sexta-feira

A GRANDE JOGADA

 


A GRANDE JOGADA (Molly's game, 2017, STX Entertainment/The Mark Gordon Company, 140min) Direção: Aaron Sorkin. Roteiro: Aaron Sorkin, livro de Molly Bloom. Fotografia: Charlotte Brus Christensen. Montagem: Alan Baumgarten, Elliot Graham, Josh Schaeffer. Música: Daniel Pemberton. Figurino: Susan Lyall. Direção de arte/cenários: David Wasco/Patricia Larman, Sandy Reynolds-Wasco. Produção executiva: Oren Aviv, Felice Bee, Stuart M. Besser, Adam Fogelson, Leopoldo Goult, Robert Simonds, Donald Tang, Wang Zhongjun, Wang Zhonglei. Produção: Mark Gordon, Matt Jackson, Amy Pascal. Elenco: Jessica Chastain, Idris Elba, Kevin Costner, Michael Cera, Jeremy Strong, Chris O'Dowd, Graham Greene. Estreia: 08/9/2017 (Festival de Toronto)

Indicado ao Oscar de roteiro adaptado

           Conhecido como um premiado dramaturgo e roteirista (vencedor do Oscar por "A rede social" e sempre lembrado por associações de críticos por seus trabalhos no cinema e na televisão), Aaron Sorkin até que demorou para estrear na direção. De seu primeiro script (a adaptação de sua própria peça teatral "Questão de honra", estrelado por Tom Cruise e Jack Nicholson em 1992) até "A grande jogada", seu primeiro filme como cineasta, se passaram 25 anos - e nesse meio-tempo ele acrescentou outras láureas a seu currículo, graças a produções como "O homem que mudou o jogo" (2011) e "Steve Jobs" (2015). Com tal histórico, não é de surpreender que Sorkin tenha escolhido a dedo o material para seu primeiro longa-metragem. "A grande jogada" é tudo que se pode esperar de um filme comandado pelo roteirista/diretor: inteligente, ágil e com personagens complexos, defendidos por um elenco coeso, no qual se destaca a sensacional Jessica Chastain.

Chastain, uma atriz superlativa que valoriza cada filme, por mais medíocre que seja, encontrou em Molly Bloom, a protagonista de "A grande jogada", um papel que toda grande intérprete sonha: cheia de camadas e dona de uma história interessante o bastante para prescindir de qualquer muleta (leia-se romances desnecessários, doenças redentoras, e tudo mais que os roteiristas criam para oferecer momentos dramáticos que justifiquem indicações ao Oscar e afins). Por esse motivo, é inacreditável que a Academia tenha ignorado seu impecável trabalho e a deixado de fora inclusive do páreo na categoria. Sem deixar de lado a beleza e o glamour de sua atriz central, Sorkin oferece à Chastain possibilidades ilimitadas - e a atriz tira todas de letra, dona absoluta do filme e de sua personagem. Molly Bloom - o mesmo nome da personagem criada por James Joyce em "Ulisses" - é uma mulher que não pede desculpas e tenta (nem sempre com sucesso) manipular o próprio destino. Logo, está fadada a enfrentar as consequências de desafiar um mundo feito por e para os homens. Sim, "A grande jogada" é, de uma certa forma, um filme feminista.


Não, não há nada de panfletário em "A grande jogada". O que faz dele um filme feminista é o fato de ter como protagonista uma mulher corajosa e que não baixa a cabeça diante dos homens que tentam mandar no jogo. Se seu advogado - vivido pelo ótimo Idris Elba - é quem vai tentar salvar sua pele, ele o faz de acordo com suas diretrizes, que incluem manter a ética profissional mesmo quando corre o risco de parar na cadeira. Molly Bloom não pede desculpas pelo que é - e essa força, que nem mesmo sua derrocada consegue apagar completamente. Atleta frustrada (com uma carreira de esquiadora interrompida por um acidente) e com sérios problemas de relacionamento com o pai (Kevin Costner) - um homem exigente e pouco dado a carinhos -, Molly descobre, quase acidentalmente, o submundo do pôquer, e, depois de um tempo como coadjuvante de uma série de jogos, decide tornar-se a coordenadora de grupos milionários de celebridades e empresários. Competente e discreta, ela se torna uma conhecida e respeitada gerente de jogos - até que se envolve, sem querer, com a perigosa máfia russa, o que a coloca na mira do FBI.

Contado através de flashbacks, através das conversas de Molly com seu advogado, Charlie Jaffey (Idris Elba), "A grande jogada" usa e abusa de artifícios visuais para seduzir o público, e para isso, conta com a edição inteligente e diálogos afiados, com certa dose de ironia e personagens bastante interessantes. Do início, com Molly explicando sua trajetória de aspirante a atleta olímpica a gerente de noitadas milionárias de pôquer, até o final, quando ela se vê obrigada a pagar por seus erros de estratégia, o filme de Sorkin apresenta ao espectador jogadores dos mais variados níveis de vício - inclusive um ator de cinema (interpretado por Michael Cera) que, segundo consta, era Tobey Maguire, que levava seu amigo Leonardo DiCaprio para noites de jogatina que enriqueciam - e muito - a renda da protagonista. E se o tom da produção vai ficando cada vez mais sombrio conforme Molly vai se encrencado com a máfia russa sem saber, melhor ainda o filme vai se tornando, demonstrando o domíno do roteirista transformado em cineasta. Se em seu primeiro filme ele já demonstra tal segurança, é de se imaginar como será sua próxima incursão na cadeira de diretor. "A grande jogada" é um filme de enormes qualidades, um entretenimento adulto de alto gabarito que merece ser descoberto e aplaudido.

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