PRÉSUME COUPABLE (Présume coupable, 2011, Nord-Ouest Productions/France 3 Cinéma, 102min) Direção: Vincent Garenq. Roteiro: Vincent Garenq, colaboração de Hubert Delarue, Serge Frydman, livro de Alain Marécaux. Fotografia: Renaud Chassaing. Montagem: Dorian Rigal-Ansous. Figurino: Fanny Drouin. Direção de arte/cenários: Patrick Schmitt/Thierry Rouxel. Produção executiva: Éve Machuel. Produção: Christophe Rossignon. Elenco: Philippe Torrenton, Noémie Lvosky, Raphael Ferrett, Farida Ouchani. Estreia: 07/9/11
Um dos temas recorrentes na obra do mestre Alfred Hitchcock "o homem errado" tem no francês "Présume coupable" um exemplar dos mais revoltantes. Uma história real narrada na autobiografia de mesmo nome de Alain Marécaux, o filme de Vincent Garenq - o mesmo cineasta do doce "Baby love", que narrava as aventuras de um casal gay atrás da oportunidade de ter um filho - é contundente e seco como um documentário, graças à câmera fluida e ao roteiro, que atém aos fatos para deslindar um dos erros jurídicos mais graves da França moderna. Com um elenco liderado pelo expressivo Philippe Torrenton, a obra é imperdível para qualquer fã de filmes de tribunal - mesmo que não se encaixe exatamente nos parâmetros do gênero por dar espaço principalmente ao drama do protagonista em seu período de calvário.
Sem perder tempo com preliminares, "Présume coupable" já começa com a prisão de Marécaux (Torrenton) por estupro e abuso sexual contra um grupo de crianças. Atônito e incrédulo com a situação kafkiana, ele aos poucos vai tomando conhecimento de detalhes da acusação, feita por uma mulher presa por prostituir os filhos pequenos e que insiste na afirmação de que ele fazia parte de um grupo de adultos que se utilizavam do serviço. Enquanto tenta provar sua inocência, Marécaux vai perdendo a família - o filho mais velho inicia um processo de autodestruição e rebeldia, a esposa pede o divórcio e outros pequenos dramas se sucedem - e a fé na humanidade e nos tribunais que tanto defendeu quando trabalhava como oficial de justiça. A situação é ainda pior porque ele percebe, no decorrer do processo, que nem sempre os inocentes são reconhecidos e tratados como tal pelas pessoas que, em tese, deveriam buscar a verdade incondicional.
Inédito nos cinemas brasileiros - nem tem título em português - o filme de Garenq encontra especial ressonância no país, onde erros judiciários e injustiças arbitrárias são cometidas frequentemente. Mesmo que o roteiro se concentre basicamente nas reações do protagonista diante das provações a que é submetido, fica difícil não se deixar levar pela revolta e pela indignação retratados, em especial quando o desfecho mostra a verdade por trás dos fatos e fica claro para o espectador a mesquinharia e a crueldade com que alguns seres humanos lidam com seus semelhantes. Sem escorregar no dramalhão lacrimoso ou nos clichês de filmes de prisão e/ou tribunal, o cineasta mantém o interesse do público justamente por manter-se como uma testemunha racional dos acontecimentos, narrando-os de forma sóbria e contida. Não há excessos na narrativa, e o que poderia ser um problema acaba sendo um grande acerto: a história de Marécaux já é suficientemente dramática e um tom a mais na maneira de contá-la seria, sem sombra de dúvida, um exagero absolutamente dispensável.
E se a trama de "Présume coupable" é de revirar o estômago de tão absurda e cruel, é a atuação de Philippe Torrenton quem comanda o espetáculo. Construindo um protagonista nos limites do estoicismo, que vê se mundo desabar sem aviso prévio e vai perdendo tudo que conquistou, o ator evita ampliar seu sofrimento, com uma atuação silenciosa e que mostra sua força apenas quando necessário. Ao fugir do sentimentalismo piegas, ele consegue expressar com verdade os problemas de Marécaux sem fazer dele uma vítima chorosa e conformada, o que acaba fazendo uma enorme diferença no resultado final. É seu trabalho discreto e eficiente que valoriza ainda mais um filme que merece ser descoberto.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
segunda-feira
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