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SEM SAÍDA

SEM SAÍDA (Eden Lake, 2008, Rollercoaster Films/Aramid Entertainment, 91min) Direção e roteiro: James Watkins. Fotografia: Christopher Ross. Montagem: Jon Harris. Música: David Julyan. Figurino: Keith Madden. Direção de arte/cenários: Simon Bowles/Lisa Chugg. Produção executiva: Conor McCaughan. Produção: Christian Colson, Richard Holmes. Elenco: Kelly Reilly, Michael Fassbender, Jack O'Connell, Finn Atkins, Jumayn Hunter, Thomas Turgoose. Estreia: 12/8/08 

Em 2008 o ator alemão Michael Fassbender ainda não tinha o prestígio que viria a acumular alguns anos mais tarde em Hollywood, dividindo sua carreira entre blockbusters ("Prometheus" e a série de filmes "X-Men") e produções incensadas pela crítica e que lhe dariam indicações ao Oscar ("12 anos de escravidão" e "Steve Jobs"). No entanto, basta um pouco de atenção para perceber que, mesmo em filmes menores, de gênero e orçamento barato, ele já demonstrava grande talento. "Sem saída", uma obra despretensiosa, rodada na Inglaterra e sem grandes astros no elenco, é um dos mais aterradores filmes de suspense de sua época. Com nítida inspiração em clássicos como "Amargo pesadelo" (72) e "O massacre da serra elétrica" (73), o roteirista e diretor James Watkins transforma em realidade - ao menos nas telas - os mais angustiantes terrores da plateia, sem poupar sangue, violência e muita tensão.

Como é tradicional em filmes do estilo, tudo começa na maior tranquilidade, com a beleza da natureza como moldura e um belo casal de namorados apaixonados em busca de um fim-de-semana de paz e amor. A professora primária Jenny (Kelly Reilly) aceita o pedido de seu amado, Steve (Michael Fassbender), de conhecer um lago afastado, frequentado por ele na adolescência e que está em vias de ser limitado à visitação pela construção de um condomínio de luxo. Steve, na verdade, tem a intenção de pedir a mão da jovem em casamento, mas antes mesmo que ele tenha a oportunidade de tocar no assunto, um grupo de adolescentes pouco amigáveis cruza seu caminho: a princípio apenas inconvenientes, eles batem de frente com Steve, que, ao defender a namorada imediatamente se torna inimigo do bando. Depois de um trágico confronto,os arruaceiros - filhos conhecidos de moradores dos arredores e liderados pelo delinquente Brett (Jack O'Connell) - passam a aterrorizar os namorados, que, cercados por uma extrema violência, passam a lutar pela sobrevivência dentro de uma densa e isolada floresta.


Construindo o suspense com inteligência e parcimônia, Watkins mergulha a plateia em um universo onde, aos poucos, a única regra é sobreviver. Desprovidos de quaisquer ferramentas que possam lhes ajudar a escapar de uma situação banal transformada em um surreal pesadelo, Steve e Jenny conquistam a simpatia do público justamente por serem vítimas inocentes de um jogo cruel e gratuito, que chega aos limites do horror físico. Sem poupar cenas explícitas e sanguinolentas, o diretor embarca em uma trilha de sadismo de dar inveja a qualquer filme B - com a diferença crucial de que ele sabe como contar uma história e utilizar tais elementos agoniantes apenas como instrumentos para isso e não os elegendo como ponto principal da trama. Para isso, ele conta com a presença de ótimos atores nos papéis centrais, ao contrário da regra geral que sempre conta com um elenco de canastrões para ilustrar sequências de banhos de sangue irresponsáveis.

Com um subtexto extremamente relevante - como a criação paterna pode levar os filhos a estados do mais absoluto desrespeito pelos outros seres humanos - e um roteiro conciso, James Watkins (que alguns anos depois comandaria "A mulher de preto", com Daniel Radcliffe, com economia muito maior de sangue e violência) assina um trabalho digno de figurar entre os grandes de seu gênero. Michael Fassbender demonstra com seu Steve aquilo que todo mundo logo saberia - ele é um ator de grandes recursos, capaz de passar de um homem romântico a um homem disposto a tudo para defender a mulher que ama (apenas para tornar-se uma presa fácil de quem não tem nada a perder). Jack O'Connell, que seria revelado por Angelina Jolie em "Invencível" (2014), transmite com intensidade a fúria animal e quase irracional de seu Brett (com direito a uma última cena arrepiante). E à Kelly Reilly cabe a mais desafiadora parte do conjunto: ultrapassar os limites de sua personagem quase clichê (a mulher que precisa defender-se sozinha das ameaças à sua vida) e fazer dela alguém com quem o público realmente se importe. Não apenas ela consegue isso como torna o desfecho da história algo ainda mais surpreendente e chocante. Com um trio de protagonistas como esse, cenas de arrepiar (que podem incomodar aos mais sensíveis) e um roteiro que segue as regras mas consegue fazê-las parecerem novas em folha, "Sem saída" é uma gratíssima surpresa. Imperdível para quem gosta de sofrer no conforto de casa.

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