MULHER NOTA 1000 (Weird science, 1985, Universal Pictures, 94min) Direção e roteiro: John Hughes. Fotografia: Matthew F. Leonetti. Montagem: Chris Lebenzon, Scott Wallace, Mark Warner. Música: Ira Newborn. Figurino: Marilyn Vance. Direção de arte/cenários: John W. Corso/Jennifer Polito. Produção: Joel Silver. Elenco: Anthony Michael Hall, Kelly LeBrock, Ilan Mitchel-Smith, Bill Paxton, Robert Downey Jr., Suzanne Snyder, Judie Aronson, Robert Rusler. Estreia: 02/8/85
Não houve adolescente dos anos 1980 que não tenha sido afetado por John Hughes. Diretor de filmes seminais como "Gatinhas e gatões (1984) e "Curtindo a vida adoidado" (1986), ele não apenas virou referência obrigatória a qualquer cineasta com pretensões de adentrar o terreno das comédias românticas teen como revelou nomes que atravessaram a década extremamente populares - como Molly Ringwald e Matthew Broderick. Nenhum filme com sua assinatura, porém, foi tão bem-sucedido em retratar as dúvidas, dores e amores juvenis quanto "Clube dos cinco" (1985), hoje considerado um clássico do gênero. O que pouca gente sabe, no entanto, é que, se não fosse uma de suas comédias menos ambiciosas, sua obra-prima poderia nem existir. Explica-se: "Clube dos cinco" só foi aprovado pelos executivos da Universal Pictures mediante a promessa de Hughes dirigir, antes, um filme de apelo mais fácil junto às plateias. Surgia assim, "Mulher nota mil", uma comédia que pode ser descrita como uma mistura de "Frankenstein" com "Porky's" - por mais que essa cruza possa soar estapafúrdia.
Os dois protagonistas de "Mulher nota mil" são Gary (Anthony Michael Hall) e Wyatt (Ilan Mitchel-Smith), estudantes do ensino médio, nerds de carteirinha e, como não poderia ser diferente, totalmente sem jeito quando se trata de relações amorosas. Frustrados em suas tentativas de serem percebidos pelo sexo oposto como algo mais que alvos dos valentões da escola, os dois adolescentes aproveitam um fim de semana sem os pais na casa de Wyatt para fazer uma experiência no computador do rapaz. Inspirados por uma sessão antiga de "Frankenstein", eles alimentam o aparelho com imagens do que consideram a mulher dos seus sonhos. O que parecia não estar funcionando, porém, se converte em realidade depois de uma tempestade elétrica que faz nascer a estonteante Lisa (Kelly LeBrock, a dama de vermelho em carne e osso): a encarnação dos sonhos lúbricos dos garotos, a bela e pouco recatada nova hóspede acaba por servir como mestre de cerimônias de um mundo completamente desconhecido por eles, repleto de festas, bebidas e uma autoconfiança com a qual eles apenas sonham.
Com o roteiro escrito em apenas dois dias, "Mulher nota mil" é, logicamente, nada mais do que uma diversão rápida e despretensiosa. O que faz dele especial é justamente o toque de mestre de Hughes em fazer de seus personagens tipos adoráveis e de fácil identificação com o público. Anthony Michael Hall, que colaborou com o diretor em "Gatinhas e gatões" e "Clube dos cinco", antes de fazer uma série de escolhas erradas que o levaram ao ostracismo, é a perfeita imagem do nerd adolescente desesperado, enquanto Ilan Michael-Smith (que abandonou a carreira nos anos 1990 para assumir como professor de Inglês em uma universidade do Texas) representa um lado mais doce e gentil. A química dos dois jovens atores com Kelly Le Brock é precisa - LeBrok, que ganhou o papel para o qual também foram testadas Demi Moore e Robin Wright, não precisa fazer muito mais do que ser linda e atraente, o que ela faz sem esforço. No elenco jovem não deixa de ser curioso perceber Bill Paxton e Robert Downey Jr. em papéis secundários - o primeiro como o irmão mais velho de Wyatt, e o segundo como um dos algozes da dupla de protagonistas.
"Mulher nota mil" é uma sessão da tarde à moda antiga. Seu visual oitentista, sua trilha sonora de rock e a presença de atores que eram a cara da época são deliciosamente cafonas, e a trama, que descamba para o escatológico e o surreal na segunda metade, impede que ele se leva a sério demais. Uma série de TV inspirada no filme e estrelada por Vanessa Angel, estreou em 1994 e durou cinco temporadas, apesar de não ser muito lembrada pelo público. Talvez porque sua essência pertença definitivamente aos anos 1980 e porque a mágica de John Hughes não funcione tão bem sem que ele esteja no comando criativo do projeto. Considerado um filme menor na carreira do cineasta, é um antídoto perfeito para qualquer filme que exija mais do cérebro do espectador.
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