quarta-feira

A LENTE DO AMOR

A LENTE DO AMOR (Addicted to love, 1997, Warner Bros, 100min) Direção: Griffin Dunne. Roteiro: Robert Gordon. Fotografia: Andrew Dunn. Montagem: Elizabeth Kling. Música: Rachel Portman. Figurino: Renee Ehrlich Kalfus. Direção de arte/cenários: Robin Standefer/Alyssa Winter. Produção executiva: Bob Weinstein, Harvey Weinstein. Produção: Jeffrey Silver. Elenco: Meg Ryan, Matthew Broderick, Kelly Preston, Tchéky Karyo, Maureen Stapleton. Estreia: 23/5/97

Ícone das comédias românticas dos anos 90 desde que estrelou o seminal "Harry & Sally, feitos um para o outro", a atriz Meg Ryan passou boa parte da década tentando fugir do estigma das mocinhas dóceis e sofredoras que fez sua glória, nem sempre com sucesso. Foi assim, por exemplo, com "Coragem sob fogo", em que viveu uma sargento do exército americano em plena guerra do Iraque, com "Quando um homem ama uma mulher", onde vivia uma dependente alcóolica, e com "A lente do amor", filme de estreia do ator Griffin Dunne ("Depois de horas") como diretor: apesar do título e de ser um comédia romântica, a personagem de Ryan destoa de suas mais conhecidas heroínas ao apresentar um lado vingativo, cruel e rancoroso que acabou por não agradar às plateias. Ao contrário de Julia Roberts, que se deu bem desviando-se do mel e apelando para um lado menos solar de sua personalidade em "O casamento do meu melhor amigo", Meg percebeu que o público gostava mesmo dela no papel de sempre e voltou às boas com ele em seus projetos seguintes, "Mensagem para você" e "Cidade dos anjos". O lado ruim de tudo isso é que o filme, em que ela divide a cena com o ótimo Matthew Broderick, acabou sendo injustamente esquecido pelo tempo.

Broderick - em papel inicialmente oferecido a Johnny Depp - vive Sam, um astrônomo apaixonado pela profissão e pela namorada, a bela professora Linda (Kelly Preston), não necessariamente nessa ordem. Quando ela o comunica que vai passar dois meses em Nova York em um intercâmbio ele imediatamente pressente um final nada feliz para seu romance, e quando ela lhe avisa - por carta - que não irá mais voltar para sua cidadezinha natal porque está emocionalmente envolvida com outro homem, ele decide não aceitar a derrota tão facilmente. Mudando-se para Manhattan e passando a morar em um prédio abandonado em frente ao novo lar de sua amada, ele começa a vigiar atentamente os passos do novo casal, em busca de uma pista que lhe comunique um fim iminente. Sua rotina de espionagem sofre uma reviravolta quando entra em cena Maggie (Meg Ryan), uma mulher decidida e firme que também tem motivos de sobra para querer o fim do bela história de amor de Linda: ela foi abandonada por Anton (Tchéky Karyo), o francês com quem a ex-namorada de Sam está vivendo. Unidos, Sam e Maggie traçam uma série de planos para acabar com o relacionamento de seus antigos parceiros - o que inclui destruir o prestígio do restaurante de Anton e plantar entre os dois a semente da desconfiança - e acabam demorando para perceber que estão se apaixonando.


Seguindo todas as regras das comédias românticas, "A lente do amor" sobressai-se principalmente por uma escolha ousada de elenco. Enquanto Meg Ryan revela um lado novo de sua persona como atriz - e de certa forma faz as pazes com o antigo no ato final - Matthew Broderick surpreende como galã romântico. Mesmo que ele repita todos os trejeitos de seu personagem mais famoso - o eterno Ferris Bueller de "Curtindo a vida adoidado" - é impossível não simpatizar com seu destrambelhado e rejeitado Sam, um homem tão apaixonado que é capaz de abdicar da vida e da profissão apenas para estar ao lado da mulher que ama quando ela decepcionar-se com o novo parceiro (ainda que a causa do rompimento seja ele mesmo). Além disso, Broderick tem um timing cômico sensacional, que enche de frescor um roteiro que às vezes pega pesado na crueldade e destoa do tom leve que se espera de um filme do gênero. Sua química com Meg Ryan é fascinante - é encantadora a cena em que eles são obrigados a um beijo diante da câmera da avó dela - e seu semblante comum ajuda na empatia do espectador que talvez se assuste um pouco diante da frieza da personagem de Ryan - que, diga-se de passagem, está ótima no papel de mulher vingativa.

Também não é exagero afirmar que, de um certo ponto de vista, "A lente do amor" não deixa de ser uma bela homenagem ao cinema, como fica claro na bela cena em que Sam começa a pintar a parede de sua nova casa para, através de lentes de seu telescópio, assistir nela a rotina de Linda e Anton: conforme ele vai transformando o muro em uma tela branca, imagens vão aparecendo, como em um passe de mágica (o que, no fundo, o cinema é). Mais inteligente do que a média, "A lente do amor" não encontrou sua audiência quando estreou, mas sempre é tempo de ser redescoberto, nem que seja para perceber que, por trás de sua aparência doce e meiga, Meg Ryan é uma excelente atriz que merece uma nova chance assim como o filme.

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