quinta-feira

INTERIORES


INTERIORES (Interiors, 1978, United Artists, 93min) Direção e roteiro: Woody Allen. Fotografia: Gordon Willis. Montagem: Ralph Rosenblum. Figurino: Joel Schumacher. Direção de arte/cenários: Mel Bourne/Mario Mazzola. Casting: Juliet Taylor. Produção executiva: Robert Greenhut. Produção: Charles H. Joffe. Elenco: Geraldine Page, Diane Keaton, Mary Beth Hurt, E.G. Marshall, Kristin Griffiths, Maureen Stapleton, Sam Waterston, Richard Jordan. Estreia: 02/8/78

5 indicações ao Oscar: Diretor (Woody Allen), Atriz (Geraldine Page), Atriz Coadjuvante (Maureen Stapleton), Roteiro Original, Direção de arte

Depois de sair consagrado da festa do Oscar com os prêmios de roteiro e direção por "Noivo neurótico, noiva nervosa", Woody Allen seguiu o único caminho que poderia surpreender os fãs de seu estilo: abandoná-lo e fazer um filme completamente diferente. Inspirado claramente na obra do cineasta sueco Ingmar Bergman, um dos seus maiores ídolos, "Interiores" pegou todo mundo - crítica e público - de surpresa, ao contar uma história sem o menor epaço para qualquer senso de humor e com um ritmo de cinema europeu. Desnecessário dizer que sua bilheteria foi ínfima.

No livro de entrevistas "Conversas com Woody Allen", de Eric Lax, o cineasta afirma que hoje em dia conseguiria fazer de "Interiores" um filme melhor. A questão é: por que? Do jeito que está, o nono filme de sua carreira é uma hipnotizante e sensível, ainda que muitas vezes árdua, história sobre as relações (ou a falta delas) entre pessoas da mesma família, que frequentemente não conseguem expressar a contento suas emoções. Com atuações sublimes de seus protagonistas e um roteiro que foge do lugar comum durante toda a sua projeção, "Interiores" é uma das mais bem-acabadas obras de Allen dentro de sua "fase bergmaniana".

É bastante provável que aqueles que se tornaram fãs do diretor devido a suas geniais comédias lançadas anteriormente se decepcionem com "Interiores", justamente porque ele é o extremo oposto da sua filmografia anterior, repleta de ironia e sarcasmo. Aqui a coisa é muito séria: depois de ser abandonada pelo marido - que cansou de levar uma vida tediosa e certinha - a dona de casa Eve (Geraldine Page) passa a dedicar-se a decorar a casa da filha do meio, Joey (Mary Beth Hurt), uma mulher indecisa quanto ao rumo a tomar em sua vida profissional. Temendo ferir os sentimentos da mãe, ela não para de dar-lhe esperanças sobre um possível arrependimento de seu pai. Essa tática não é aprovada por Renata (Diane Keaton), a filha mais velha, uma escritora relativamente bem-sucedida que tem um relacionamento conflituoso com o também escritor Frederick (Richard Jordan), que, em uma noite de exagero etílico tenta estuprar a cunhada caçula, a atriz Flyn (Kristin Griffith). A fragilidade psicológica de Eve entra em colapso quando seu ex-marido, Arthur (E.G.Marshall) anuncia seu casamento com a duplamente viúva Pearl (Maureen Stapleton).


Nada em "Interiores" é fácil, clichê e/ou de fácil assimilação. Allen não poupa sua plateia de mergulhar dentro dos pensamentos de personagens sofridos, densos, complexos e incapazes de lidar com suas próprias emoções. A fotografia em tom pastel - assim como os figurinos e os cenários - apenas reitera a total falta de passionalidade de suas personagens, trancadas em uma redoma de inseguranças e inaptidão em lidar com suas vidas. Nem mesmo as cenas de maior emoção do filme são exageradas, sendo apresentadas sempre em um tom médio, que remete diretamente à frieza estética do cinema sueco que inspirou seu roteiro e sua direção. Quando Flyn é quase violentada, não há uma música grandiloquente ou lágrimas derramadas a rodo. Todos ali são elegantes, sofisticados, empedernidos. Por dentro, no entanto, sofrem um turbilhão de sensações, nem todas elas agradáveis.

Acertadamente, Woody Allen declarou que as falas de "Interiores" soam mais como legendas do que diálogos naturais - ingrediente básico em suas comédias. Mas é inegável que essa ausência de naturalismo imposta por ele em seu roteiro empurra o resultado final mais para um drama discreto e quase silencioso do que para um catártico e emocional melodrama hollywoodiano. O público não gostou. A crítica, em sua maioria, aplaudiu vigorosamente.

E um dos motivos para esses aplausos merecidos da crítica atende pelo nome de Geraldine Page. Herdando um papel oferecido inicialmente a Ingrid Bergman - que o recusou porque iria fazer "Sonata de outono", dirigido pelo mestre de Allen - Page tem uma atuação exemplar, de uma economia inteligente e adequada. A cena em que ela tem um ataque de choro por achar que sua vida não tem nada de interessante é de arrepiar, assim como seu diálogo final com Joey, capaz de emocionar sem soar óbvio.

E é justamente por fugir do óbvio - em todos os sentidos - que "Interiores" é um dos filmes mais interessantes de Woody Allen. Não é para qualquer público, mas aqueles que se arriscam a assisti-lo sabendo de suas intenções tem pouquíssimas chances de se decepcionar.

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