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BOM COMPORTAMENTO

BOM COMPORTAMENTO (Good time, 2017, Elara Pictures/Rhea Films, 101min) Direção e roteiro: Benny Safdie, Josh Safdie. Fotografia: Sean Price Williams. Montagem: Ronald Bronstein, Benny Safdie. Música: Oneothrix Point Never. Figurino: Miyako Bellizzi, Mordechai Rubinstein. Direção de arte/cenários: Sam Lisenco/Audrey Turner. Produção executiva: Jean-Luc De Fanti. Produção: Sebastian Bear-McClard, Oscar Boyson, Terry Douglas, Paris Kasidokostas Latsis. Elenco: Robert Pattinson, Benny Safdie, Buddy Duress, Jennifer Jason Leigh, Taliah Webster, Barkhad Abdi. Estreia: 25/5/17 (Festival de Cannes)

Fazer parte de um fenômeno cultural logicamente ajuda na carreira de um ator/atriz. Ao mesmo tempo, porém, pode transformar-se em uma prisão, especialmente quando tal fenômeno não alcança, em termos de prestígio, o tanto que alcançou comercialmente. É o que aconteceu com o elenco da saga "Crepúsculo", inspirada nos livros de Stephanie Meyer: desde que começaram a chegar aos cinemas, em 2008, suas adaptações lotaram salas de exibição mundo afora e deram instantaneamente a seus atores principais, Kristen Stewart e Robert Pattinson, status de estrelas. Mesmo bombardeados pela crítica, os filmes seguiram aplaudidos por milhares de adolescentes, encantados com o triângulo amoroso entre uma mortal, um vampiro melancólico e um lobisomem juvenil. Presos a personagens quase risíveis e entregando atuações constrangedoras, os jovens atores saíram da empreitada com seus currículos chamuscados e desacreditados diante de Hollywood. Demorou um bom tempo até que finalmente eles começassem a demonstrar que, por trás de ídolos juvenis, eles tinham talento suficiente para encarar desafios maiores. Kristen (que começou a ser notada como a filha de Jodie Foster em "O quarto do pânico", de  2002) foi a primeira, integrando o elenco de produções de peso, como a versão cinematográfica de "Na estrada", de Jack Kerouac - dirigida por Walter Salles em 2012 - e "Acima das nuvens" (2014), de Olivier Assayas, que lhe rendeu um César de atriz coadjuvante (ela foi a primeira atriz norte-americana a levar o prêmio, considerado o Oscar francês). Já seu colega de elenco - e também namorado por um determinado período de tempo, durante as filmagens da série - demorou um pouco mais a convencer além de seus fãs adolescentes.

Lembrado também como Cedric Diggory em "Harry Potter e o cálice de fogo" (2005), Pattinson já tinha vivido o pintor Salvador Dalí em "Poucas cinzas", de 2008, antes mesmo de interpretar o vampiro Edward Cullen, mas seu trabalho nas tramas de Meyer atrapalhou sua trajetória como ator sério. Suas participações em "Bel Ami: o sedutor" (baseado em Guy de Maupassant) e "Cosmópolis", dirigido por David Cronenberg, chamaram a atenção de alguns críticos, mas não chegaram a alterar a forma como o espectador médio o via. Até que "Bom comportamento", uma produção independente com orçamento de cerca de 4,5 milhões de dólares mudou tudo: aplaudidíssimo no Festival de Cannes 2017, o filme dos irmãos Benny e Josh Safdie lhe rendeu indicações a vários prêmios na temporada, elogios rasgados da imprensa e a chance de finalmente deixar para trás a imagem de galã púbere. A melhor notícia, no entanto, é que ele realmente faz esquecer as caras e bocas de seu mais célebre papel e convence com um personagem amoral e pouco confiável - escrito especialmente para ele depois que ele contatou os diretores/roteiristas e comunicou que queria trabalhar com eles.


Intrigado pelo cartaz do filme "Amor, drogas e Nova York" quando o viu pela Internet, Pattinson escreveu um email aos irmãos, demonstrando interesse em um projeto qualquer no futuro. Poucas semanas depois os três se encontraram, e os Safdie, sabendo que o nome do ator poderia abrir muitas portas para uma produção sem o apoio de grandes produtoras, não perderam tempo. Logo criaram Connie Nickas, um jovem criminoso que, movido pela força do amor que sente por seu irmão com problemas mentais, Nick (o próprio Benny Safdie, um dos diretores), se vê obrigado a entrar em uma perigosa jornada para tirá-lo do hospital em que se encontra internado desde que um assalto cometido pelos dois resultou em sua prisão. Para isso, ele conta com a ajuda de sua namorada, Corey (participação especial de Jennifer Jason Leigh) e com a adolescente Crystal (Taliah Lennice Webster), que se envolve quase sem querer na situação.

Situando sua trama em uma única noite (com poucos flashbacks), "Bom comportamento" não é, nem de longe, um filme perfeito. Apesar do esforço de Pattinson e alguns bons momentos de tensão, a trama não é forte o bastante para segurar a atenção da plateia sem que se torne cansativa. Um tanto superficial em seu desenvolvimento e com um roteiro que deixa coisas demais para a imaginação do espectador, tem um começo promissor, mas vai perdendo o gás com o decorrer do tempo - para retomá-lo, e mesmo assim sem a mesma força, na reta final. Desperdiçando o talento de Jennifer Jason Leigh e de Barkhad Abdi (indicado ao Oscar de coadjuvante por "Capitão Phillips", de 2013), "Bom comportamento" aposta todas as suas fichas no desempenho de seu ator central e no ritmo ágil: acerta no primeiro - Pattinson nunca esteve tão bem em cena -, mas tropeça no segundo, já que a agilidade da edição é, talvez, um dos calcanhares de Aquiles da produção: ao invés de complexa e inteligente, é apenas confusa. O filme seguinte dos cineastas, "Joias brutas", foi igualmente elogiado pela crítica e havia quem confiasse que a Academia iria lembrar de Adam Sandler entre seus indicados da temporada 2019 - e novamente pareceu mais uma alucinação coletiva, já que foi a produção foi solenemente ignorada pelo Oscar. Aparentemente, os irmãos tem talento, mas ainda precisam lapidá-lo antes de sua consagração. "Bom comportamento" apresenta boas ideias, mas está bem longe de estar acima da média.

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