DOCE LAR (Sweet home Alabama, 2002, Touchstone Pictures, 108min) Direção: Andy Tennant. Roteiro: C. Jay Cox, história de Douglas J. Eboch. Fotografia: Andrew Dunn. Montagem: Troy Takaki, Tracey Wadmore-Smith. Música: George Fenton. Figurino: Sophie de Rakoff Carbonell. Direção de arte/cenários: Clay A. Griffith/Lisa K. Sessions. Produção executiva: Michael Fottrell, Jon Jashni, Wink Mordaunt. Produção: Stokely Chaffin, Neal H. Moritz. Elenco: Reese Witherspoon, Patrick Dempsey, Josh Lucas, Candice Bergen, Fred Ward, Mary Kay Place, Jean Smart, Melanie Lysnkey, Ethan Embry, Dakota Fanning. Estreia: 27/9/02
Não é difícil compreender o enorme êxito de bilheteria de "Doce lar" nos EUA, onde arrecadou mais de 180 milhões de dólares. Em primeiro lugar, é uma comédia romântica açucarada (gênero que se mantém como um dos mais populares mesmo no cínico século XXI). Depois, é o tipo de filme que não ofende ninguém e nem tenta reinventar a roda (e todo mundo sabe que sempre é bom recorrer aos mesmos clichês de sempre vez ou outra). E em terceiro (e talvez mais importante) existe o fator Reese Witherspoon. Desde que "Legalmente loira" fez um inesperado sucesso em 2001, a jovem atriz - à época ainda casada com Ryan Phillippe - tornou-se um dos nomes mais quentes da "nova Hollywood". Carismática, talentosa e dona de uma beleza nada ameaçadora (ou seja, perfeita para agradar às mulheres que levam os namorados ao cinema), Witherspoon é o centro do filme de Andy Tennant e a responsável por torná-lo um agradável e descompromissado entretenimento.
Assumindo o papel que seria de Charlize Theron antes que ela pulasse fora para participar do infame "Encurralada", Witherspoon interpreta Melanie Carmichael, uma promissora estilista de moda que vive o melhor momento de sua vida: além de estar dando os primeiros passos rumo à sua realização profissional, ela acaba de ser pedida em casamento por um dos mais cobiçados solteiros de Nova York, o bem-sucedido Andrew Hennings (Patrick Dempsey), filho da prefeita da cidade (vivida com graça por Candice Bergen). O problema é que, apesar de aparentar ser uma cosmopolita e sofisticada cidadã nova-iorquina, ela na verdade é uma caipira fugida do Alabama, seu estado natal. E o pior ainda: é casada com um namorado da adolescência, Jake Perry (Josh Lucas), que se recusa a conceder-lhe o divórcio. Desesperada para esconder do noivo seu passado (e com o objetivo de exigir de Jake a separação formal), Melanie volta à sua cidade, mas acaba descobrindo que ainda é o objeto dos sonhos de seu ex-marido e que suas raízes são mais fortes do que ela imaginava.
"Doce lar" é mais uma comédia romântica da estirpe politicamente correta que tomou conta da América nos anos 90. Sua ideologia mal-disfarçada não deixa de ser um tanto desconfortável, contrapondo a vida pacata e "verdadeira" do interior do país à correria hedonista e "fútil" das grandes cidades (e fazendo com que todas as personagens relacionadas ao noivo mauricinho soem como pastiches de uma sociedade vazia enquanto sua família e seu ex-marido servem quase como exemplo de pureza e integridade). No entanto, para a sorte do espectador, o roteiro consegue fazer com que tudo seja facilmente assimilável graças a diálogos rápidos e algumas piadas realmente engraçadas, em especial as relacionadas ao amigo de infância de Melanie, o jovem Bobby Ray (Ethan Embry), que precisa lidar com sua homossexualidade em um cenário não especialmente simpático à sua causa. Também é pouco justo com a personagem de Patrick Dempsey (voltando aos poucos ao estrelato que culminaria na série "Grey's anatomy") rivalizá-lo com Josh Lucas em um papel que explora ao máximo seu charme rústico. Não é preciso mais do que dez minutos de Lucas em cena para que a plateia perceba os rumos da história.
É impossível dizer que "Doce lar" é um grande filme. É previsível, é ideologicamente questionável (se bem que ninguém assiste a comédias românticas pensando sobre essas coisas) e não apresenta maiores novidades. Mas é agradável, é simpático e tem Reese Witherspoon fazendo o que faz de melhor. Os fãs não reclamarão jamais!
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
sexta-feira
quinta-feira
POSSESSÃO
Quem diria? Neil LaBute, o responsável pela misoginia em estado puro de "Na companhia de homens", também tem um coração e sabe falar de amor... Diferente de todos os seus trabalhos anteriores - e a lista inclui o chato "Seus vizinhos, seus amigos" e a brilhante comédia "A enfermeira Betty" - o drama romântico "Possessão", baseado em um livro de A.S. Byatt, não apenas costura duas histórias de amor separadas por gerações mas também dá ao ator-fetiche de LaBute, o competente Aaron Eckhart, a chance de mostrar seu lado galante e sedutor sem ter que utilizar de seu charme cafajeste. Fracasso de bilheteria nos EUA (onde arrecadou menos da metade de seu orçamento relativamente pequeno de 25 milhões de dólares), é um filme com personagens reprimidas e aprisionadas a suas próprias regras de conduta. Não é exatamente o tipo de romance que os fãs de Meg Ryan consideram popular.
A despeito do título - idêntico ao do elogiado francês estrelado por Isabelle Adjani em 1981 - "Possessão" não é um filme de terror e nem ao mesmo flerta com qualquer ideia de reencarnação ou ideias afins. O roteiro apresenta ao público duas relações amorosas aparentemente sem maiores ligações que convergem para um final que equilibra o feliz com o melancólico. Eckhart está à vontade como Roland Michell, um americano com ambições de tornar-se um nome respeitado junto aos acadêmicos de literatura britânicos. Em uma pesquisa quase banal, ele dá de cara com um conjunto de cartas de amor escritas pelo poeta Randolph Ash (Jeremy Northam) na era vitoriana. O conteúdo das cartas leva Roland a suspeitar que a destinatária de tal dedicação não era a esposa de Ash mas sim outra poeta de renome, Christabell LaMotte (Jennifer Ehle). Para provar sua teoria, ele procura uma especialista na escritora, a inglesa Maude Bailey (Gwyneth Paltrow), que a princípio desacredita no romance por saber que Christabella tinha uma relação com outra mulher, a possessiva Blanche Glover (Lena Headey). Quando as investigações avançam e o relacionamento entre os dois poetas se transforma de uma possibilidade em uma certeza, os dois estudiosos acabam por perceber que também estão se apaixonando.
Neil LaBute consegue, em "Possessão", unir duas maneiras aparentemente conflitantes de narrativa sem tornar-se confuso ou incoerente. Enquanto investiga a trágica e romanesca relação entre Ash e Christabella ele se serve de todo a tonalidade dramática que a trama exige, usando e abusando da trilha sonora claustrofóbica de Gabriel Yared para sublinhar a sensação de sufocamento que o amor impossível entre os dois causa a eles e àqueles a seu redor. Quando concentra sua atenção no titubeante romance entre Roland e Maude, porém, ele dá à fotografia e à direção de arte tons menos quentes e mais sóbrios, com o objetivo de reiterar a distância imposta pela britânica em relação ao americano, a quem ela considera alguém inferior culturalmente (suposição que se torna cada vez mais forte conforme ele vai mostrando suas atitudes pouco éticas mas muito passionais em relação ao objetivo de sua busca). Talvez essa frieza seja um tanto excessiva (mas muito bem representada por Paltrow, com um belo sotaque em cena) a ponto de fazer com que a química entre a atriz e Aaron Eckhart não seja tão poderosa quanto deveria, mas de certa forma serve de contraponto ao vulcão prestes a explodir entre os dois poetas vitorianos. É quase como se o roteiro quisesse dizer que os dois modernos, jovens e atraentes pesquisadores do século XXI não sabem aproveitar a sorte que tem de poder viver sua história sem devastar as vidas de outras pessoas.
O fracasso de "Possessão" não foi justo. É um romance elegante, sofisticado e adulto que merecia mais sorte e menos críticas negativas. Tem defeitos, sim (e eles são nítidos, em especial quando se percebe a quase falta de jeito de seu diretor em abraçar a tragédia), mas levando-se em consideração a péssima qualidade da maioria dos filmes que tentam conquistar o público através de amores proibidos (quase sempre apelando para os mais vergonhosos clichês), eles são ínfimos. É difícil não se emocionar com o belo final (que proporciona à audiência uma pequena surpresa) e é sempre um prazer ver Gwyneth Paltrow e Aaron Eckhart em cena.
quarta-feira
SINAIS
SINAIS (Signs, 2002, Touchstone Pictures, 106min) Direção e roteiro: M. Night Shyamalan. Fotografia: Tak Fujimoto. Montagem: Barbara Tulliver. Música: James Newton Howard. Figurino: Ann Roth. Direção de arte/cenários: Larry Fulton/Douglas Mowat. Produção executiva: Kathleen Kennedy. Produção: Frank Marshall, Sam Mercer, M. Night Shyamalan. Elenco: Mel Gibson, Joaquin Phoenix, Cherry Jones, Rory Culkin, Abigail Breslin, M. Night Shyamalan. Estreia: 29/7/02
Em primeiro lugar é necessário elogiar o talento que o diretor/roteirista/produtor (e neste filme também ator) M. Night Shyamalan tem em criar climas aterradores. Desde que encantou o mundo com "O sexto sentido", o cineasta indiano (mas criado perto da Filadélfia) encontrou a fórmula para criar, através do som e de imagens cuidadosamente desenhadas, um patamar de suspense que poucos diretores conseguiram atingir. Ainda que tenha sofrido uma queda vertiginosa de qualidade em sua filmografia a partir de "A vila", de 2004, Shyamalan não pode ser acusado de trair suas referências no gênero. E elas estão claramente presentes em "Sinais", seu último filme até hoje que foi realmente capaz de empolgar os cinéfilos (ou ao menos parte deles).
Mais uma vez o clima é o principal elemento que Shyamalan utiliza para estarrecer a audiência e deixá-la grudada na poltrona. Sem apelar para sustos desnecessários (mas nunca evitando a tensão que explode em pulos do sofá) ou para monstros sanguinários, o cineasta volta a provar o grande poder da sugestão em detrimento do explícito. Ao preferir concentrar-se na complexidade dramática de suas personagens (sempre bem escritas e desenvolvidas com delicadeza) e na maneira com que elas agem em circunstâncias adversas (e "adversas" aqui é até eufemismo), o homem que revelou Haley Joel Osment ao mundo exige de sua plateia apenas a empatia necessária para que se embarque na trama sem pestanejar. E faz isso aos poucos, delicadamente, dando tempo para que todas as circunstâncias se apresentem (e façam todo o sentido do mundo nas cenas finais). Cada diálogo escrito por Shyamalan, cada detalhe visual e cada minuto de filme não estão ali à toa. Poucos cineastas conseguem ser tão enxutos sem ser apressados quanto ele. E isso faz toda a diferença.
"Sinais" começa quando os dois filhos pequenos de Graham Hess (Mel Gibson em uma das melhores atuações de sua carreira) descobrem, na plantação de milho de sua fazenda no interior da Pensilvânia, círculos misteriosos semelhantes a outros que estão sendo descobertos pelo mundo todo. A princípio descrente da ameaça que o mistério pode representar, o ex-reverendo (que abandonou a batina após o acidente de carro que matou sua mulher, seis meses antes) aos poucos se deixa convencer pela mídia e por seu irmão caçula Merrill (Joaquin Phoenix) de que tudo é a preparação para uma invasão alienígena de grande porte e violência. Sozinho na fazenda com sua família, ele tenta reencontrar a fé perdida para sobreviver à tragédia.
É interessante perceber, em "Sinais", a forma com que o roteiro se desenrola diante dos olhos do espectador sem que ele se dê conta exatamente do que está acontecendo (o grande trunfo também de "O sexto sentido"). Até perto dos créditos de encerramento tudo leva a crer que trata-se de um suspense de ficção científica que abdica de efeitos especiais exorbitantes (e é inegável que o orçamento generoso de mais de 70 milhões de dólares pagaria por um visual menos pobre dos alienígenas) para homenagear clássicos do gênero, como a primeira versão de "Invasores de corpos". Seu desfecho, porém, mostra uma ambição maior de seu diretor: ele quer questionar a fé de seu público, assim como questionou de suas personagens. Explicar a forma com que ele lança a pergunta ao público seria estragar a surpresa de quem ainda não o assistiu, mas não há problema em dizer que NADA que aconteceu na vida de Hess foi por acaso e tudo estava apenas o levando à situação extrema em que ele se encontra.
Desde sua abertura - com a trilha sonora tonitruante de James Newton Howard emulando o melhor Bernard Herrman de "Psicose" - até suas cenas finais, "Sinais" é (mais) um belo exemplo da seriedade com que M. Night Shyamalan trata o cinema e seu público. O cuidado na direção de atores - incluindo um Mel Gibson em sua melhor forma, em um papel rejuvenescido para combinar com sua idade (Paul Newman e Clint Eastwood foram pensados para o projeto), um Joaquin Phoenix bastante diferente do vilão que interpretou em "Gladiador" e dois atores mirins em ótima forma (Rory Culkin, irmão de Macaulay, e Abigail Breslin, que despontaria para a fama quatro anos depois no ótimo "Pequena Miss Sunshine") - a inteligência na utilização do som e a opção em contar toda a história pelo restrito ponto de vista de uma pequena família comprovam o enorme talento de seu criador. Torçamos para que ele volte a nos encantar novamente muito em breve!
Em primeiro lugar é necessário elogiar o talento que o diretor/roteirista/produtor (e neste filme também ator) M. Night Shyamalan tem em criar climas aterradores. Desde que encantou o mundo com "O sexto sentido", o cineasta indiano (mas criado perto da Filadélfia) encontrou a fórmula para criar, através do som e de imagens cuidadosamente desenhadas, um patamar de suspense que poucos diretores conseguiram atingir. Ainda que tenha sofrido uma queda vertiginosa de qualidade em sua filmografia a partir de "A vila", de 2004, Shyamalan não pode ser acusado de trair suas referências no gênero. E elas estão claramente presentes em "Sinais", seu último filme até hoje que foi realmente capaz de empolgar os cinéfilos (ou ao menos parte deles).
Mais uma vez o clima é o principal elemento que Shyamalan utiliza para estarrecer a audiência e deixá-la grudada na poltrona. Sem apelar para sustos desnecessários (mas nunca evitando a tensão que explode em pulos do sofá) ou para monstros sanguinários, o cineasta volta a provar o grande poder da sugestão em detrimento do explícito. Ao preferir concentrar-se na complexidade dramática de suas personagens (sempre bem escritas e desenvolvidas com delicadeza) e na maneira com que elas agem em circunstâncias adversas (e "adversas" aqui é até eufemismo), o homem que revelou Haley Joel Osment ao mundo exige de sua plateia apenas a empatia necessária para que se embarque na trama sem pestanejar. E faz isso aos poucos, delicadamente, dando tempo para que todas as circunstâncias se apresentem (e façam todo o sentido do mundo nas cenas finais). Cada diálogo escrito por Shyamalan, cada detalhe visual e cada minuto de filme não estão ali à toa. Poucos cineastas conseguem ser tão enxutos sem ser apressados quanto ele. E isso faz toda a diferença.
"Sinais" começa quando os dois filhos pequenos de Graham Hess (Mel Gibson em uma das melhores atuações de sua carreira) descobrem, na plantação de milho de sua fazenda no interior da Pensilvânia, círculos misteriosos semelhantes a outros que estão sendo descobertos pelo mundo todo. A princípio descrente da ameaça que o mistério pode representar, o ex-reverendo (que abandonou a batina após o acidente de carro que matou sua mulher, seis meses antes) aos poucos se deixa convencer pela mídia e por seu irmão caçula Merrill (Joaquin Phoenix) de que tudo é a preparação para uma invasão alienígena de grande porte e violência. Sozinho na fazenda com sua família, ele tenta reencontrar a fé perdida para sobreviver à tragédia.
É interessante perceber, em "Sinais", a forma com que o roteiro se desenrola diante dos olhos do espectador sem que ele se dê conta exatamente do que está acontecendo (o grande trunfo também de "O sexto sentido"). Até perto dos créditos de encerramento tudo leva a crer que trata-se de um suspense de ficção científica que abdica de efeitos especiais exorbitantes (e é inegável que o orçamento generoso de mais de 70 milhões de dólares pagaria por um visual menos pobre dos alienígenas) para homenagear clássicos do gênero, como a primeira versão de "Invasores de corpos". Seu desfecho, porém, mostra uma ambição maior de seu diretor: ele quer questionar a fé de seu público, assim como questionou de suas personagens. Explicar a forma com que ele lança a pergunta ao público seria estragar a surpresa de quem ainda não o assistiu, mas não há problema em dizer que NADA que aconteceu na vida de Hess foi por acaso e tudo estava apenas o levando à situação extrema em que ele se encontra.
Desde sua abertura - com a trilha sonora tonitruante de James Newton Howard emulando o melhor Bernard Herrman de "Psicose" - até suas cenas finais, "Sinais" é (mais) um belo exemplo da seriedade com que M. Night Shyamalan trata o cinema e seu público. O cuidado na direção de atores - incluindo um Mel Gibson em sua melhor forma, em um papel rejuvenescido para combinar com sua idade (Paul Newman e Clint Eastwood foram pensados para o projeto), um Joaquin Phoenix bastante diferente do vilão que interpretou em "Gladiador" e dois atores mirins em ótima forma (Rory Culkin, irmão de Macaulay, e Abigail Breslin, que despontaria para a fama quatro anos depois no ótimo "Pequena Miss Sunshine") - a inteligência na utilização do som e a opção em contar toda a história pelo restrito ponto de vista de uma pequena família comprovam o enorme talento de seu criador. Torçamos para que ele volte a nos encantar novamente muito em breve!
terça-feira
POR UM FIO
POR UM FIO (Phone booth, 2002, Fox 2000 Pictures, 81min) Direção: Joel Schumacher. Roteiro: Larry Cohen. Fotografia: Matthew Libatique. Montagem: Mark Stevens. Música: Harry Gregson-Williams. Figurino: Daniel Orlandi. Direção de arte/cenários: Andrew Laws/Don Diers. Produção executiva: Ted Kurdyla. Produção: Gil Netter, David Zucker. Elenco: Colin Farrell, Forest Whitaker, Katie Holmes, Rhada Mitchell, Kiefer Sutherland. Estreia: 10/9/02 (Festival de Toronto)
Em 2001, Joel Schumacher deu ao ator irlandês Colin Farrell sua primeira grande chance no cinema, escolhendo-o para ser o protagonista de "Tigerland, a caminho da guerra", que agradou aos críticos mas foi ignorado pelo público (boa parte devido a sua péssima distribuição nos cinemas americanos). Um ano depois, Farrell retribuiu o favor, estrelando uma produção barata (13 milhões de dólares) dirigida por Schumacher que tornou-se um sucesso inesperado. Depois de ter seu lançamento adiado nos EUA por cinco meses (estreou no Festival de Toronto em setembro de 2002 e só chegou às salas ianques em abril de 2003), "Por um fio" arrecadou quase cem milhões só no mercado americano e, em se tratando de uma obra de Joel Schumacher surpreendeu também por ter uma consistência rara.
Filmado em apenas duas semanas - e em ordem cronológica - "Por um fio" é um one man-show de Farrell, que carrega nas costas todo o suspense e o drama da história criada por Larry Cohen, também autor do roteiro de "Celular", estrelado por Kim Basinger e Chris Evans pouco tempo depois. Substituindo Jim Carrey, Mel Gibson e Will Smith (todos interessados no papel), o jovem ator mostra uma segurança ímpar na pele de Stuart Shepard, um divulgador de entretenimento que mora em Nova York com a esposa Kelly (Radha Mitchell) e que vive de humilhar o assistente, de passar a perna nos clientes e tentar se dar bem sem fazer muito esforço. Sua arrogância e egocentrismo não lhe bastam, porém, quando ele acaba caindo em uma armadilha inesperada: depois de falar com a aspirante a atriz Pam (Katie Holmes) - que ele quer levar para a cama o mais rápido possível com promessas de conseguir-lhe uma chance no cinema - de uma cabine telefônica ele atende o telefone e acaba sendo feito de refém por um misterioso atirador que sabe tudo de sua vida e ameaça matá-lo ou à sua mulher se ele desligar. O que parecia uma brincadeira de péssimo gosto vira um pesadelo quando o atirador (com a voz de Kiefer Sutherland) mata um gigolô na frente de testemunhas e Stu torna-se o principal suspeito do crime. Quando a mídia chega ao local, juntamente com o Capitão Ed Ramey (o sempre competente Forest Whitaker), o circo está armado.
Contado em enxutos 81 minutos - o que elimina cenas supérfluas e dá ao filme um ritmo extremamente ágil mas nunca apressado - "Por um fio" mais uma vez mostra que Joel Schumacher se dá muito melhor quando é menos ambicioso. Assim como em "Tigerland" (que também contava com a mesma equipe técnica), ele foca sua atenção no desempenho dos atores e não em mirabolantes pirotecnias ou marketing excessivo."Por um fio" é tenso na medida certa e surpreende a audiência com uma história que foge do previsível sempre que pode - o que em termos de filme de suspense é um ingrediente cada vez mais difícil de encontrar. O duelo entre Farrell e Sutherland (cuja voz foi acrescentada na pós-produção) é empolgante e muito dessa eletricidade vem do trabalho impecável de Colin, cujo personagem passa da arrogância e da auto-confiança ao desespero e ao medo em um piscar de olhos, sem que seja necessário muito mais do que puro e simples talento.
"Por um fio" não mudou a história do cinema e provavelmente com um ator menos capaz que Farrel seria apenas mais um filme a ser reprisado nas sessões noturnas da TV aberta. Mas graças à força que o ator imprime em sua atuação torna-se um produto acima da média em seu gênero.
Em 2001, Joel Schumacher deu ao ator irlandês Colin Farrell sua primeira grande chance no cinema, escolhendo-o para ser o protagonista de "Tigerland, a caminho da guerra", que agradou aos críticos mas foi ignorado pelo público (boa parte devido a sua péssima distribuição nos cinemas americanos). Um ano depois, Farrell retribuiu o favor, estrelando uma produção barata (13 milhões de dólares) dirigida por Schumacher que tornou-se um sucesso inesperado. Depois de ter seu lançamento adiado nos EUA por cinco meses (estreou no Festival de Toronto em setembro de 2002 e só chegou às salas ianques em abril de 2003), "Por um fio" arrecadou quase cem milhões só no mercado americano e, em se tratando de uma obra de Joel Schumacher surpreendeu também por ter uma consistência rara.
Filmado em apenas duas semanas - e em ordem cronológica - "Por um fio" é um one man-show de Farrell, que carrega nas costas todo o suspense e o drama da história criada por Larry Cohen, também autor do roteiro de "Celular", estrelado por Kim Basinger e Chris Evans pouco tempo depois. Substituindo Jim Carrey, Mel Gibson e Will Smith (todos interessados no papel), o jovem ator mostra uma segurança ímpar na pele de Stuart Shepard, um divulgador de entretenimento que mora em Nova York com a esposa Kelly (Radha Mitchell) e que vive de humilhar o assistente, de passar a perna nos clientes e tentar se dar bem sem fazer muito esforço. Sua arrogância e egocentrismo não lhe bastam, porém, quando ele acaba caindo em uma armadilha inesperada: depois de falar com a aspirante a atriz Pam (Katie Holmes) - que ele quer levar para a cama o mais rápido possível com promessas de conseguir-lhe uma chance no cinema - de uma cabine telefônica ele atende o telefone e acaba sendo feito de refém por um misterioso atirador que sabe tudo de sua vida e ameaça matá-lo ou à sua mulher se ele desligar. O que parecia uma brincadeira de péssimo gosto vira um pesadelo quando o atirador (com a voz de Kiefer Sutherland) mata um gigolô na frente de testemunhas e Stu torna-se o principal suspeito do crime. Quando a mídia chega ao local, juntamente com o Capitão Ed Ramey (o sempre competente Forest Whitaker), o circo está armado.
Contado em enxutos 81 minutos - o que elimina cenas supérfluas e dá ao filme um ritmo extremamente ágil mas nunca apressado - "Por um fio" mais uma vez mostra que Joel Schumacher se dá muito melhor quando é menos ambicioso. Assim como em "Tigerland" (que também contava com a mesma equipe técnica), ele foca sua atenção no desempenho dos atores e não em mirabolantes pirotecnias ou marketing excessivo."Por um fio" é tenso na medida certa e surpreende a audiência com uma história que foge do previsível sempre que pode - o que em termos de filme de suspense é um ingrediente cada vez mais difícil de encontrar. O duelo entre Farrell e Sutherland (cuja voz foi acrescentada na pós-produção) é empolgante e muito dessa eletricidade vem do trabalho impecável de Colin, cujo personagem passa da arrogância e da auto-confiança ao desespero e ao medo em um piscar de olhos, sem que seja necessário muito mais do que puro e simples talento.
"Por um fio" não mudou a história do cinema e provavelmente com um ator menos capaz que Farrel seria apenas mais um filme a ser reprisado nas sessões noturnas da TV aberta. Mas graças à força que o ator imprime em sua atuação torna-se um produto acima da média em seu gênero.
segunda-feira
ESTRADA PARA PERDIÇÃO
ESTRADA PARA PERDIÇÃO (Road to Perdition, 2002, Dreamworks SKG, 117min) Direção: Sam Mendes. Roteiro: David Self, HQ de Max Allan Collins, Richard Piers Rayner. Fotografia: Conrad L. Hall. Montagem: Jill Bilcock. Música: Thomas Newman. Figurino: Albert Wolsky. Direção de arte/cenários: Dennis Gassner/Nancy Haigh. Produção executiva: Joan Bradshaw, Walter F. Parkes. Produção: Sam Mendes, Dean Zanuck, Richard D. Zanuck. Elenco: Tom Hanks, Paul Newman, Jude Law, Tyler Hoechlin, Stanley Tucci, Daniel Craig, Jennifer Jason Leigh, Ciaran Hinds, Dylan Baker, Liam Aiken. Estreia: 12/7/02
6 indicações ao Oscar: Ator Coadjuvante (Paul Newman), Fotografia, Trilha Sonora Original, Direção de Arte/Cenários, Som, Edição de Som
Vencedor do Oscar de Fotografia
Quem achava que o Oscar de direção por "Beleza americana" tinha sido sorte de principiante do inglês Sam Mendes foi obrigado a segurar o queixo com o lançamento de "Estrada para Perdição", seu segundo longa. Enquanto seu filme de estreia analisava com um olhar estrangeiro as entranhas dos subúrbios ianques sua adaptação da HQ de Max Allan Collins investiga a fundo os elementos básicos de outro gênero caro à plateia norte-americana (e a todas aquelas que cultuam o cinema hollywoodiano): os filmes de gângster. Ao lançar um olhar europeu sobre essa história de traição, vingança e violência (vagamente baseada em uma história real ocorrida com o gângster irlandês John Looney nos anos 30), Mendes construiu uma peça rara de ourivesaria visual e dramática, provando que, além de sensibilidade para as mazelas humanas, tem um apuradíssimo senso estético. "Estrada para Perdição" é um dos filmes mais deslumbrantes de seu tempo, e a fotografia do veterano Conrad R. Hall (que morreu logo após as filmagens) não mereceu seu Oscar injustamente.
Não existe nenhum plano ou sequência de "Estrada para Perdição" que não seja claramente planejado para causar um efeito específico na audiência (mesmo que às vezes esse objetivo seja bastante discreto a ponto de não ser percebido em uma primeira sessão) ou reiterar a visão de Mendes do roteiro de David Self (um exemplo disso é a maneira como os closes nos protagonistas vão se tornando frequentes à medida em que a relação entre eles também começa a se estreitar). Esse cuidado extremo do cineasta em encantar pelo visual em detrimento de um ritmo mais ágil e uma violência mais gráfica é, ao mesmo tempo, a qualidade maior de seu filme e seu calcanhar de Aquiles. Aparentemente Mendes nega aos fãs do gênero os tiroteios sangrentos que fizeram a glória de nomes como James Cagney e Paul Muni nos primórdios do cinema (e de banhos de sangue como o hiperbólico "Scarface" de Brian de Palma), porém o que ele faz (com invejável competência) é revestir-lhes com um uma poesia em forma de imagens. E, ao contar mais do que uma simples história de revanche - preferindo focalizar seus trunfos na relação conflitante entre um pai distante e silencioso e um filho pré-adolescente que anseia por uma figura paterna mais acessível e próxima.
A trama de "Estrada para Perdição" se passa em 1931, quando os EUA estão passando pela Grande Depressão causada pela queda da bolsa de valores de 1929. É a época da Lei Seca, onde gente como Al Capone faz fortuna em negócios escusos. Em Illinois, quem manda neste setor é o irlandês John Rooney (Paul Newman em sua última e esplêndida atuação, que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de coadjuvante), um homem que não se conforma com a falta de talento e personalidade do único filho, Connor (Daniel Craig) e vê em seu protegido Michael Sullivan (Tom Hanks) a esperança de um substituto à sua altura. Sua atitude em relação a ele irá se transformar radicalmente quando Connor mata um empregado suspeito de roubo e o filho mais velho de Sullivan, Mike (Tyler Hoechlin) testemunha o crime às escondidas. Temendo as consequências que a situação pode trazer, o veterano gângster manda exterminar o menino, mas quem acaba morto por engano é seu irmão caçula, em companhia da mãe. Desesperado pela tragédia, Sullivan une-se ao filho em uma viagem na qual pretende vingar a morte de sua família. No caminho, ele acaba se aproximando do garoto, com quem sempre teve uma relação quase fria e precisa protegê-lo de um matador contratado pelos Rooney, o apavorante fotógrafo Harlen Maguire (Jude Law, irreconhecível).
"Estrada para Perdição" funciona lindamente em todos os seus níveis dramáticos. Enquanto filme de gângster é formalmente tradicional, apesar de evitar ferozmente a violência explícita. Como conflito familiar emociona ao aproximar pai e filho de maneira delicada e melancólica (ainda que sua opção por não exagerar no dramalhão o afaste um pouco de um público desacostumado a sutilezas). Visualmente é um espetáculo (cortesia também da direção de arte e do figurino caprichados). A trilha sonora de Thomas Newman é marcante e adequada e o elenco é de aplaudir de pé: Tom Hanks escapa pela primeira vez de sua persona carismática para viver um Michael Sullivan fechado e sorumbático (mesmo que esteja longe de ser um vilão como parte da mídia pintou è época da estreia do filme) e Jude Law mostra que não precisa mostrar seu sorriso luminoso para chamar a atenção. Mas é, acima de tudo, um belíssimo filme que melhora a cada revisão e marca o adeus de um mito absoluto, o grande Paul Newman. Convenhamos, não é pouca coisa!!!
6 indicações ao Oscar: Ator Coadjuvante (Paul Newman), Fotografia, Trilha Sonora Original, Direção de Arte/Cenários, Som, Edição de Som
Vencedor do Oscar de Fotografia
Quem achava que o Oscar de direção por "Beleza americana" tinha sido sorte de principiante do inglês Sam Mendes foi obrigado a segurar o queixo com o lançamento de "Estrada para Perdição", seu segundo longa. Enquanto seu filme de estreia analisava com um olhar estrangeiro as entranhas dos subúrbios ianques sua adaptação da HQ de Max Allan Collins investiga a fundo os elementos básicos de outro gênero caro à plateia norte-americana (e a todas aquelas que cultuam o cinema hollywoodiano): os filmes de gângster. Ao lançar um olhar europeu sobre essa história de traição, vingança e violência (vagamente baseada em uma história real ocorrida com o gângster irlandês John Looney nos anos 30), Mendes construiu uma peça rara de ourivesaria visual e dramática, provando que, além de sensibilidade para as mazelas humanas, tem um apuradíssimo senso estético. "Estrada para Perdição" é um dos filmes mais deslumbrantes de seu tempo, e a fotografia do veterano Conrad R. Hall (que morreu logo após as filmagens) não mereceu seu Oscar injustamente.
Não existe nenhum plano ou sequência de "Estrada para Perdição" que não seja claramente planejado para causar um efeito específico na audiência (mesmo que às vezes esse objetivo seja bastante discreto a ponto de não ser percebido em uma primeira sessão) ou reiterar a visão de Mendes do roteiro de David Self (um exemplo disso é a maneira como os closes nos protagonistas vão se tornando frequentes à medida em que a relação entre eles também começa a se estreitar). Esse cuidado extremo do cineasta em encantar pelo visual em detrimento de um ritmo mais ágil e uma violência mais gráfica é, ao mesmo tempo, a qualidade maior de seu filme e seu calcanhar de Aquiles. Aparentemente Mendes nega aos fãs do gênero os tiroteios sangrentos que fizeram a glória de nomes como James Cagney e Paul Muni nos primórdios do cinema (e de banhos de sangue como o hiperbólico "Scarface" de Brian de Palma), porém o que ele faz (com invejável competência) é revestir-lhes com um uma poesia em forma de imagens. E, ao contar mais do que uma simples história de revanche - preferindo focalizar seus trunfos na relação conflitante entre um pai distante e silencioso e um filho pré-adolescente que anseia por uma figura paterna mais acessível e próxima.
A trama de "Estrada para Perdição" se passa em 1931, quando os EUA estão passando pela Grande Depressão causada pela queda da bolsa de valores de 1929. É a época da Lei Seca, onde gente como Al Capone faz fortuna em negócios escusos. Em Illinois, quem manda neste setor é o irlandês John Rooney (Paul Newman em sua última e esplêndida atuação, que lhe rendeu uma indicação ao Oscar de coadjuvante), um homem que não se conforma com a falta de talento e personalidade do único filho, Connor (Daniel Craig) e vê em seu protegido Michael Sullivan (Tom Hanks) a esperança de um substituto à sua altura. Sua atitude em relação a ele irá se transformar radicalmente quando Connor mata um empregado suspeito de roubo e o filho mais velho de Sullivan, Mike (Tyler Hoechlin) testemunha o crime às escondidas. Temendo as consequências que a situação pode trazer, o veterano gângster manda exterminar o menino, mas quem acaba morto por engano é seu irmão caçula, em companhia da mãe. Desesperado pela tragédia, Sullivan une-se ao filho em uma viagem na qual pretende vingar a morte de sua família. No caminho, ele acaba se aproximando do garoto, com quem sempre teve uma relação quase fria e precisa protegê-lo de um matador contratado pelos Rooney, o apavorante fotógrafo Harlen Maguire (Jude Law, irreconhecível).
"Estrada para Perdição" funciona lindamente em todos os seus níveis dramáticos. Enquanto filme de gângster é formalmente tradicional, apesar de evitar ferozmente a violência explícita. Como conflito familiar emociona ao aproximar pai e filho de maneira delicada e melancólica (ainda que sua opção por não exagerar no dramalhão o afaste um pouco de um público desacostumado a sutilezas). Visualmente é um espetáculo (cortesia também da direção de arte e do figurino caprichados). A trilha sonora de Thomas Newman é marcante e adequada e o elenco é de aplaudir de pé: Tom Hanks escapa pela primeira vez de sua persona carismática para viver um Michael Sullivan fechado e sorumbático (mesmo que esteja longe de ser um vilão como parte da mídia pintou è época da estreia do filme) e Jude Law mostra que não precisa mostrar seu sorriso luminoso para chamar a atenção. Mas é, acima de tudo, um belíssimo filme que melhora a cada revisão e marca o adeus de um mito absoluto, o grande Paul Newman. Convenhamos, não é pouca coisa!!!
quinta-feira
MINORITY REPORT, A NOVA LEI
MINORITY REPORT, A NOVA LEI (Minority report, 2002, 20th Century Fox/Dreamworks SKG, 145min) Direção: Steven Spielberg. Roteiro: Scott Frank, Jon Cohen, conto de Philip K. Dick. Fotografia: Janusz Kaminski. Montagem: Michael Kahn. Música: John Williams. Figurino: Deborah L. Scott. Direção de arte/cenários: Alex McDowell/Anne Kuljian. Produção executiva: Gary Goldman, Ronald Shusett. Produção: Bonnie Curtis, Gerald R. Molen, Walter F. Parkes. Elenco: Tom Cruise, Colin Farrell, Max Von Sydow, Samantha Morton, Lois Smith, Tim Blake Nelson, Peter Stormare. Estreia: 17/6/02
Indicado ao Oscar de Edição de Som
É o ano de 2054, e o índice de criminalidade da cidade de Washington despencou vertiginosamente. O responsável por esse milagre é um projeto chamado "Pré-crime", que permite à força policial antecipar-se aos homicídios premeditados e evitar os crimes graças às premonições de três poderosos videntes, mantidos em constante cuidado pelo departamento de polícia. O chefe da equipe "Pré-crime" é o detetive John Anderton (Tom Cruise), um homem assombrado pelo desaparecimento do filho pequeno anos antes e que encontra no vício em drogas uma forma de escapar da depressão. Às vésperas de uma votação popular que irá consagrar definitivamente o projeto e torná-lo nacional, Anderton - um policial de extrema competência e ética - se vê envolvido em um apavorante pesadelo kafkiano: em menos de 36 horas ele será o responsável pelo assassinato de um homem cuja existência ele nem mesmo tem conhecimento. Desesperado para provar sua inocência (em um crime ainda não cometido), ele sequestra Agatha (Samantha Morton), a mais dotada das videntes e parte em busca da verdade. Atrás dele está principalmente Danny Witwer (Colin Farrell), que quer encontrar falhas no sistema.
Baseado em um conto do escritor Philip K. Dick - cuja mente fértil deu ao cinema as histórias de "Blade Runner" e "O vingador do futuro" - "Minority report, a nova lei" marca o reencontro de Steven Spielberg com a ficção científica, gênero do qual estava afastado desde seu megasucesso "ET", de 1982 - isso se "Jurassic Park" não for considerado como tal. Nos vinte anos que separam os dois filmes, a tecnologia do cinema alterou-se drasticamente - boa parte devido aos filmes do próprio cineasta - e Spielberg tornou-se um diretor respeitado, vencedor de 2 Oscar. Portanto, é lógico que exista uma diferença abissal entre a ingenuidade oitentista da clássica história da amizade entre o menino Elliot e seu extra-terrestre de estimação e a distópica visão de mundo do filme estrelado por Cruise. Realizado a um custo altíssimo - mais de cem milhões de dólares - "Minority report" é uma ficção científica noir, ao estilo de "Blade runner", mas sem espaço para a filosofia melancólica do filme de Ridley Scott.
Se dá para comparar "Minority report" com algum outro filme baseado em Dick, este é "O vingador do futuro", estrelado por Arnold Schwarzenegger em 1990, mas mesmo assim o trabalho de Spielberg ganha pontos em não se deixar contaminar pelo certo ar cafona da produção dirigida pelo holandês Paul Verhoeven. Seus efeitos especiais são mais discretos, dando espaço bem mais à história complexa (bastante modificada do conto original, diga-se de passagem) do que a mirabolantes pirotecnias visuais, que estão presentes mas em um nível muito mais sutil. A fotografia espetacular do premiado Janusz Kaminski é estourada, dando à imagem um aspecto feio e descuidado que combina à perfeição com o objetivo do cineasta de passar ao público uma sensação de angústia. E angústia é o que não falta: durante suas mais de duas horas e meia de duração, "Minority report" não dá tréguas ao espectador, levando-o como testemunha do calvário de seu protagonista em direção à verdade. O roteiro cria transplantes de olhos, aranhas que dão choque, propagandas personalizadas, caixas de cereais animadas e tudo que um escritor criativo pode imaginar, mas não se deixa nunca fugir do mais importante: a história empolgante e surpreendente.
Muito mais inteligente do que a maioria dos filmes de ação com pretensões comerciais que aportam nos cinemas americanos na temporada de verão - bem na época em que foi lançado - "Minority report" tem a seu favor também o carisma de Tom Cruise, ainda no auge de seu sucesso. Ainda que não explore como poderia as possibilidades dramáticas de sua complexa personagem, Cruise é competente o bastante para conquistar a simpatia do público, fator essencial para o êxito do filme, mesmo porque seu rival em cena é o irlandês Colin Farrel - que, em 2002 era considerado a grande promessa do início do século. É Cruise quem sustenta toda a mirabolante trama - que envolve até mesmo o veterano Max Von Sydow - e mantém a atenção da plateia suspensa até os minutos finais. O equilíbrio exato entre cenas da mais alta ação (inclusive com uma sequência que Hitchcock declarou certa vez que sonhava fazer, em uma fábrica de automóveis) com o misterioso homicídio a ser perpetrado por John Anderton é que faz com que o filme seja mais do que um simples entretenimento passageiro.
E seria injusto elogiar "Minority report" sem citar Samantha Morton. Na pele de Agatha, a talentosa vidente que desencadeia todo o drama (e cujo nome é uma homenagem à escritora Agatha Christie), a jovem atriz nem precisa falar muito para transmitir toda a vasta gama de emoções que permeia sua personalidade. Vinda de uma indicação ao Oscar de coadjuvante (pelo ótimo "Poucas e boas", de Woody Allen), Morton consegue roubar a cena e ser tão memorável quanto os inventivos efeitos visuais e a rocambolesca trama central.
Indicado ao Oscar de Edição de Som
É o ano de 2054, e o índice de criminalidade da cidade de Washington despencou vertiginosamente. O responsável por esse milagre é um projeto chamado "Pré-crime", que permite à força policial antecipar-se aos homicídios premeditados e evitar os crimes graças às premonições de três poderosos videntes, mantidos em constante cuidado pelo departamento de polícia. O chefe da equipe "Pré-crime" é o detetive John Anderton (Tom Cruise), um homem assombrado pelo desaparecimento do filho pequeno anos antes e que encontra no vício em drogas uma forma de escapar da depressão. Às vésperas de uma votação popular que irá consagrar definitivamente o projeto e torná-lo nacional, Anderton - um policial de extrema competência e ética - se vê envolvido em um apavorante pesadelo kafkiano: em menos de 36 horas ele será o responsável pelo assassinato de um homem cuja existência ele nem mesmo tem conhecimento. Desesperado para provar sua inocência (em um crime ainda não cometido), ele sequestra Agatha (Samantha Morton), a mais dotada das videntes e parte em busca da verdade. Atrás dele está principalmente Danny Witwer (Colin Farrell), que quer encontrar falhas no sistema.
Baseado em um conto do escritor Philip K. Dick - cuja mente fértil deu ao cinema as histórias de "Blade Runner" e "O vingador do futuro" - "Minority report, a nova lei" marca o reencontro de Steven Spielberg com a ficção científica, gênero do qual estava afastado desde seu megasucesso "ET", de 1982 - isso se "Jurassic Park" não for considerado como tal. Nos vinte anos que separam os dois filmes, a tecnologia do cinema alterou-se drasticamente - boa parte devido aos filmes do próprio cineasta - e Spielberg tornou-se um diretor respeitado, vencedor de 2 Oscar. Portanto, é lógico que exista uma diferença abissal entre a ingenuidade oitentista da clássica história da amizade entre o menino Elliot e seu extra-terrestre de estimação e a distópica visão de mundo do filme estrelado por Cruise. Realizado a um custo altíssimo - mais de cem milhões de dólares - "Minority report" é uma ficção científica noir, ao estilo de "Blade runner", mas sem espaço para a filosofia melancólica do filme de Ridley Scott.
Se dá para comparar "Minority report" com algum outro filme baseado em Dick, este é "O vingador do futuro", estrelado por Arnold Schwarzenegger em 1990, mas mesmo assim o trabalho de Spielberg ganha pontos em não se deixar contaminar pelo certo ar cafona da produção dirigida pelo holandês Paul Verhoeven. Seus efeitos especiais são mais discretos, dando espaço bem mais à história complexa (bastante modificada do conto original, diga-se de passagem) do que a mirabolantes pirotecnias visuais, que estão presentes mas em um nível muito mais sutil. A fotografia espetacular do premiado Janusz Kaminski é estourada, dando à imagem um aspecto feio e descuidado que combina à perfeição com o objetivo do cineasta de passar ao público uma sensação de angústia. E angústia é o que não falta: durante suas mais de duas horas e meia de duração, "Minority report" não dá tréguas ao espectador, levando-o como testemunha do calvário de seu protagonista em direção à verdade. O roteiro cria transplantes de olhos, aranhas que dão choque, propagandas personalizadas, caixas de cereais animadas e tudo que um escritor criativo pode imaginar, mas não se deixa nunca fugir do mais importante: a história empolgante e surpreendente.
Muito mais inteligente do que a maioria dos filmes de ação com pretensões comerciais que aportam nos cinemas americanos na temporada de verão - bem na época em que foi lançado - "Minority report" tem a seu favor também o carisma de Tom Cruise, ainda no auge de seu sucesso. Ainda que não explore como poderia as possibilidades dramáticas de sua complexa personagem, Cruise é competente o bastante para conquistar a simpatia do público, fator essencial para o êxito do filme, mesmo porque seu rival em cena é o irlandês Colin Farrel - que, em 2002 era considerado a grande promessa do início do século. É Cruise quem sustenta toda a mirabolante trama - que envolve até mesmo o veterano Max Von Sydow - e mantém a atenção da plateia suspensa até os minutos finais. O equilíbrio exato entre cenas da mais alta ação (inclusive com uma sequência que Hitchcock declarou certa vez que sonhava fazer, em uma fábrica de automóveis) com o misterioso homicídio a ser perpetrado por John Anderton é que faz com que o filme seja mais do que um simples entretenimento passageiro.
E seria injusto elogiar "Minority report" sem citar Samantha Morton. Na pele de Agatha, a talentosa vidente que desencadeia todo o drama (e cujo nome é uma homenagem à escritora Agatha Christie), a jovem atriz nem precisa falar muito para transmitir toda a vasta gama de emoções que permeia sua personalidade. Vinda de uma indicação ao Oscar de coadjuvante (pelo ótimo "Poucas e boas", de Woody Allen), Morton consegue roubar a cena e ser tão memorável quanto os inventivos efeitos visuais e a rocambolesca trama central.
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