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OS OLHOS DE LAURA MARS


OS OLHOS DE LAURA MARS (Eyes of Laura Mars, 1978, Columbia Pictures, 104min) Direção: Irvin Kershner. Roteiro: John Carpenter, David Zelag Goodman, estória de John Carpenter. Fotografia: Victor J. Kemper. Montagem: Michael Kahn. Música: Artie Kane. Figurino: Theoni V. Aldredge. Direção de arte/cenários: Gene Callahan/John Godfrey. Produção executiva: Jack H. Harris. Produção: Jon Peters. Elenco: Faye Dunaway, Tommy Lee Jones, Brad Dourif, Rene Auberjournois, Raul Julia. Estreia: 02/8/78

No final dos anos 1970,  John Carpenter, então um cineasta à procura do primeiro grande sucesso, vendeu à Columbia Pictures um roteiro com o título de "Eyes", que contava a história de uma fotógrafa que tinha o poder paranormal de ver através dos olhos de um assassino. Quando tal roteiro finalmente chegou às telas, em agosto de 1978, sob a direção de Irvin Kershner, pouco restava de suas ideias originais: além das alterações propostas pelo estúdio e pelo diretor, o desfecho era diferente do imaginado por Carpenter, que, apesar de tantas modificações, manteve o crédito como autor da trama e se viu, dois meses depois, alçado à condição de ícone do cinema de terror com seu "Halloween", lançado em outubro do mesmo ano. E se o primeiro capítulo das matanças promovidas por Michael Meyers é, ainda hoje, um clássico do gênero, seu roteiro renomeado como "Os olhos de Laura Mars" tampouco pode ser subestimado. Estrelado por Faye Dunaway pouco depois de seu Oscar por "Rede de intrigas" (1976), o filme se mantém como um suspense eficiente, a despeito de seu visual um tanto datado e de sua narrativa por vezes lenta em excesso.

O filme conta a história de Laura Mars, uma fotógrafa influente, celebrada e que vive o auge da carreira com suas imagens que vinculam arte, sexo e violência. Sem ter consciência do fato, Laura criou sua obra a partir de visões que frequentemente surgiam em sua mente. Tal dom, no entanto, torna-se um fardo quando ela começa a perceber que tem o poder de ver através dos olhos de um criminoso. Quando várias pessoas a seu redor começam a morrer violentamente assassinadas diante de seus olhos - sem que ela possa impedir -, ela resolve buscar a ajuda da polícia, que, por motivos compreensíveis, faz pouco caso de suas informações. O único a acreditar em sua narrativa é John Neville (Tommy Lee Jones), um tenente que se apaixona por ela durante as investigações. Apavorada com a possibilidade de ser a próxima vítima do assassino, Laura inicia um processo de paranoia que envolve a todos que conhece - incluindo seu violento ex-marido, Michael Reisler (Raul Julia), e seu motorista, Tommy Ludlow (Brad Dourif), cujo passado criminoso pode ter voltado à tona.


 

"Os olhos de Laura Mars" caiu nas mãos de Irvin Kershner depois da saída de Michael Miller, que abandonou o projeto devido às tradicionais "diferenças criativas" entre ele e o estúdio. Nem mesmo a estrela inicialmente pensada para o papel central, Barbra Streisand, se manteve - apesar de Barbra emprestar sua bela voz na canção-tema, "Prisoner", que toca nos criativos créditos iniciais. Antes que Faye Dunaway assumisse o protagonismo, nomes tão díspares quanto Jane Fonda, Diane Keaton, Goldie Hawn e Catherine Deneuve chegaram a ser cogitadas. A entrada de Dunaway, no auge do sucesso, acabou oferecendo à produção uma seriedade até então rara em filmes do gênero e ajudou muito no êxito comercial do filme - com um orçamento estimado em sete milhões de dólares, rendeu quase três vezes no mercado internacional. A seu lado, um então jovem Tommy Lee Jones - que dois anos depois estaria no elenco do oscarizado "O destino mudou sua vida", com Sissy Spacek -, Brad Dourif (indicado à estatueta de ator coadjuvante por "Um estranho no ninho", de 1975) e Raul Julia, antes de tornar-se um dos atores latino-americanos mais celebrados de Hollywood.  

Com um visual típico dos anos 1970 - com sua fotografia granulada, figurinos exóticos e uma narrativa sóbria mesmo quando apela para a sanguinolência -, "Os olhos de Laura Mars" conquista justamente por levar-se a sério, evitando o tom de deboche que viria a infestar o gênero na década seguinte. Ao localizar sua trama no ambiente sofisticado das fotografias de moda, Irvin Kershner usa e abusa de ângulos criativos para mergulhar o espectador no universo de pesadelo vivido por sua protagonista. Interpretada com garra por Dunaway - que três anos mais tarde escorregaria na caricatura ao interpretar Joan Crawford no polêmico "Mamãezinha querida" (1981) -, Laura Mars é uma heroína típica de sua época, quando as mulheres assumiam as rédeas do próprio destino: apesar de contar com a ajuda do policial vivido por Lee Jones, a fotógrafa jamais se deixa acomodar na posição de vítima, lutando pela sobrevivência ao mesmo tempo em que corre atrás da identidade do assassino que a persegue - uma revelação que não escapa do clichê mas não compromete o resultado final. Talvez a única questão que incomoda no roteiro é o romance entre os dois personagens principais, que soa um tanto deslocado e forçado (mas faz certo sentido nos momentos finais).

 E se existe uma prova da perenidade cultural de "Os olhos de Laura Mars" é o fato de, em 2002, quase vinte e cinco anos depois de seu lançamento, sua protagonista ter sido citada na canção "Gold dust", da cantora Tori Amos (parte de seu álbum "Scarlet's walker"). Não é toda personagem de filmes de suspense que merece tal reconhecimento!

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