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sábado

O ESCORPIÃO DE JADE


O ESCORPIÃO DE JADE (The curse of the Jade Scorpion, 2001, Dreamworks Pictures/Gravier Productions, 113min) Direção e roteiro: Woody Allen. Fotografia: Fei Zhao. Montagem: Alisa Lepselter. Figurino: Suzanne McCabe. Direção de arte/cenários: Santo Loquasto/Jessica Lanier. Produção executiva: Stephen Tenenbaum. Produção: Letty Aronson. Elenco: Woody Allen, Helen Hunt, Dan Ayckroyd, Charlize Theron, Wallace Shawn, Elizabeth Berkley, David Ogden Stiers. Estreia: 05/8/2001 (Hollywood Film Festival)

Nova York, 1940. CW Briggs trabalha há dezesseis anos como investigador em uma agência de seguros, e é considerado um dos melhores do ramo por, segundo gosta de afirmar, ter a mente criminosa necessária para o trabalho. Arraigado a seus métodos clássicos, Briggs vê em Betty Ann Fitzgerald, a mais nova contratada do escritório, uma ameaça à sua estabilidade profissional: cheia de ideias para renovar o ambiente, ela não faz a menor questão de esconder sua antipatia gratuita pelo veterano colega. A relação de total antagonismo entre os dois não é desconhecida pelos outros empregados, ao contrário do relacionamento secreto entre Betty Ann e seu chefe, Chris Magruder - que há tempos promete abandonar a família para assumir o novo relacionamento. Ambos frustrados - por motivos diferentes - e necessitados de momentos de diversão, os dois aceitam o convite para a apresentação de um mágico em uma casa noturna e tem suas rotinas transformadas: hipnotizados pelo misterioso Voltan, eles divertem a plateia ao se revelarem apaixonados quando em transe - e, à sua revelia e sem o conhecimento de mais ninguém, passam, a partir de então, a cometer, sob o comando do mago, uma série de roubos de joias que podem colocá-los em sérios problemas com a justiça. Além disso, tal situação acaba os aproximando mais do que gostariam de admitir.

Lançado em 2001 e distribuído pela Dreamworks Pictures, "O escorpião de jade" estabeleceu duas marcas numéricas para a carreira de Woody Allen: não apenas era o filme mais caro do diretor até então (com um orçamento de 28 milhões de dólares) como estreou em cerca de 900 salas nos EUA, um lançamento bastante generoso para um cineasta acostumado a circuitos bem mais modestos. Tal providência não foi suficiente, no entanto, para chamar a atenção do público, que não se deixou conquistar por seu humor inteligente e produção caprichada. Apresentando uma reconstituição de época cuidadosa e uma paleta de cores das mais elegantes, "O escorpião de jade" é uma espécie de homenagem do diretor às comédias românticas da década de 1940, estreladas por Cary Grant e Katharine Hepburn. Repleto de diálogos brilhantes e com uma trama original e imprevisível, o filme reafirma a fascinação de Allen por mágicos e afins (elementos com que já havia brincado em "Édipo arrasado" (1989) e "Simplesmente Alice" (1990)), além de oferecer a Helen Hunt um de seus raros bons papéis depois do Oscar por "Melhor é impossível (1997). Hunt, que teve o privilégio de ler o roteiro inteiro antes de aceitar o trabalho (e mesmo assim com um mensageiro esperando na sala ao lado para levar o script de volta), está nitidamente à vontade como Betty Ann Fitzgerald, uma mulher inteligente e sagaz, mas incapaz de se deixar envolver pela mais antiga das mentiras masculinas. Na pele de Briggs, porém, Allen não vai além do que se espera de uma atuação sua: não à toa, ele detesta seu desempenho no filme, frustrado pela recusa de suas duas primeiras opções, Tom Hanks e Jack Nicholson.

 

Não que Allen não esteja em boa forma. Como ele mesmo reconhece, seus dons como ator são bastante restritos, mas CW Briggs é um personagem que cabe em suas limitações. Levemente atrapalhado, metido a conquistador, cheio de manias e com uma saudável dose de neuroses, Briggs diverte a plateia com tiradas rápidas e repletas de um sarcasmo delicioso. Sua parceria com Helen Hunt é preciosa, e a participação mais do que especial de Charlize Theron (depois de uma rápida aparição em "Celebridades", de 1999) incendeia a tela em poucos minutos. Além disso, ao contrário do que acontece na maioria de sua filmografia, o roteirista Allen não se obriga a ter pressa: perto de sua média de 90 minutos de duração, as quase duas horas de "O escorpião de jade" soam como um épico - e, por incrível que pareça, não há nenhuma gordurinha na narrativa, que flui equilibrada entre a comédia romântica à moda antiga e um leve drama policial. Aliás, se há algo do que se reclamar é justamente o fato desse equilíbrio prejudicar o aprofundamento das duas histórias contadas, ainda que elas dialoguem profundamente: apesar da trama dos roubos render bons momentos, é a relação entre Briggs e Betty Ann que torna o filme notável.

Relegado a um segundo plano na carreira de Allen, "O escorpião de jade" estreou nos EUA pouco mais de um mês antes dos atentados ao World Trade Center e, em um gesto de simpatia, o cineasta pisou pela primeira vez no palco da cerimônia do Oscar no começo do ano seguinte para apresentar uma homenagem à Nova York. Em uma de suas tiradas geniais, ele começou seu discurso afirmando que, ao receber um telefonema da Academia, pensou que fosse para um pedido de desculpas por seus integrantes terem ignorado seu filme. Teria sido compreensível: mesmo que "O escorpião de jade" não seja uma obra-prima, seus valores de produção são inegáveis, e uma indicação à estatueta de roteiro original era mais que merecida. Pouco visto e pouco comentado, é um filme que precisa ser descoberto e alçado à lista dos melhores do diretor.

DO QUE AS MULHERES GOSTAM

DO QUE AS MULHERES GOSTAM (What women want, 2000, Paramount Pictures/Icon  Entertainment International, 127min) Direção: Nancy Meyers. Roteiro: Josh Goldsmith, Cathy Yuspa, estória de Josh Goldsmith, Cathy Yuspa, Diane Drake. Fotografia: Dean Cundey. Montagem: Thomas J. Nordberg, Stephen A. Rotter. Música: Alan Silvestri. Figurino: Ellen Mirojnick. Direção de arte/cenários: Jon Hutman/Rosemary Brandenburg. Produção executiva: Carmen Finestra, Stephen McEveety, David McFadzean. Produção: Susan Cartsonis, Bruce Davey, Gina Matthews, Nancy Meyers, Matt Williams. Elenco: Mel Gibson, Helen Hunt, Alan Alda, Marisa Tomei, Judy Greer, Sarah Paulson, Bette Midler, Mark Feuerstein, Lisa Edelstein, Loretta Devine. Estreia: 13/12/2000

No ano 2000, poucos astros de Hollywood eram tão confiáveis, em termos de bilheteria, quanto Mel Gibson. Além de popular, ele também agradava à crítica, com desempenhos elogiados como sua interpretação em  "O preço de um resgate" (96) e os Oscar conquistados por seu "Coração valente", premiado pela Academia como o melhor filme de 1995. Seu apelo comercial era tão grande que até mesmo um filme previsível e apenas correto rendeu, só no mercado doméstico, mais de 180 milhões de dólares (colaborando para uma arrecadação total de pouco menos de 375 milhões. Tudo bem que sua parceira de cena era Helen Hunt, premiada com o Oscar de melhor atriz pouco tempo antes - por "Melhor é impossível", de 1997 -, mas foi seu carisma o principal responsável pelo êxito de "Do que as mulheres gostam", uma comédia romântica inofensiva e quase esquecível dirigida por Nancy Meyers - a mesma cineasta que se especializaria no gênero, mas com uma dose extra de inteligência e elegância.

Meyers, cuja única experiência havia sido o remake de "Operação Cupido", de 1998 - que ela havia co-dirigido pelo então marido Charles Shyer - foi contratada apenas para reescrever um roteiro concebido pela Touchstone para o estrelato de Tim Allen, um ator de grande sucesso nos EUA mas pouco celebrado internacionalmente. Com o roteiro pronto, ela chegou à conclusão de que ninguém seria melhor do que ela mesma para comandar - e pediu à Paramount, novo estúdio do projeto, para assinar também a direção e a co-produção. Pedido aceito e filme realizado, ficou claro para todos que, mesmo que outros pudessem ter sido o diretor, poucos falariam do assunto com tanta propriedade quanto Meyers. uma mulher bem-sucedida em um campo onde a grande maioria é formada por homens. Muitas das falas de sua protagonista feminina, Darcy Maguire, interpretada com correção por Helen Hunt, poderiam sair diretamente de suas memórias de sobrevivência no mercado de trabalho. Apesar disso, falta um pouco de consistência no resultado final de ""Do que as mulheres gostam": mesmo com algumas sequências bastante inspiradas e uma trilha sonora das melhores - que vão de Frank Sinatra a Alanis Morissette - o filme termina sem explorar todas as situações que apresenta no começo, e apela para um final feliz apressado e superficial, apesar de ter pouco mais de duas horas de duração.


A trama, improvável mas divertida, é mais um capítulo da série de guerras dos sexos que Hollywood sempre promoveu nas telas, com resultados os mais diversos - de Katharine Hepburn/Cary Grant a Meg Ryan/Tom Hanks, passando pelos icônicos Doris Day/Rock Hudson. Gibson vive Nick Marshall, um publicitário mulherengo e pouco sensível às necessidades das mulheres à sua volta - ex-esposa, filha adolescente, colegas de trabalho e eventuais amantes. Talentoso mas famoso por seu machismo, ele acaba perdendo a promoção que buscava para a igualmente competente Darcy McGuire, responsável por ser a responsável por conquistar o mercado feminino. Desgostoso com a situação, Nick se embebeda em seu apartamento e, enquanto tenta sentir o que as mulheres passam com seus rituais de beleza - o que inclui depilação por cera quente -, sofre um acidente doméstico e acorda com um dom inesperado: ouvir o pensamento de todas as mulheres à sua volta. A princípio totalmente desesperado com a novidade, ele descobre, em uma visita a uma terapeuta (interpretação não creditada da sempre ótima Bette Midler), que, em vez de uma maldição, sua nova condição pode ser uma bênção. Com esse novo olhar sobre o fato, Nick resolve utilizá-lo para roubar as ideias de Darcy e recuperar suas chances de promoção. Porém, como em toda boa comédia romântica, ele se apaixona pela nova colega, que, por sua vez, está encantada com a "sensibilidade feminina" de quem ela considerava desprezível pela forma com que tratava o "sexo frágil".

Meyers consegue fazer rir em boa parte do filme, principalmente quando mostra Nick tentando tirar vantagem de seus novos poderes - suas cenas com Marisa Tomei são engraçadíssimas, tanto no esperado encontro entre os dois quanto na revelação de seu "segredo". Os momentos de Nick antes do acidente são igualmente divertidos, apesar da canastrice de Gibson, e sua química com Marisa solta faíscas - o que não acontece com sua dupla com Helen Hunt, uma boa atriz mas dona de um papel que não se presta a maiores voos. Quando brinca e não se leva a sério, o filme de Meyers conquista sem esforço, mas o mesmo não acontece quando decide ser romântico: quando Nick e Darcy começam a se acertar, o bom humor da primeira parte fica de lado e quase assume, inclusive, uma subtrama dramática que aproxima o publicitário de uma jovem estagiária (interpretada por Judy Greer, uma atriz ainda subaproveitada em Hollywood). No final do jogo, pode-se dizer que "Do que as mulheres gostam"  ganha mais do que perde, mas o resultado - que tinha tudo para ser uma goleada - é uma vitória apertada, sem o brilho que jogadores como Gibson e Hunt poderiam apresentar. É divertido, mas poderia ter sido muito melhor.

terça-feira

PEGGY SUE: SEU PASSADO À ESPERA

PEGGY SUE: SEU PASSADO À ESPERA (Peggy Sue got married, 1986, TriStar Pictures, 103min) Direção: Francis Ford Coppola. Roteiro: Jerry Leichtling, Arlene Sarner. Fotografia: Jordan Cronenweth. Montagem: Barry Malkin. Música: John Barry. Figurino: Theadora Van Runckle. Direção de arte/cenários: Dean Tavoularis/Marvin March. Produção executiva: Barrie M. Osborne. Produção: Paul R. Gurian. Elenco: Kathleen Turner, Nicolas Cage, Joan Allen, Helen Hunt, Sofia Coppola, Barbara Harris, Jim Carrey, Don Murray, Barry Miller, Kevin J. O'Connor. Estreia: 05/10/86

3 indicações ao Oscar: Atriz (Kathleen Turner), Fotografia, Figurino

A carreira de Francis Ford Coppola se divide entre produções ambiciosas (que tanto podem agradar em cheio quanto serem solenemente ignoradas pelo público) e filmes menores, de baixo orçamento e pretensões ainda menores. Em 1986, ele estava vindo do fracasso comercial do épico musical "Cotton Club" (84) quando acertou a mão com um drama romântico, delicado e sensível que refletia a nostalgia generalizada em relação à uma época mais inocente dos EUA, pré-assassinato de John Kennedy e Guerra do Vietnã. Projeto herdado da diretora Penny Marshall (que foi afastada pelos produtores por ser considerada inexperiente para um filme que já era tido pelo estúdio como uma produção relativamente grande), "Peggy Sue: seu passado à espera" não apenas deu à Kathleen Turner um dos maiores papéis de sua carreira (e uma subsequente indicação ao Oscar de melhor atriz) como contava com um jovem Jim Carrey em papel coadjuvante e revelou o nome de Nicolas Cage à plateia (ainda que em uma atuação um tanto equivocada e questionada pelo próprio diretor).

Na verdade, a presença de Cage esteve por um fio principalmente por sua insistência em utilizar-se de um tom de voz que tanto Coppola (seu próprio tio) e os produtores simplesmente odiaram desde o princípio. O fato de Cage ter vencido a disputa diz muito sobre sua personalidade persuasiva, mas é inegável que sua presença desequilibra o resultado final - quando Penny Marshall estava no comando da produção, por exemplo, os nomes cotados para viver o protagonista masculino foram os de Tom Hanks, Dennis Quaid e Sean Penn, todos atores bem menos excêntricos e de registro mais sutil. Sempre que Cage entra em cena, o filme assume um tom mais debochado, contrastando com o lirismo impresso pela fotografia de Jordan Cronenweth (também indicada ao Oscar) e pela trilha sonora leve e onírica, a cargo de John Barry e canções populares do começo dos anos 60. Felizmente a presença do ator não atrapalha o desempenho luminoso de Kathleen Turner, que transborda emoção e graça em cada diálogo.


Substituindo Debra Winger, que abandonou o projeto depois de um acidente de bicicleta, Turner está plenamente à vontade em cena, convencendo tanto como a dona-de-casa frustrada de 43 anos em vias de divorciar-se quanto como a adolescente atônita ao descobrir seu poder inexplicável de mudar os rumos de sua vida quando acorda em 1960. Aproveitando-se de um roteiro que explora o humor, o romantismo e o surreal da situação, a atriz revelada por Lawrence Kasdan em "Corpos ardentes" (81) entrega uma performance encantadora e tão mágica quanto o enredo: Peggy Sue, uma mulher desiludida com o fim de seu casamento com o namorado de adolescência, Charles Bodell (Nicolas Cage), vai quase à contragosto a uma festa para celebrar o reencontro de seus colegas de escola. Coroada rainha da festa, ela subitamente desmaia e, para sua surpresa/deleite/angústia, desperta em 1960, quando ainda não estava definitivamente comprometida com o futuro marido. Percebendo a possibilidade de modificar seu destino, ela resolve tentar a sorte com outro rapaz, o sensível e rebelde poeta Michael Fitzsimmons (Kevin J. O'Connor) - mas para isso ela terá de desvencilhar-se de Charles, completamente apaixonado por ela.

Equilibrando seu filme entre as decisões amorosas da protagonista e a forma como ela passa a lidar com a novidade temporal de sua vida - o reencontro com a irmã caçula, o contato com os avós já falecidos, a tentativa de ajudar Charles em sua carreira musical lhe dando de bandeja um sucesso ainda não lançado dos Beatles, sua associação com o gênio da escola, Richard Norvick (Barry Miller) -, Coppola dirige "Peggy Sue" com mão leve, sem jamais pesar o drama e preferindo sublinhar o tom lúdico do roteiro, em contraste com o humor acelerado e juvenil de "De volta para o futuro", dirigido por Robert Zemeckis um ano antes e que também brincava com viagens no tempo. Felizmente evitando explicações mirabolantes para a situação central - e também uma solução fácil e insatisfatória -, o filme fecha sua trama de forma coerente e emocionante, sem trair o público ou transfigurar seus personagens. Um entretenimento adulto e um dos melhores Francis Ford Coppola da década de 80!

segunda-feira

AS SESSÕES

AS SESSÕES (The sessions, 2012, Fox Searchlight Pictures, ) Direção: Ben Lewin. Roteiro: Ben Lewin, artigo "On seeing sex surrogate", de  Mark O'Brien. Fotografia: Geoffrey Simpson. Montagem: Lisa Bromwell. Música: Marco Beltrami. Figurino: Justine Seymour. Direção de arte/cenários: John Mott/Sofia Elena Jimenez. Produção executiva: Douglas Blake, Julius Colman, Maurice Silman. Produção: Judi Levine, Ben Lewin, Stephen Nemeth. Elenco: John Hawkes, Helen Hunt, William H. Macy, Moon Bloodgood, Annika Marks, Adam Arkin, Rhea Perlman. Estreia: 23/01/12

Indicado ao Oscar de Atriz Coadjuvante (Helen Hunt)

Uma verdade quase absoluta entre a indústria hollywoodiana é que o papel de uma pessoa com qualquer tipo de deficiência física ou mental já é meio caminho andado para os tapetes vermelhos que levam a prêmios cobiçados como Golden Globe e Oscar. Por isso não deixou de ser uma surpresa quando John Hawkes ficou de fora da lista de indicados à estatueta dourada de 2013 por seu trabalho em "As sessões". Produção independente dirigida por Ben Lewin - cujo currículo inclui vários episódios de séries de TV e o denso "Georgia", de 1995, que deu a Mare Winningham uma indicação ao Oscar de coadjuvante - e baseado em fatos reais, o filme agradou em cheio ao público do Festival de Sundance e recebeu inúmeras loas por sua qualidade, mas somente o trabalho de Helen Hunt foi lembrado pelos eleitores da Academia. Tentando uma volta aos holofotes quinze anos depois de seu Oscar de melhor atriz por "Melhor é impossível", Hunt teve, porém, poucas chances de vitória contra a favorita Anne Hathway, vencedora pela pavorosa adaptação do musical "Os miseráveis".

Hawkes - que concorreu ao Golden Globe e ao Screen Actors Guild por seu desempenho impecável - vive Mark O'Brien, um homem de 38 anos condenado à uma paralisia quase total que lhe impede de mexer quaisquer partes do corpo abaixo do pescoço, devido a uma poliomielite adquirida na infância. Virgem, ele não deixa de ter intensos desejos lúbricos, o que o leva a constantes conversas com o padre de sua paróquia (atuação hilariante de William H. Macy). Sua condição sexual acaba chamando a atenção de sua enfermeira que, com a ajuda de conhecidos, lhe recomenda a contratação dos serviços de Cheryl Cohen-Greene (Helen Hunt), uma terapeuta sexual. Casada e mãe, Cheryl leva sua profissão a sério e tentará, em seis sessões, fazer com que O'Brien descubra os prazeres de uma vida sexual ativa a despeito de suas limitações. Encantado por ela, o homem acaba se apaixonando, mesmo sabendo que suas chances com ela são nulas.


Apesar do tema pesado e das inúmeras possibilidades de esbarrar em clichês melodramáticos, "As sessões" se beneficia muito da leveza com que o cineasta/roteirista lhe envolve. Ao contrário do que poderia ocorrer, a doença do protagonista nunca descamba para o lacrimoso ou o exagerado, ficando sempre no limiar do melancólico com o tragicômico. A atuação de John Hawkes - que concorreu ao Oscar de coadjuvante em 2011 por "Inverno da alma" - é sutil e não força a compaixão do espectador, principalmente porque jamais tem pena de si mesmo. Seus diálogos com o pároco interpretado por William H. Macy são ao mesmo tempo ternos e engraçados, possibilitando ao espectador um saudável distanciamento do drama do protagonista, enquanto todas as cenas em que Hawkes e Helen Hunt estão juntos aumentam o interesse pelo desenrolar da trama. É admirável a maneira com que Lewin não explora com vulgaridade as cenas de sexo entre os dois, mesmo que Hunt não tenha o menor pudor em mostrar seu corpo. O sexo como visto aqui não é uma manifestação erótica e sim uma forma de inclusão social e sentimental, e a maneira como tudo é filmado (sem artifícios sensuais ou uma edição que transmita outra ideia) é extremamente acertada. Fugindo do estilo "doença da semana", Lewin faz um gol e tanto, oferecendo à plateia mais do que simplesmente um drama com o objetivo de levá-la às lágrimas.

Por não ser um "deficiente engraçadinho" como muitos dos filmes semelhantes que volta e meia são louvados pela Academia, o Mark O'Brien de John Hawkes não conquista a plateia com cenas exageradas ou por discursos inflamados. Seu olhar - ora lúbrico ora apaixonado - diz o suficiente sobre seus pensamentos e sua relação com o mundo é neutra o bastante para não potencializar o dramalhão que sua história poderia transformar-se em mãos menos hábeis e mais vorazes em conquistar o coração do público e da Academia. Essa quase neutralidade imposta por sua direção é louvável, mas provavelmente acabou sendo a responsável por tirar Hawkes do páreo pelo Oscar. É perceptível, no entanto que seu trabalho é fascinante, em especial se for considerado que o ator é bem mais velho que seu personagem - fato que se torna irrelevante graças a seu desempenho.

"As sessões" é um belo filme, competente e interessante. Por sua opção em fugir do melodrama e abraçar com naturalidade um tema complexo pode afastar àqueles que procuram por algo mais caloroso e piegas. Mas a história é inspiradora e as atuações do elenco são esplêndidas, o que deixa sem importância qualquer pecado que possa ter.

sexta-feira

BOBBY

BOBBY (Bobby, 2006, The Weinstein Company, 120min) Direção e roteiro: Emilio Estevez. Fotografia: Michael Barrett. Montagem: Richard Chew. Música: Mark Isham. Figurino: Julie Weiss. Direção de arte/cenários: Patti Podesta/Lisa Fischer, Radha Mehta. Produção executiva: Dan Grodnick, Anthony Hopkins, Michelle Krumm, Matthew Landon, Gary Michael Walters. Produção: Edward Bass, Michael Litvak, Holly Wiersma. Elenco: Harry Belafonte, Emilio Estevez, Laurence Fishburne, Heather Graham, Anthony Hopkins, Helen Hunt, Joshua Jackson, David Krumholtz, Ashton Kutscher, Shia LeBeouf, Lindsay Lohan, William H. Macy, Demi Moore, Freddie Rodriguez, Martin Sheen, Christian Slater, Sharon Stone, Elijah Wood. Estreia: 05/9/06 (Festival de Veneza)

Em 1991, Oliver Stone lançou o espetacular "JFK", em que investigava o assassinato do presidente John Fitzgerald Kennedy, ocorrido em novembro de 1963, utilizando-se, para isso, de toda a sua parafernália de artifícios narrativos e visuais - deu certo, e, além de várias indicações ao Oscar (e das estatuetas de fotografia e edição) e do sucesso de bilheteria, tornou-se um clássico instantâneo do cinema político e talvez o melhor trabalho de sua carreira. O roteiro - baseado em dois livros com teorias distintas e que paradoxalmente se completavam - citava, em determinado momento, a morte do irmão caçula de John, o senador Robert, assassinado em Los Angeles, justamente quando estava a caminho de tornar-se ele mesmo presidente dos EUA, em 1968. Tal fato, que confirmava o triste destino dos Kennedy e que serviu de combustível a mais em um país em um período de convulsão social - com lutas violentas pelos direitos civis e a guerra do Vietnã suscitando as mais beligerantes discussões entre todas as classes sociais - serve de tema para "Bobby", escrito e dirigido pelo ator/cineasta Emilio Estevez: ao contrário do filme de Stone, porém, Estevez optou por um caminho menos ambicioso, ao utilizar a tragédia apenas como pano de fundo para um representativo painel humano da época. Se por um lado acerta - ao fugir das comparações e evitar controvérsias desnecessárias - também peca - com tantos personagens em cena é difícil aprofundá-los. Mas a indicação ao Golden Globe de melhor filme dramático de 2006 mostra que, entre mortos e feridos, a obra do irmão mais velho de Charlie Sheen tem muito mais méritos do que defeitos.

A trama de "Bobby" se passa no dia 04 de junho de 1968, data das eleições primárias na Califórnia, onde Robert Kennedy é o franco-favorito graças à sua campanha baseada no pacifismo e nos interesses do povo. O QG de sua campanha é o Hotel Ambassador, onde ele é esperado no final da noite para discursar a seus eleitores e apoiadores. E é nesse hotel de luxo em Los Angeles que vários dramas se desenrolam durante o dia, atingindo funcionários e hóspedes que esperam ansiosamente pela chegada do homem que eles acreditam ser capaz de renovar as esperanças do país. Entre eles está o antigo porteiro do hotel, o veterano John Casey (Anthony Hopkins, produtor executivo do filme) e seu velho amigo Nelson (Harry Belafonte), inconscientes dos problemas da cozinha do local, quase implodindo com o racismo do responsável pelo departamento, Daryl (Christian Slater) e pelas conversas entre o experiente cozinheiro Edward (Laurence Fishburne) e o latino Jose (Freddie Rodriguez), contrariado pelo expediente duplo que o impedirá de assistir a um jogo de baseball já clássico antes mesmo de acontecer. É nas dependências dos empregados também que Paul (William H. Macy) esconde da esposa - a cabeleireira Miriam (Sharon Stone) - seu relacionamento com a telefonista Angela (Heather Graham) e os responsáveis pela campanha de Kennedy - Wade (Joshua Jackson) e Dwayne (Nick Cannon) - tentam dar ordem aos jovens cabos eleitorais e organizar a leva de jornalistas sequiosos por entrevistas.

Entre os hóspedes também há espaço para drama: a veterana cantora Virginia Fallon (Demi Moore, que foi noiva de Estevez antes de tornar-se diva sexy) luta contra o vício em álcool enquanto enlouquece seu marido e empresário Tim (o próprio Estevez). O casal Samantha (Helen Hunt) e Jack (Martin Sheen) luta contra a instabilidade mental dela, a jovem Diane (Lindsay Lohan) se casa com o amigo William (Elijah Wood) para impedí-lo de ser chamado ao Vietnã e os dois amigos Jimmy (Brian Geraghty) e Cooper (Shia LaBeouf), em vez de buscar eleitores, entram em uma viagem de LSD proporcionada pelo traficante Fisher (Ashton Kutscher). Como é comum em filmes-coral - popularizados por Robert Altman no início dos anos 90 e quase obrigatórios desde então - os personagens se cruzam ocasionalmente, até o clímax, quando a chegada do senador e a subsequente tragédia unem a todos, independente de classe social, fama ou drama pessoal.


Intercalando cenas reais de discursos de Robert Kennedy aos dramas dos personagens fictícios de seu filme (embora alguns sejam levemente inspirados em histórias reais, como o jovem cozinheiro vivido por Freddie Rodriguez, que ficou ao lado do senador enquanto aguardava o socorro médico e o porteiro interpretado por Anthony Hopkins), Emilio Estevez dá a ele um tom acertado de nostalgia e ao mesmo tempo mostra um amplo painel de relações humanas à luz de sua época, sem soar exageradamente saudosista e demonstrando clara admiração pelas palavras do homem que dá título à sua obra. Enquanto apresenta hippies, ativistas, negros e latinos em busca de aceitação social, jovens com medo da guerra do Vietnã e até repórteres socialistas atrás de cinco minutos de atenção com o homem do dia, o filme também mostra sequências que mostram o carisma enorme de Bobby, ao som da eloquente "The sound of silence", da dupla Simon & Garfunkel - em especial depois dos tiros que o vitimam é díficil não se emocionar com elas, em um toque emocional que chega perto do clichê, mas que funciona muito bem, assim como o encontro de duas das mais belas mulheres do cinema americano da década de 90 (Sharon Stone e Demi Moore) na cena mais interessante do filme, quando elas discutem a força do tempo em relação à efemeridade da juventude.

Talvez a indicação ao Golden Globe de melhor filme tenha sido mais por causa do elenco atraente ou das boas intenções de Estevez - que demorou sete anos para transformar a ideia em algo concreto. Mas é inegável que é um filme correto, sem exageros e até discreto - deixando de lado a atuação vergonhosa de Ashton Kutscher. Vale uma espiada, especialmente por seguir um viés diametralmente oposto ao "JFK" de Oliver Stone.

domingo

NÁUFRAGO

NÁUFRAGO (Cast away, 2000, 20th Century Fox/DreamWorks SKG, 143min) Direção: Robert Zemeckis. Roteiro: William Broyles Jr.. Fotografia: Don Burgess. Montagem: Arthur Schmidt. Música: Alan Silvestri. Figurino: Joanna Johnston. Direção de arte/cenários: Rick Carter/Rosemary Brandenburg, Karen O'Hara. Produção executiva: Joan Bradshaw. Produção: Tom Hanks, Jack Rapke, Steve Starkey, Robert Zemeckis. Elenco: Tom Hanks, Helen Hunt, Chris Noth. Elenco: 07/12/00

2 indicações ao Oscar: Ator (Tom Hanks), Som
Vencedor do Golden Globe de Melhor Ator/Drama (Tom Hanks)

A história da gênese de "Náufrago" - um projeto arriscado do cineasta Robert Zemeckis e do ator Tom Hanks que acabou se tornando um enorme sucesso de bilheteria e crítica - todo mundo conhece: para dar veracidade à história de um homem preso em uma ilha deserta, sem comida e sendo obrigado a aprender as regras de sobrevivência de um lugar até então inóspito e desconhecido, os dois interromperam as filmagens por um ano. Nesse meio-tempo, Hanks perdeu o peso que havia adquirido para criar seu personagem antes do acidente que o joga na ilha e Zemeckis concluiu outro filme - o suspense "Revelações", estrelado por Harrison Ford e Michelle Pfeiffer. O fato é que, a despeito dessa curiosa e até hoje única particularidade, o filme que saiu dela é, ao contrário da maioria das produções cujas anedotas de bastidores são mais interessantes que o resultado final, digno dos mais entusiasmados aplausos. Com exceção de um posfácio um tanto redundante, "Náufrago" é um belíssimo trabalho de roteiro, ritmo, emoção e principalmente atuação. Não foi à toa que Hanks esteve bastante perto de abocanhar um terceiro Oscar de melhor ator - perdeu para Russell Crowe em "Gladiador", mas não deixou de ficar com um Golden Globe por seu desempenho antológico.

Depois das estatuetas douradas por "Filadélfia" e "Forrest Gump, o contador de histórias", Hanks arrancou elogios rasgados e unânimes na pele de Chuck Noland, um executivo da FedEx (a agência de Correios dos EUA) extremamente dedicado ao trabalho que deixa até menos sua relação com a namorada, Kelly (Helen Hunt) em segundo plano, priorizando sempre os prazos exatos prometidos aos clientes e a imagem da empresa. Às vésperas do Natal de 1995, porém, sua vida regrada e constantemente corrida sofre um abalo profundo: durante uma viagem a negócios, seu avião cai em algum ponto do Oceano Pacífico, matando toda a tripulação (seus colegas) e deixando-o à deriva, sob uma violenta tempestade. Sozinho em uma ilha - e sem nenhum tipo de apoio da tecnologia ou conforto moderno - Noland se vê obrigado, então, a tratar da própria sobrevivência. Para não morrer de fome ou sede, ele aprende a pescar, caçar, procurar água e construir uma cabana para se proteger das intempéries da natureza. Sua solidão é quebrada apenas pelas lembranças de sua relação com Kelly e por suas longas conversas com uma bola de vôlei - encomenda de um cliente que chega intocada à ilha, junto com ele. Batizando-a de Wilson, o poderoso e controlador executivo passa a perceber de forma diferente sua vida e suas prioridades.


Um Robinson Crusoé pós-moderno, Chuck Nolan recebe, das mãos hábeis e experientes de Tom Hanks, uma interpretação precisa, que dosa com exatidão momentos de economia dramática com outros onde o ator - que começou a carreira em comédias despretensiosas mas via de regra deliciosas - esbanja o carisma que fez dele um dos astros mais poderosos de Hollywood nos anos 90. Só mesmo alguém com todo o alcance histriônico de Hanks seria capaz de segurar, praticamente sozinho, duas horas e meia de um filme que - à exceção da primeira meia-hora e dos vinte minutos finais - trata-se basicamente de uma odisseia solitária e exasperante de um homem em confronto (e diálogo) constante com o mundo natural que o cerca. Se a transformação física do ator é impressionante (mas não inédita em sua trajetória, haja visto as alterações sofridas para "Uma equipe muito especial" e "Filadélfia"), ela não é mais fascinante do que aquela que se passa interiormente, quando o personagem - quase arrogante em sua pretensa superioridade ao mundo - se curva diante de forças maiores e reconhece sua insignificância em relação ao mundo. São em momentos assim - principalmente durante os diálogos de Nolan e um obviamente calado Wilson - que fazem de "Náufrago" mais do que simplesmente uma aventura dramática: é, principalmente, um show particular de um ator no auge de seu vigor técnico.

Porém, mesmo que Hanks domine o espetáculo do princípio ao fim, seria injusto não reconhecer o trabalho impecável de Robert Zemeckis, que teve a coragem de apostar em um filme com ritmo perceptivelmente mais lento do que a maioria das produções comerciais. Mesmo que mostre seu domínio técnico em sequências absolutamente perfeitas - como o acidente de avião - são nos momentos mais humanos que o diretor (acostumado a êxitos incontestes de bilheteria, como "Uma cilada para Roger Rabbit", "De volta para o futuro" e o próprio "Forrest Gump", que deu a ele e Hanks os prêmios da Academia) mostra que, mais do que pirotecnias visuais, ele também entende de contar histórias. Sem deixar que o ritmo de seu filme caia mesmo com apenas um personagem em cena, Zemeckis fez de uma aposta arriscada um sucesso extraordinário, com uma renda superior a 200 milhões de dólares somente no mercado doméstico (EUA e Canadá). Mereceu. "Náufrago" é um dos filmes memoráveis do final do século XX.

terça-feira

TWISTER

TWISTER (Twister, 1996, Warner Bros/Universal Pictures/Amblin Entertainment, 118min) Direção: Jan De Bont. Roteiro: Michael Chrichton, Anne-Marie Martin. Fotografia: Jack N. Green. Montagem: Michael Kahn. Música: Mark Mancina. Figurino: Ellen Mirojnick. Direção de arte/cenários: Joseph Nemec III/Ron Reiss. Produção executiva: Laurie MacDonald, Gerald R. Molen, Walter Parkes, Steven Spielberg. Produção: Ian Bryce, Michael Chrichton, Kathleen Kennedy. Elenco: Helen Hunt, Bill Paxton, Cary Elwes, Jami Gertz, Philip Seymour Hoffman, Lois Smith, Alan Ruck, Todd Field, Abraham Benrubi. Estreia: 10/5/96

2 indicações ao Oscar: Melhor Som, Melhores Efeitos Visuais

Steven Spielberg é apenas o produtor executivo - através de sua Amblin Entertainment - mas é impossível assistir-se a "Twister" sem ver seu dedo em cada detalhe. Os efeitos visuais caprichados, a trama familiar de razoável importância no contexto dramático, a violência extremamente comedida para não chocar o espectador e o ritmo acelerado, sem tempos mortos, são características que fizeram de seus filmes sucessos inegáveis de crítica e bilheteria, e todas elas estão presentes no segundo filme de Jan De Bont - diretor de fotografia alçado à condição de cineasta bem-sucedido depois do inesperado êxito de seu "Velocidade máxima" (94). Mergulhando a plateia em uma montanha-russa divertida e desprovida de quaisquer elocubrações intelectuais, De Bont acertou novamente, proporcionando à audiência duas horas de um delicioso cinema-pipoca.

A trama, como convém a esse tipo de filme, é simples e direta (apesar de um dos roteiristas ser o escritor de ficção científica Michael Chrichton): um grupo de cientistas, liderado pela decidida Jo Harding (Helen Hunt), tem como objetivo perseguir uma série de tornados que vem castigando a região de Oklahoma para colocar, dentro de um deles, um dispositivo que irá permitir que sejam estudados e, por consequência, previstos a tempo de avisar suas possíveis vítimas. Traumatizada por ter testemunhado a morte do pai em um ataque do mais violento dos tornados, Jo é obcecada em atingir sua meta profissional, mas justamente quando está em vias de conseguir sucesso - várias violentas tempestades estão em seu caminho - ela reencontra seu ex-marido, Bill (Bill Paxton), que deseja que ela assine os documentos de seu divórcio. Não bastasse isso, seu maior rival e ex-colega de trabalho, Jonas Miller (Cary Elwes) - que roubou a ideia de sua invenção - também está disposto a chamar para si o êxito da tarefa.


Temperado com efeitos visuais ainda hoje impressionantes - que perderam o Oscar para o previsível "Independence day" - e uma química perfeita entre seus protagonistas (Hunt ainda não havia ganho o Oscar por "Melhor é impossível" e Paxton já era um dos atores preferidos de James Cameron), "Twister" diverte justamente por saber equilibrar com perfeição todos os ingredientes que sempre fizeram o sucesso dos filmes de Spielberg. Sabendo que grande parte de seu público seria de adolescentes e jovens, o roteiro evita ao máximo qualquer tipo de violência gráfica, por mais que seja difícil imaginar um filme sobre tornados sem destruição em massa e mortes a granel. Sendo assim, que não se espere realismo nesse particular do filme: por mais que os ciclones sejam apavorantemente reais, suas consequências são mostradas de forma discreta e nenhuma morte chocante é exposta aos olhos da plateia: assim como em "Jurassic Park" (sintomaticamente dirigido por Spielberg) o perigo é sempre barrado pelos limites do cinema: todos sofrem de tensão e nervosismo, mas com a certeza aconchegante de que nada irá ultrapassar as telas.

É esse o tipo de filme que "Twister" é: um entretenimento direto e eficaz, daqueles que fazem o espectador torcer pelos protagonistas, se abismar com os efeitos de última geração e, no caso, reconhecer, no elenco coadjuvante, nomes que se tornariam famosos pouco tempo depois, como Philip Seymour Hoffman, ou que conheceram o gostinho da fama nos anos 80 antes de desaparecerem em filmes menores (como Alan Ruck, o melhor amigo de Matthew Broderick em "Curtindo a vida adoidado" e Jami Gertz, a mocinha de "Garotos perdidos"). "Twister" é um filme com a marca de Spielberg, com tudo que isso tem de positivo e negativo. Mas é, acima de tudo, um filme que cumpre o que promete: duas horas de diversão pura e quase ingênua.

MELHOR É IMPOSSÍVEL


MELHOR É IMPOSSÍVEL (As good as it gets, 1997, TriStar Pictures/Gracie Films, 139min) Direção: James L. Brooks. Roteiro: James L. Brooks, Mark Andrus, história de Mark Andrus. Fotografia: John Bailey. Montagem: Richard Marks. Música: Hans Zimmer. Figurino: Molly Maginnis. Direção de arte/cenários: Bill Brzeski/Clay A. Griffith. Produção executiva: Laura Ziskin, Laurence Mark, Richard Sakai. Produção: James L. Brooks, Bridget Johnson. Kristi Zea. Elenco: Jack Nicholson, Helen Hunt, Greg Kinnear, Cuba Gooding Jr., Shirley Knight, Harold Ramis, Timothy Olyphant, Jamie Kennedy. Estreia: 25/12/97

7 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Ator (Jack Nicholson), Atriz (Helen Hunt), Ator Coadjuvante (Greg Kinnear), Roteiro Original, Montagem, Trilha Sonora Original/Comédia ou Musical
Vencedor de 2 Oscar: Ator (Jack Nicholson), Atriz (Helen Hunt)
Vencedor de 3 Golden Globes: Melhor Filme/Comédia ou Musical, Ator/Comédia ou Musical (Jack Nicholson), Atriz/Comédia ou Musical (Helen Hunt)

Em 1983, o cineasta James L. Brooks fez a festa na cerimônia do Oscar com "Laços de ternura", um misto de comédia de costumes com melodrama familiar que arrancou elogios da crítica e lágrimas do público. Em 1988, ele falhou em conseguir um bicampeonato com "Nos bastidores da notícia", uma comédia romântica ácida que criticava a falta de ética nos telejornais. Levou quase uma década - período em que criou a mega bem-sucedida série de TV "Os Simpsons" - até que Brooks voltasse a ver um filho seu na disputa pela estatueta mais cobiçada de Hollywood. E quando isso aconteceu, não poderia ter sido de melhor forma. "Melhor é impossível" é um filme adorável, que mais uma vez mostra o dom de seu diretor/roteirista/produtor em equilibrar drama e comédia em histórias humanas com personagens extremamente próximas da realidade. Indicado a 6 Oscar - incluindo Melhor Filme mas não Melhor Diretor - o ... longa de Brooks bateu de frente com "Titanic", mas ainda assim seus intérpretes não podem se queixar da recepção que tiveram junto aos membros da Academia. Tanto Jack Nicholson quanto Helen Hunt, seus protagonistas, foram (merecidamente) oscarizados.

"Melhor é impossível" segue o estilo elegante e simples de Brooks, que faz rir de situações cotidianas sem forçar gargalhadas e cria personagens que falam ao público de maneira simples. Os diálogos inteligentes/engraçados/dramáticos nunca soam como diálogos de filme e sim como conversas de gente normal. As personagens parecem pessoas comuns (ainda que entre elas encontre-se um escritor famoso e um artista plástico gay). E as situações, mesmo que pareçam um tanto forçadas, funcionam perfeitamente a seus objetivos dramáticos.

 

Melvin Udall (Jack Nicholson em mais um papel antológico de sua carreira) é um escritor bem-sucedido profissionalmente mas com sérios problemas em relação à convivência com outros seres humanos. Sofrendo de transtorno obsessivo-compulsivo, ele vive recluso em seu apartamento luxuoso, vivendo em constante conflito com os vizinhos, em especial Simon (Greg Kinnear, indicado ao Oscar de ator coadjuvante), artista plástico homossexual por quem ele nutre uma antipatia gratuita. Dono de rígidas regras de comportamento, Melvin lava as mãos com água fervendo, pula as rachaduras das ruas de Nova York e tranca a porta de casa dezenas de vezes antes de dar-se por satisfeito e leva sua vida confortavelmente. Sua rotina necessária é quebrada quando, ao frequentar o mesmo restaurante de sempre e sentar-se à mesma mesa de sempre, ele descobre que sua garçonete preferida, a doce Carol (Helen Hunt) faltou ao trabalho para cuidar do filho pequeno, portador de uma doença crônica. Para não perder seu hábito adquirido, Melvin resolve pagar o tratamento da criança e se descobre apaixonado por Carol, uma mulher batalhadora que esconde sua carência e seu romantismo por trás de uma máscara de força e estoicismo. Depois que Simon é violentamente espancado por um grupo de drogados, Carol convence Melvin a viajar com ele até a casa de sua família e um real relacionamento de amizade e carinho surge entre eles, aproximando-o da mulher que ama.

Ainda que a trama acene com a possibilidade de um forte melodrama ou situações forçadas por um roteiro necessitado de emoções, "Melhor é impossível" paira acima dos clichês por uma razão muito simples: tem um diálogo direto com o espectador, não tenta falar bonito nem busca complexidades psicológicas. A doença de Melvin - que tornou-se bem mais conhecida após o filme - é apenas um elemento a mais na trama, não ocupando mais espaço do que o necessário (assim como os problemas de saúde do filho de Carol e das relações familiares de Simon). O que interessa a Brooks é a interrelação entre as personagens, como suas vidas podem ser transformadas quando em contato com outras. E nisso o roteiro é pródigo, ainda que muitos considerem um tanto "simples demais". Na verdade, essa simplicidade é que faz dele tão especial. O público se identifica com as personagens e é aí que reside seu charme maior. E ter um elenco como o escalado pelo diretor ajuda bastante.
 
Em mais uma prova de que segundas opções podem ser extremamente benéficas em termos hollywoodianos, o elenco de "Melhor é impossível" que encantou público e crítica poderia não ter feito o filme. Melvin Udall, que acabou tornando-se um dos papéis mais representativos da carreira de Jack Nicholson (que levou um terceiro e justo Oscar), foi oferecido inicialmente a John Travolta. Carol, que elevou o status de Helen Hunt (em uma atuação delicada e sutil) de atriz de TV a estrela de cinema, poderia ter ido parar nas mãos de Holly Hunter ou (Deus nos proteja!) Courtney Love. E Simon, que fez de Greg Kinnear um ator respeitado depois de bombas com a refilmagem de "Sabrina", com Julia Ormond, quase esteve nas mãos de John Cusack, que saiu do projeto devido a seus compromissos com a comédia de humor negro "Matador em conflito". Juntos, os três apresentam uma química invejável, o que reitera a teoria de que certos filmes tem a hora certa de acontecer.

"Melhor é impossível" é um filme delicioso, sofisticado e que se pode assistir com prazer diversas vezes. Seu alto-astral e sua inteligência, aliados à inconfundível música de Hans Zimmer e a seu elenco impecável fazem dele um clássico dos anos 90. Poucas vezes um título soou tão adequado.

JADE

  JADE (Jade, 1995, Paramount Pictures, 95min) Direção: William Friedkin. Roteiro: Joe Eszterhas. Fotografia: Andrzej Bartkowiak. Montagem...