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O ESPIÃO QUE SABIA DEMAIS

O ESPIÃO QUE SABIA DEMAIS (Tinker tailor soldier spy, 2011, StudioCanal, 127min) Direção: Tomas Alfredson. Roteiro: Peter Straughan, Bridget O'Connor, romance de John Le Carré. Direção: Hoyte Van Hoytema. Montagem: Dino Jonsater. Música: Alberto Iglesias. Figurino: Jacqueline Durran. Direção de arte/cenários: Maria Djurkovic/Tatiana MacDonald, Zsuzsa Mihalek. Produção executiva: Liza Chasin, Olivier Courson, Ron Halpern, Debra Hayward, John Le Carré, Peter Morgan, Douglas Urbanski. Produção: Tim Bevan, Eric Fellner, Robyn Slovo. Elenco: Gary Oldman, John Hurt, Colin Firth, Toby Jones, Tom Hardy, Benedict Cumberbatch, Kahty Burke, Ciarán Hinds, David Dencik. Estreia: 05/9/11 (Festival de Veneza)

3 indicações ao Oscar: Ator (Gary Oldman), Montagem, Trilha Sonora Original 

Para se assistir a "O espião que sabia demais" duas coisas são imprescindíveis: paciência e atenção. Paciência porque o filme, baseado em um romance de John LeCarré - que já rendeu uma minissérie de TV - tem um ritmo próprio, mais lento do que as habituais produções hollywoodianas centradas em espionagem que mal dão tempo ao espectador para respirar (como a excepcional trilogia Bourne, estrelada por Matt Damon). E atenção porque, apesar de nunca atropelar as informações, o roteiro de Peter Straughan e Bridget O'Connor(que morreu antes do lançamento do filme e a quem ele é dedicado) é tão recheado de pequenos detalhes e silêncios reveladores que, se o espectador der uma piscadela corre o risco de perder o fio da meada e se confundir irremediavelmente.

Em uma época em que tudo chega ao público da maneira mais mastigadinha possível, um filme como "O espião que sabia demais" é um estranho no ninho. Dirigida com uma elegância e uma quase frieza que trai as origens nórdicas de seu diretor Tomas Alfredson (cujo cartão de visitas é a ótima versão original do terror "Deixe ela entrar"), a trama - complexa e um tanto anacrônica nos dias de hoje, em que a Guerra Fria é apenas um fantasma longínquo - quase serve mais como um show de atores do que exatamente um thriller convencional de espionagem. Na pele do protagonista George Smiley, finalmente Gary Oldman tem o reconhecimento que merece há décadas, em uma atuação construída em cima de sutilezas e movimentos delicados que foi recompensada com uma indicação ao Oscar. Mesmo cercado de atores de talento comprovado - Colin Firth, Toby Jones, Ciarán Hinds, Kathy Burke, Tom Hardy - o inglês que deu intensidade ímpar ao protagonista de "Drácula de Bram Stoker" cria um personagem de personalidade ambígua, mantendo o interesse do público desde as primeiras cenas até o final coerente e inteligente.


Ah, sim, a história... Passado nos anos primeiros anos da década de 70, "O espião que sabia demais" começa quando Control (o ótimo John Hurt), chefe do Serviço de Inteligência Britânico é obrigado a se demitir depois de uma missão tragicamente equivocada na Hungria. Junto com ele, sai do serviço seu braço-direito, George Smiley (Oldman, econômico em gestos e palavras), que, algum tempo depois, é procurado pelo governo para investigar a acusação do jovem agente Ricki Tarr (Tom Hardy em papel herdado de Michael Fassbender e demonstrando um talento que frequentemente se esconde debaixo dos músculos), que, ecoando uma suspeita de seu antigo chefe, afirma que existe um agente duplo entre os agentes do grupo. Smiley, de fora da agência, tenta descobrir a partir daí, quem é o real culpado (e se ele realmente existe), uma tarefa nada fácil, uma vez que todos os seus ex-colegas - Percy Alleline (Toby Jones), Toby Esterhase (David Dencik), Roy Bland (Ciarán Hinds) e Bill Haydon (Colin Firth) - parecem ter algo a esconder.

O filme de Alfredson é construído a partir de detalhes, de pequenas coisas, de mentiras e meias-verdades que só serão esclarecidas em seus minutos finais. O ritmo lento talvez afugente o público acostumado a ação desenfreada, mas, fotografado com discrição e apresentando uma reconstituição de época impecável, é um filme sério, feito para adultos que prezam o cérebro e os olhos. A estupenda e precisa edição - que a princípio parece confundir mas aos poucos vai iluminando cada um de seus personagens a partir de sutilezas de que só os grandes cineastas são capazes - contribui para o clima de confusão que se estabelece tanto ao público como a seu protagonista, permitindo uma imersão total na trama criada pelo escritor John Le Carré, que tem aqui a melhor adaptação de uma obra sua, ao lado de "O jardineiro fiel", dirigida pelo brasileiro Fernando Meirelles em 2005 mas dotada de um calor que os contrapõem totalmente. É uma prova da personalidade marcante de seu cineasta, capaz de acrescentar - e muito - ao cinema hollywoodiano.

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