quarta-feira

TRATAMENTO DE CHOQUE

 


TRATAMENTO DE CHOQUE (Anger management, 2003, Revolution Studios, 106min) Direção: Peter Segal. Roteiro: David Dorfman. Fotografia: Donald McAlpine. Montagem: Jeff Gourson. Música: Teddy Castellucci. Figurino: Ellen Lutter. Direção de arte/cenários: Alan Au/Brad Davis, Chris Spellman. Produção executiva: Allen Covert, Todd Garner, Tim Herlihy, John Jacobs, Adam Sandler. Produção: Barry Bernardi, Jack Giarraputo. Elenco: Jack Nicholson, Adam Sandler, Marisa Tomei, John Turturro, Woody Harrelson, John C. Reilly, Luis Guzman, Alen Covert, January Jones. Estreia: 11/4/2003

Um tem doze indicações ao Oscar e três estatuetas para chamar de suas. O outro é frequentemente criticado por seus méritos artísticos ainda que de vez em quando surpreenda ao trabalhar com cineastas de prestígio. Um deles é um ícone absoluto do cinema hollywoodiano desde o final dos anos 1960. O outro entrou no imaginário popular somente a partir da década de 1990. Um deles passeou por todos os gêneros possíveis - começando com os filmes de horror de Roger Corman - e fez personagens tão díspares quanto um lobisomem quanto um escritor com TOC. O outro especializou-se em tipos comuns e dividiu-se entre comédias (românticas ou debochadas). Ambos tiveram filmes com bilheterias expressivas e tem uma legião de fãs - nem sempre os mesmos, mas em número considerável. Por mais diferentes que possam ser e por mais incompatíveis que pareçam, Jack Nicholson e Adam Sandler acabaram por revelar uma insuspeita química em "Tratamento de choque", uma comédia inofensiva que explora o melhor de cada um de seus protagonistas e conquista justamente pelo inusitado encontro de gerações.

Sem medo de apostar em algumas piadas fora do politicamente correto - mas sem os exageros dos irmãos Farrelly - e brincando com a febre dos coachs que assolava os EUA (e posteriormente se espalhou pelo mundo), o roteiro de "Tratamento de choque" mescla, com sucesso na maior parte do tempo, um filme sobre parceiros de personalidades opostas (subgênero popularíssimo e querido pelo público em geral) e uma comédia romântica com todos os ingredientes já conhecidos. Depois de uma breve introdução em que oferece à plateia um flashback explicativo sobre o trauma do protagonista em demonstrar carinho em lugares públicos, o filme começa com o jovem Dave Buznik (Adam Sandler) embarcando em uma viagem de negócios. O que deveria ser um voo tranquilo, no entanto, torna-se o começo de um pesadelo quando um pequeno mal-entendido o leva a ser expulso do voo e condenado a uma série de sessões de terapia para tratar de sua suposta agressividade. O médico escolhido pela juíza é o renomado Buddy Rydell (Jack Nicholson) - justamente o homem cujo comportamento deu início ao transtorno na viagem - e o atônito Dave se vê obrigado a um tratamento intensivo que inclui 24 horas por dia a seu lado. Dono de um estilo heterodoxo de cuidar de seus pacientes, Rydell se intromete em todos os setores da vida do rapaz - o que parece mais atrapalhar do que ajudar em suas questões profissionais e amorosas. Nem mesmo sua namorada, Linda (Marisa Tomei), parece estar imune aos arroubos pouco normais do médico, famoso por realizar milagres mesmo com seus métodos excêntricos.

 

Buddy Rydell parece um personagem sob medida para Jack Nicholson, que oferece ao público tudo aquilo que faz dele um dos mais queridos atores de sua geração - olhares insanos, a risada debochada, a sensação de perigo constante e um charme à toda prova. Porém, Nicholson não foi a primeira opção para o papel, que aceitou a conselhos de Kathy Bates, colega de Adam Sandler em "O rei da água" (1998): o primeiro ator pensado para interpretar o tresloucado terapeuta foi o de Eddie Murphy, e até que o veterano ator de "Um estranho no ninho" (1975) entrasse em cena, nomes como os de Robert DeNiro, Dustin Hoffman, Bill Murray e Steve Martin chegaram a ser considerados pelos produtores, cientes de que era imprescindível um astro de peso para dividir a cena com Sandler. Sem apresentar grandes novidades a seu repertório como intérprete - coisa que provavelmente nem era algo esperado por seu fiel séquito de fãs -, Sandler surpreende apenas em apostar em uma bem-vinda sutileza que se contrapõe à atuação a um passo do exagero (proposital) de seu veterano parceiro de cena. Os dois combinam tão bem que o filme se dá ao luxo de contar com participações especiais de gente como John C. Reilly e Woody Harrelson sem sair do foco central, que é sua conflituosa (e quase perversa) relação. O único senão é explorar tão pouco o talento da ótima Marisa Tomei, que pouco tem a fazer como o interesse romântico do protagonista.

"Tratamento de choque" é uma daquelas comédias que cumpre exatamente o que promete - e até chega a surpreender com uma reviravolta final que justifica alguns excessos cometidos no meio do caminho. O encontro entre Nicholson e Sandler é certeiro, boa parte das piadas funciona e a direção de Peter Segal não tenta sobressair-se ao real destaque da produção, que é o encontro de seus atores centrais. Pode não ser o melhor filme de suas carreiras e nem um trabalho para entrar na história do cinema, mas é divertido o bastante para arrancar gargalhadas sinceras e mostrar que Jack Nicholson é um dos raros atores capazes de transformar qualquer roteiro, por mais banal que seja, em uma experiência satisfatória. Coisa de quem sabe!

Um comentário:

Anônimo disse...

Até dá pra considerar uma comédia divertida no geral, sem ser exigente. Mas o final arruina tudo. (Spoiler) Não dá pra acreditar que o Dave ficaria com a namorada depois que é revelado todo o tormento pelo qual ele passou foi resultado de uma armação dela, para "ajuda-lo" a controlar suas emoções. Ninguém com um mínimo de instinto de auto-preservação ou amor-próprio continuaria um relacionamento desses. Com uma revelação dessa, teria sido melhor um com Dave na legião estrangeira, marchando pelo Saara, onde nunca mais teria problemas de raiva. Ou um final de desenho animado, daquele em que o personagem foge correndo e arrebenta a parede, deixando um buraco em forma do seu corpo.

DESEJO PROIBIDO

DESEJO PROIBIDO (If these walls could talk 2, 2000, HBO Films/Team Todd, 96min) Direção: Jane Snderson ("1961"), Martha Coolidge...