JEFFREY, DE CASO COM A VIDA (Jeffrey, 1995, The Booking Office, 92min) Direção: Christopher Ashley. Roteiro: Paul Rudnick, peça
teatral de sua autoria. Fotografia: Jeffery J. Tufano. Montagem: Cara
Silverman. Música: Stephen Endelman. Direção de arte/cenários: Michael
Johnston/Andrew Baseman. Produção executiva: Kevin McCollum. Produção:
Mark Balsam, Mitchell Maxwell, Victoria Maxwell. Elenco: Steven Weber,
Sigourney Weaver, Patrick Stewart, Victor Garber, Christine Baranski,
Camryn Manheim, Kathy Najimy, Nathan Lane, Olympia Dukakis. Estreia:
04/8/95
Filmes como "Meu querido companheiro" (90) e
"E a vida continua" (92) retrataram, com uma boa dose de melancolia e
realismo, a devastação causada pela AIDS na comunidade gay
norte-americana. A doença, que espalhou paranoia, preconceito e dor
entre os homossexuais - até que assumiu o status de epidemia a
ultrapassar os limites da sexualidade para encontrar suas vítimas - é
também o motor propulsor de "Jeffrey, de caso com a vida", que, apesar
do tema sombrio é, surpresa, uma comédia. Baseado em uma peça
off-Broadway lançada em 1993, o filme de Christopher Ashley - que também
comandou a montagem nos palcos - o filme brinca com os clichês
relativos ao mundo gay sem desrespeitá-lo e, através da ironia e do
humor debochado, tenta fazer um inventário das relações amorosas entre
homens. Em alguns momentos até consegue atingir seus objetivos, mas
acaba preso a uma irregularidade que o impede de se tornar melhor do que
é.
Jeffrey, o protagonista vivido com gosto e carisma
por Steven Weber - que em seguida seria corajoso o bastante para
substituir Jack Nicholson em uma versão para a TV de "O iluminado",
escrita pelo próprio Stephen King em formato de minissérie - é um ator
desempregado que, para ganhar
a vida, trabalha como garçons em eventos. Traumatizado com uma
sequência de aventuras sexuais frustradas pelo medo da contaminação pelo
vírus da AIDS, ele toma uma decisão radical: abdicar totalmente de
sexo. Essa categórica decisão não é bem-vista nem por seus pais liberais
nem tampouco por seu melhor amigo, Sterling (Patrick Stewart), cujo
amante Darius (Bryan Batt) é soropositivo. Todos eles acreditam que o
rapaz não precisa do celibato e sim de um novo amor. Esse novo amor
surge na pele de Steve Howard (Michael T. Weiss), que ele conhece na
academia e por quem imediatamente sente-se atraído. A atração e o apoio
dos amigos, porém, não são o suficiente para Jeffrey, que tem medo de
envolver-se em uma relação amorosa que pode acabar em dor e sofrimento.
É
preciso louvar a coragem do dramaturgo e roteirista Paul Rudnick em
transformar um tema tão pesado quanto a AIDS em uma comédia leve e
despretensiosa: a sombra da doença paira densa sobre os personagens do
filme, sempre lembrando-os de sua existência perniciosa, mas os diálogos
e o desenvolvimento da trama fogem com destreza do dramalhão, até mesmo
quando ele esmurra com força a porta. Patrick Stewart, por exemplo,
usou a tristeza que sentiu ao ler o roteiro como elemento para uma cena
dramática de "Jornada nas estrelas: generations" (94). Mas, talvez como
maneira de exorcizar o tema, Rudnick preenche suas cenas com um humor
ácido e recheado de referências culturais típicas do universo gay, como
filmes musicais, programas de auditório cafonas e as mães exageradamente
liberais - caso da personagem interpretada pela sempre sensacional
Olympia Dukakis, que vive a mãe de um homem gay que se tornou lésbica
(!!) e que está em vias de fazer uma operação de mudança de sexo.
Contada
de forma episódica - o que enfraquece o desenvolvimento de seus
personagens, até mesmo os principais - "Jeffrey" tem a seu favor também a
participação especial de nomes consagrados em papéis pequenos.
Sigourney Weaver brilha como uma espécie de palestrante de autoajuda a
quem o protagonista recorre em seu desejo de aprovação - e que se mostra
preconceituosa e arrogante. Patrick Stewart - ícone da série "Star
Trek" e dos filmes "X-Men" - vive um gay extremamente afetado mas muito
carinhoso e dedicado aos amigos e ao amante. Christine Baranski
interpreta uma milionária que dá festas beneficentes como quem troca de
sapatos. Victor Garber faz uma ponta como um viciado em sexo que
participa do grupo que Jeffrey passa a frequentar. E Dukakis, como já
citado, brilha como uma mãe orgulhosa do rebelde rebento. Essas
participações dão credibilidade ao filme de Ashley - iniciante em cinema
- e disfarçam suas inconsistências dramáticas. A criatividade de muitos
momentos - criados para o palco e que nem sempre funcionam na transição
para a tela grande - se perde na falta de coesão do resultado final,
mas mesmo assim é refrescante ver a praga da AIDS sob um novo - e menos
fatalista - ângulo.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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