WILDE
 (Wilde, 1997, BBC/Capitol Films, 118min) Direção: Brian Gilbert. 
Roteiro: Julian Mitchell, livro de Richard Ellman. Fotografia: Martin 
Fuhrer. Montagem: Michael Bradsell. Música: Debbie Wiseman. Figurino: 
Nic Ede. Direção de arte/cenários: Maria Djurkovic. Produção executiva: 
Alex Graham, Alan Howden, Deborah Raffin, Michael Viner, Michiyo 
Yoshizaki. Produção: Marc Samuelson, Peter Samuelson. Elenco: Stephen 
Fry, Jude Law, Vanessa Redgrave, Jennifer Ehle, Gemma Jones, Judy 
Parfitt, Michael Sheen, Tom Wilkinson, Ioan Gruffud, Zoe Wanamaker, 
Orlando Bloom. Estreia: 01/9/97
Um dos escritores 
mais respeitados e conhecidos do mundo - especialmente graças à sua 
obra-prima "O retrato de Dorian Gray" - o irlandês Oscar Wilde era 
conhecido em sua época também devido a seu estilo de vida pouco 
recomendado à alta sociedade. Notadamente homossexual - fato que nem 
mesmo seu casamento e os posteriores filhos conseguiram disfarçar 
perante a sociedade - ele frequentemente desfilava por Londres com algum
 jovem rapaz à tiracolo, suscitando todos os tipos de comentários (que 
naturalmente ficavam restritos a quatro paredes). Um desses rapazes, 
porém, foi o responsável indireto por jogar o autor de "A importância de
 ser honesto" em um escândalo de grandes proporções que nem mesmo o 
respeito público por sua obra literária foi capaz de abafar: condenado à
 dois anos de trabalhos forçados (a homossexualidade era crime passível 
de punição na Inglaterra do século XIX), Wilde se viu humilhado e 
rechaçado pela população, em um dos mais infames casos jurídicos do 
país. É esse recorte da vida do escritor - que se passa entre a criação 
de seu maior livro e a condenação que lhe fragilizou a saúde - a base de
 "Wilde", bela cinebiografia de Brian Gilbert que, apesar das inúmeras 
qualidades, passou quase despercebido pelos cinemas e pelas cerimônias 
de premiação.
Sua maior qualidade - e a que mais 
merecia homenagens nos tapetes vermelhos que tanto aplaudem talentos 
menores - é a atuação de Stephen Fry no papel central. Além da 
semelhança física com o Oscar Wilde, o ator inglês entrega um desempenho
 irretocável, que abrange todas as nuances da complexa personalidade do 
escritor de forma orgânica e objetiva. Em sua interpretação a plateia 
pode ver o homem apaixonado, o intelectual sardônico, o pai amoroso, o 
marido carinhoso, o dândi debochado e finalmente o mártir vencido pelo 
preconceito e pelo amor incondicional àquele que, de um modo ou outro, 
foi a faísca que deflagrou sua decadência. Ignorado por todas as 
cerimônias de premiação, Fry - que parece ter nascido para interpretar 
Wilde - foi o grande injustiçado de um ano em que a Academia resolveu 
homenagear a velha guarda de Hollywood (Jack Nicholson, Dustin Hoffman, 
Robert Duvall e Peter Fonda foram indicados ao Oscar) e lançar um novo 
candidato a astro (Matt Damon, que saiu vencedor na categoria de roteiro
 original ao lado de Ben Affleck mas cuja lembrança no páreo de 
interpretação masculina soou mais como um incentivo do que como 
merecimento). Essa esnobada de todos os críticos - somente o Golden 
Globe lhe indicou no ano seguinte, quando o filme finalmente estreou nos
 EUA - porém, não tiram o brilho, tanto do ator quanto do filme em si.
A
 obra de Gilbert começa quando Wilde, voltando à Londres depois de uma 
temporada nos EUA, se casa com a doce Constance (Jennifer Ehle), com 
quem tem dois filhos justamente quando começa a tornar-se um dramaturgo 
de sucesso. É nessa época também que ele passa a exercer mais 
explicitamente sua homossexualidade, envolvendo-se com homens mais 
jovens e frequentemente de menos posses, que não se importam em dividir 
sua cama com outros rapazes na mesma situação - como Robie Ross (Michael
 Sheen), que se torna amigo íntimo e fiel do escritor. Sua rotina se 
altera profundamente, porém, quando ele se apaixona perdidamente pelo 
sedutor e manipulador Alfred 'Bosie' Douglas (Jude Law, antes de ficar 
famoso com "O talentoso Ripley" mas já demonstrando grande talento e 
beleza), filho do influente Marquês de Queensbery (Tom Wilkinson). 
Furioso com a relação entre o filho e aquele a quem considera um 
"pederasta pervertido", o marquês inicia uma campanha de difamação que 
resulta em um julgamento que expõe o estilo de vida de Oscar - e 
consequentemente, na sua ruína financeira e moral.
Construindo
 sua história sem pressa e estabelecendo com inteligência a relação 
desigual entre Wilde e Bosie - um rapaz egoísta, irresponsável e imaturo
 que é incapaz de perceber o estrago que suas atitudes podem causar ao 
amante - Brian Gilbert também cuida em dotar de personalidade os 
coadjuvantes de sua história, vividos por atores sensacionais como Tom 
Wilkinson e Vanessa Redgrave - que interpreta a mãe do protagonista com a
 personalidade forte de sempre. Dirigindo com elegâncias as cenas de 
sexo - que nunca ultrapassam o limite do bom-gosto e servem apenas para 
ilustrar o drama central - o cineasta conduz o roteiro de forma a 
enfatizar a situação extrema de seus personagens e não apenas de 
comentá-la como uma testemunha neutra. Nitidamente simpática a Wilde e à
 causa gay, a produção não se furta a retratar seu personagem principal 
como uma vítima de uma sociedade preconceituosa e hipócrita, o que 
confere ao filme ares de uma atualidade pungente. Mesmo que não se 
aprofunde na psicologia de seus protagonistas - que muitas vezes soam 
bastante fúteis e volúveis - o roteiro serve com perfeição para 
apresentar ao público uma das histórias mais tristes e revoltantes dos 
bastidores da literatura mundial. Um filme que não merecia o pouco-caso 
com que foi recebido e deve ser descoberto pelos fãs do gênero e de um 
dos maiores escritores da língua inglesa de todos os tempos.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade.
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