AVA (Ava, 2020, Voltage Pictures/Freckle Films/Leeding Media, 96min) Direção: Tate Taylor. Roteiro: Matthew Newton. Fotografia: Stephen Goldblatt. Montagem: Zach Staenberg. Música: Bear McCreary. Figurino: Megan Coates. Direção de arte/cenários: Molly Hughes/Leslie E. Rollins. Produção executiva: Jonathan Deckter, William A. Earon, Erika Hampson, John Norris. Produção: Kelly Carmichael, Nicolas Chartier, Jessica Chastain, Dominic Rustam. Elenco: Jessica Chastain, John Malkovich, Colin Farrell, Common, Geena Davis, Jess Weixler, Ioan Gruffud, Joan Chen. Estreia: 02/7/2020 (Hungria)
Foi-se o tempo em que apenas homens monopolizavam o cinema de ação. Com o passar dos anos e a mudança nos hábitos do público, personagens femininas deixaram de ser apenas espectadoras passivas de sequências de adrenalina em profusão para se tornarem protagonistas de suas próprias aventuras. Agentes secretas, espiãs, matadoras de aluguel ou simplesmente defensoras do lar e da família, as mulheres passaram a donas do próprio destino - e atrizes como Angelina Jolie, Charlize Theron, Linda Hamilton, Jennifer Lawrence e Sigourney Weaver foram promovidas a estrelas de um gênero antes dominado por Stallone, Schwarzenegger, Van-Damme, Vin Diesel e Mel Gibson. Uma das mais recentes aquisições do estilo é Jessica Chastain. Linda, sexy e de constituição física aparentemente frágil, Chastain - mais conhecida por seus desempenhos dramáticos e por uma vitoriosa carreira nos palcos - assume, em "Ava", seu lado mais radical, e embarca sem receio em uma produção que aposta nos clichês como forma de segurar o espectador. Sem novidades e sem se aprofundar nos dramas pessoais de seus personagens centrais, o filme dirigido por Tate Taylor acabou por decepcionar os mais exigentes, mas consegue agradar aos entusiastas - da atriz e do gênero.
A produção de "Ava" não foi isenta de problemas. A mudança em seu nome original - "Eve" foi deixado de lado para que não houvesse confusão com a série "Killing Eve", também sobre matadoras de aluguel - foi o menor dos percalços. O principal deles, para preocupação dos produtores (Chastain incluída), foi a polêmica envolvendo o nome do roteirista Matthew Newton, também contratado como diretor: julgado em 2007 por violência doméstica contra a namorada (e absolvido sob a desculpa de sofrer de distúrbios psiquiátricos), Newton voltou a ser acusado por outras mulheres, desta vez de assédio sexual e abuso. A pressão das redes sociais foi pesada - Chastain chegou a ser questionada sobre o assunto, uma vez que é tida como uma das porta-vozes do movimento MeToo - e a cadeira de diretor não demorou a ficar vaga. Quem acabou assumindo o posto foi Tate Taylor - um cineasta competente mas nunca brilhante -, o nome responsável pelo oscarizado "Histórias cruzadas" (2011) e pelo sucesso "A garota no trem" (2016). Com Taylor no comando, "Ava" ficou nas mãos de um operário e não de um artista conhecido pela ousadia. A má notícia: não há quase nada no resultado final que não tenha sido visto em outras produções similares. A boa notícia: Taylor é um eficiente diretor de atores, e extrai interpretações primorosas de seu talentoso elenco mesmo sem ter um grande material em mãos.
O roteiro de Matthew Newton não se preocupa em aprofundar a psicologia ou o drama de seus personagens, preferindo centrar seu foco em uma trama um tanto quanto confusa sobre traição e lealdade no mundo dos matadores de aluguel. É assim que surge a história de Ava (Jessica Chastain, excelente tanto no drama como na porrada), uma bem-sucedida e talentosa assassina por contrato. Protegida pelo veterano Duke (John Malkovich) - que é, ao mesmo tempo, um mentor e uma figura paterna -, Ava se diferencia dos demais profissionais por sempre fugir dos rígidos protocolos da profissão ao buscar um mínimo de conexão com suas vítimas. Tal característica - e um atentado frustrado - acabam por colocá-la na mira de um dos líderes do grupo, Simon (Colin Farrell), que encomenda sua morte apesar dos clamores de Duke. Sem saber que está condenada pelos próprios colegas, Ava se reaproxima da família de quem esteve afastada por oito anos, lutando contra o alcoolismo e o vício em drogas. Seu reencontro com o antigo namorado, Michael (Common), a põe em rota de colisão com a irmã, Judy (Jess Weixler), atual noiva do rapaz, e reacende os problemas com a mãe, Bobbi (Geena Davis).
Como era de se esperar, "Ava" tem nas sequências de ação o seu maior trunfo. Mesmo que o resultado esteja a anos-luz de distância da icônica trilogia Jason Bourne - só para citar um dos exemplares mais famosos do gênero - e a edição deixe a desejar, com um excesso de cortes que impede de aproveitar por inteiro as longas coreografias de luta, o filme de Taylor não decepciona por completo. Boa parte de sua qualidade está na escolha de um elenco que dá dignidade e consistência a uma trama frágil - e por vezes incompreensível. Jessica Chastain brilha como sempre, oferecendo nuances várias a uma personagem que em mãos erradas poderia ser apenas incoerente. Colin Farrell e John Malkovich protagonizam cenas de grande tensão com a tranquilidade de veteranos e até mesmo Geena Davis ressurge, em uma participação pequena mas emocionante - vale lembrar que Davis foi uma das pioneiras em tentar elevar as mulheres à protagonização de filmes de ação, com os malfadados "A ilha da garganta cortada" (1995) e " Despertar de um pesadelo" (1996). Divertido mas esquecível, "Ava" fica em um razoável meio-termo: agrada aos fãs do estilo mas dificilmente conquista novos adeptos.
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