A GUERRA DOS SEXOS (Battle of the sexes, 2017, Fox Searchlight Pictures, 121min) Direção: Jonathan Dayton, Valerie Farris. Roteiro: Simon Beaufoy. Fotografia: Linus Sandgren. Montagem: Pamela Martin. Música: Nicholas Britell. Figurino: Mary Zophres. Direção de arte/cenários: Judy Becker/Matthew Flood Ferguson. Produção: Danny Boyle, Christian Colson, Robert Graf. Elenco: Emma Stone, Steve Carell, Andrea Riseborough, Bill Pullman, Elisabeth Shue, Nathalie Morales, Sarah Silverman, Alan Cumming, Eric Christian Olsen. Estreia: 02/9/17 (Festival de Teluride)
Nada como um casal de verdade para comandar, diante dos olhos do público, uma batalha tão representativa sobre a disputa de gêneros quanto a protagonizada, em 1973, por dois jogadores de tênis populares e radicalmente diferentes quanto Billie Jean King e Bobby Riggs. Um dos mais importantes episódios esportivos - e por que não políticos? - da história dos EUA, a partida que uniu o país defronte a uma quadra de tênis ganhou, em "A guerra dos sexos", um retrato ao mesmo tempo irônico e emocionante nas mãos de Jonathan Dayton e Valerie Farris, diretores do já clássico "Pequena Miss Sunshine" (2006). Com um roteiro preciso de Simon Beaufoy - Oscar por "Quem quer ser um milionário? "(2008) - e atuações exemplares de Emma Stone e Steve Carell, o filme acabou sendo um inesperado fracasso de bilheteria e passou quase despercebido pelas cerimônias de premiação (Stone e Carell foram indicados apenas ao Golden Globe, sendo ignorados pelo Oscar e demais associações de críticos). Na verdade, tal resultado tão pouco auspicioso não reflete sua qualidade: sem apelar para o humor fácil ou o ativismo barato, o filme de Dayton e Farris diverte na mesma medida em que faz uma análise atualíssima sobre os papéis masculinos e femininos no final do século XX - e que encontra eco fortíssimo nas reivindicações sobre igualdade salarial no esporte, assunto mais do que em voga nessas primeiras décadas do XXI.
A trama começa em 1970, quando a famosa e vitoriosa Billie Jean King (Emma Stone) bate de frente com Jack Kramer (Bill Pullman), o organizador de um torneio mundial de tênis feminino cujo prêmio máximo é apenas 1/8 do prêmio oferecido ao campeão do campeonato masculino. Criando uma liga própria para mulheres, juntamente com outras jogadoras, Billie Jean acaba se tornando uma espécie de porta-voz de um movimento que pede equiparação de pagamento a homens e mulheres. Sua luta encontra resistência entre os executivos do esporte - todos homens que pregam a inferioridade de talento e força física das jogadoras em relação aos ídolos do chamado "sexo forte". É com essa gana de provar que existe igualdade entre os gêneros que Billie Jean aceita o desafio de Bobby Riggs (Steve Carell) para uma partida a ser transmitida internacionalmente. Jogador já aposentado - depois de uma carreira brilhante -, Briggs é um apostador compulsivo e vive sustentado pela esposa Priscilla (Elisabeth Shue), mas não resiste a bravatas pouco sutis e misóginas. E é para defender seu gênero que Billie Jean entra na quadra e se torna um ícone feminista.
Porém, fora das quadras, a jovem tenista também tem seus problemas pessoais. O casamento com Larry (Austin Stowell) está ameaçado por sua atração pela cabeleireira Marilyn Barnett (Andrea Riseborough) - e esta relação, se chegar até os meios de comunicação pode atrapalhar sua imagem diante do público. Além disso, Bobby tem a seu lado um séquito de atletas e jornalistas conservadores, o que lhe dá uma certa vantagem psicológica. O roteiro de Beaufoy acerta em tratar o romance entre Billie e Marilyn com naturalidade - inclusive dourando um pouco a pílula, uma vez que o relacionamento acabou em 1981 de forma pouco agradável (com Marilyn processando a jogadora). A direção de Dayton e Farris também foge do sensacionalismo e da polêmica, centrando seu foco muito mais na disputa entre os protagonistas (dentro e fora da quadra) e no trabalho irrepreensível de seus dois atores centrais. Emma Stone - que quase foi substituída por Brie Larson mas recuperou o papel a tempo - alterna os estados de espírito de sua personagem com extrema segurança, e Steve Carell parece ter nascido para interpretar Bobby Riggs: sua verve e seu timing cômico são precisos e dão a leveza necessária para não tornar a narrativa algo panfletário ou desinteressante. Da mesma forma, o elenco coadjuvante brilha sem roubar a atenção da dupla principal - e conta com nomes conhecidos como Bill Pullman e Elisabeth Shue.
Engraçado, importante e absolutamente atual, "A guerra dos sexos" talvez tenha fracassado nas bilheterias justamente por não se dobrar ao óbvio e ao cômodo. Não provoca gargalhadas fáceis nem tampouco tenta forçar a simpatia da plateia a um assunto bastante explosivo. É apenas um (bom) filme, contado com inteligência e sensibilidade, e que pode provocar discussões bastante saudáveis e pertinentes. Em uma época na qual poucos filmes tem a coragem de sair da zona de conforto, é um alento dos mais divertidos e simpáticos. Não vai mudar a história do cinema nem a vida do espectador, mas é muito mais relevante do que obras pretensamente sérias e politicamente corretas que conseguem enganar crítica e público. Um filme a ser descoberto e aplaudido!
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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