O PROCURADO (Wanted, 2008, Universal Pictures, 110min) Direção: Timur Bekmambetov. Roteiro: Michael Brandt, Derek Haas, Chris Morgan, estória de Michael Brandt, Derek Haas, comic book de Mark Millar, J.G. Jones. Fotografia: Mitchell Amundsen. Montagem: David Brenner. Música: Danny Elfman. Figurino: Varvara Avdyushko. Direção de arte/cenários: John Myrhe/Richard Roberts. Produção executiva: Gary Barber, Roger Birnbaum, Adam Siegel, Marc Silvestri. Produção: Jim Lemley, Jason Netter, Marc Platt, Iain Smith. Elenco: James McAvoy, Angelina Jolie, Morgan Freeman, Terence Stamp, Thomas Kretschman. Estreia: 19/6/08 (Festival de Los Angeles)
2 indicações ao Oscar: Edição de Som, Mixagem de Som
Nada como um filme de ação com um protagonista atípico, capaz de despertar a identificação do público! Estrelada pelo inglês James McAvoy - nem de longe uma escolha óbvia para liderar o elenco de um blockbuster de orçamento generoso de 75 milhões de dólares - a adaptação do comic book de Mark Millar e J.G. Jones chamado "O procurado" tem em seu ator principal uma de suas maiores qualidades. Carismático e talentoso, o jovem astro de filmes sérios como "O último rei da Escócia" e "Desejo e reparação" mostra que nem só de dramas densos sobrevive uma carreira em Hollywood, e, com a preciosa companhia de Morgan Freeman e Angelina Jolie, transforma o que seria apenas mais um filme de ação corriqueiro da máquina americana em um programa empolgante.
Dirigido pelo russo Timbur Bekmambetov - autor de "Guardiões da noite" (04) e "Guardiões do dia" (06), dois dos maiores sucessos de seu país no século XXI - "O procurado" também tem a seu favor o extremo cuidado com o visual, um senso de humor nunca invasivo e cenas capazes de deixar o espectador sem fòlego como nos melhores momentos de James Cameron pré-"Titanic". Exagero? Nem tanto: basta assistir-se à primeira sequência com Angelina Jolie e McAvoy fugindo da perseguição de Thomas Kretschman pelas ruas de uma cidade com trânsito intenso para ser fisgado. Mesmo que as cenas sejam um tanto improváveis é impossível não ficar de queixo caído. E é apenas o primeiro de uma série de momentos admiráveis captados pela criativa câmera de Mitchell Amundsen - cujo currículo inclui o megasucesso "Transformers".
Quando o filme começa, o jovem Wesley Gibson (McAvoy) trabalha na contabilidade de uma empresa qualquer, sendo humilhado pela chefe obesa e traído pela namorada com o melhor amigo. Levando uma vida tediosa e sentindo-se a última criatura na face da Terra, ele se surpreende quando é procurado por um misterioso grupo chamado A Fraternidade, formado por assassinos profissionais e do qual seu pai fazia parte. Incrédulo a princípio, ele aceita entrar no time quando descobre que o homem que matou seu pai tem como missão assassiná-lo. Treinado pela misteriosa Fox (Angelina Jolie) e chefiado pelo veterano Sloan (Morgan Freeman), Wesley acaba tornando-se uma peça fundamental no grupo, aprendendo técnicas de sobrevivência que lhe ajudarão a encarar seu maior inimigo.
Fazendo modificações bastante consideráveis no material que lhe deu origem, a versão para as telas de "O procurado" não foge de alguns clichês do gênero - revelações surpreendentes, tiroteios a granel, treinamentos cruéis, uma mulher fatal - mas os utiliza de forma inteligente e com um ritmo invejável. A transformação de seu protagonista de rapaz frágil e tímido em um assassino talentoso e inteligente é verossímil, graças a um roteiro esperto e à direção firme de Bekmambetov, que trata cada cena com extremo carinho e atenção. Visualmente impactante, seu filme é repleto de ângulos distorcidos, cores estouradas, efeitos visuais e de som impecáveis e um elenco acima de qualquer crítica. Se McAvoy sai-se muito bem de seu primeiro desafio em uma superprodução comercial, a participação luxuosa de Angelina Jolie - deslumbrante como a matadora Fox -, Morgan Freeman e Terence Stamp colabora para deixar tudo ainda mais interessante.
Grande sucesso de bilheteria - de certa forma até mesmo surpreendente - "O procurado" é um dos melhores filmes de ação de seu tempo, equilibrando adrenalina, humor e apuro visual na medida certa. E em um tempo onde qualquer filme do gênero busca sua inspiração em franquias já testadas e aprovadas, não deixa de ser, também, refrescante.
Filmes, filmes e mais filmes. De todos os gêneros, países, épocas e níveis de qualidade. Afinal, a sétima arte não tem esse nome à toa.
sexta-feira
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FIM DOS TEMPOS
FIM DOS TEMPOS (The happening, 2008, 20th Century Fox, 91min) Direção e roteiro: M. Night Shyamalan. Fotografia: Tak Fujimoto. Montagem: Conrad Buff. Música: James Newton Howard. Figurino: Betsy Heinman. Direção de arte/cenários: Jeannine Oppewall/Jay Hart. Produção executiva: Gary Barber, Roger Birnbaum, Ronnie Screwvala, Zarina Screwvala. Produção: Barry Mendel, Sam Mercer, M. Night Shyamalan. Elenco: Mark Wahlberg, Zooey Deschanel, John Leguizamo. Estreia: 13/6/08
Em 1963, o mestre do suspense, Alfred Hitchcock, lançou um de seus mais célebres filmes, "Os pássaros", que contava a revolta sem explicação de milhares de aves de rapina em uma cidade litorânea dos EUA. A julgar pela recepção histérica da crítica e do público americanos a "Fim dos tempos" - thriller dirigido por M. Night Shyamalan que investiga uma catástrofe natural de proporções nacionais - é de se imaginar a quantidade de pedras que seriam jogadas ao velho Hitch caso seu filme estreasse quarenta anos depois de seu lançamento original. Massacrado sem dó nem piedade, "Fim dos tempos" seguiu-se às péssimas críticas que o cineasta havia colecionado com seu "A dama na água", e serviu para, no mínimo, confirmar a extrema má-vontade geral contra os trabalhos do diretor que transformou-se em fenômeno graças a "O sexto sentido". Mesmo longe de ser uma obra-prima - e com alguns defeitos claramente perceptíveis até ao mais distraido espectador - o filme estrelado por Mark Wahlberg é um suspense acima da média, que comprova o talento de um dos poucos cineastas ainda donos de um estilo próprio.
A primeira sequência já é arrepiante e dá uma mostra da capacidade de Shyamalan de sugerir o horror contando apenas com a música (mais uma vez a cargo de James Newton Howard) e a edição de som: em uma bela e tranquila manhã de sol no Central Park nova-iorquino, dezenas de pessoas começam a agir estranhamente. Primeiro, perdem a noção de direção. Depois, falam coisas sem sentido. Por fim, cometem suicídio sem razão aparente. Em pouco tempo, operários de uma construção agem da mesma forma. Não demora para que o acontecimento chegue à imprensa, que de cara pensa tratar-se de um atentado terrorista em forma de arma química. Pouco depois, na Filadélfia, o professor de química Elliot Moore (Mark Wahlberg, um tanto deslocado no papel) descobre que sua cidade também está na rota do misterioso fenômeno e resolve, assim como centenas de conterrâneos, fugir para um local mais seguro. Acompanhado da esposa Alma (Zooey Deschanel) - cujo relacionamento está em crise - e da filha pequena de um amigo que foi procurar a mulher, o rapaz se vê diante de uma catástrofe sem explicações fáceis, que está dizimando a população pelas próprias mãos.
Uma das maiores críticas feitas a "Fim dos tempos" refere-se à explicação dada pelo roteiro ao trágico acontecimento - e que tem nuances ecológicas e de defesa ao meio-ambiente. As reclamações sobre tal opção de Shyamalan apenas mostram o quão engessado está o público de cinema, que provavelmente aceitariam com mais bom grado resoluções fáceis e clichês como conspirações governamentais e alienígenas malvados com sede de destruição. Ao contrariar o esperado, o cineasta apostou na inteligência da plateia e na possibilidade de um pacto com a audiência. Sua aposta não deu certo principalmente porque ele exigiu da audiência uma liberdade maior de imaginação, e contar com isso junto a um público acostumado a soluções mastigadinhas é suicídio comercial. Por outro lado, quem embarcou de verdade no filme ganhou muito mais: cenas dirigidas com extremo cuidado, tensão constante e ao menos uma personagem marcante, capaz de assombrar aos reais fãs de cinema de suspense.
Vivida pela veterana Betty Buckley - que estreou no cinema como uma das professoras de "Carrie, a estranha" (76) - a apavorante Mrs. Jones é, talvez, a melhor personagem de "Fim dos tempos". Misteriosa e paranoica, é ela quem hospeda - meio a contragosto - os protagonistas, no ato final do filme e sua entrada comprova a teoria de Shyamalan de que as pessoas mostram quem elas realmente são justamente nos momentos mais críticos. O desempenho impecável de Buckley de certa forma anula a atuação mecânica tanto de Mark Wahlberg quanto de Zooey Deschanel - que não faz mais do que desfilar caras e bocas, a despeito de seu talento. E são exatamente Wahlberg e Deschanel o calcanhar de Aquiles do filme. Com personagens centrais tão apáticos, não é de admirar que a maior qualidade do trabalho do cineasta seja a direção caprichada e a coragem de ir até o fim com suas ideias.
Primeiro filme de Shyamalan a receber a classificação R-17 (menores de 17 anos somente entram nas salas acompanhados de pais ou responsáveis), "Fim dos tempos" intercala a sugestão com o explícito, com cenas de uma violência até então não vistas na filmografia do diretor. A boa notícia é que a possibilidade de mostrar sangue e cadáveres não tirou do cineasta seu enorme talento em provocar o público. Bem mais inteligente e eficaz do que muitos fizeram crer, é um filme que terá seu valor reconhecido com o passar do tempo.
Em 1963, o mestre do suspense, Alfred Hitchcock, lançou um de seus mais célebres filmes, "Os pássaros", que contava a revolta sem explicação de milhares de aves de rapina em uma cidade litorânea dos EUA. A julgar pela recepção histérica da crítica e do público americanos a "Fim dos tempos" - thriller dirigido por M. Night Shyamalan que investiga uma catástrofe natural de proporções nacionais - é de se imaginar a quantidade de pedras que seriam jogadas ao velho Hitch caso seu filme estreasse quarenta anos depois de seu lançamento original. Massacrado sem dó nem piedade, "Fim dos tempos" seguiu-se às péssimas críticas que o cineasta havia colecionado com seu "A dama na água", e serviu para, no mínimo, confirmar a extrema má-vontade geral contra os trabalhos do diretor que transformou-se em fenômeno graças a "O sexto sentido". Mesmo longe de ser uma obra-prima - e com alguns defeitos claramente perceptíveis até ao mais distraido espectador - o filme estrelado por Mark Wahlberg é um suspense acima da média, que comprova o talento de um dos poucos cineastas ainda donos de um estilo próprio.
A primeira sequência já é arrepiante e dá uma mostra da capacidade de Shyamalan de sugerir o horror contando apenas com a música (mais uma vez a cargo de James Newton Howard) e a edição de som: em uma bela e tranquila manhã de sol no Central Park nova-iorquino, dezenas de pessoas começam a agir estranhamente. Primeiro, perdem a noção de direção. Depois, falam coisas sem sentido. Por fim, cometem suicídio sem razão aparente. Em pouco tempo, operários de uma construção agem da mesma forma. Não demora para que o acontecimento chegue à imprensa, que de cara pensa tratar-se de um atentado terrorista em forma de arma química. Pouco depois, na Filadélfia, o professor de química Elliot Moore (Mark Wahlberg, um tanto deslocado no papel) descobre que sua cidade também está na rota do misterioso fenômeno e resolve, assim como centenas de conterrâneos, fugir para um local mais seguro. Acompanhado da esposa Alma (Zooey Deschanel) - cujo relacionamento está em crise - e da filha pequena de um amigo que foi procurar a mulher, o rapaz se vê diante de uma catástrofe sem explicações fáceis, que está dizimando a população pelas próprias mãos.
Uma das maiores críticas feitas a "Fim dos tempos" refere-se à explicação dada pelo roteiro ao trágico acontecimento - e que tem nuances ecológicas e de defesa ao meio-ambiente. As reclamações sobre tal opção de Shyamalan apenas mostram o quão engessado está o público de cinema, que provavelmente aceitariam com mais bom grado resoluções fáceis e clichês como conspirações governamentais e alienígenas malvados com sede de destruição. Ao contrariar o esperado, o cineasta apostou na inteligência da plateia e na possibilidade de um pacto com a audiência. Sua aposta não deu certo principalmente porque ele exigiu da audiência uma liberdade maior de imaginação, e contar com isso junto a um público acostumado a soluções mastigadinhas é suicídio comercial. Por outro lado, quem embarcou de verdade no filme ganhou muito mais: cenas dirigidas com extremo cuidado, tensão constante e ao menos uma personagem marcante, capaz de assombrar aos reais fãs de cinema de suspense.
Vivida pela veterana Betty Buckley - que estreou no cinema como uma das professoras de "Carrie, a estranha" (76) - a apavorante Mrs. Jones é, talvez, a melhor personagem de "Fim dos tempos". Misteriosa e paranoica, é ela quem hospeda - meio a contragosto - os protagonistas, no ato final do filme e sua entrada comprova a teoria de Shyamalan de que as pessoas mostram quem elas realmente são justamente nos momentos mais críticos. O desempenho impecável de Buckley de certa forma anula a atuação mecânica tanto de Mark Wahlberg quanto de Zooey Deschanel - que não faz mais do que desfilar caras e bocas, a despeito de seu talento. E são exatamente Wahlberg e Deschanel o calcanhar de Aquiles do filme. Com personagens centrais tão apáticos, não é de admirar que a maior qualidade do trabalho do cineasta seja a direção caprichada e a coragem de ir até o fim com suas ideias.
Primeiro filme de Shyamalan a receber a classificação R-17 (menores de 17 anos somente entram nas salas acompanhados de pais ou responsáveis), "Fim dos tempos" intercala a sugestão com o explícito, com cenas de uma violência até então não vistas na filmografia do diretor. A boa notícia é que a possibilidade de mostrar sangue e cadáveres não tirou do cineasta seu enorme talento em provocar o público. Bem mais inteligente e eficaz do que muitos fizeram crer, é um filme que terá seu valor reconhecido com o passar do tempo.
segunda-feira
O MENINO DO PIJAMA LISTRADO
O MENINO DO PIJAMA LISTRADO (The boy with the stripped pyjamas, 2008, Miramax Films, 94min) Direção: Mark Herman. Roteiro: Mark Herman, romance de John Boyne. Fotografia: Benoit Delhomme. Montagem: Michael Ellis. Música: James Horner. Figurino: Natalie Ward. Direção de arte/cenários: Martin Childs/Gabor Nagy. Produção executiva: Mark Herman, Christine Langan. Produção: David Heyman. Elenco: Asa Butterfield, Zac Matoon O'Brien, Vera Farmiga, David Thewlis, Rupert Friend. Estreia: 28/8/08 (Festival de Carnegie)
Trágicas histórias passadas em campos de concentração não são novidade no cinema, haja visto que é quase um subgênero dentro da indústria. Porém, com raras exceções - o clássico "O diário de Anne Frank" entre elas - poucas vezes esse capítulo chocante da história da humanidade foi retratado sob o ponto de vista das crianças. Essa é, talvez, uma das maiores qualidades de "O menino do pijama listrado", uma sensível e delicada adaptação do romance de John Boyne feita pelo inglês Mark Herman - comandante de algumas das mais festejadas produções inglesas dos anos 90, como "Laura, a voz de uma estrela". Discreto e direto, ele não interfere no desenvolvimento de uma trama que, por si só, já é chocante o bastante.
Recriando com competência a Alemanha da II Guerra Mundial, o filme de Herman é visto pela ótica de Bruno (Asa Butterfield), o filho caçula de um comandante da SS (vivido por David Thewlis) que se vê, contra a vontade de toda a família, transferido para uma propriedade no interior. Solitário e introspectivo, Bruno tenta entender, com toda a ingenuidade de seus oito anos de idade, o mundo à sua volta - logicamente tendo seus questionamentos oprimidos pelo pai e pelo professor que vai até sua casa ensinar-lhe a respeito do orgulho nacionalista pregado por Hitler. Enquanto sua irmã mais velha vai cedendo à ideologia nazista - em parte também por sua paixão por um jovem soldado (Rupert Friend) - ele acaba fazendo amizade com o pequeno Shmuel (Jack Scanlon), um menino judeu prisioneiro do campo de concentração perto de sua propriedade. Sua inocência é tamanha que ele imagina que o campo é apenas uma fazenda, e essa sua falta de conhecimento o leva a uma tragédia.
Narrado com sutileza e sem aprofundar-se na violência - afinal de contas o romance no qual é baseado tinha o público infanto-juvenil como alvo, além dos adultos - "O menino do pijama listrado"conquista exatamente pelo lirismo com que se apresenta diante do espectador, acostumado a filmes com essa temática bem mais contundentes visualmente - como "A lista de Schindler", de Steven Spielberg. A crueldade do nazismo é disfarçada com soluções narrativas inteligentes e com certa poesia, valorizadas pela fotografia simples e sutil de Benoit Delhomme e pela bela trilha sonora de James Horner, que mesmo nos momentos de maior tensão alivia a angústia do público na medida em que a trama se dirige a um final dramático e chocante.
Justamente por não apelar para a violência que tornou-se clichê quando se fala em nazismo e por manter o senso de inocência do romance que lhe deu origem, "O menino do pijama listrado" é uma pérola que merece ser descoberta e louvada. A amizade entre Bruno e Shmuel - que proporciona ao filme suas melhores cenas - são de uma beleza única no gênero e é impossível não sentir-se um tanto tocado quando começarem os créditos finais. Não é isso que fazem os bons filmes?
Trágicas histórias passadas em campos de concentração não são novidade no cinema, haja visto que é quase um subgênero dentro da indústria. Porém, com raras exceções - o clássico "O diário de Anne Frank" entre elas - poucas vezes esse capítulo chocante da história da humanidade foi retratado sob o ponto de vista das crianças. Essa é, talvez, uma das maiores qualidades de "O menino do pijama listrado", uma sensível e delicada adaptação do romance de John Boyne feita pelo inglês Mark Herman - comandante de algumas das mais festejadas produções inglesas dos anos 90, como "Laura, a voz de uma estrela". Discreto e direto, ele não interfere no desenvolvimento de uma trama que, por si só, já é chocante o bastante.
Recriando com competência a Alemanha da II Guerra Mundial, o filme de Herman é visto pela ótica de Bruno (Asa Butterfield), o filho caçula de um comandante da SS (vivido por David Thewlis) que se vê, contra a vontade de toda a família, transferido para uma propriedade no interior. Solitário e introspectivo, Bruno tenta entender, com toda a ingenuidade de seus oito anos de idade, o mundo à sua volta - logicamente tendo seus questionamentos oprimidos pelo pai e pelo professor que vai até sua casa ensinar-lhe a respeito do orgulho nacionalista pregado por Hitler. Enquanto sua irmã mais velha vai cedendo à ideologia nazista - em parte também por sua paixão por um jovem soldado (Rupert Friend) - ele acaba fazendo amizade com o pequeno Shmuel (Jack Scanlon), um menino judeu prisioneiro do campo de concentração perto de sua propriedade. Sua inocência é tamanha que ele imagina que o campo é apenas uma fazenda, e essa sua falta de conhecimento o leva a uma tragédia.
Narrado com sutileza e sem aprofundar-se na violência - afinal de contas o romance no qual é baseado tinha o público infanto-juvenil como alvo, além dos adultos - "O menino do pijama listrado"conquista exatamente pelo lirismo com que se apresenta diante do espectador, acostumado a filmes com essa temática bem mais contundentes visualmente - como "A lista de Schindler", de Steven Spielberg. A crueldade do nazismo é disfarçada com soluções narrativas inteligentes e com certa poesia, valorizadas pela fotografia simples e sutil de Benoit Delhomme e pela bela trilha sonora de James Horner, que mesmo nos momentos de maior tensão alivia a angústia do público na medida em que a trama se dirige a um final dramático e chocante.
Justamente por não apelar para a violência que tornou-se clichê quando se fala em nazismo e por manter o senso de inocência do romance que lhe deu origem, "O menino do pijama listrado" é uma pérola que merece ser descoberta e louvada. A amizade entre Bruno e Shmuel - que proporciona ao filme suas melhores cenas - são de uma beleza única no gênero e é impossível não sentir-se um tanto tocado quando começarem os créditos finais. Não é isso que fazem os bons filmes?
sexta-feira
QUEIME DEPOIS DE LER
QUEIME DEPOIS DE LER (Burn after reading, 2008, Focus Features, 96min) Direção e roteiro: Ethan Coen, Joel Coen. Fotografia: Emmanuel Lubezki. Montagem: Roderick Jaynes. Música: Carter Burwell. Figurino: Mary Zophres. Direção de arte/cenários: Jess Gonchor/Nancy Haigh. Produção executiva: Tim Bevan, Eric Fellner, Robert Graf. Elenco: George Clooney, Brad Pitt, Frances McDormand, John Malkovich, Tilda Swinton, Richard Jenkins, J.K. Simmons. Estreia: 07/8/08 (Festival de Veneza)
Depois da consagração com os Oscar de filme, direção e roteiro por "Onde os fracos não tem vez", era de se esperar que os irmãos Coen se tornassem mais ambiciosos. Acontece, porém, que a dupla - responsável pela aura de respeitabilidade que o cinema independente americano atingiu nos anos 80 - não joga exatamente pelas regras do mainstream hollywoodiano. Fugindo desesperadamente da repetição, eles lançaram, poucos meses depois da cerimônia de entrega das estatuetas, a comédia "Queime depois de ler", que mistura um roteiro anárquico com personagens que beiram a estupidez - elementos que deram muito certo em algumas de suas obras mais respeitadas, como "Fargo" e "E aí, meu irmão, cadê você?".
Escrito concomitantemente a "Onde os fracos não tem vez", o roteiro de "Queime depois de ler" tem a seu favor o fato de não se levar a sério em momento algum, devolvendo a seus autores o tom de deboche que sempre faz parte de sua filmografia. A diferença é que dessa vez os diálogos nonsense são declamados por rostos conhecidos do grande público, como John Malkovich, George Clooney e Brad Pitt, o que talvez explique a renda de mais de 60 milhões de dólares - tímida em relação aos blockbusters, mas respeitável em se tratando de um filme com o orçamento modesto de pouco mais de 35 milhões. Levando-se em conta também que não segue o padrão de comédias que o público americano gosta - a saber, bobagens sobre fluidos corporais e piadas grosseiras e apelativas. Inteligente e sarcástico, o filme dos Coen é um biscoito fino, despretensioso e muito engraçado.
Tudo começa quando Osborne Cox (John Malkovich, exercitando ainda mais sua persona enlouquecida), um agente da CIA especializado nos Balcãs, é demitido devido a seu problema de alcoolismo. Revoltado, ele resolve escrever suas memórias. Enquanto isso, sua mulher, Katie (Tilda Swinton) tem um caso extraconjugal com Harry Pfarrer (George Clooney), que trabalha no Departamento de Estado e também é casado. O quadrilátero amoroso se complica ainda mais quando Harry - que busca outras amantes em sites da Internet - conhece Linda Litzke (Frances McDormand), funcionária de uma academia de ginástica que tem a ideia fixa de realizar uma série de cirurgias plásticas. Frustrada por não ter cobertura de seu plano de saúde, ela vê uma luz no fim do túnel quando encontra, sem querer, um disquete com os primeiros capítulos das memórias de Cox. Ao lado de seu colega Chad Feldheimer (Brad Pitt), ela resolve chantagear o ex-agente, acreditando que o manuscrito trata de segredos de estado. A partir daí a confusão está formada.
Que não se espere de "Queime depois de ler" uma profusão de piadas. O roteiro dos irmãos Coen é um brilhante exercício de bom-humor e crítica política (sem precisar apelar para intelectualismo). Sua trama, repleta de mal-entendidos e reviravoltas, é um prato cheio para o talento de seu elenco, que deita e rola com personagens que tem seu charme justamente na sua falta de noção. Desde o don juan virtual vivido por Clooney - em sua terceira atuação sobre o comando dos cineastas - até a ansiosa e carente personagem de McDormand, tudo funciona divinamente, graças, logicamente, ao talento dos diretores em extrair de cada um o seu melhor. Aí inclui-se o timing cômico de Brad Pitt e J.K. Simmons e o rosto sempre repleto de nuances de Tilda Swinton. São os excelentes atores escalados que dão suporte ao tresloucado roteiro, cujo principal objetivo é divertir o espectador. E, justiça seja feita, faz isso muito bem.
Depois da consagração com os Oscar de filme, direção e roteiro por "Onde os fracos não tem vez", era de se esperar que os irmãos Coen se tornassem mais ambiciosos. Acontece, porém, que a dupla - responsável pela aura de respeitabilidade que o cinema independente americano atingiu nos anos 80 - não joga exatamente pelas regras do mainstream hollywoodiano. Fugindo desesperadamente da repetição, eles lançaram, poucos meses depois da cerimônia de entrega das estatuetas, a comédia "Queime depois de ler", que mistura um roteiro anárquico com personagens que beiram a estupidez - elementos que deram muito certo em algumas de suas obras mais respeitadas, como "Fargo" e "E aí, meu irmão, cadê você?".
Escrito concomitantemente a "Onde os fracos não tem vez", o roteiro de "Queime depois de ler" tem a seu favor o fato de não se levar a sério em momento algum, devolvendo a seus autores o tom de deboche que sempre faz parte de sua filmografia. A diferença é que dessa vez os diálogos nonsense são declamados por rostos conhecidos do grande público, como John Malkovich, George Clooney e Brad Pitt, o que talvez explique a renda de mais de 60 milhões de dólares - tímida em relação aos blockbusters, mas respeitável em se tratando de um filme com o orçamento modesto de pouco mais de 35 milhões. Levando-se em conta também que não segue o padrão de comédias que o público americano gosta - a saber, bobagens sobre fluidos corporais e piadas grosseiras e apelativas. Inteligente e sarcástico, o filme dos Coen é um biscoito fino, despretensioso e muito engraçado.
Tudo começa quando Osborne Cox (John Malkovich, exercitando ainda mais sua persona enlouquecida), um agente da CIA especializado nos Balcãs, é demitido devido a seu problema de alcoolismo. Revoltado, ele resolve escrever suas memórias. Enquanto isso, sua mulher, Katie (Tilda Swinton) tem um caso extraconjugal com Harry Pfarrer (George Clooney), que trabalha no Departamento de Estado e também é casado. O quadrilátero amoroso se complica ainda mais quando Harry - que busca outras amantes em sites da Internet - conhece Linda Litzke (Frances McDormand), funcionária de uma academia de ginástica que tem a ideia fixa de realizar uma série de cirurgias plásticas. Frustrada por não ter cobertura de seu plano de saúde, ela vê uma luz no fim do túnel quando encontra, sem querer, um disquete com os primeiros capítulos das memórias de Cox. Ao lado de seu colega Chad Feldheimer (Brad Pitt), ela resolve chantagear o ex-agente, acreditando que o manuscrito trata de segredos de estado. A partir daí a confusão está formada.
Que não se espere de "Queime depois de ler" uma profusão de piadas. O roteiro dos irmãos Coen é um brilhante exercício de bom-humor e crítica política (sem precisar apelar para intelectualismo). Sua trama, repleta de mal-entendidos e reviravoltas, é um prato cheio para o talento de seu elenco, que deita e rola com personagens que tem seu charme justamente na sua falta de noção. Desde o don juan virtual vivido por Clooney - em sua terceira atuação sobre o comando dos cineastas - até a ansiosa e carente personagem de McDormand, tudo funciona divinamente, graças, logicamente, ao talento dos diretores em extrair de cada um o seu melhor. Aí inclui-se o timing cômico de Brad Pitt e J.K. Simmons e o rosto sempre repleto de nuances de Tilda Swinton. São os excelentes atores escalados que dão suporte ao tresloucado roteiro, cujo principal objetivo é divertir o espectador. E, justiça seja feita, faz isso muito bem.
quinta-feira
SEX AND THE CITY - O FILME
SEX AND THE CITY, O FILME (Sex and the city, 2008, New Line Cinema/HBO Pictures, 145min) Direção: Michael Patrick King. Roteiro: Michael Patrick King, livro de Candance Bushnell, série criada por Darren Starr. Fotografia: John Thomas. Montagem: Michael Berenbaum. Música: Dean Landon, Aaron Zigman. Figurino: Patricia Field. Direção de arte/cenários: Jeremy Conway/Lydia Marks. Produção executiva: Richard Brener, Kathryn Busby, Toby Emmerich, Jonathan Filley. Produção: Michael Patrick King, John Melfi, Sarah Jessica Parker, Darren Starr. Elenco: Sarah Jessica Parker, Kim Catrall, Kristen Davis, Cynthia Nixon, Chris Noth, Candice Bergen, Jennifer Hudson, Evan Handler, David Eigenberg. Estreia: 27/5/08
Depois de seis temporadas de sucesso, com direito a lançar moda e ditar comportamentos, era de se esperar que "Sex and the city" fizesse a transição da tv para o cinema. O que causou estranheza foi a demora para que isso acontecesse. Tendo seu último episódio transmitido em 2004, a série - criada por Darren Star e baseada em um livro da jornalista americana Candance Bushnell - só viu sua versão cinematográfica quatro anos mais tarde, principalmente devido a dificuldades salariais com Kim Catrall, que exigia um cachê igual ao da protagonista Sarah Jessica Parker. Problema resolvido - com um acordo com a HBO - finalmente os fãs de Carrie Bradshaw e suas fiéis escudeiras puderam acompanhar mais um capítulo de suas personagens preferidas, dessa vez no escurinho de uma sala de cinema e com a extensa duração de 2 horas e meia.
Sim, "Sex and the city, o filme" é um episódio estendido da série - e é inclusive roteirizado e dirigido por Michael Patrick King, que assinou vários capítulos do programa. Isso significa que não tem ambições outras que não divertir o público que conquistou durante seus anos no ar. Para isso, mantém - e expande - tudo que deu certo, além de acrescentar uma personagem nova (vivida pela vencedora do Oscar Jennifer Hudson) e dar a suas personagens crises familiares ainda não exploradas (ou ao menos pouco detalhadas na telinha). Funciona que é uma beleza para todos aqueles que acompanharam a trajetória da jornalista vivida por Parker - que tornou-se produtora executiva no decorrer dos anos - e suas amigas, todas moradoras de uma Nova York fotogênica, antenada com a moda e capaz de deslumbrar o espectador. Pode aborrecer a quem não sabe do que se trata, mas é claro e evidente que não é pra esse público que o filme foi realizado.
Não se pode dizer que "Sex and the city" funcione única e exclusivamente para quem já tem prévio conhecimento do enredo, mas é claro que os fãs tem muito mais a aproveitar com a trama criada por Michael Patrick King, que começa quatro anos depois do último episódio. Carrie (Sarah Jessica Parker, sempre à vontade no papel) ainda está completamente apaixonada por Mr. Big (Chris Noth) - agora devidamente nomeado como John Preston - e, mais por motivos práticos do que por românticos, aceita casar-se com ele. Enquanto é preparada a cerimônia - que aumenta de tamanho conforme o entusiasmo da noiva - suas amigas passam por fases diferentes da vida. Charlotte (Kristin Davis) está feliz com o marido e a filha adotiva e se descobre grávida quando menos espera; Samantha (Kim Catrall) começa a aborrecer-se com a atenção que dá mais ao namorado astro de Hollywood do que a si mesma; e Miranda (Cynthia Nixon) descobre que o marido Steve (David Eigenberg) a traiu com outra mulher, o que desencadeia uma crise na relação entre Carrie e o noivo.
Como cinema "Sex and the city" não acrescenta muito. Tem vícios televisivos, um roteiro simples - mas que ainda assim consegue emocionar e fazer rir na mesma medida - e dá a constante impressão de ser um episódio triplo da série. O melhor de tudo é que isso não interfere na qualidade do produto final. A química entre as quatro protagonistas continua intocada, a fotografia é caprichada e o figurino de Patricia Field mantém-se como uma personagem à parte. Não deixa nada a desejar junto aos fãs. Não surpreende ter rendido mais de 150 milhões de dólares somente no mercado doméstico. Mereceu!
Depois de seis temporadas de sucesso, com direito a lançar moda e ditar comportamentos, era de se esperar que "Sex and the city" fizesse a transição da tv para o cinema. O que causou estranheza foi a demora para que isso acontecesse. Tendo seu último episódio transmitido em 2004, a série - criada por Darren Star e baseada em um livro da jornalista americana Candance Bushnell - só viu sua versão cinematográfica quatro anos mais tarde, principalmente devido a dificuldades salariais com Kim Catrall, que exigia um cachê igual ao da protagonista Sarah Jessica Parker. Problema resolvido - com um acordo com a HBO - finalmente os fãs de Carrie Bradshaw e suas fiéis escudeiras puderam acompanhar mais um capítulo de suas personagens preferidas, dessa vez no escurinho de uma sala de cinema e com a extensa duração de 2 horas e meia.
Sim, "Sex and the city, o filme" é um episódio estendido da série - e é inclusive roteirizado e dirigido por Michael Patrick King, que assinou vários capítulos do programa. Isso significa que não tem ambições outras que não divertir o público que conquistou durante seus anos no ar. Para isso, mantém - e expande - tudo que deu certo, além de acrescentar uma personagem nova (vivida pela vencedora do Oscar Jennifer Hudson) e dar a suas personagens crises familiares ainda não exploradas (ou ao menos pouco detalhadas na telinha). Funciona que é uma beleza para todos aqueles que acompanharam a trajetória da jornalista vivida por Parker - que tornou-se produtora executiva no decorrer dos anos - e suas amigas, todas moradoras de uma Nova York fotogênica, antenada com a moda e capaz de deslumbrar o espectador. Pode aborrecer a quem não sabe do que se trata, mas é claro e evidente que não é pra esse público que o filme foi realizado.
Não se pode dizer que "Sex and the city" funcione única e exclusivamente para quem já tem prévio conhecimento do enredo, mas é claro que os fãs tem muito mais a aproveitar com a trama criada por Michael Patrick King, que começa quatro anos depois do último episódio. Carrie (Sarah Jessica Parker, sempre à vontade no papel) ainda está completamente apaixonada por Mr. Big (Chris Noth) - agora devidamente nomeado como John Preston - e, mais por motivos práticos do que por românticos, aceita casar-se com ele. Enquanto é preparada a cerimônia - que aumenta de tamanho conforme o entusiasmo da noiva - suas amigas passam por fases diferentes da vida. Charlotte (Kristin Davis) está feliz com o marido e a filha adotiva e se descobre grávida quando menos espera; Samantha (Kim Catrall) começa a aborrecer-se com a atenção que dá mais ao namorado astro de Hollywood do que a si mesma; e Miranda (Cynthia Nixon) descobre que o marido Steve (David Eigenberg) a traiu com outra mulher, o que desencadeia uma crise na relação entre Carrie e o noivo.
Como cinema "Sex and the city" não acrescenta muito. Tem vícios televisivos, um roteiro simples - mas que ainda assim consegue emocionar e fazer rir na mesma medida - e dá a constante impressão de ser um episódio triplo da série. O melhor de tudo é que isso não interfere na qualidade do produto final. A química entre as quatro protagonistas continua intocada, a fotografia é caprichada e o figurino de Patricia Field mantém-se como uma personagem à parte. Não deixa nada a desejar junto aos fãs. Não surpreende ter rendido mais de 150 milhões de dólares somente no mercado doméstico. Mereceu!
OS ESTRANHOS
OS ESTRANHOS (The strangers, 2008, Rogue Pictures, 86min) Direção e roteiro: Bryan Bertino. Fotografia: Peter Sova. Montagem: Kevin Greutert. Música: tomandandy. Figurino: Susan Kaufman. Direção de arte/cenários: John D. Kretschmer/Missy Berent. Produção executiva: Joe Drake, Mark D. Evans, Kelli Konop, Trevor Macy, Sonny Mallhi. Produção: Doug Davison, Nathan Kahane, Roy Lee. Elenco: Scott Speedman, Liv Tyler. Estreia: 30/5/08
Em uma época onde os filmes de terror apelam com frequência cada vez maior ao sobrenatural e aos efeitos visuais, não deixa de ser surpreendente que algo como "Os estranhos" tenha sido realizado. Feito com cerca de 10 milhões de dólares - o que não paga nem um terço do salário dos grandes astros hollywoodianos - e protagonizado por um casal de atores de apenas razoável popularidade, o filme de estreia do cineasta Bryan Bertino é daqueles capazes de fazer o espectador pular da poltrona e roer as unhas de aflição do início ao fim. Tudo graças a uma edição de som espetacular, um roteiro que dá mais importância à sugestão do que ao explícito e a algumas palavrinhas no início da projeção: baseado em fatos reais.
Ainda que essas palavras não sejam exatamente verdadeiras - segundo o diretor e roteirista ele inspirou-se em uma vaga memória de infância e em alguns crimes da família Manson - isso fica insignificante diante da qualidade do terror apresentado pelo filme. Contando basicamente com dois atores centrais - e um elenco de apoio que sustenta a ação em momentos pontuais - "Os estranhos" é uma aula de narrativa de suspense, que daria orgulho ao mestre Hitchcock. Quase totalmente realizado com uma câmera na mão, o que acentua o clima de angústia e urgência da história, o filme de Bertino (que quase foi assinado pelo Mark Romanek de "Marcas de uma obsessão") é opressivo e claustrofóbico na medida certa. É, também, uma pequena obra-prima do gênero.
Construindo o suspense aos poucos, o roteiro começa apresentando seus protagonistas, o jovem casal James (Scott Speedman) e Kristen (Liv Tyler), que chegam à casa de campo da família do rapaz depois de uma noite que não correu exatamente como o esperado: apaixonado pela namorada, ele acaba de pedí-la em casamento e está decepcionado com sua recusa. O clima pesado entre os dois, porém, não é nada perto do que está por vir. O que começa com batidas repetidas na porta - e com estranhos pedindo informações a respeito de pessoas que eles não conhecem - termina com uma noite do mais puro desespero: um grupo de três desconhecidos passa a aterrorizá-los, impedindo-os de abandonar a propriedade.
É admirável a maneira com que o cineasta estreante consegue manter o nível de tensão constante, utilizando para isso elementos básicos como o silêncio e a sensação de desamparo da protagonista, vivida com garra e esforço pela bela Liv Tyler, que transmite com perfeição os sentimentos de pânico de sua personagem. É Tyler quem comanda o espetáculo, deixando a Scott Speedman a árdua tarefa de buscar atos de heroísmo em circunstâncias tão carregadas de medo. O pavor com que os dois se descobrem prisioneiros inocentes de uma brincadeira mortal é dividido com a plateia, que embarca sem reversas na trama urdida pelo roteiro. Tenso e angustiante, "Os estranhos" é o típico filme de deixar qualquer um com medo de dormir com as luzes apagadas.
Em uma época onde os filmes de terror apelam com frequência cada vez maior ao sobrenatural e aos efeitos visuais, não deixa de ser surpreendente que algo como "Os estranhos" tenha sido realizado. Feito com cerca de 10 milhões de dólares - o que não paga nem um terço do salário dos grandes astros hollywoodianos - e protagonizado por um casal de atores de apenas razoável popularidade, o filme de estreia do cineasta Bryan Bertino é daqueles capazes de fazer o espectador pular da poltrona e roer as unhas de aflição do início ao fim. Tudo graças a uma edição de som espetacular, um roteiro que dá mais importância à sugestão do que ao explícito e a algumas palavrinhas no início da projeção: baseado em fatos reais.
Ainda que essas palavras não sejam exatamente verdadeiras - segundo o diretor e roteirista ele inspirou-se em uma vaga memória de infância e em alguns crimes da família Manson - isso fica insignificante diante da qualidade do terror apresentado pelo filme. Contando basicamente com dois atores centrais - e um elenco de apoio que sustenta a ação em momentos pontuais - "Os estranhos" é uma aula de narrativa de suspense, que daria orgulho ao mestre Hitchcock. Quase totalmente realizado com uma câmera na mão, o que acentua o clima de angústia e urgência da história, o filme de Bertino (que quase foi assinado pelo Mark Romanek de "Marcas de uma obsessão") é opressivo e claustrofóbico na medida certa. É, também, uma pequena obra-prima do gênero.
Construindo o suspense aos poucos, o roteiro começa apresentando seus protagonistas, o jovem casal James (Scott Speedman) e Kristen (Liv Tyler), que chegam à casa de campo da família do rapaz depois de uma noite que não correu exatamente como o esperado: apaixonado pela namorada, ele acaba de pedí-la em casamento e está decepcionado com sua recusa. O clima pesado entre os dois, porém, não é nada perto do que está por vir. O que começa com batidas repetidas na porta - e com estranhos pedindo informações a respeito de pessoas que eles não conhecem - termina com uma noite do mais puro desespero: um grupo de três desconhecidos passa a aterrorizá-los, impedindo-os de abandonar a propriedade.
É admirável a maneira com que o cineasta estreante consegue manter o nível de tensão constante, utilizando para isso elementos básicos como o silêncio e a sensação de desamparo da protagonista, vivida com garra e esforço pela bela Liv Tyler, que transmite com perfeição os sentimentos de pânico de sua personagem. É Tyler quem comanda o espetáculo, deixando a Scott Speedman a árdua tarefa de buscar atos de heroísmo em circunstâncias tão carregadas de medo. O pavor com que os dois se descobrem prisioneiros inocentes de uma brincadeira mortal é dividido com a plateia, que embarca sem reversas na trama urdida pelo roteiro. Tenso e angustiante, "Os estranhos" é o típico filme de deixar qualquer um com medo de dormir com as luzes apagadas.
quarta-feira
VESTIDA PARA CASAR
VESTIDA PARA CASAR (27 dresses, 2008, 20th Century Fox, 111min) Direção: Anne Fletcher. Roteiro: Aline Brosh McKenna. Fotografia: Peter James. Montagem: Priscilla Nedd-Friendly. Música: Randy Edelman. Figurino: Catherine Marie Thomas. Direção de arte/cenários: Sheperd Frankel/Chryss Hionis. Produção executiva: Becki Cross Trujillo, Michael Mayer, Bobby Newmyer, Erin Stam. Produção: Gary Barber, Roger Birnbaum, Jonathan Glickman. Elenco: Katherine Heigl, James Marsden, Edward Burns, Malin Akerman, Judy Greer, Melora Hardin. Estreia: 09/01/08
Alçada à fama graças ao sucesso da série de TV "Grey's anatomy", a atriz Katherine Heigl tentou sua sorte no cinema em um gênero nada comprometedor, a comédia romântica. Dona de uma beleza não ameaçadora, do tipo girl next door, ela conquistou o público que estava órfão de uma estrela nos moldes de Meg Ryan. Uma prova disso foi o sucesso de "Vestida para casar", um filme simpático e divertido - mas nada excepcional - que confirmou-a como um nome quente, capaz de segurar um filme sem fazer muita força. Ao lado de James Marsden - no papel inédito de galã, já que ele sempre foi o preterido nos triângulos amorosos dos quais participou no cinema - Heigl exala simpatia e carisma no papel da romântica Jane, que tem orgulho em ser a melhor dama-de-honra que se pode imaginar.
Dedicada e confiável, Jane não hesita em ajudar a todas as suas amigas que a escolhem como dama de honra, mesmo que para isso, precise desdobrar-se exaustivamente. Secretamente apaixonada pelo chefe, o charmoso George (Edward Burns), ela sonha em ter um casamento romântico, mas suas probabilidades ficam ainda menores quando ele acaba iniciando um romance com Tess (Malin Akerman), sua irmã caçula. Desesperada e mantendo seus sentimentos escondidos, ela conhece o jornalista Kevin (James Marsden), que tenta a todo custo deixar de fazer matérias sobre festas de casamento e assinar reportagens menos banais. Kevin descobre o currículo vasto de Jane - 27 casamentos como dama-de-honra - e pretende escrever uma história sobre ela, mas a convivência entre eles acaba levando-os a se apaixonar.
"Vestida para casar" é uma comédia romântica que, apesar de não acrescentar nenhuma novidade ao gênero, tem a seu favor o carisma de seus protagonistas e o talento de sua diretora, Anne Fletcher - que depois assinaria "A proposta", com Sandra Bullock e "Minha mãe é uma viagem", com Barbra Streisand - em transformar clichês em novidade. É assim que a plateia se vê sorrindo em uma cena na qual Jane e Kevin, bêbados, cantam "Bennie and the Jets", de Elton John e dando risada na sequência em que Jane mostra ao jornalista todos os vestidos que usou nas festas de casamento das quais participou - e que ainda mantém em um guarda-roupa lotado. Exatamente por não mexer em time que está ganhando é que Fletcher deixa seu filme com um sabor bastante delicioso de sessão da tarde das antigas.
Que não se espere de "Vestida para casar" mais do que 110 minutos de diversão leve e descompromissada. É o programa perfeito para quem gosta de comédias românticas cujo final não surpreende e o desenvolvimento não machuca. Quem procura mais do que isso não vai gostar. Mas quem sabe o que esperar não tem como se decepcionar.
terça-feira
P.S. EU TE AMO
P. S. EU TE AMO (P. S. I love you, 2007, Alcon Entertainment, 126min) Direção: Richard LaGravenese. Roteiro: Richard LaGravenese, Steven Rogers, romance de Cecelia Aihern. Fotografia: Terry Stacey. Montagem: David Moritz. Música: John Powell. Figurino: Cindy Evans. Direção de arte/cenários: Sheperd Frankel/Alyssa Winter. Produção executiva: James Hollond, John H. Starke, Donald A. Starr, Daniel J. B. Taylor. Produção: Wendy Finerman, Broderick Johnson, Andrew A. Kosove, Molly Smith. Elenco: Hilary Swank, Gerard Butler, Kathy Bates, Harry Connick Jr., Jeffrey Dean Morgan, Lisa Kudrow, Gina Gershon. Estreia: 21/12/07
Richard LaGravanese tem em seu currículo de roteirista algumas pérolas do cinema americano, como "O pescador de ilusões" (pelo qual concorreu ao Oscar) e "As pontes de Madison", que levou multidões às lagrimas. Como cineasta, porém, não teve a mesma sorte, apesar das qualidades de seu "Escritores da liberdade", estrelado por Hilary Swank, seu filme mais relevante. E é justamente Swank, do alto de seu prestígio como vencedora de 2 estatuetas da Academia a protagonista daquele que acabou tornando-se seu maior sucesso como diretor. Romântico e melancólico, "P.S. Eu te amo", adaptado bastante livremente do livro de Cecelia Aihern é a prova de que nem só de mocinhas fortes vive a carreira da atriz. Mesmo que bem distante de seus melhores momentos, Swank lidera o elenco com desenvoltura e convence como uma jovem viúva que tenta superar a morte do marido com a ajuda dele mesmo.
A primeira - e longa - sequência do filme apresenta o casal formado por Holly (vivida por uma Swank mais frágil e feminina do que até então) e Gerry (Gerard Butler). Apaixonados, eles almejam uma vida melhor, um apartamento maior e um futuro onde terão filhos e dinheiro sobrando. O futuro, porém, não chega. Gerry morre de um tumor no cérebro, deixando Holly arrasada. Com dificuldades de seguir sua vida, porém, ela se surpreende quando, no dia de seu aniversário, recebe uma carta de Gerry, incentivando-a a sacudir a poeira, dar a volta por cima e recomeçar. A partir daí, ela passa a receber constante correspondência do marido - que chega até ela de forma misteriosa - e redescobre os prazeres da vida e o amor, que pode estar tanto com o tímido Daniel (Harry Connick Jr.), ajudante de sua mãe, ou com o sedutor William (Jeffrey Dean Morgan), um músico irlandês que, por coincidência, era amigo de Gerry.
Fazendo alterações substanciais no romance de Aihern - como mudar a ação para Nova York e acrescentar a personagem William, além de diminuir a numerosa família da protagonista - o roteiro de LaGravenese e Steven Rogers tem a seu favor o fato de dar à história um ritmo ágil, que equilibra com facilidade momentos de grande delicadeza e diálogos bem-humorados, em especial quando estão em cenas as melhores amigas de Holly, vividas por Gina Gershon e Lisa Kudrow - essa última repetindo os trejeitos de sua personagem mais famosa, a Phoebe da série "Friends". Quando Kathy Bates entra em cena, como a mãe de Holly, mostra porque é uma das atrizes mais respeitadas de Hollywood, e Jeffrey Dean Morgan exala carisma na pele de William, acrescentando ao filme um calor que falta sempre que Gerard Butler - usando e abusando de seu charme mezzo canastrão mezzo sedutor - não está presente. A atuação apática de Harry Connick Jr. tampouco colabora para o resultado final, o que deixa bastante claras suas limitações dramáticas. E, apesar de forçado, o final comove o suficiente.
Para os fãs do cinema romântico americano "P.S. Eu te amo" é um prato cheio. Apesar de mergulhar em alguns dos clichês mais batidos do gênero, conta uma história que prende a atenção até o final e conta com um elenco acima da média. Não muda a vida de ninguém, mas pode despertar muitas lágrimas.
Richard LaGravanese tem em seu currículo de roteirista algumas pérolas do cinema americano, como "O pescador de ilusões" (pelo qual concorreu ao Oscar) e "As pontes de Madison", que levou multidões às lagrimas. Como cineasta, porém, não teve a mesma sorte, apesar das qualidades de seu "Escritores da liberdade", estrelado por Hilary Swank, seu filme mais relevante. E é justamente Swank, do alto de seu prestígio como vencedora de 2 estatuetas da Academia a protagonista daquele que acabou tornando-se seu maior sucesso como diretor. Romântico e melancólico, "P.S. Eu te amo", adaptado bastante livremente do livro de Cecelia Aihern é a prova de que nem só de mocinhas fortes vive a carreira da atriz. Mesmo que bem distante de seus melhores momentos, Swank lidera o elenco com desenvoltura e convence como uma jovem viúva que tenta superar a morte do marido com a ajuda dele mesmo.
A primeira - e longa - sequência do filme apresenta o casal formado por Holly (vivida por uma Swank mais frágil e feminina do que até então) e Gerry (Gerard Butler). Apaixonados, eles almejam uma vida melhor, um apartamento maior e um futuro onde terão filhos e dinheiro sobrando. O futuro, porém, não chega. Gerry morre de um tumor no cérebro, deixando Holly arrasada. Com dificuldades de seguir sua vida, porém, ela se surpreende quando, no dia de seu aniversário, recebe uma carta de Gerry, incentivando-a a sacudir a poeira, dar a volta por cima e recomeçar. A partir daí, ela passa a receber constante correspondência do marido - que chega até ela de forma misteriosa - e redescobre os prazeres da vida e o amor, que pode estar tanto com o tímido Daniel (Harry Connick Jr.), ajudante de sua mãe, ou com o sedutor William (Jeffrey Dean Morgan), um músico irlandês que, por coincidência, era amigo de Gerry.
Para os fãs do cinema romântico americano "P.S. Eu te amo" é um prato cheio. Apesar de mergulhar em alguns dos clichês mais batidos do gênero, conta uma história que prende a atenção até o final e conta com um elenco acima da média. Não muda a vida de ninguém, mas pode despertar muitas lágrimas.
sexta-feira
[REC]
[REC] ([REC], 2007, Castelao Producciones, 78min) Direção: Jaume
Balagueró, Paco Plaza. Roteiro: Jaume Balagueró, Luis Berdejo, Paco
Plaza. Fotografia: Pablo Rosso. Montagem: David Gallart. Figurino:
Glória Viguer. Direção de arte: Gemma Fauria. Produção executiva: Carlos
Fernández, Julio Fernández. Produção: Julio Fernández. Elenco: Manuela
Velasco, Ferran Terraza, Jorge-Yaman Serrano, Pablo Rosso. Estreia:
29/8/07 (Festival de Veneza)
Nos últimos anos (décadas?), quem procura filmes de terror ousados e criativos precisa buscar longe de Hollywood. Obrigados a agradar a uma plateia que exige nada mais do que sangue e piadas sem graça, os estúdios se contentam a apelar para continuações, refilmagens e versões que pouco ou nada acrescentam às obras originais. Por isso é que, quando um filme como o espanhol "[REC]" surge, todos os elogios são poucos. Realizada com poucos recursos financeiros - mas muito talento e inteligência - a obra dos cineastas Jaume Balagueró e Paco Plaza é assustadora e tensa na medida certa, capaz de fazer a plateia dar saltos olímpicos da poltrona.
A história até não é das mais originais, bebendo na fonte dos zumbis/experiências genéticas/seres de origem duvidosa que tanto serviço prestou ao cinema de terror: a protagonista é a repórter de TV Angela Vidal (Manuela Velasco), que em uma noite aparentemente tranquila, tem como missão acompanhar a rotina de um grupo de bombeiros. O que seria apenas um trabalho de rotina - até mesmo um tanto tedioso - transforma-se em um pesadelo surreal quando todos são chamados a um prédio residencial para socorrer uma senhora de idade presa em seu apartamento. Logo que chegam ao local, eles percebem que a coisa é muito mais séria do que poderiam supor: de forma inexplicável, os moradores são atacados uns pelos outros e transformam-se em assassinos cruéis. Presos ao edifício pela defesa municipal e pela saúde pública, resta a eles tentar entender o que está acontecendo e fugir de um destino trágico.
O modo com que os cineastas traduzem em imagens desfocadas e tremidas o desespero e a angústia das personagens é brilhante: ao eleger como ponto de vista uma câmera de TV estoicamente fiel aos acontecimentos, o roteiro não perde seu tempo em apresentar suas personagens, com a exceção de sua protagonista (e ainda assim de maneira vaga): à audiência não é permitido saber as origens dos moradores, seus dramas pessoais, suas interrelações - todos estão ali com o único objetivo de tornarem-se (ou não) vítimas. Dessa forma, não sobra tempo ao público nem mesmo para respirar. Quando a história realmente começa - depois de um prólogo que em nada deixa antever o pesadelo que virá - é golpe atrás de golpe, susto atrás de susto e um final que (como todo bom filme do gênero) deixa escancarada uma porta para possíveis continuações.
Não que essa possibilidade - tornada real com as sequências - enfraqueça o resultado final. "[REC]" é potente justamente porque não nega suas referências e porque brinca com os clichês sem fazer piada com eles - como a maioria dos filmes de terror da geração "Pânico". Sua coragem em assumir-se como um filme de terror de verdade é a sua maior qualidade, ao lado de sua enorme capacidade de assustar à plateia. Não é à toa que ganhou um remake americano com o nome de "Quarentena", que manteve-se quase 100% fiel à origem. Em time que está ganhando não se mexe, e Hollywood sabe disso como ninguém, mesmo que isso signifique falta de criatividade.
Nos últimos anos (décadas?), quem procura filmes de terror ousados e criativos precisa buscar longe de Hollywood. Obrigados a agradar a uma plateia que exige nada mais do que sangue e piadas sem graça, os estúdios se contentam a apelar para continuações, refilmagens e versões que pouco ou nada acrescentam às obras originais. Por isso é que, quando um filme como o espanhol "[REC]" surge, todos os elogios são poucos. Realizada com poucos recursos financeiros - mas muito talento e inteligência - a obra dos cineastas Jaume Balagueró e Paco Plaza é assustadora e tensa na medida certa, capaz de fazer a plateia dar saltos olímpicos da poltrona.
A história até não é das mais originais, bebendo na fonte dos zumbis/experiências genéticas/seres de origem duvidosa que tanto serviço prestou ao cinema de terror: a protagonista é a repórter de TV Angela Vidal (Manuela Velasco), que em uma noite aparentemente tranquila, tem como missão acompanhar a rotina de um grupo de bombeiros. O que seria apenas um trabalho de rotina - até mesmo um tanto tedioso - transforma-se em um pesadelo surreal quando todos são chamados a um prédio residencial para socorrer uma senhora de idade presa em seu apartamento. Logo que chegam ao local, eles percebem que a coisa é muito mais séria do que poderiam supor: de forma inexplicável, os moradores são atacados uns pelos outros e transformam-se em assassinos cruéis. Presos ao edifício pela defesa municipal e pela saúde pública, resta a eles tentar entender o que está acontecendo e fugir de um destino trágico.
O modo com que os cineastas traduzem em imagens desfocadas e tremidas o desespero e a angústia das personagens é brilhante: ao eleger como ponto de vista uma câmera de TV estoicamente fiel aos acontecimentos, o roteiro não perde seu tempo em apresentar suas personagens, com a exceção de sua protagonista (e ainda assim de maneira vaga): à audiência não é permitido saber as origens dos moradores, seus dramas pessoais, suas interrelações - todos estão ali com o único objetivo de tornarem-se (ou não) vítimas. Dessa forma, não sobra tempo ao público nem mesmo para respirar. Quando a história realmente começa - depois de um prólogo que em nada deixa antever o pesadelo que virá - é golpe atrás de golpe, susto atrás de susto e um final que (como todo bom filme do gênero) deixa escancarada uma porta para possíveis continuações.
Não que essa possibilidade - tornada real com as sequências - enfraqueça o resultado final. "[REC]" é potente justamente porque não nega suas referências e porque brinca com os clichês sem fazer piada com eles - como a maioria dos filmes de terror da geração "Pânico". Sua coragem em assumir-se como um filme de terror de verdade é a sua maior qualidade, ao lado de sua enorme capacidade de assustar à plateia. Não é à toa que ganhou um remake americano com o nome de "Quarentena", que manteve-se quase 100% fiel à origem. Em time que está ganhando não se mexe, e Hollywood sabe disso como ninguém, mesmo que isso signifique falta de criatividade.
quinta-feira
O NEVOEIRO
O NEVOEIRO (The mist, 2007, Dimension Films, 126min) Direção: Frank Darabont. Roteiro: Frank Darabont, romance de Stephen King. Fotografia: Ron Schmidt. Montagem: Hunter M. Via. Música: Mark Isham. Figurino: Giovanna Ottobre-Melton. Direção de arte/cenários: Gregory Melton/Raymond Pumilia. Produção executiva: Richard Saperstein, Bob Weinstein, Harvey Weinstein. Produção: Frank Darabont, Liz Glotzer. Elenco: Thomas Jane, Marcia Gay Harden, Andre Braugher, Laurie Holden, Toby Jones, William Sadler, Frances Sternhagen. Estreia: 21/11/07
De certa forma o cineasta Frank Darabont deve sua carreira ao escritor Stephen King. Seus dois primeiros filmes - "Um sonho de liberdade" e "À espera de um milagre" - foram adaptações da obra do mestre do suspense, e conquistaram, ambos, indicações ao Oscar de melhor filme, ao explorar de maneira sensível histórias que deixavam o terror de lado, concentrando-se em personagens humanas convivendo com situações extremas. Não é de se estranhar, portanto, que Darabont - antes de criar a bem-sucedida série de TV "The walking dead" - voltasse ao universo de King depois do fracasso de seu "Cine Majestic", estrelado por Jim Carrey e praticamente ignorado por crítica e público. Porém, para fugir um pouco do previsível, o diretor arriscou na escolha: optou pela novela "O nevoeiro", publicada em 1980, e pela primeira vez trabalha com uma trama que envolve muito mais a tensão do que o drama.
Não quer dizer que Darabont abandone seu estilo de preocupar-se mais com as personagens do que com efeitos visuais ou terror em estado puro: em "O nevoeiro" ele explora muito mais as reações das personagens diante do horror do que exatamente cenas sanguinolentas, criadas para aterrorizar o espectador. E, comprovando mais uma vez seu grande talento, a receita funciona muito bem. Dirigida com firmeza e com um elenco de ótimos atores - em detrimento de astros milionários - a nova obra do cineasta é tensa, emocionante e, melhor de tudo, ousada, com um final capaz de provocar as reações mais diversas na plateia.
Logicamente a trama de "O nevoeiro" se passa em uma pequena cidade do Maine, como toda história criada por Stephen King. É lá que, depois de uma forte tempestade, o artista plástico Dave Drayton (Thomas Jane em ótimo desempenho) resolve ir ao supermercado para comprar mantimentos, acompanhado do filho pequeno e do vizinho, o advogado Brent Norton (Andre Braugher), com quem já tinha tido desentendimentos jurídicos. Logo que chegam, porém, eles percebem que uma névoa bastante densa está se aproximando do local e, para pavor de todos os habitantes que estão no local, dentro dela existe algo capaz de matar violentamente. Sem saber do que se trata e impedidos de abandonar o supermercado - sob pena de morrerem - o grupo de pessoas (que inclui funcionários, militares, gente de idade avançada, crianças e uma fanática religiosa disposta a arrebanhar fiéis para sua igreja, diante da situação) é obrigado a chegar a um acordo de convivência - que fica mais difícil à medida em que a paranoia, o medo e o desespero vão aumentando.
Como se poderia esperar de uma história de King, o maniqueísmo é moeda corrente. Fica claro, desde o início do filme, quem são os mocinhos e quem são os vilões. Ao mesmo tempo em que isso enfraquece o aprofundamento psicológico das personagens (que acabam sendo unidimensionais), serve perfeitamente para estabelecer os times - que só raramente mudam de jogadores. É assim que Dave Drayton assume as rédeas de cara, batendo de frente com a radical Sra. Carmody (em atuação sensacional de Marcia Gay Harden) e com seu vizinho, que não acredita, a princípio, no perigo à espreita. Como herói da história, Drayton precisa ainda lidar com as inseguranças do filho pequeno e até ensaia um flerte com Amanda Dunfrey (Laurie Holden), uma nova moradora da cidade - afinal de contas, o que seria de um filme sem um toque de romance, não?
Apesar de jamais tentar ser mais do que entretenimento - mesmo com cenas de grande tensão - "O nevoeiro" conquista justamente por sua simplicidade temática. Não há o menor desejo de explicar as origens misteriosas da névoa (que é vagamente mencionada e mesmo assim superficialmente) nem existe intenções de agradar ao público com um final açucarado. E é justamente seu desfecho - cruel, amargo, surpreendente - que desperta as maiores polêmicas. Mantendo-se fiel ao epílogo de seus sonhos, Darabont é capaz de enfurecer aos menos abertos a surpresas, mas certamente sua escolha é que faz com que seu filme fique na mente do público por muito mais tempo do que produtos menos ousados.
De certa forma o cineasta Frank Darabont deve sua carreira ao escritor Stephen King. Seus dois primeiros filmes - "Um sonho de liberdade" e "À espera de um milagre" - foram adaptações da obra do mestre do suspense, e conquistaram, ambos, indicações ao Oscar de melhor filme, ao explorar de maneira sensível histórias que deixavam o terror de lado, concentrando-se em personagens humanas convivendo com situações extremas. Não é de se estranhar, portanto, que Darabont - antes de criar a bem-sucedida série de TV "The walking dead" - voltasse ao universo de King depois do fracasso de seu "Cine Majestic", estrelado por Jim Carrey e praticamente ignorado por crítica e público. Porém, para fugir um pouco do previsível, o diretor arriscou na escolha: optou pela novela "O nevoeiro", publicada em 1980, e pela primeira vez trabalha com uma trama que envolve muito mais a tensão do que o drama.
Não quer dizer que Darabont abandone seu estilo de preocupar-se mais com as personagens do que com efeitos visuais ou terror em estado puro: em "O nevoeiro" ele explora muito mais as reações das personagens diante do horror do que exatamente cenas sanguinolentas, criadas para aterrorizar o espectador. E, comprovando mais uma vez seu grande talento, a receita funciona muito bem. Dirigida com firmeza e com um elenco de ótimos atores - em detrimento de astros milionários - a nova obra do cineasta é tensa, emocionante e, melhor de tudo, ousada, com um final capaz de provocar as reações mais diversas na plateia.
Logicamente a trama de "O nevoeiro" se passa em uma pequena cidade do Maine, como toda história criada por Stephen King. É lá que, depois de uma forte tempestade, o artista plástico Dave Drayton (Thomas Jane em ótimo desempenho) resolve ir ao supermercado para comprar mantimentos, acompanhado do filho pequeno e do vizinho, o advogado Brent Norton (Andre Braugher), com quem já tinha tido desentendimentos jurídicos. Logo que chegam, porém, eles percebem que uma névoa bastante densa está se aproximando do local e, para pavor de todos os habitantes que estão no local, dentro dela existe algo capaz de matar violentamente. Sem saber do que se trata e impedidos de abandonar o supermercado - sob pena de morrerem - o grupo de pessoas (que inclui funcionários, militares, gente de idade avançada, crianças e uma fanática religiosa disposta a arrebanhar fiéis para sua igreja, diante da situação) é obrigado a chegar a um acordo de convivência - que fica mais difícil à medida em que a paranoia, o medo e o desespero vão aumentando.
Como se poderia esperar de uma história de King, o maniqueísmo é moeda corrente. Fica claro, desde o início do filme, quem são os mocinhos e quem são os vilões. Ao mesmo tempo em que isso enfraquece o aprofundamento psicológico das personagens (que acabam sendo unidimensionais), serve perfeitamente para estabelecer os times - que só raramente mudam de jogadores. É assim que Dave Drayton assume as rédeas de cara, batendo de frente com a radical Sra. Carmody (em atuação sensacional de Marcia Gay Harden) e com seu vizinho, que não acredita, a princípio, no perigo à espreita. Como herói da história, Drayton precisa ainda lidar com as inseguranças do filho pequeno e até ensaia um flerte com Amanda Dunfrey (Laurie Holden), uma nova moradora da cidade - afinal de contas, o que seria de um filme sem um toque de romance, não?
Apesar de jamais tentar ser mais do que entretenimento - mesmo com cenas de grande tensão - "O nevoeiro" conquista justamente por sua simplicidade temática. Não há o menor desejo de explicar as origens misteriosas da névoa (que é vagamente mencionada e mesmo assim superficialmente) nem existe intenções de agradar ao público com um final açucarado. E é justamente seu desfecho - cruel, amargo, surpreendente - que desperta as maiores polêmicas. Mantendo-se fiel ao epílogo de seus sonhos, Darabont é capaz de enfurecer aos menos abertos a surpresas, mas certamente sua escolha é que faz com que seu filme fique na mente do público por muito mais tempo do que produtos menos ousados.
terça-feira
MEDO DA VERDADE
MEDO DA VERDADE (Gone baby gone, 2007, Miramax Films, 114min) Direção: Ben Affleck. Roteiro: Ben Affleck, Aaron Stockard, romance de Dennis Lehane. Fotografia: John Toll. Montagem: William Goldenberg. Música: Harry Gregson-Williams. Figurino: Alix Friedberg. Direção de arte/cenários: Sharon Seymour/Chris Cornwell. Produção executiva: David Crockett. Produção: Sean Bailey, Alan Ladd Jr., Dan Rissner. Elenco: Casey Affleck, Michelle Monaghan, Ed Harris, Morgan Freeman, Amy Ryan, Amy Madigan. Estreia: 19/10/07
Indicado ao Oscar de Atriz Coadjuvante (Amy Ryan)
Apesar de alguns sucessos de bilheteria - "Armaggedon" e "Pearl Harbor" entre eles - o nome de Ben Affleck não era exatamente sinônimo de prestígio dentro de Hollywood no início dos anos 2000. Severamente criticado por suas parcas qualidades como ator - fato comprovado com atuações pífias em "Contato de risco" (ao lado da então noiva Jennifer Lopez) e "Menina dos olhos" (que repetiu sua parceria com o diretor Kevin Smith) - ele optou então por um caminho inteligente cujos primeiros passos ele havia dado em 1998 com "Gênio indomável" (que ele co-escreveu com o amigo Matt Damon e lhe deu o Oscar da categoria) - tornar-se diretor. Se a crítica e o público tinham reservas quanto a seu talento dramático, porém, não puderam deixar de surpreender-se positivamente com "Medo da verdade". Adaptado do romance de Dennis Lehane pelo próprio ator e por Aaron Stockard, o filme agradou em cheio por revelar em Affleck um cineasta sensível, discreto e, melhor ainda, atento ao objetivo principal de um filme: prender a atenção da plateia.
Lehane - também autor do livro que originou "Sobre meninos e lobos" - criou uma trama potente e inteligente, que valoriza os dramas pessoais das personagens tanto quanto o desenvolvimento do suspense e Affleck acertou em dar a devida atenção a tais conflitos, contando para isso com um elenco coadjuvante acima de qualquer crítica. Seu único erro - e de certa forma crucial - foi escalar para o papel central seu irmão Casey, que, apesar da indicação ao Oscar de coadjuvante por "O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford", não tem estofo dramático o suficiente para segurar tal desafio. Ao lado da igualmente frágil Michelle Monaghan, Casey acaba fazendo de seu Patrick Kenzie a menos interessante personagem da história.
Situado em um subúrbio de Boston, "Medo da verdade" começa com o desaparecimento da pequena Amanda McCready, de apenas 4 anos de idade. Filha única de Helene (Amy Ryan) - uma mulher não exatamente exemplar - a menina sumiu de sua própria casa sem deixar vestígios, o que deixa a vizinhança em polvorosa. Chamados para investigar o caso em paralelo com a polícia, os detetives Patrick Kenzie e Angie Gennaro (Monaghan) acabam por descobrir uma rede de corrupção policial, pedófilos e traficantes de drogas. Mesmo acostumados com a região, eles ficam chocados com todos os desdobramentos do crime, que apontam para uma solução nada ortodoxa.
Com as já citadas atuações apenas razoáveis de Casey Affleck e Michelle Monaghan - ele sem o tipo físico e o carisma apropriados e ela sem maiores características marcantes - "Medo da verdade" se beneficia também de seu elenco de apoio, formado por atores extraordinários em papéis que demonstram várias camadas no decorrer da projeção. É assim que Ed Harris, Morgan Freeman e Amy Madigan crescem conforme a trama vai se desenrolando e é assim também que Amy Ryan cria uma Helene McCready impecável, que lhe deu uma merecida indicação ao Oscar de coadjuvante. É Ryan, com sua personagem desagradável, quase cruel e fria, que melhor representa todas as nuances do filme, com seu jogo de aparências e interesses.
Tratado mais como um drama do que como um policial, "Medo da verdade" foge dos clichês do gênero ao apostar em reviravoltas críveis, que empurram a história adiante sem soar forçadas. As engrenagens do roteiro - muito bem adaptado, com fidelidade e respeito mas sem perder a objetividade - só são expostas de verdade no terço final, quando tudo faz um apavorante sentido e justifica o crescimento interno dos protagonistas - também presentes em outros romances de Lehane. A sensação sufocante que deixa quando acaba - ao contrário de muitos produtos puramente comerciais e ocos - dá ao filme de Affleck uma qualidade tangível, de tristeza e indignação. E não é isso que diferencia os filmes apenas corretos daqueles que merecem um lugar na lista dos melhores?
Indicado ao Oscar de Atriz Coadjuvante (Amy Ryan)
Apesar de alguns sucessos de bilheteria - "Armaggedon" e "Pearl Harbor" entre eles - o nome de Ben Affleck não era exatamente sinônimo de prestígio dentro de Hollywood no início dos anos 2000. Severamente criticado por suas parcas qualidades como ator - fato comprovado com atuações pífias em "Contato de risco" (ao lado da então noiva Jennifer Lopez) e "Menina dos olhos" (que repetiu sua parceria com o diretor Kevin Smith) - ele optou então por um caminho inteligente cujos primeiros passos ele havia dado em 1998 com "Gênio indomável" (que ele co-escreveu com o amigo Matt Damon e lhe deu o Oscar da categoria) - tornar-se diretor. Se a crítica e o público tinham reservas quanto a seu talento dramático, porém, não puderam deixar de surpreender-se positivamente com "Medo da verdade". Adaptado do romance de Dennis Lehane pelo próprio ator e por Aaron Stockard, o filme agradou em cheio por revelar em Affleck um cineasta sensível, discreto e, melhor ainda, atento ao objetivo principal de um filme: prender a atenção da plateia.
Lehane - também autor do livro que originou "Sobre meninos e lobos" - criou uma trama potente e inteligente, que valoriza os dramas pessoais das personagens tanto quanto o desenvolvimento do suspense e Affleck acertou em dar a devida atenção a tais conflitos, contando para isso com um elenco coadjuvante acima de qualquer crítica. Seu único erro - e de certa forma crucial - foi escalar para o papel central seu irmão Casey, que, apesar da indicação ao Oscar de coadjuvante por "O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford", não tem estofo dramático o suficiente para segurar tal desafio. Ao lado da igualmente frágil Michelle Monaghan, Casey acaba fazendo de seu Patrick Kenzie a menos interessante personagem da história.
Situado em um subúrbio de Boston, "Medo da verdade" começa com o desaparecimento da pequena Amanda McCready, de apenas 4 anos de idade. Filha única de Helene (Amy Ryan) - uma mulher não exatamente exemplar - a menina sumiu de sua própria casa sem deixar vestígios, o que deixa a vizinhança em polvorosa. Chamados para investigar o caso em paralelo com a polícia, os detetives Patrick Kenzie e Angie Gennaro (Monaghan) acabam por descobrir uma rede de corrupção policial, pedófilos e traficantes de drogas. Mesmo acostumados com a região, eles ficam chocados com todos os desdobramentos do crime, que apontam para uma solução nada ortodoxa.
Com as já citadas atuações apenas razoáveis de Casey Affleck e Michelle Monaghan - ele sem o tipo físico e o carisma apropriados e ela sem maiores características marcantes - "Medo da verdade" se beneficia também de seu elenco de apoio, formado por atores extraordinários em papéis que demonstram várias camadas no decorrer da projeção. É assim que Ed Harris, Morgan Freeman e Amy Madigan crescem conforme a trama vai se desenrolando e é assim também que Amy Ryan cria uma Helene McCready impecável, que lhe deu uma merecida indicação ao Oscar de coadjuvante. É Ryan, com sua personagem desagradável, quase cruel e fria, que melhor representa todas as nuances do filme, com seu jogo de aparências e interesses.
Tratado mais como um drama do que como um policial, "Medo da verdade" foge dos clichês do gênero ao apostar em reviravoltas críveis, que empurram a história adiante sem soar forçadas. As engrenagens do roteiro - muito bem adaptado, com fidelidade e respeito mas sem perder a objetividade - só são expostas de verdade no terço final, quando tudo faz um apavorante sentido e justifica o crescimento interno dos protagonistas - também presentes em outros romances de Lehane. A sensação sufocante que deixa quando acaba - ao contrário de muitos produtos puramente comerciais e ocos - dá ao filme de Affleck uma qualidade tangível, de tristeza e indignação. E não é isso que diferencia os filmes apenas corretos daqueles que merecem um lugar na lista dos melhores?
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