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DJANGO LIVRE

DJANGO LIVRE (Django unchained, 2012, The Weinstein Company/Columbia Pictures, 165min) Direção e roteiro: Quentin Tarantino. Fotografia: Robert Richardson. Montagem: Fred Raskin. Figurino: Sharen Davis. Direção de arte/cenários: J. Michael Riva/Leslie Pope. Produção executiva: Shannon McIntosh, Michael Shamberg, James W. Skotchdopole, Bob Weinstein, Harvey Weinstein. Produção: Reginald Hudlin, Pilar Savone, Stacey Sher. Elenco: Jamie Foxx, Christoph Waltz, Leonardo DiCaprio, Kerry Washington, Samuel L. Jackson, Don Johnson, James Remar, James Russo, Bruce Dern, Franco Nero, Robert Carradine, Quentin Tarantino. Estreia: 25/12/12

 5 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Ator Coadjuvante (Christoph Waltz), Roteiro Original, Fotografia, Edição de Som
Vencedor de 2 Oscar: Ator Coadjuvante (Christoph Waltz), Roteiro Original
Vencedor de 2 Golden Globes: Ator Coadjuvante (Christoph Waltz), Roteiro Original

 Quentin Tarantino é um cineasta que não nega suas influências. Elas estão sempre espalhadas por sua obra, seja explicitamente (como em "Jackie Brown" ou nos dois volumes de "Kill Bill") ou discretamente (pero no mucho) como em "Pulp Fiction, tempo de violência". Por isso não é de estranhar que "Django livre", seu mais uma vez incensado trabalho seja coalhado de homenagens e piadas internas. Sorte do grande público é que, além de todas essas reverências o homem é também um roteirista de mão cheia (como comprova sua vitória nos Golden Globes e no Oscar) e um diretor que consegue SEMPRE arrancar atuações antológicas de seus atores. Se alguém ainda tinha dúvidas a esse respeito (e alguém tinha?) é altamente recomendável que esse alguém assista, sem desculpa de nenhuma espécie, a esse misto de faroeste/filme sobre escravidão: nele não apenas o cineasta mais cultuado de sua geração lega ao cinema mais um grande filme como mostra que mesmo em filmes de gêneros diversos ao que se acostumou a assinar ele consegue manter-se fiel a seu estilo bastante peculiar e imediatamente reconhecível.

Provocando o desprezo do cineasta Spike Lee - que vê no filme um "desrespeito a seus ancestrais" - Quentin Tarantino fez de "Django livre" uma enciclopédia de todas as suas marcas registradas, somada à sua homenagem rasgada aos westerns-spaghetti menos conhecidos do grande público (ao invés de Sergio Leone e afins, suas influências atendem pelos nomes de Sergio Corbucci e Tonino Valeri, entre outros). Nas duas horas e quarenta cinco minutos de projeção estão espalhados diálogos ácidos, humor negro, personagens deliciosamente complexos e uma carnificina exagerada que não deixa nada a dever ao hiperviolento "Cães de aluguel", o filme de estreia que imediatamente o fez cair nas graças da crítica. Mesmo que demore a engrenar - a impressão que se tem é que a história só começa mesmo depois da primeira hora, quando os protagonistas chegam à fazenda de Calvin Candie (um Leonardo DiCaprio exercitando seu overacting em busca de Oscar) - a história do escravo Django (Jamie Foxx, espetacular) que se torna caçador de recompensas e parte ao lado do alemão King Schultz (Christoph Waltz, premiado pela segunda vez com um Oscar de coadjuvante por um filme de Tarantino, e também vencedor do Golden Globe) em busca de sua esposa Broomhilda (Kerry Washington) utiliza elementos tão díspares quanto a luta "mandingo" (chupada de um filme de 1975) quanto referências à ópera "O anel dos Nibelungos", de Richard Wagner. Mas é tudo misturado de  maneira tão orgânica que é difícil imaginar que o diretor/roteirista (e ator em uma sequência perto do final) vá criando sua trama durante a escrita do roteiro. E é difícil acreditar também que outro elenco pudesse ser melhor do que o escolhido para o projeto.


Ainda que Will Smith tenha sido o primeiro nome a passar pela cabeça de Tarantino para protagonizar seu filme, o trabalho impecável de Jamie Foxx no papel central é digno de figurar entre os melhores de sua carreira já premiada com o Oscar por seu desempenho na cinebiografia "Ray" (2004). Christoph Waltz novamente dá um banho de interpretação com seu complexo Schultz - que é dono de algumas das melhores falas. Até mesmo Franco Nero - o Django do filme de 1966 - encontra espaço para uma participação afetiva, assim como Don Johnson faz com que se mantenha a tradição do diretor de recuperar a carreira de nomes deixados de lado pelo cinema comercial. E se Leonardo DiCaprio repete os maneirismos de sempre em sua atuação como o vilão Calvin Candie, seu escravo fiel - e surpreendentemente racista ao extremo - vivido por Samuel L. Jackson rouba a cena descaradamente, em uma interpretação que merecia ter sido lembrada pelo Oscar.

Violento como poucos filmes da atualidade - com sangue jorrando aos borbotões, escravos sendo devorados por cães e tiroteios ensandecidos - "Django livre" comprova novamente o talento e a criatividade de seu diretor. Porém, faz pensar o quanto ele ainda tem a oferecer dentro do universo um tanto restrito - ainda que passível de grandes expansões narrativas - em que gravita. Em 2015 ele vem com um novo e aguardado filme - "The hateful eight" - e será a hora de o público mais uma vez se render a sua maestria ou demonstrar sinais de cansaço. O tempo dirá, mas "Django livre" sempre se manterá como um excelente exemplo de seu estilo de fazer grande cinema.

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