angústia testemunhada apenas pela audiência, que o acompanha através da câmera nervosa de John Alcott pelos corredores apertados do Pentágono. A tensão crescente, sublinhada pela música do veterano Maurice Jarre e pela edição ágil que não permite o menor descanso - nem ao personagem nem à plateia - só acaba nas sequências finais, que apresentam não apenas um clímax forte o suficiente mas também uma surpresa que muda tudo que havia sido estabelecido até então.

Dirigido com firmeza e com senso de entretenimento na medida certa, "Sem saída" foi o veículo ideal para a construção do ídolo Kevin Costner, que sai-se muito bem em seu primeiro papel de protagonista, mesmo quando precisa encarar Gene Hackman como um dos vilões mais frios de sua carreira. A química entre o galã e a bela Sean Young (que já havia chamado a atenção como uma replicante em "Blade Runner, o caçador de androides" (82)) é outro ponto alto do filme, e culmina com a já famosa cena no interior de uma limousine que passeia pelos pontos turísticos de Washington enquanto os dois estão pra lá de entretidos com paisagens menos clássicas. Tal momento de descontração serve de prelúdio para o abismo que ambos irão encontrar em seguida - e no qual serão seguidos atentamente pelo público que, pelos anos seguintes, correria a qualquer sala de cinema que estivesse apresentando um filme de Costner, um ator cuja queda foi tão espetacular quanto sua ascensão dentro da indústria hollywoodiana.

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