segunda-feira

SPLENDOR

 


SPLENDOR (Splendor, 1989, Cecchi Gori Group/Tiger Cinematografica/Studio El/Gaumont/Warner Bros, 115min) Direção e roteiro: Ettore Scola. Fotografia: Luciano Tovoli. Montagem: Francesco Malvestito. Música: Armando Torovaioli. Figurino: Gabriella Pescucci. Direção de arte/cenários: Luciano Ricceri/Ezizo Di Monte. Produção: Mario Cecchi Gori, Vittorio Cecchi Gori. Elenco: Marcello Mastrroianni, Massimo Troisi, Marina Vlady, Paolo Panelli, Pamela Villoresi. Estreia: 09/3/89

Dois filmes italianos, lançados com a diferença de seis meses entre si, fizeram com que plateias internacionais voltassem os olhos ao passado do cinema, com seus clássicos incontestáveis servindo de matéria-prima para uma jornada de nostalgia e emoção. Um deles, "Cinema Paradiso" - que estreou no final de setembro de 1988 - entrou diretamente no coração do público e acabou seu caminho com um merecido Oscar de melhor filme estrangeiro. O outro, "Splendor", dirigido pelo veterano Ettore Scola, chegou às telas em março de 1989 mas, apesar da presença sempre hipnotizante de Marcello Mastroianni, não obteve o mesmo reconhecimento por parte dos espectadores. Bem menos sentimental do que a viagem de Giuseppe Tornatore à sua pequena Giancaldo, o filme de Scola só apela para as lágrimas em seus belos minutos finais e talvez por isso - e pela provável sensação de que sua história havia recém sido contada - tenha ficado à sombra de seu rival mais consagrado. Isso quer dizer que é menor que ele? De forma alguma. Apesar da temática soar semelhante, "Cinema Paradiso" e "Splendor" tem qualidades e narrativas diferentes - pode-se até dizer que um complementa o outro e formam um belo panorama sobre a importância do cinema em existências aparentemente banais. E o fato de um deles contar com Mastroianni no elenco - um dos ícones da produção cinematográfica europeia (e da italiana em particular) torna tudo ainda mais interessante.

Enquanto "Cinema Paradiso" apostava na emoção deslavada e pontuava sua trama com uma pungente história de amor, "Splendor" centra sua narrativa em personagens adultos, que se equilibram na tênue linha que separa o idealismo romântico e o pragmatismo econômico e social. Seu protagonista, Jordan (Marcello Mastroianni), é o dono de uma sala de cinema que, a despeito de seus dias de glória, se vê às portas da falência. Com a concorrência da televisão e a queda de público, ele tenta quixotescamente manter as portas abertas - apelando até mesmo para possíveis shows de striptease -, mas sabe que o fim é inevitável. Com a ajuda do projecionista Luigi (Massimo Troisi) e da fiel Chantelle (Marina Vlady), Jordan busca a solução de seus problemas mesmo ciente da inutilidade de seus esforços. Tendo herdado o cinema de seu pai - que projetava filmes ao ar livre durante sua infância -, Jordan não vê seu trabalho como um mero negócio, e sim como um estilo de vida, uma profissão de fé. Seu amor pela rotina no salão significa mais para ele do que apenas uma prestação de serviços: apaixonado por filmes, ele os tem como marcas indeléveis para cada fase e momento de sua vida, desde os dias de criança até a maturidade. Quando finalmente joga a toalha e vende o espaço para um negociante de móveis, é impossível não se deixar invadir por uma profusão de memórias - nem todas em ordem cronológica, mas todas de vital importância em sua trajetória pessoal.

 

Sem a trilha sonora arrasadora de Ennio Morricone e sem o apelo da pureza infantil do pequeno Salvatore Cascio - dois dos maiores destaques do filme de Tornatore -, "Splendor" perde muito na comparação em termos sentimentais. Scola não é um diretor que manipula emoções de forma óbvia, preferindo sempre a sutileza e o tom sóbrio de suas narrativas. Sua opção em contar a história fora de ordem cronológica é válida, mas peca em não permitir ao espectador uma conexão mais profunda com seus personagens, que muitas vezes soam superficiais e pouco interessantes. O romance entre Luigi e Chantelle, por exemplo, falha em cativar a audiência, e até mesmo a relação de Jordan com a família não é aprofundada o bastante para causar algum tipo de catarse. Mastroianni é sempre um ator de presença forte, mas, com exceção da bela sequência final (e um ou outro momento pontual) não entrega a performance memorável que se poderia esperar de um encontro com Ettore Scola, com quem trabalhou em outras ocasiões - como no espetacular "Um dia muito especial" (1977). E Massio Troisi não está muito diferente do que demonstrou alguns anos depois com "O carteiro e o poeta" (1994), que lhe rendeu uma indicação póstuma ao Oscar de melhor ator.

Mesmo sem alcançar todo o seu potencial emotivo e de ter sido eclipsado pela obra-prima de Giuseppe Tornatore, "Splendor" ainda tem muito coisa a ser admirada. Com um roteiro que oferece pinceladas da história política e social da Itália pós-guerra - característica da obra do diretor - e uma produção caprichada que reconstitui com precisão todas as épocas que abarcam a história do filme, a declaração de amor de Scola ao cinema atinge em cheio o coração da plateia em seus minutos finais (uma referência direta ao clássico "A felicidade não se compra", de Frank Capra) e, no decorrer de sua narrativa carinhosa, brinda os fãs da sétima arte com flashes de grandes estrelas e cenas de produções inesquecíveis - e Scola, modesto que era, abdicou de colocar nesses clipes alguns de seus trabalhos geniais. Ou alguém acha que "Nós que nos amávamos tanto" (1974) ou "Feios, sujos e malvados" (1976) não poderiam estar nesta lista?

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