NÃO
TENHO TROCO (Quick change, 1990, Devoted Pictures, 89min) Direção:
Howard Franklin, Bill Murray. Roteiro: Howard Franklin, romance de Jay
Cronley. Fotografia: Michael Chapman. Montagem: Alan Heim. Música: Randy
Edelman. Figurino: Jeffrey Kurland. Direção de arte/cenários: David
Gropman/Susan Bode. Produção executiva: Frederic Golchan. Produção:
Robert Greenhut, Bill Murray. Elenco: Bill Murray, Geena Davis, Randy
Quaid, Jason Robards, Tony Shalhoub. Estreia: 13/7/90
Uma
dose de "Um dia de cão" (75), de Sidney Lumet. Pitadas da comédia
juvenil "Uma noite de aventuras" (87), de Chris Columbus. E muito da
paranoia bizarra de "Depois de horas" (85), de Martin Scorsese. Assim
pode ser definida a comédia "Não tenho troco", estreia - e até hoje
única experiência - do ator Bill Murray como diretor. Trabalhando em
conjunto com o também cineasta Howard Franklin com base em um livro de
Jay Cronley que já havia sido adaptado para o cinema em 1985 com
Jean-Paul Belmondo e Kim Catrall nos papéis centrais, Murray demonstrou
que, além de um ator superlativo e frequentemente subestimado ao ser
limitado ao nicho do humor, é também capaz de destacar-se por trás das
câmeras. Dotado de um ritmo invejável e de piadas inteligentes, "Não
tenho troco" é um passatempo dos mais agradáveis, que tem no humor
despretensioso a sua maior qualidade.
Murray brilha
como sempre no papel principal desde a sequência de abertura, em que,
vestido de palhaço - com direito a balões e tudo - atravessa Nova York
de metrô até chegar a um banco prestes a encerrar suas atividades
diárias. Logo que entra no local, ele anuncia um assalto, trancafia os
clientes em um cofre e passa a negociar a libertação dos reféns com o
chefe da polícia, o ambicioso Ratzinger (Jason Robards, comprando a
brincadeira com extrema simpatia). Não demora muito, porém, para que o
público perceba, antes de qualquer autoridade policial, que o plano do
palhaço é bem mais simples do que exigir tratores e helicópteros.
Enquanto todos tentam desesperadamente cumprir tudo que lhes é pedido, o
assaltante, que se chama Grimm, já saiu do prédio com o dinheiro
escondido nas roupas - nas suas e nas de dois cúmplices que
estavam disfarçados de reféns: sua namorada Phyllis (Geena Davis) e seu
melhor amigo, o inconsequente Loomis (Randy Quaid). E é justamente
Loomis que, por acidente, atrapalha o plano perfeito do trio que se vê, a
partir de então, em rota de fuga, tentando alcançar o aeroporto para
sair do país.
As
tentativas de Grimm, Phyllis e Loomis de fugir da polícia em uma Nova
York noturna, cheia de personagens amalucados e uma sensação de perigo
(amenizada pelo tom cômico do roteiro) preenche os dois terços finais do
filme de Murray e Franklin. Povoada por personagens à beira do surreal -
como um taxista estrangeiro incapaz de compreender a mais simples das
ordens, interpretado por um então novato Tony Shalhoub - e de situações
de deixar qualquer cidadão à beira do desespero, a trajetória do trio
ainda é dificultada pelos problemas românticos entre Grimm e Phyllis,
cujo relacionamento enfrenta (ainda que unilateralmente) uma
encruzilhada que terá o poder de definir de vez seu desfecho. Enquanto
isso, resta ao público divertir-se com suas confusões, torcer por seu
sucesso e, de quebra, acompanhar algumas sequências que equilibram com
maestria um senso de humor negro com um elenco em dias inspirados (em
especial Geena Davis, que acumulava com graça um sucesso atrás do
outro).
Pouco lembrado dentro da filmografia de Murray e
Geena Davis, "Não tenho troco" é uma grata surpresa para quem procura
comédias realmente engraçadas e um ótimo programa para quem deseja
relembrar como Hollywood preferiu trocar o humor sutil pelas grosserias
adolescentes que se tornariam quase uma praga na década seguinte. É
ligeiro, é sem contra-indicações e deixa qualquer um sorrindo à toa.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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