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CUJO

CUJO (Cujo, 1983, Sunn Classic Pictures, 93min) Direção: Lewis Teague. Roteiro: Don Carlos Dunaway, Lauren Currier, romance de Stephen King. Fotografia: Jan De Bont. Montagem: Neil Travis. Música: Charles Bernstein. Figurino: Jack Buehler. Direção de arte/cenários: Guy Comtois/John Bergman. Produção: Daniel H. Blatt, Robert Singer. Elenco: Dee Wallace, Daniel Hugh-Kelly, Danny Pintauro, Christopher Stone, Ed Lauter, Kaiulani Lee. Estreia: 10/8/83

Tudo começou quando o escritor Stephen King deu de cara com o assustador cachorro de seu mecânico, enquanto aguardava o conserto de sua motocicleta. Criativo e com a imaginação à solta, não demorou para transformar esse encontro tão banal em um romance assustador, publicado em 1981 depois de um processo de escrita que ele mesmo não lembra de ter desenvolvido (cortesia de seu vício em álcool, então no auge). Transformado em filme dois anos depois de seu lançamento nas livrarias, "Cujo" chegou às telas em uma produção barata, dirigida por um cineasta pouco conhecido e com um elenco sem grandes estrelas. Tais circunstâncias, no entanto, não o impediram de atingir um alto grau de fidelidade a seu original literário e, melhor ainda, manter um nível de suspense capaz de grudar o espectador na poltrona até seus minutos finais. Graças a um grande domínio narrativo, uma edição enxuta e o belo trabalho de Dee Wallace (mais conhecida como a mãe de Elliott no sucesso "ET", de 1982), "Cujo" é um pequeno grande filme, uma pérola rápida (93 minutos contando com os créditos) e quase sempre esquecida (injustamente) dentre as dezenas de adaptações de obras de King.

O próprio King teve um envolvimento bastante efetivo na realização do filme, dirigido por Lewis Teague - que em seguida assinaria a segunda parceria de Michael Douglas e Kathleen Turner nas telas, a comédia "A joia do Nilo" (85): apesar de não estar creditado, colaborou ativamente no roteiro e chegou a declarar que a atuação de Dee Wallace era a melhor que ele já havia visto em uma adaptação de uma obra sua - o que talvez seja verdade se não forem contabilizados os trabalhos impecáveis de Kathy Bates em "Louca obsesão" (vencedor do Oscar) e "Eclipse total". Totalmente entregue à sua personagem, Wallace cumpre com louvor sua missão de deixar o público angustiado e tenso - a credibilidade que ela imprime em cada cena conduz a ação a um alto grau de claustrofobia e realismo que fazem o terço final do filme ser simplesmente um dos mais tensos exercícios de suspense dos anos 80. Sem medo de fazer de um animal doméstico um vilão dos mais violentos da história, "Cujo" transforma uma situação corriqueira em um puro pesadelo.


Apesar do cão São Bernardo ser o personagem-título e principal elemento da narrativa, os humanos é que dominam os dois primeiros terços do filme de Teague. Boa parte da ação inicial serve para apresentar a família Trenton, aparentemente parte de um lar feliz e bem estruturado: o pai, Vic (Daniel-Hugh Kelly) é publicitário e anda às voltas com um problema profissional que pode lhe custar o emprego; o filho pequeno, Ted (Danny Pintauro) é um menino feliz mas constantemente apavorado com o "monstro do armário"; e a mãe, Donna (Dee Wallace) é uma dona-de-casa dedicada e presente. Na verdade, porém, há um segredo que põe em risco seu casamento: ela tem um caso com o conquistador da cidade, Steve Kemp (Christopher Stone) - e sua culpa a impede de levar uma vida totalmente em paz. Enquanto se desenrola o drama doméstico, o cachorro do mecânico Joe Camber (Ed Lauter) é mordido por um morcego e desenvolve raiva, passando a atacar - e matar! - qualquer um que cruze seu caminho, inclusive seu dono. A viagem de sua esposa e de seu filho deixam sua oficina (localizada a alguns quilômetros da cidade) completamente abandonada - e é lá que Donna e o pequeno Ted ficarão à mercê de Cujo, quando o carro que estão levando para o conserto simplesmente se recusa a funcionar.

Presos em um carro em uma oficina distante, em um dia de calor extremo e sem condições de pedir ajuda - Vic também está fora da cidade, a trabalho -, mãe e filho iniciam uma odisseia de pavor, compartilhada de forma exata pela câmera detalhista do cineasta, que acompanha cada minuto de seu desespero com o máximo de tensão. A trilha sonora discreta e a edição competente do futuro diretor Jan De Bont completam o cenário, estabelecendo um panorama que permite ao público mergulhar sem reservas na história. Mesmo que apenas o ato final se concentre nos ataques de Cujo a mãe e filho, são exatamente esses poucos minutos (que parecem muito mais, devido ao talento do diretor em expandir a linha do medo até seu limite máximo) que permanecem na memória da plateia depois que os créditos finais surgem na tela. Mais do que um filme que mexe com os nervos do espectador, "Cujo" é a prova de que até mesmo as mais minimalistas histórias de Stephen King são capazes de se transformar em ótimos filmes - desde que contem com a equipe apropriada e não tentem inventar a roda. É um filme de suspense de tirar o sono - ou ao menos pensar duas vezes antes de mexer com qualquer cachorro.

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