SEGREDOS
DO PODER (Primary colors, 1998, Award Entertainment/BBC Films, 143min)
Direção: Mike Nichols. Roteiro: Elaine May, livro de autor anônimo.
Fotografia: Michael Ballahaus. Montagem: Arthur Schmidt. Música: Ry
Cooder. Figurino: Ann Roth. Direção de arte/cenários: Bo Welch/Cheryl
Carasik. Produção executiva: Jonathan D. Krane, Neil Machlis. Produção:
Mike Nichols. Elenco: John Travolta, Emma Thompson, Billy Bob Thornton,
Kathy Bates, Adrian Lester, Larry Hagman, Maura Tierney, Diane Ladd,
Paul Guilfoyle, Allison Janney, Rob Reiner. Estreia: 20/3/98
2 indicações ao Oscar: Atriz Coadjuvante (Kathy Bates), Roteiro Adaptado
As semelhanças entre Bill Clinton e
o fictício governador sulista Jack Stanton, personagem central do livro
"Primary Colors" - de um autor anônimo que posteriormente revelou-se
como Joe Klein, jornalista da revista Time - eram tão notórias e óbvias
que, dizem as más línguas, Tom Hanks declinou do convite feito pelo
cineasta Mike Nichols de interpretá-lo na sua versão para as telas por
ser amigo do então presidente. Os temores de Hanks, porém, se mostraram
infundados depois do lançamento do filme: não só Clinton tornou-se fã do
resultado final como o retrato do protagonista é bem menos negativo do
que se poderia imaginar quando se trata de um filme que vasculha os
bastidores - quase sempre abarrotado de lama e cinismo - de uma campanha
eleitoral. Talvez devido ao roteiro banhado em sarcasmo da ótima Elaine
May e talvez pela direção firme do experiente Nichols, "Segredos do
poder" escapa do ranço panfletário frequentemente aborrecido do gênero e
revela à plateia um jogo de interesses, mentiras, ataques e
contra-ataques empolgante, com direito a um elenco impecável e uma
produção sofisticada que se dá ao luxo de ter entre seus atores duas
vencedoras do Oscar, Emma Thompson e Kathy Bates - sendo que Bates quase
arrebatou uma segunda estatueta por seu desempenho como Libby Holden,
valente colaboradora de Stanton em seu caminho rumo à Casa Branca.
Como
normalmente ocorre em tramas semelhantes, toda a ação chega ao
espectador através dos olhos do ingênuo e idealista Henry Burton (Adrian
Lester), neto de uma lenda pela luta pelos direitos civis que enxerga
no governador - vivido com gosto por John Travolta - um homem capaz de
se comprometer com causas populistas e relevantes e que aceita entrar em
sua equipe de campanha. No decorrer do processo de conquista de votos,
porém, Burton começa a notar detalhes nada dignificantes a respeito de
seu novo chefe, como sua tendência ao adultério - sempre relevado
tristemente por sua ambiciosa esposa, Susan (Emma Thompson, perfeita com
sotaque americano) - e a confusões inerentes a esse traço de sua
personalidade, como testes de paternidade e chantagens feitas por
amantes ocasionais. O carisma de Stanton, no entanto, é mais forte do
que suas escapadas sexuais, e o rapaz - cobrado por seus antigos
companheiros de ativismo - vai se deixando levar pelo fascinante jogo
que se desdobra à sua frente. As coisas ficam complicadas mesmo quando o
principal rival de Stanton sofre um ataque cardíaco quase fatal e é
substituído na campanha por outro carismático político, Fred Picker
(Larry Hagman, o eterno J.R. da série "Dallas"), que retorna aos
palanques anos depois de ter-se retirado da vida pública e se transforma
em uma séria ameaça aos planos do galante governador.
Veterano
em arrancar interpretações excepcionais dos atores com quem trabalha,
Mike Nichols não faz diferente em "Segredos do poder": um dos maiores
destaques do filme é o elenco, recheado de astros reconhecidos do grande
público vivendo personagens que fogem do maniqueísmo habitual do
cinemão hollywoodiano e portanto, são um desafio considerável a quem
deseja conquistar uma plateia mal-acostumada com os simplismos
rotineiros. John Travolta, por exemplo, apesar de não deixar de ser ele
mesmo em nenhum momento, constroi um Jack Stanton encantador, mesmo que a
audiência saiba de suas canalhices e suas demagogias. Emma Thompson
brilha em uma Hilary Clinton mais pobre, uma mulher forte e determinada
capaz de passar por cima do próprio orgulho por uma causa que considera
mais importante: a vitória nas urnas. E Kathy Bates quase rouba a cena
como Libby Holden, uma idealista e honesta partidária que vê seus
princípios postos em xeque quando fica frente a frente com a verdade nua
e crua dos bastidores sujos de seu meio - sua personagem certamente é a
mais forte da história, oferecendo ao desfecho um senso ético e mordaz
que transforma a fábula roteirizada por Elaine May - uma humorista
experiente que preenche de sarcasmo e humor fino um drama que seria
cômico se não fosse trágico.
Longe de ser um drama
didático e aborrecido sobre os meandros da política norte-americana,
"Segredos do poder" é um filme sobre a hipocrisia generalizada, sobre a
podridão escondida nos bastidores do poder, sobre ideologias sendo
esmagadas pelas circunstâncias. Em 2011, George Clooney lançou um filme
ainda mais contundente sobre o assunto, "Tudo pelo poder", estrelado por
ele mesmo e Ryan Gosling, mas este pequeno tratado de Mike Nichols
ainda se mantém como uma das mais interessantes obras a respeito do
pantanoso mundo político.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
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LEMBRANÇAS DE HOLLYWOOD
LEMBRANÇAS
DE HOLLYWOOD (Postcards from the edge, 1990, Columbia Pictures, 101min )
Direção: Mike Nichols. Roteiro: Carrie Fisher, livro de sua autoria.
Fotografia: Michael Ballhaus. Montagem: Sam O'Steen. Música: Carly
Simon. Figurino: Ann Roth. Direção de arte/cenários: Patrizia Von
Brandestein/Chris A. Butler. Produção executiva: Robert Greenhut, Neil
Machlis. Produção: John Calley, Mike Nichols. Elenco: Meryl Streep,
Shirley MacLaine, Dennis Quaid, Gene Hackman, Richard Dreyfuss, Rob
Reiner, Annette Bening, Simon Callow, CCH Pounder, Oliver Platt, Michael
Ontkean, Anthony Heald. Estreia: 14/9/90
2 indicações ao Oscar: Atriz (Meryl Streep), Canção Original ("I'm checking out")
Carrie Fisher foi ao inferno e voltou - com um humor mordaz e venenoso à tiracolo. A eterna Princesa Leia da cinessérie "Star Wars" - filha de um ícone (Debbie Reynolds), ex-mulher de outro (Paul Simon), ídolo de uma (ou provavelmente mais de uma) geração de nerds - Fisher enfrentou um perigoso vício em drogas e sobreviveu para contar sua história. Disfarçada sob o rótulo de ficção, sua trajetória para recuperar sua carreira, aprender a conviver com as idiossincrasias da mãe estrela de cinema e de quebra fazer uma dura e mordaz crítica aos bastidores da indústria do cinema americano chegou às livrarias com o título de "Postcards from the edge" ("Cartões postais do abismo", em tradução literal) e, mais tarde, como não poderia deixar de ser, apesar da ironia, chamou a atenção dos produtores de Hollywood (que, sabidamente, adoram ser retratados nas telas, por pior que seja tal retrato). Dirigido pelo ótimo Mike Nichols - acostumado a lidar com os melindres da terra do cinema - "Lembranças de Hollywood" acabou resultando em uma agridoce comédia dramática que mesmo em seus momentos mais sentimentais nunca abandona sua tendência ao sarcasmo - em boa parte porque o roteiro ficou a cargo da própria Fisher, especialista em transformar aridez em saborosos diálogos.
E diálogos furiosos banhados a humor não faltam na história de Suzanne Vale, a protagonista interpretada com verve cômica por Meryl Streep (que obviamente concorreu ao Oscar por seu desempenho repleto de frescor e ironia). Famosa mais por seu vício em drogas e por ser filha da excêntrica, querida e popular Doris Mann (Shirley MacLaine, esplêndida), ela é obrigada a fazer um tratamento de desintoxicação como cláusula para ser contratada para um filme que ela nem mesmo está tão empolgada a fazer. O problema do tratamento é, além daqueles normalmente inerentes a ele, é a obrigação de voltar a conviver com a mãe, uma mulher carismática, adorada pelo público e de cuja sombra ela vem tentando sair há anos. Com seus próprios problemas de vício - dessa vez em álcool - Mann não chega a ser um exemplo para a filha, mas a convivência, apesar de difícil, passa a ser responsável por uma aproximação entre elas, principalmente quando demônios e traumas passados vem à tona. Não bastasse tudo isso, Suzanne ainda se vê diante de seus problemas amorosos, em especial quando se encanta por um ator metido a conquistador, Jack Faulkner (Dennis Quaid).
Lotado de participações especiais - Richard Dreyfuss como seu médico, Gene Hackman como um cineasta com o coração bem menos duro do que aparenta, o cineasta Rob Reiner como um produtor - "Lembranças de Hollywood" é um retrato tão sincero dos bastidores do cinema comercial americano que incomodou alguns (Lana Turner não gostou nem um pouco de ter sido citada em uma cena que a qualificava como uma má mãe), trouxe lembrnças a outros (Liza Minnelli encontrou ecos de sua relação com Judy Garland no filme) e despertou cobiça em outros tantos (Janet Leigh queria fazer o filme com a filha Jamie Lee Curtis e a própria Debbie Reynolds se interessou em interpretar Doris Mann). A coragem de Fisher em expor-se e seu mundo é admirável, em especial quando se nota que em momento algum existe resquícios de autopiedade ou sentimentalismo. Como uma metralhadora giratória, o roteiro brinca com o egocentrismo dos cineastas e atores, com o mundo de aparências em que vivem e até mesmo com o perigo do vício em entorpecentes (em vias de morrer de overdose, Suzanne se vê em um corredor decorado com fotos de Judy Garland, Elvis Presley, James Belushi e Marilyn Monroe). Mas é na problemática/amorosa/inconstante relação entre mãe e filha que está o âmago do filme de Mike Nichols, e é onde estão também seus maiores trunfos: Meryl Streep e Shirley MacLaine.
Se foi Streep quem concorreu ao Oscar - e perdeu para Kathy Bates em "Louca obsessão" - é MacLaine quem rouba a cena com sua histriônica Doris Mann, uma atriz capaz de fazer um mini-show em sua casa na festa que dá para comemorar o retorno da filha de uma clínica de reabilitação e de dar uma entrevista coletiva ao sair do hospital depois de ter sofrido um acidente por dirigir bêbada como se estivesse saindo de um espetáculo na Broadway. Os duelos entre as duas - repleto de farpas, rancores e uma indisfarçável inveja (a filha inveja o talento da mãe, a mãe queria a juventude da filha) - estão entre os melhores momentos do filme, a ponto de o público ficar constantemente querendo ver mais e mais arranca-rabos entre as duas. Mesmo que a diferença entre as duas atrizes não ultrapasse quinze anos, não existe dúvidas de que Nichols não poderia ter feito escolhas melhores para suas protagonistas: elas iluminam e dão calor humano a um filme que, a despeito de tratar de um assunto aparentemente tão distante da plateia que não é astro de cinema nem viciado em drogas, consegue atingir em cheio o coração e a mente do espectador graças a um belo roteiro, uma trilha sonora inspirada e duas atrizes extraordinárias.
2 indicações ao Oscar: Atriz (Meryl Streep), Canção Original ("I'm checking out")
Carrie Fisher foi ao inferno e voltou - com um humor mordaz e venenoso à tiracolo. A eterna Princesa Leia da cinessérie "Star Wars" - filha de um ícone (Debbie Reynolds), ex-mulher de outro (Paul Simon), ídolo de uma (ou provavelmente mais de uma) geração de nerds - Fisher enfrentou um perigoso vício em drogas e sobreviveu para contar sua história. Disfarçada sob o rótulo de ficção, sua trajetória para recuperar sua carreira, aprender a conviver com as idiossincrasias da mãe estrela de cinema e de quebra fazer uma dura e mordaz crítica aos bastidores da indústria do cinema americano chegou às livrarias com o título de "Postcards from the edge" ("Cartões postais do abismo", em tradução literal) e, mais tarde, como não poderia deixar de ser, apesar da ironia, chamou a atenção dos produtores de Hollywood (que, sabidamente, adoram ser retratados nas telas, por pior que seja tal retrato). Dirigido pelo ótimo Mike Nichols - acostumado a lidar com os melindres da terra do cinema - "Lembranças de Hollywood" acabou resultando em uma agridoce comédia dramática que mesmo em seus momentos mais sentimentais nunca abandona sua tendência ao sarcasmo - em boa parte porque o roteiro ficou a cargo da própria Fisher, especialista em transformar aridez em saborosos diálogos.
E diálogos furiosos banhados a humor não faltam na história de Suzanne Vale, a protagonista interpretada com verve cômica por Meryl Streep (que obviamente concorreu ao Oscar por seu desempenho repleto de frescor e ironia). Famosa mais por seu vício em drogas e por ser filha da excêntrica, querida e popular Doris Mann (Shirley MacLaine, esplêndida), ela é obrigada a fazer um tratamento de desintoxicação como cláusula para ser contratada para um filme que ela nem mesmo está tão empolgada a fazer. O problema do tratamento é, além daqueles normalmente inerentes a ele, é a obrigação de voltar a conviver com a mãe, uma mulher carismática, adorada pelo público e de cuja sombra ela vem tentando sair há anos. Com seus próprios problemas de vício - dessa vez em álcool - Mann não chega a ser um exemplo para a filha, mas a convivência, apesar de difícil, passa a ser responsável por uma aproximação entre elas, principalmente quando demônios e traumas passados vem à tona. Não bastasse tudo isso, Suzanne ainda se vê diante de seus problemas amorosos, em especial quando se encanta por um ator metido a conquistador, Jack Faulkner (Dennis Quaid).
Lotado de participações especiais - Richard Dreyfuss como seu médico, Gene Hackman como um cineasta com o coração bem menos duro do que aparenta, o cineasta Rob Reiner como um produtor - "Lembranças de Hollywood" é um retrato tão sincero dos bastidores do cinema comercial americano que incomodou alguns (Lana Turner não gostou nem um pouco de ter sido citada em uma cena que a qualificava como uma má mãe), trouxe lembrnças a outros (Liza Minnelli encontrou ecos de sua relação com Judy Garland no filme) e despertou cobiça em outros tantos (Janet Leigh queria fazer o filme com a filha Jamie Lee Curtis e a própria Debbie Reynolds se interessou em interpretar Doris Mann). A coragem de Fisher em expor-se e seu mundo é admirável, em especial quando se nota que em momento algum existe resquícios de autopiedade ou sentimentalismo. Como uma metralhadora giratória, o roteiro brinca com o egocentrismo dos cineastas e atores, com o mundo de aparências em que vivem e até mesmo com o perigo do vício em entorpecentes (em vias de morrer de overdose, Suzanne se vê em um corredor decorado com fotos de Judy Garland, Elvis Presley, James Belushi e Marilyn Monroe). Mas é na problemática/amorosa/inconstante relação entre mãe e filha que está o âmago do filme de Mike Nichols, e é onde estão também seus maiores trunfos: Meryl Streep e Shirley MacLaine.
Se foi Streep quem concorreu ao Oscar - e perdeu para Kathy Bates em "Louca obsessão" - é MacLaine quem rouba a cena com sua histriônica Doris Mann, uma atriz capaz de fazer um mini-show em sua casa na festa que dá para comemorar o retorno da filha de uma clínica de reabilitação e de dar uma entrevista coletiva ao sair do hospital depois de ter sofrido um acidente por dirigir bêbada como se estivesse saindo de um espetáculo na Broadway. Os duelos entre as duas - repleto de farpas, rancores e uma indisfarçável inveja (a filha inveja o talento da mãe, a mãe queria a juventude da filha) - estão entre os melhores momentos do filme, a ponto de o público ficar constantemente querendo ver mais e mais arranca-rabos entre as duas. Mesmo que a diferença entre as duas atrizes não ultrapasse quinze anos, não existe dúvidas de que Nichols não poderia ter feito escolhas melhores para suas protagonistas: elas iluminam e dão calor humano a um filme que, a despeito de tratar de um assunto aparentemente tão distante da plateia que não é astro de cinema nem viciado em drogas, consegue atingir em cheio o coração e a mente do espectador graças a um belo roteiro, uma trilha sonora inspirada e duas atrizes extraordinárias.
A DIFÍCIL ARTE DE AMAR
A DIFÍCIL ARTE DE AMAR (Heartburn, 1986, Paramount Pictures,
108min) Direção: Mike Nichols. Roteiro: Nora Ephron, livro de Nora
Ephron. Fotografia: Nestor Almendros. Montagem: Sam O'Steen. Música:
Carly Simon. Figurino: Ann Roth. Direção de arte/cenários: Tony
Walton/Susan Bode. Produção: Robert Greenhut, Mike Nichols. Elenco: Jack
Nicholson, Meryl Streep, Jeff Daniels, Maureen Stapleton, Stockard
Channing, Richard Masur, Catherine O'Hara, Kevin Spacey, Joanna Gleason,
Mercedes Ruehl. Estreia: 25/7/86
Segundo trabalho de Meryl Streep sob o comando de Mike Nichols e um roteiro de Nora Ephron - o primeiro foi "Silkwood, o retrato de uma coragem" (83), que lhe deu uma indicação ao Oscar - "A difícil arte de amar" é a adaptação de um livro da própria Ephron, que pôs no papel, em forma de ficção, a real história de seu casamento com o jornalista Carl Bernstein, o mesmo que, junto com Bob Woodward, expôs o escândalo Watergate e obrigou a renúncia do presidente Richard Nixon (e foi vivido por Dustin Hoffman no filme "Todos os homens do presidente" (86)). Mais conhecido pela bela canção-tema de Carly Simon, "Coming around again", o filme de Nichols é uma amarga e cínica análise de um relacionamento pouco saudável, que aposta no texto ácido de Ephron e no talento de Streep e Jack Nicholson para transformar o que poderia facilmente se tornar uma longa diatribe contra a instituição do casamento em um drama realista, ainda que com a mordacidade típica da roteirista e a elegância de sempre da direção de Nichols.
Quando o filme começa, a escritora nova-iorquina Rachel Samstat (Meryl Streep) e o jornalista Mark Formn (Jack Nicholson, substituindo Mandy Patinkin depois de dois dias de filmagens) se conhecem no casamento de um amigo em comum. Mesmo já tendo passado por relacionamentos não muito felizes, ambos acabam se apaixonando e, depois de deixar as reservas a respeito do assunto de lado, resolvem também subir ao altar. Como todo casal apaixonado, eles compram uma casa - que mais os estressa do que os deixa felizes, graças à sua interminável reforma - e tentam administrar a relação, já que ele continua trabalhando, mas ela abandonou o emprego para mudar-se com ele para Washington. A familia não demora a aumentar, mas nem mesmo a filha pequena impede Mark de embarcar em um caso extraconjugal que ameaça jogar tudo por terra. Traída, Rachel acaba por perdoar o marido, mas a confiança abalada mostra-se cada vez mais ameaçadora à tranquilidade do casal, especialmente com uma segunda gravidez na jogada.
Não é de surpreender que o roteiro de Ephron, assim como o livro que lhe deu origem, ponha a maior parcela de culpa no fracasso do casamento entre Rachel e Mark no jornalista, uma vez que a trama é contada quase do ponto de vista da personagem de Streep (que, mais uma vez, está soberba), mas é preciso admirar a forma como Nichols tenta fugir da tentação de apontar qualquer dedo, mostrando que em qualquer relação existe dois lados a considerar. Ter Jack Nicholson como a segunda metade do casal não atrapalha em nada, apesar do eterno ar cínico do ator complicar quando seu personagem tenta convencer Rachel - e por contrapartida a audiência inteira - de seu arrependimento. Mark Forman não é um papel simpático, e Nicholson faz o que pode para que a alta dose de maniqueísmo imposta pelo roteiro não prejudique sua comunicação com o público - não foi à toa que Dustin Hoffman recusou o papel, talvez também para não reviver com Meryl Streep um casamento fracasso como o que viveram em "Kramer x Kramer" (79). Segundo o roteiro, não existe algoz mais fatal para uma relação do que o adultério, mesmo que o tédio, a frutração profissional e a falta de tesão também estejam na equação, e esse quase simplismo acaba sendo o calcanhar de Aquiles do filme.
Com o talento de Ephron em tirar humor das mais trágicas e sérias situações - talento esse que ficaria patente com o sucesso de suas comédias românticas "Sintonia de amor" (93) e "Mensagem pra você" (98) - seria de esperar que "A difícil arte de amar" fosse um tanto menos pessimista. No entanto, como forma de catarse, é inegável que a radiografia da relação estragada entre Rachel e Mark funciona às mil maravilhas. Com diálogos escritos com extrema fluência - característica de Ephron - e interpretados por um elenco de sonhos que inclui ainda Jeff Daniels, Stockard Channing, o cineasta Milos Forman e um estreante Kevin Spacey em uma ponta impagável, o roteiro tem ritmo, consistência e um senso de verdade que somente uma história real que não apela para o sentimentalismo de doenças terminais consegue, o filme de Mike Nichols ainda por cima tem a luxuosa participação da trilha sonora charmosa de Carly Simon, que comenta a história com sua voz inconfundível e delicia o espectador. É ela um dos principais motivos para se assistir ao filme - se é que preciso motivos além de Meryl Streep e Jack Nicholson.
Segundo trabalho de Meryl Streep sob o comando de Mike Nichols e um roteiro de Nora Ephron - o primeiro foi "Silkwood, o retrato de uma coragem" (83), que lhe deu uma indicação ao Oscar - "A difícil arte de amar" é a adaptação de um livro da própria Ephron, que pôs no papel, em forma de ficção, a real história de seu casamento com o jornalista Carl Bernstein, o mesmo que, junto com Bob Woodward, expôs o escândalo Watergate e obrigou a renúncia do presidente Richard Nixon (e foi vivido por Dustin Hoffman no filme "Todos os homens do presidente" (86)). Mais conhecido pela bela canção-tema de Carly Simon, "Coming around again", o filme de Nichols é uma amarga e cínica análise de um relacionamento pouco saudável, que aposta no texto ácido de Ephron e no talento de Streep e Jack Nicholson para transformar o que poderia facilmente se tornar uma longa diatribe contra a instituição do casamento em um drama realista, ainda que com a mordacidade típica da roteirista e a elegância de sempre da direção de Nichols.
Quando o filme começa, a escritora nova-iorquina Rachel Samstat (Meryl Streep) e o jornalista Mark Formn (Jack Nicholson, substituindo Mandy Patinkin depois de dois dias de filmagens) se conhecem no casamento de um amigo em comum. Mesmo já tendo passado por relacionamentos não muito felizes, ambos acabam se apaixonando e, depois de deixar as reservas a respeito do assunto de lado, resolvem também subir ao altar. Como todo casal apaixonado, eles compram uma casa - que mais os estressa do que os deixa felizes, graças à sua interminável reforma - e tentam administrar a relação, já que ele continua trabalhando, mas ela abandonou o emprego para mudar-se com ele para Washington. A familia não demora a aumentar, mas nem mesmo a filha pequena impede Mark de embarcar em um caso extraconjugal que ameaça jogar tudo por terra. Traída, Rachel acaba por perdoar o marido, mas a confiança abalada mostra-se cada vez mais ameaçadora à tranquilidade do casal, especialmente com uma segunda gravidez na jogada.
Não é de surpreender que o roteiro de Ephron, assim como o livro que lhe deu origem, ponha a maior parcela de culpa no fracasso do casamento entre Rachel e Mark no jornalista, uma vez que a trama é contada quase do ponto de vista da personagem de Streep (que, mais uma vez, está soberba), mas é preciso admirar a forma como Nichols tenta fugir da tentação de apontar qualquer dedo, mostrando que em qualquer relação existe dois lados a considerar. Ter Jack Nicholson como a segunda metade do casal não atrapalha em nada, apesar do eterno ar cínico do ator complicar quando seu personagem tenta convencer Rachel - e por contrapartida a audiência inteira - de seu arrependimento. Mark Forman não é um papel simpático, e Nicholson faz o que pode para que a alta dose de maniqueísmo imposta pelo roteiro não prejudique sua comunicação com o público - não foi à toa que Dustin Hoffman recusou o papel, talvez também para não reviver com Meryl Streep um casamento fracasso como o que viveram em "Kramer x Kramer" (79). Segundo o roteiro, não existe algoz mais fatal para uma relação do que o adultério, mesmo que o tédio, a frutração profissional e a falta de tesão também estejam na equação, e esse quase simplismo acaba sendo o calcanhar de Aquiles do filme.
Com o talento de Ephron em tirar humor das mais trágicas e sérias situações - talento esse que ficaria patente com o sucesso de suas comédias românticas "Sintonia de amor" (93) e "Mensagem pra você" (98) - seria de esperar que "A difícil arte de amar" fosse um tanto menos pessimista. No entanto, como forma de catarse, é inegável que a radiografia da relação estragada entre Rachel e Mark funciona às mil maravilhas. Com diálogos escritos com extrema fluência - característica de Ephron - e interpretados por um elenco de sonhos que inclui ainda Jeff Daniels, Stockard Channing, o cineasta Milos Forman e um estreante Kevin Spacey em uma ponta impagável, o roteiro tem ritmo, consistência e um senso de verdade que somente uma história real que não apela para o sentimentalismo de doenças terminais consegue, o filme de Mike Nichols ainda por cima tem a luxuosa participação da trilha sonora charmosa de Carly Simon, que comenta a história com sua voz inconfundível e delicia o espectador. É ela um dos principais motivos para se assistir ao filme - se é que preciso motivos além de Meryl Streep e Jack Nicholson.
SILKWOOD, O RETRATO DE UMA CORAGEM
SILKWOOD, O RETRATO DE UMA CORAGEM (Silkwood, 1983, ABC Motion Picture, 131min) Direção: Mike Nichols. Roteiro: Nora Ephron, Alice Arlen. Fotografia: Miroslav Ondricek. Montagem: Sam O'Steen. Música: Georges Delerue. Figurino: Ann Roth. Direção de arte/cenários: Patrizia Von Brandestein/Richard James. Produção executiva: Larry Cano, Buzz Hirsch. Produção: Michael Hausman, Mike Nichols. Elenco: Meryl Streep, Kurt Russell, Cher, Craig T. Nelson, Ron Silver, Diana Scarwid, David Strathairn, Fred Ward, Bruce McGill, Will Patton Estreia: 14/12/83
5 indicações ao Oscar: Diretor (Mike Nichols), Atriz (Meryl Streep), Atriz Coadjuvante (Cher), Roteiro Original, Montagem
Vencedor do Golden Globe de Melhor Atriz Coadjuvante (Cher)
Ao contrário do que acontece no Brasil, nos EUA o negócio dos sindicatos profissionais é coisa bastante séria, a ponto de nomes como Jimmy Hoffa - presidente do sindicato dos caminhoneiros - e Norma Rae - nome fictício de uma moradora do sul do país que tornou-se líder sindicalista da indústria têxtil - tenham servido de inspiração para filmes estrelados por gente graúda (Jack Nicholson no primeiro e Sally Field, no papel que lhe deu seu primeiro Oscar, no segundo). Nos anos 80, quando a paranoia nuclear estava no ar, ameaçando a população com uma tragédia invisível - e que deu origem a uma espécie de ciclo que inclui o polêmico "Síndrome da China" (79), estrelado por Michael Douglas e Jane Fonda- o cineasta Mike Nichols resolveu juntar os dois temas em um mesmo filme, baseado em um história real ocorrida meros nove anos antes. "Silkwood, o retrato de uma coragem", estrelado por Meryl Streep - e que foi o primeiro roteiro da futuramente célebre Nora Ephron a chegar às telas - concorreu a cinco Oscar, incluindo diretor e atriz (a quinta indicação de Streep, já então duplamente premiada com a estatueta), mas teve o azar de concorrer com o furacão "Laços de ternura" e saiu da festa com as mãos abanando. Isso não diminiu sua importância, sua qualidade e, melhor ainda, sua força como denúncia e drama.
Quem torce o nariz para filmes sobre coisas como sindicatos, no entanto, não precisa se preocupar. O roteiro de Ephron - co-escrito com Alice Arlen e também indicado ao Oscar - não se detém apenas na trajetória de sua protagonista Karen Silkwood rumo à conscientização política e social, mas abre bastante espaço também para seus dramas pessoais, que incluem um casamento falido, a distância que mantém dos três filhos e os relacionamentos com o colega de trabalho Drew (um jovem Kurt Russell) - com quem mantém um romance - e a amiga Dolly (a cantora Cher, começando a ser respeitada como atriz em papel que lhe rendeu um Golden Globe de coadjuvante), além de dar ênfase especial à sua luta para denunciar a maneira torpe com que a indústria de processamento de plutônio de sua cidade natal, Oklahoma, escondia de seus funcionários o enorme perigo de contaminação que eles corriam manipulando o material. Equilibrando essas duas pontas - a familiar e a profissional - é que o roteiro se torna especial, desviando-se do caminho fácil do sensacionalismo e conquistando o espectador pelo desenho de seus personagens.
Mike Nichols, um cineasta acostumado a apontar suas lentes para personagens complexos e arrancar de seus atores desempenhos nunca aquém de fabulosos, conta a história de Karen Silkwood em seu próprio ritmo, convidando aos poucos a audiência a estabelecer intimidade com sua protagonista, uma mulher comum, com um casamento fracassado no currículo, um relacionamento amoroso que é motivo de falatório entre seus colegas de trabalho e uma amizade com uma lésbica que é apaixonada por ela. Sua vida dá uma guinada quando ela é acusada de contaminar seu local de trabalho (uma usina de tratamento de plutônio) para conseguir um fim-de-semana de folga, o que desencadeia uma onda inesperada de contaminação que atinge uma funcionária mais idosa e a ela própria. Com a ajuda de um sindicato - de quem se torna líder, para desgosto de seu namorado - ela parte para o ataque, com planos de denunciar o caso. Sua nova atitude, porém, causa polêmica entre seus companheiros de trabalho, que sabem que o fechamento da indústria também os levaria ao desemprego.
"Silkwood" é um drama com a cara de sua época: engajado, relevante e realizado com paixão. Se Meryl Streep dispensa qualquer comentário com mais uma interpretação impecável, seus coadjuvantes merecem igual respeito. Kurt Russell injeta personalidade a um personagem que poderia ficar em um melancólico segundo plano em mãos menos competentes - a cena em que ele percebe que está perdendo Karen para a militância e quiçá para o líder sindical vivido por Ron Silver é um exemplo da discrição eficaz de seu desempenho. E Cher, até então conhecida como cantora, sai-se muito bem como Dolly, a amiga homossexual da protagonista, que é responsável por um dos momentos mais ternos do filme. Em pouco tempo, ela se tornaria uma atriz respeitada, a ponto de levar um Oscar pela comédia romântica "Feitiço da lua" e aqui, ela mostra que sua persona excêntrica em nada atrapalha seu talento dramático. Ela é um motivo a mais para se assistir a "Silkwood", que, além dela, apresenta uma verdadeira e revoltante história real. Merece uma conferida.
5 indicações ao Oscar: Diretor (Mike Nichols), Atriz (Meryl Streep), Atriz Coadjuvante (Cher), Roteiro Original, Montagem
Vencedor do Golden Globe de Melhor Atriz Coadjuvante (Cher)
Ao contrário do que acontece no Brasil, nos EUA o negócio dos sindicatos profissionais é coisa bastante séria, a ponto de nomes como Jimmy Hoffa - presidente do sindicato dos caminhoneiros - e Norma Rae - nome fictício de uma moradora do sul do país que tornou-se líder sindicalista da indústria têxtil - tenham servido de inspiração para filmes estrelados por gente graúda (Jack Nicholson no primeiro e Sally Field, no papel que lhe deu seu primeiro Oscar, no segundo). Nos anos 80, quando a paranoia nuclear estava no ar, ameaçando a população com uma tragédia invisível - e que deu origem a uma espécie de ciclo que inclui o polêmico "Síndrome da China" (79), estrelado por Michael Douglas e Jane Fonda- o cineasta Mike Nichols resolveu juntar os dois temas em um mesmo filme, baseado em um história real ocorrida meros nove anos antes. "Silkwood, o retrato de uma coragem", estrelado por Meryl Streep - e que foi o primeiro roteiro da futuramente célebre Nora Ephron a chegar às telas - concorreu a cinco Oscar, incluindo diretor e atriz (a quinta indicação de Streep, já então duplamente premiada com a estatueta), mas teve o azar de concorrer com o furacão "Laços de ternura" e saiu da festa com as mãos abanando. Isso não diminiu sua importância, sua qualidade e, melhor ainda, sua força como denúncia e drama.
Quem torce o nariz para filmes sobre coisas como sindicatos, no entanto, não precisa se preocupar. O roteiro de Ephron - co-escrito com Alice Arlen e também indicado ao Oscar - não se detém apenas na trajetória de sua protagonista Karen Silkwood rumo à conscientização política e social, mas abre bastante espaço também para seus dramas pessoais, que incluem um casamento falido, a distância que mantém dos três filhos e os relacionamentos com o colega de trabalho Drew (um jovem Kurt Russell) - com quem mantém um romance - e a amiga Dolly (a cantora Cher, começando a ser respeitada como atriz em papel que lhe rendeu um Golden Globe de coadjuvante), além de dar ênfase especial à sua luta para denunciar a maneira torpe com que a indústria de processamento de plutônio de sua cidade natal, Oklahoma, escondia de seus funcionários o enorme perigo de contaminação que eles corriam manipulando o material. Equilibrando essas duas pontas - a familiar e a profissional - é que o roteiro se torna especial, desviando-se do caminho fácil do sensacionalismo e conquistando o espectador pelo desenho de seus personagens.
Mike Nichols, um cineasta acostumado a apontar suas lentes para personagens complexos e arrancar de seus atores desempenhos nunca aquém de fabulosos, conta a história de Karen Silkwood em seu próprio ritmo, convidando aos poucos a audiência a estabelecer intimidade com sua protagonista, uma mulher comum, com um casamento fracassado no currículo, um relacionamento amoroso que é motivo de falatório entre seus colegas de trabalho e uma amizade com uma lésbica que é apaixonada por ela. Sua vida dá uma guinada quando ela é acusada de contaminar seu local de trabalho (uma usina de tratamento de plutônio) para conseguir um fim-de-semana de folga, o que desencadeia uma onda inesperada de contaminação que atinge uma funcionária mais idosa e a ela própria. Com a ajuda de um sindicato - de quem se torna líder, para desgosto de seu namorado - ela parte para o ataque, com planos de denunciar o caso. Sua nova atitude, porém, causa polêmica entre seus companheiros de trabalho, que sabem que o fechamento da indústria também os levaria ao desemprego.
"Silkwood" é um drama com a cara de sua época: engajado, relevante e realizado com paixão. Se Meryl Streep dispensa qualquer comentário com mais uma interpretação impecável, seus coadjuvantes merecem igual respeito. Kurt Russell injeta personalidade a um personagem que poderia ficar em um melancólico segundo plano em mãos menos competentes - a cena em que ele percebe que está perdendo Karen para a militância e quiçá para o líder sindical vivido por Ron Silver é um exemplo da discrição eficaz de seu desempenho. E Cher, até então conhecida como cantora, sai-se muito bem como Dolly, a amiga homossexual da protagonista, que é responsável por um dos momentos mais ternos do filme. Em pouco tempo, ela se tornaria uma atriz respeitada, a ponto de levar um Oscar pela comédia romântica "Feitiço da lua" e aqui, ela mostra que sua persona excêntrica em nada atrapalha seu talento dramático. Ela é um motivo a mais para se assistir a "Silkwood", que, além dela, apresenta uma verdadeira e revoltante história real. Merece uma conferida.
quarta-feira
QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF?
QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF? (Who's afraid of Virginia Woolf?, 1966, Warner Bros, 131min) Direção: Mike Nichols. Roteiro: Ernest Lehman, peça teatral de Edward Albee. Fotografia: Haskel Wexler. Montagem: Sam O'Steen. Música: Alex North. Figurino: Irene Sharaff. Direção de Arte/Cenários: Richard Sylbert/George James Hopkins. Produção: Ernest Lehman. Elenco: Elizabeth Taylor, Richard Burton, George Segal, Sandy Dennis. Estreia: 21/6/66
13 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (Mike Nichols), Ator (Richard Burton), Atriz (Elizabeth Taylor), Ator Coadjuvante (George Segal), Atriz Coadjuvante (Sandy Dennis), Roteiro Adaptado, Fotografia em P&B, Montagem,Trilha Sonora Original, Figurino em P&B, Direção em Arte/Cenários em P&B, Som
Vencedor de 5 Oscar: Melhor Atriz (Elizabeth Taylor), Atriz Coadjuvante (Sandy Dennis), Fotografia em P&B, Figurino em P&B, Direção de Arte/Cenários em P&B
Quando se diz que um filme arrebatou 13 indicações ao Oscar a primeira imagem que vem à cabeça é de uma superprodução épica, ao estilo "Lawrence da Arábia" e "...E o vento levou", com centenas de figurantes, efeitos visuais revolucionários e histórias maiores que a vida. Uma prova da falácia desse pensamento é "Quem tem medo de Virginia Woolf?", adaptação da peça teatral de Edward Albee que chegou à cerimônia de entrega do Oscar aos melhores de 1966 cheio de moral e repleto de possibilidades de vitória. Intimista e preocupado exclusivamente com a psicologia dos personagens, o filme de estreia de Mike Nichols quebrou paradigmas sociais e até mesmo de classificação etária junto ao público norte-americano: foi ele quem inaugurou o que posteriormente o selo NC-17, que estipula que menores de 17 anos só podem entrar nas salas de exibição acompanhados de um responsável.
Exagero? Talvez hoje em dia, estando o público acostumado com uma dieta de produções onde a vulgaridade é moeda corrente. Em 1966, porém, a história era bem outra. Ainda sofrendo com as restrições temáticas impostas pelo famigerado Código Hayes, o cinema americano raramente tratava de assuntos considerados tabus, como adultério - principalmente quando o tema era tratado de forma tão rude e agressiva quanto no texto de Albee, que usa e abusa de termos chulos e apresenta como protagonistas um casal de meia-idade a anos-luz de distância do que se convencionava no cinemão de então. Interpretados pelo então casal de verdade Elizabeth Taylor e Richard Burton em seu quarto trabalho juntos, Martha e George são assustadoramente reais e o retrato mais chocante de uma relação doentia.
Depois de uma reunião social em um sábado à noite, o casal Martha e George recebe, em sua casa, os jovens Nick (George Segal em papel recusado por Robert Redford) e Honey (Sandy Dennis). Nick é um ambicioso professor de Biologia por quem Martha nutre uma forte atração e aos poucos começa a perceber que seus anfitriões tem uma maneira muito particular de convivência: professor de História na universidade onde o pai de Martha é reitor, George mantém com ela uma relação que alterna momentos de enfado com outros de extrema agressividade verbal. Conforme a noite avança e todos vão ficando mais e mais calibrados de álcool, acusações de todos os lados começam a surgir, acompanhadas de ressentimentos e revelações vexaminosas. Quando o filho adolescente do casal torna-se o assunto, então, a truculência atinge seu mais alto grau.
É preciso paciência com "Quem tem medo de Virginia Woolf?". Centrado quase que unicamente nos diálogos fortes e cadenciados de Edward Albee, o filme de Nichols tem um ritmo próprio, intercalando momentos de alta combustão com cenas mais tranquilas, fotografadas em exuberante preto-e-branco por Haskel Wexler que exploram a melancolia de seus personagens. O texto da peça - seguido à risca pelo cineasta, que creditou Ernest Lehman como roteirista mas não utilizou sua adaptação - é a força motriz do filme, fato que não passou incólume a seus intérpretes, que dão corpo e alma em suas atuações. Enquanto Burton está em seu melhor momento da carreira e George Segal constrói seu Nick com a sutileza apropriada, porém, Sandy Dennis força a caricatura com sua Honey, que frequentemente parece carregar nas tintas - não deixa de ser irônico que Dennis tenha levado o Oscar de coadjuvante, enquanto os intérpretes masculinos tenham ficado apenas com indicações.
Mas, se "Virginia Woolf" tem uma cara, ela é Elizabeth Taylor. Mais gorda que o habitual e desprovida da vaidade que a marcaram como uma das mais belas atrizes de Hollywood, ela calou de vez a boca dos detratores - que debitaram seu Oscar por "Disque Butterfiel 8" a seus problemas de saúde - com uma atuação fabulosa como a amarga e bêbada Martha, que não hesita em trair o marido diante de seus olhos e tem como combustível a virulência e a crueldade verbal. Merecedora vencedora do Oscar de melhor atriz Taylor - que recebeu mais de 1 milhão de dólares por seu trabalho - mostrou que, por trás de todas as polêmicas que cercavam sua vida pessoal, ela era uma atriz de primeira grandeza.
13 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (Mike Nichols), Ator (Richard Burton), Atriz (Elizabeth Taylor), Ator Coadjuvante (George Segal), Atriz Coadjuvante (Sandy Dennis), Roteiro Adaptado, Fotografia em P&B, Montagem,Trilha Sonora Original, Figurino em P&B, Direção em Arte/Cenários em P&B, Som
Vencedor de 5 Oscar: Melhor Atriz (Elizabeth Taylor), Atriz Coadjuvante (Sandy Dennis), Fotografia em P&B, Figurino em P&B, Direção de Arte/Cenários em P&B
Quando se diz que um filme arrebatou 13 indicações ao Oscar a primeira imagem que vem à cabeça é de uma superprodução épica, ao estilo "Lawrence da Arábia" e "...E o vento levou", com centenas de figurantes, efeitos visuais revolucionários e histórias maiores que a vida. Uma prova da falácia desse pensamento é "Quem tem medo de Virginia Woolf?", adaptação da peça teatral de Edward Albee que chegou à cerimônia de entrega do Oscar aos melhores de 1966 cheio de moral e repleto de possibilidades de vitória. Intimista e preocupado exclusivamente com a psicologia dos personagens, o filme de estreia de Mike Nichols quebrou paradigmas sociais e até mesmo de classificação etária junto ao público norte-americano: foi ele quem inaugurou o que posteriormente o selo NC-17, que estipula que menores de 17 anos só podem entrar nas salas de exibição acompanhados de um responsável.
Exagero? Talvez hoje em dia, estando o público acostumado com uma dieta de produções onde a vulgaridade é moeda corrente. Em 1966, porém, a história era bem outra. Ainda sofrendo com as restrições temáticas impostas pelo famigerado Código Hayes, o cinema americano raramente tratava de assuntos considerados tabus, como adultério - principalmente quando o tema era tratado de forma tão rude e agressiva quanto no texto de Albee, que usa e abusa de termos chulos e apresenta como protagonistas um casal de meia-idade a anos-luz de distância do que se convencionava no cinemão de então. Interpretados pelo então casal de verdade Elizabeth Taylor e Richard Burton em seu quarto trabalho juntos, Martha e George são assustadoramente reais e o retrato mais chocante de uma relação doentia.
Depois de uma reunião social em um sábado à noite, o casal Martha e George recebe, em sua casa, os jovens Nick (George Segal em papel recusado por Robert Redford) e Honey (Sandy Dennis). Nick é um ambicioso professor de Biologia por quem Martha nutre uma forte atração e aos poucos começa a perceber que seus anfitriões tem uma maneira muito particular de convivência: professor de História na universidade onde o pai de Martha é reitor, George mantém com ela uma relação que alterna momentos de enfado com outros de extrema agressividade verbal. Conforme a noite avança e todos vão ficando mais e mais calibrados de álcool, acusações de todos os lados começam a surgir, acompanhadas de ressentimentos e revelações vexaminosas. Quando o filho adolescente do casal torna-se o assunto, então, a truculência atinge seu mais alto grau.
É preciso paciência com "Quem tem medo de Virginia Woolf?". Centrado quase que unicamente nos diálogos fortes e cadenciados de Edward Albee, o filme de Nichols tem um ritmo próprio, intercalando momentos de alta combustão com cenas mais tranquilas, fotografadas em exuberante preto-e-branco por Haskel Wexler que exploram a melancolia de seus personagens. O texto da peça - seguido à risca pelo cineasta, que creditou Ernest Lehman como roteirista mas não utilizou sua adaptação - é a força motriz do filme, fato que não passou incólume a seus intérpretes, que dão corpo e alma em suas atuações. Enquanto Burton está em seu melhor momento da carreira e George Segal constrói seu Nick com a sutileza apropriada, porém, Sandy Dennis força a caricatura com sua Honey, que frequentemente parece carregar nas tintas - não deixa de ser irônico que Dennis tenha levado o Oscar de coadjuvante, enquanto os intérpretes masculinos tenham ficado apenas com indicações.
Mas, se "Virginia Woolf" tem uma cara, ela é Elizabeth Taylor. Mais gorda que o habitual e desprovida da vaidade que a marcaram como uma das mais belas atrizes de Hollywood, ela calou de vez a boca dos detratores - que debitaram seu Oscar por "Disque Butterfiel 8" a seus problemas de saúde - com uma atuação fabulosa como a amarga e bêbada Martha, que não hesita em trair o marido diante de seus olhos e tem como combustível a virulência e a crueldade verbal. Merecedora vencedora do Oscar de melhor atriz Taylor - que recebeu mais de 1 milhão de dólares por seu trabalho - mostrou que, por trás de todas as polêmicas que cercavam sua vida pessoal, ela era uma atriz de primeira grandeza.
quinta-feira
CLOSER, PERTO DEMAIS
CLOSER, PERTO DEMAIS (Closer, 2004, Columbia TriStar, 104min) Direção: Mike Nichols. Roteiro: Patrick Marber, peça teatral de sua autoria. Fotografia: Stephen Goldblatt. Montagem: John Bloom, Antonia Van Drimmelen. Figurino: Ann Roth. Direção de arte/cenários: Tim Hatley/John Bush. Produção executiva: Celia D. Costas, Robert Fox, Scott Rudin. Produção: Cary Brokaw, John Calley, Mike Nichols. Elenco: Julia Roberts, Jude Law, Clive Owen, Natalie Portman. Estreia: 03/12/04
2 indicações ao Oscar: Ator Coadjuvante (Clive Owen), Atriz Coadjuvante (Natalie Portman)
Vencedor de 2 Golden Globes: Ator Coadjuvante (Clive Owen), Atriz Coadjuvante (Natalie Portman)
Qualquer drama romântico/sensual forjado por Hollywood frequentemente esbarra na superficialidade, na vulgaridade e muitas vezes no sentimentalismo barato. Quando acontece um filme como "Closer - perto demais", então, o choque é nunca menos do que desconcertante: forte, contundente, real e longe de qualquer concessão ao tradicional final feliz, o filme de Mike Nichols - diretor do aclamado e igualmente poderoso "Quem tem medo de Virginia Woolf?" - é um dos dramas adultos mais impactantes realizados pelo cinema americano no início do século XXI e um dos raros a mostrar relações humanas vividas por personagens que realmente parecem humanos e não criações fictícias.
Na verdade, grande parte dos méritos de "Closer" deve ser creditado ao roteirista Patrick Marber, também autor da peça teatral que deu origem ao filme (e que chegou a ser montada no Brasil). São de Marber os diálogos corantes, ácidos e secos declamados pelos atores - todos eles em grande momento de suas carreiras - e é de sua autoria a trama, que apresenta personagens vulneráveis em seus desejos e fortes em suas obsessões. Com o texto forte em mãos, coube ao veterano Mike Nichols conduzir a história sem ceder
ao lugar-comum. A edição jamais é previsível, a fotografia de Stephen Goldblatt é elegante e a trilha sonora é discreta mas fundamental. Nem mesmo as frases menos sutis do roteiro soam grosseiras e sim reais, graças principalmente à empatia das personagens e das situações propostas.
2 indicações ao Oscar: Ator Coadjuvante (Clive Owen), Atriz Coadjuvante (Natalie Portman)
Vencedor de 2 Golden Globes: Ator Coadjuvante (Clive Owen), Atriz Coadjuvante (Natalie Portman)
Qualquer drama romântico/sensual forjado por Hollywood frequentemente esbarra na superficialidade, na vulgaridade e muitas vezes no sentimentalismo barato. Quando acontece um filme como "Closer - perto demais", então, o choque é nunca menos do que desconcertante: forte, contundente, real e longe de qualquer concessão ao tradicional final feliz, o filme de Mike Nichols - diretor do aclamado e igualmente poderoso "Quem tem medo de Virginia Woolf?" - é um dos dramas adultos mais impactantes realizados pelo cinema americano no início do século XXI e um dos raros a mostrar relações humanas vividas por personagens que realmente parecem humanos e não criações fictícias.
Sem delongas e conversas desnecessárias, o público é jogado diretamente na trama logo nos primeiros acordes da belíssima canção "The blower's daughter", do inglês Damien Rice - que de certa forma é a quinta personagem da história de amor, traição, vingança e sexo que se desenrolará a partir dali: recém chegada a Londres, a bela e sensual americana Alice (interpretada com fúria e entrega por uma Natalie Portman irrepreeensível) conhece e se apaixona pelo jornalista e aspirante a escritor Daniel Woolf (Jude Law, deixando de lado a persona sexy e quase arrogante com que vinha conduzindo sua carreira até então). O romance dos dois poderia correr sempre às mil maravilhas se o rapaz não se sentisse atraído pela fotógrafa Ana (Julia Roberts em uma performance corajosa e desprovida de glamour), que, mesmo envolvida por ele inicia um romance com o dermatologista Larry (Clive Owen no grande papel de sua carreira). Durante alguns anos os destinos dos quatro irão permanecer ligados em uma corrente de desejo, dependencia e até amor verdadeiro.
Na verdade, grande parte dos méritos de "Closer" deve ser creditado ao roteirista Patrick Marber, também autor da peça teatral que deu origem ao filme (e que chegou a ser montada no Brasil). São de Marber os diálogos corantes, ácidos e secos declamados pelos atores - todos eles em grande momento de suas carreiras - e é de sua autoria a trama, que apresenta personagens vulneráveis em seus desejos e fortes em suas obsessões. Com o texto forte em mãos, coube ao veterano Mike Nichols conduzir a história sem ceder
ao lugar-comum. A edição jamais é previsível, a fotografia de Stephen Goldblatt é elegante e a trilha sonora é discreta mas fundamental. Nem mesmo as frases menos sutis do roteiro soam grosseiras e sim reais, graças principalmente à empatia das personagens e das situações propostas.
Dolorosamente real, "Closer" é um filme para se ver e rever, nem que seja para ter a convicção de que nenhum relacionamento é um mar de rosas e que qualquer pessoa, por mais amor que julgue estar sentindo ainda é apenas uma pessoa em busca de algo novo, de mais felicidade e mais amor. Dói, mas é necessário.
sexta-feira
UMA SECRETÁRIA DE FUTURO
UMA SECRETÁRIA DE FUTURO (Working girl, 1988, 20th Century Fox, 113min) Direção: Mike Nichols. Roteiro: Kevin Wade. Fotografia: Michael Ballhaus. Montagem: Sam O'Steen. Figurino: Ann Roth. Direção de arte/cenários: Patrizia Von Brandenstein/George DeTitta. Casting: Juliet Taylor. Produção executiva: Robert Greenhut, Laurence Mark. Produção: Douglas Wick. Elenco: Melanie Griffith, Harrison Ford, Sigourney Weaver, Joan Cusack, Alec Baldwin, Kevin Spacey, Philip Bosco, Oliver Platt, Olympia Dukakis, David Duchovny. Estreia: 20/12/88
6 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (Mike Nichols), Atriz (Melanie Griffith), Atriz Coadjuvante (Joan Cusack, Sigourney Weaver), Canção ("Let the river run")
Vencedor do Oscar de Melhor Canção Original ("Let the river run")
Vencedor de 4 Golden Globes: Melhor Filme Comédia/Musical, Atriz Comédia/Musical (Melanie Griffith), Atriz Coadjuvante (Sigourney Weaver), Canção Original ("Let the river run")
Tess McGill é uma trintona que mora em Nova Jersey e trabalha como secretária na ilha de Manhattan. Com dificuldades de manter-se nos empregos que arruma, ela vive um romance fogo brando com o seu eterno namorado Mick (Alec Baldwin) e passa suas noites frequentando festinhas suburbanas ao lado da melhor amiga, Cyn (Joan Cusack). No entanto, sua sorte muda quando ela começa a trabalhar no escritório de Kathryn Parker (Sigourney Weaver), que divide com ela a ambição de subir na vida. Tess McGill não é um exemplo ético. Tess McGill é a protagonista de "Uma secretária de futuro", a mais bem-sucedida comédia romântica do diretor Mike Nichols desde "A primeira noite de um homem". Cotada para ser vivida por Michelle Pfeiffer, Geena Davis, Carrie Fisher, Kim Basinger, Kathleen Turner, Debra Winger, Diane Lane e Sarah Jessica Parker, ela acabou nas mãos de Melanie Griffith, que aproveitou a chance com tudo e acabou finalista ao Oscar de melhor atriz.
Quando "Uma secretária de futuro" começa, Tess McGill está saindo de um emprego insatisfatório e começando a trabalhar como secretária de Kathryn, uma mulher linda e bem-sucedida que não hesita em roubar descaradamente uma ideia de Tess, envolvendo a compra de uma emissora de rádio. Ao descobrir a traição da chefe - quando ela fica fora da cidade devido a um acidente de esqui - a ambiciosa secretária resolve dar a volta por cima. Passando-se por executiva, ela conta com a ajuda do atraente Jack Trainer(Harrison Ford) para conquistar seu lugar ao sol. Sua farsa, no entanto, corre o risco de ser desmascarada quando ela descobre que justamente que o homem por quem está perdidamente apaixonada é também amante de sua patroa.
"Uma secretária de futuro" não é exatamente um filme brilhante, como alguns dos filmes assinados por Mike Nichols (em especial "A primeira noite" e "Closer, perto demais"). Mas tem um charme oitentista que conquista desde os créditos de abertura (ao som da canção de Carly Simon vencedora do Oscar) até o visual exagerado tanto da protagonista em suas primeiras cenas quanto das coadjuvantes - é engraçado reparar na clara divisão entre o kitsch anos 80 do figurino e dos penteados das suburbanas secretárias e do requinte clean da classe "superior". Sigourney Weaver, em especial, esbanja beleza e classe, metida em vestidos caríssimos e vivendo em um apartamento chique, enquanto Tess e suas amigas habitam um mundo quase escuro - matizado apenas pela maquiagem sempre acima do básico.
"Uma secretária de futuro" é também o auge da carreira de Melanie Griffith, uma atriz sem maiores talentos dramáticos que, depois de uma vida regada a drogas e álcool, se reergueu artisticamente aqui. Depois de algumas escolhas equivocadas posteriores - a saber "A fogueira das vaidades", de Brian de Palma e "Uma luz na escuridão", ao lado de Michael Douglas - ela voltou a seu quase anonimato, sendo notícia quase sempre devido a seu casamento com o ator espanhol Antonio Banderas. Na pele de Tess, no entanto, Griffith - filha da atriz Tippi Hedren, de "Os pássaros" - brilha, em uma atuação discreta, eficiente e envolvente. Por incrível que pareça é ela que dá luz ao filme, mesmo dividindo cenas com as sensacionais Weaver e Joan Cusack - ambas indicadas ao Oscar de coadjuvante.
"Uma secretária de futuro" é a cara de seu tempo, pro bem e pro mal. Lançado em um momento em que as mulheres buscavam desesperadamente seu espaço no mercado de trabalho e o movimento yuppie estava em seu apogeu - é dessa época a famosa frase de Gordon Gekko em "Wall Street" que dizia que "ganância é bom!" -, foi o filme certo no momento certo. Daí talvez sua reputação um tanto exagerada - inclusive como finalista ao Oscar de melhor filme. É uma comédia romântica interessante - ainda que não seja exatamente uma comédia rasgada - e que retrata com ironia e condescendência um importante momento social e econômico americano, sem apelar para lições de moral. Divertido e simpático! O que mais se espera de um filme assim?
PS - E de quebra, "Uma secretária de futuro" conta com uma participação pequena de Kevin Spacey, no início de uma brilhante carreira.
A PRIMEIRA NOITE DE UM HOMEM
A PRIMEIRA NOITE DE UM HOMEM (The graduate, 1967, Universal Pictures, 105min) Direção: Mike Nichols. Roteiro: Calder Willingham, Buck Henry, baseado no romance de Charles Webb. Fotografia: Robert Surtess. Montagem: Sam O'Steen. Música: Dave Grusin, canções de Paul Simon. Produção: Lawrence Turman. Elenco: Anne Bancroft, Dustin Hoffman, Katharine Ross, William Daniels, Elizabeth Wilson, Murray Hamilton, Brian Avery. Estreia: 21/12/67
7 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Diretor (Mike Nichols), Ator (Dustin Hoffman), Atriz (Anne Bancroft), Atriz Coadjuvante (Katharine Ross), Roteiro Adaptado, Fotografia
Vencedor do Oscar de Melhor Diretor (Mike Nichols)
Vencedor de 5 Golden Globes: Melhor Filme Comédia/Musical, Diretor (Mike Nichols), Atriz Comédia/Musical (Anne Bancroft), Most Promising Newcomer Male (Dustin Hoffman), Most Promising Newcomer Female (Katharine Ross)
Não é difícil entender os motivos que levaram "A primeira noite de um homem" a tornar-se um dos filmes de maior sucesso de sua época e um dos mais influentes dramas geracionais de Hollywood. Quando o filme foi lançado, em 1967, a juventude americana encontrava-se em um estado que abandonava a letargia dos anos pós-guerra e começava a questionar seu país - envolvido em uma muito mal-explicada guerra no Vietnã - sua estrutura familiar e o estado social em que se encontravam - vale lembrar que Martin Luther King ainda vivia e liderava movimentos em prol dos direitos civis. Os jovens que estavam começando a entrar na faixa dos vinte anos sentiam-se sufocados pelas expectativas dos pais e perdidos quanto a um futuro que parecia cada vez mais incerto. Sufocado e perdido também estava Benjamin Braddock, o protagonista do livro de Carl Webb e do filme de Mike Nichols. Não tinha como não haver uma identificação imediata.
Ligeiramente diferente de sua versão literária - um pouco menos passiva - a personificação de Benjamin Braddock no filme de Nichols ainda assim mantém sua essência confusa e sem norte. Quando a história começa, o jovem Braddock (às vésperas de completar 21 anos) está de volta à casa dos pais, depois de formar-se na universidade. Sem saber o que fazer com seu futuro e nada sutilmente cobrado pela família e pelos amigos dela - um grupo de bem-sucedidos homens de negócios e mulheres que frequentam a alta sociedade - Benjamin fecha-se cada vez mais em si mesmo. Sua vida dá uma virada quando ele é seduzido pela Mrs. Robinson do título da canção de Paul Simon. Vivida magistralmente por Anne Bancroft, a sexy mulher mais velha, com idade para ser sua mãe lhe apresenta aos prazeres do sexo, que lhe foram negados por um casamento sem amor e uma maternidade indesejada. Absolutamente não-romântica, a experiente e prática esposa de um dos amigos de seu pai parece ser exatamente o que o jovem precisa em seus momentos de descoberta do mundo, mas acaba se tornando uma pedra em seu sapato quando ele conhece e se apaixona pela jovem Elaine (Katharine Ross em papel oferecido a Natalie Wood e para o qual foram testadas Candice Bergen e Sally Field). Doce e delicada, a bela jovem também se apaixona por ele, mas o romance esbarra em um grave problema: ela é filha da sedutora sra. Robinson.
Dustin Hoffman já tinha quase 30 anos de idade quando interpretou Benjamin Braddock, de apenas 21. Isso não o impediu, no entanto, de criar uma das personagens mais interessantes de sua carreira, um jovem inseguro e com uma dose de inocência e romantismo que ia de encontro à praticidade e o cinismo de sua amante. A atuação de Anne Bancroft é antológica, equilibrando genialmente a amargura de uma mulher cuja vida não seguiu o rumo sonhado com uma certa dose de egoísmo. A sra. Robinson não tem apenas ciúme da relação da filha com Benjamin e sim considera o rapaz indigno de ficar com ela. A complexidade da personagem encontra em Bancroft a atriz perfeita, o que não dá margem a qualquer dúvida sobre o acerto em sua escalação para o papel, uma vez que ela era apenas seis anos mais velha que Hoffman. É impossível imaginar alguém melhor, mais inteligente e mais sensível - e isso que inúmeras atrizes foram sondadas e/ou cotadas para vivê-la, nomes que iam de Jeanne Moreau e Ava Gardner até a Doris Day e Judy Garland. A química entre os dois protagonistas é preciosa e as cenas inicias de sua conquista são de figurar em qualquer antologia de diálogos geniais da história do cinema. Unidos à bela trilha sonora - que apresenta as clássicas instântaneas "Mrs. Robinson" e "The sound of silence" - e a um elenco coadjuvante impecável (onde até mesmo um jovem Richard Dreyfuss faz uma figuração de luxo), Hoffman e Bancroft elevam o filme a um patamar acima do corriqueiro.
"A primeira noite de um homem" é bem mais profundo do que mostra em sua superfície. Em um primeiro momento, é apenas a história do despertar de um homem em relação à sua sexualidade e ao amor. No entanto, como o próprio título original - a graduação, em bom português - sugere, fala sobre acordar para a vida, para um caminho que talvez não seja o mais seguro, mas ainda assim, é o que foi escolhido e não pré-determinado. Com seu jeito loser de ser, Dustin Hoffman é a perfeita encarnação de um rapaz abismado com o mundo à sua volta, que não sabe caminhar com as próprias pernas sem que alguém o empurre e que, de repente, nota que optar pelo que deseja é o caminho certo, mesmo que não saiba como agir depois de fazer suas escolhas. Nem Warren Beatty, nem Jack Nicholson nem Robert Redford - todos cotados para o papel - fariam melhor.
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