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MUITO ALÉM DO JARDIM


MUITO ALÉM DO JARDIM (Being there, 1979, United Artists, 130min) Direção: Hal Ashby. Roteiro: Jerzy Kosinski, romance de sua autoria. Fotografia: Caleb Deschanel. Montagem: Don Zimmerman. Música: Johnny Mandel. Figurino: May Routh. Direção de arte/cenários: James Schoppe/Robert Benton. Casting: Lynn Stalmaster. Produção executiva: Jack Schwartzman. Produção: Andrew Braunsberg. Elenco: Peter Sellers, Shirley MacLaine, Melvyn Douglas, Jack Warden, Richard Dysart. Estreia: 19/12/79

2 indicações ao Oscar: Ator (Peter Sellers), Ator Coadjuvante (Melvyn Douglas)
Vencedor do Oscar de Ator Coadjuvante (Melvyn Douglas)
Vencedor de 2 Golden Globes: Melhor Ator/Comédia ou Musical (Peter Sellers), Coadjuvante (Melvyn Douglas)


Considerado por muitos como um dos maiores gênios do humor no cinema, o inglês Peter Sellers passava por uma fase difícil de sua carreira nos anos 70. Depois de muito sucesso com a série de filmes da "Pantera cor-de-rosa" (iniciada em 1964 e retomada com sucesso em 1975, 76 e 78) ele demorou anos para convencer um estúdio a realizar um de seus projetos de estimação, a adaptação para o cinema do romance "Being there", de Jerzy Kosinski. Foi apenas com sua ressurreição comercial (com o filme "A vingança da pantera cor-de-rosa") que ele finalmente conseguiu tirar do papel a melancólica e quase surreal história de um jardineiro tido como gênio. Elogiado unaninemente pela crítica, o filme do autoral Hal Ashby acabou tornando-se um dos últimos trabalhos do genial ator, que morreu menos de um ano depois da estreia do filme nos cinemas americanos. Seu canto do cisne lhe deu uma última e merecida indicação ao Oscar de melhor ator.

Em uma inspirada e cuidadosa atuação, Sellers vive, em "Muito além do jardim" , uma das personagens mais sensíveis de sua carreira. Chance é um jardineiro quase obtuso, um homem que vive cercado de suas plantas e de seu aparelho de televisão, as duas paixões de sua vida. Chance não sabe ler, nem escrever nem manter uma conversa mais articulada, além de não ter nenhum registro oficial e não tem a menor noção de uma existência fora da mansão onde foi criado. Quando seu patrão morre, ele se vê, inesperadamente, frente a um universo absolutamente novo e com o qual não tem a menor noção de como lidar. Por obra do acaso, ele é atropelado pela limousine de Eve Rand (Shirley MacLaine), a esposa de um industrial milionário que está às portas da morte. Levado para o casarão onde o casal mora, servido por inúmeros empregados, ele conquista a todos com seu jeito calado e discreto. Suas frases - todas tiradas de programas de TV - e até mesmo seu silêncio constrangido são tidos como geniais tanto por Eve e seu marido Benjamin (Melvyn Douglas) quanto pelo próprio presidente dos EUA (Jack Warden), amigo da família. Aos poucos, Chance começa a influenciar a todos a sua volta, inclusive despertando a paixão de uma carente Eve.


"Muito além do jardim" é uma espécie de precursor de "Forrest Gump", uma vez que assim como no filme de Robert Zemeckis, o protagonista é um homem de QI abaixo do normal que consegue atingir um nível de sucesso inesperado. Ao contrário da obra estrelada por Tom Hanks, no entanto, o humor do filme de Ashby é muito menos óbvio, menos popular, digamos assim. Ao optar por um estilo mais sóbrio de fazer comédia, o roteiro escrito pelo mesmo autor do romance que o originou, Jerzy Kosinski, foge das gargalhadas e percorre um caminho mais denso e crítico. Simbólico ao extremo, é um trabalho tão rico em possibilidades de compreensão que dificilmente estaria em uma lista das maiores bilheterias da história. Quem se dispuser a assistí-lo, no entanto, pode ter uma grata surpresa.

Não é preciso dizer que o ritmo imposto por Ashby à sua narrativa é menos ágil do que se espera de uma comédia. Devagar e sem impor ao público uma edição veloz, ele dá a exata noção do comportamento de seu protagonista, um homem preso a um mundo particular, com seus próprios interesses e que é totalmente alheio ao que se passa a seu redor. Ironia é a palavra que melhor define o humor de "Muito além do jardim", que critica de forma não muito velada a mediocridade americana (e por que não mundial?) quando o assunto é escolher seus gurus e/ou ídolos. Buscando inspiração em "O idiota", de Dostoievsky, o filme final de Peter Sellers é uma espécie de alerta contra o conformismo, mas realizado de forma elegante e altamente simbólica.

"Muito além do jardim" não é um filme que seja citado corriqueiramente nas listas dos melhores, nem da crítica (que o elogiou muito em seu lançamento) e tampouco do público, que praticamente o relegou a um quase esquecimento. Mas tem uma inteligência e uma sutilezas raras, além de ser um belo testamento legado por um dos grandes atores de sua geração.

Um comentário:

dea oliva disse...

Vi hj o filme e gostei bastante. Me senti tocada por esta personagem tao livre e interessante . O filme é um primor e seria de um egoismo imprrdoavel nao recomenda-lo e escrever algo sobre ele!

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