JULES E JIM, UMA MULHER PARA DOIS (Jules et Jim, 1962, Les Films
du Carrosse, 105min) Direção: François Truffaut. Roteiro: François
Truffaut, Jean Gruault, romance de Henri-Pierre Roché. Fotografia: Raoul
Coutard. Montagem: Claudine Bouché. Música: Georges Delerue.
Figurino/Direção de arte: Fred Capel. Produção executiva: Marcel
Berbert. Produção: François Truffaut. Elenco: Jeanne Moreau, Oskar
Werner, Henri Serre, Vanna Urbino, Bassiak, Sabine Haudepin. Estreia:
23/01/62
Em seu filme "Uma mulher é uma mulher",
lançado em 1961, o cineasta Jean-Luc Godard - que, assim como François
Truffaut era um dos críticos da prestigiosa revista "Cahiers du Cinéma" -
faz com que o personagem vivido por Jean-Paul Belmondo encontre com a
atriz Jeanne Moureau (no papel dela mesma) e pergunte a ela "Como está
indo 'Jules e Jim'?" Essa pequena brincadeira entre amigos
(frequentemente os diretores colaboravam nos projetos do outro) é a
primeira menção feita no cinema àquele que se tornaria um dos mais
conhecidos, amados e reverenciados filmes franceses de todos os tempos.
Terceiro filme de Truffaut - depois do memorialista "Os incompreendidos"
(59) e do quase experimental "Atire no pianista" (60) - o drama
romântico "Jules e Jim, uma mulher para dois" se baseia no romance
autobiográfico de Henri-Pierre Roché para contar a história de um
triângulo amoroso libertário que encontrou na juventude revolucionária
dos anos 60 sua audiência perfeita. Uma pena que o próprio Roché tenha
morrido antes de ver na esplendorosa fotografia em preto-e-branco de
Raoul Coutard a personificação de sua Catherine na bela e fascinante
Jeanne Moreau.
A trama tem início antes da Primeira
Guerra Mundial, quando o alemão Jules (Oskar Werner) e o francês Jim
(Henri Serre), inseparáveis e amantes da arte, da vida boêmia e dos
prazeres mundanos que Paris lhes pode oferecer, conhecem a independente
Catherine (Jeanne Moreau), que logo conquista a ambos com sua
vivacidade, beleza e uma certa dose de amoralidade. Sentindo-se
irresistivelmente atraída a Jules, ela acaba se casando e tendo uma
filha com ele. Separados pela guerra - e pelo medo paralisador de
matarem um ao outro sem o saber - os dois amigos ficam anos sem
encontrar-se, comunicando-se apenas por cartas. O final do conflito,
porém, volta a aproximá-los apenas para que Jim perceba que o
relacionamento entre Jules e Catherine não é mais o mesmo, tendo sido
abalado pelo tempo, por traições e pela rotina. Apaixonando-se novamente
pela mulher do amigo, Jim se surpreende quando é convidado por ele a
morar com a família. A ideia de Jules é simples: sabendo que não tem
mais o amor da esposa, aceita que ela se envolva com o rapaz, como forma
de não perdê-la de uma vez por todas.
Tido por muitos
jovens de sua época como uma espécie de ode ao amor livre, "Jules e Jim"
é, no entanto, o exato oposto dessa ideia, por mais excitante que ela
possa parecer. Com suas imagens icônicas e sempre lembradas pelos fãs de
cinema - a corrida dos três amigos em uma ponte, Jeanne Moreau vestida
de homem, com direito a bigodinho e tudo - François Truffaut traduziu,
para toda uma geração, a ansiedade em relação aos próprios sentimentos.
Mesmo com todo o glamour da primeira parte do filme, quando todo um
universo está disponível aos personagens, fica claro, em sua metade
final, de que arriscar-se no amor é um jogo de azar e que, por mais
modernos e descolados que as pessoas sejam, a dor é uma possibilidade
bastante grande. Apesar disso, no entanto, o cineasta tem o bom gosto de
mostrar isso de maneira poética e sutil, contando para isso com a
jovialidade de seu talento e seu elenco excepcional - em especial a
inesquecível Jeanne Moreau.
Se Oskar Werner e Henri
Serre serão eternamente lembrados como os dois amigos enfeitiçados pelos
encantos de uma sereia francesa de olhar penetrante e sorriso
misterioso, é Jeanne Moreau quem domina o filme com seus encantos, sua
voz sedutora - que inclusive canta graciosamente em uma sequência
agradável e leve que remete aos primórdios de sua relação a três, antes
que ela se tornasse mais complicada do que deveria - e seu carisma.
Apaixonado pela atriz à época das filmagens, Truffaut dá a ela,
visualmente, o status de uma divindade, inalcançável e paradoxalmente
acessível. Moreau - que ajudou inclusive a financiar o filme quando o
dinheiro inicialmente disponível acabou - sorri e faz com que o
espectador sorria com ela. É difícil de condenar Jules e Jim por amá-la.
É difícil não se apaixonar pela Catherine de Jeanne Moreau. E esse
magnetismo é impossível fingir!
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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