COCKTAIL (Cocktail, 1988, Touchstone Pictures, 104min) Direção: Roger Donaldson. Roteiro: Heywood Gould, romance de sua autoria. Fotografia: Dean Semler. Montagem: Neil Travis. Música: J. Peter Robinson. Figurino: Ellen Mirojnick. Direção de arte/cenários: Mel Bourne/Hilton Rosemarin. Produção: Robert W. Cort, Ted Field. Elenco: Tom Cruise, Bryan Brown, Elisabeth Shue, Gina Gershon, Kelly Lynch. Estreia: 29/7/88
Em 1989, Tom Cruise já havia começado sua transição de galã juvenil para ator respeitado pela crítica e pela indústria - o que confirmou-se com sua indicação ao Oscar por "Nascido em 4 de julho", dirigido por Oliver Stone. Antes de abandonar seu status de símbolo sexual, porém, deu de presente a seus fãs um último trabalho capaz de explorar seu sorriso e seu carisma. Baseado no romance homônimo de Heywood Gould, também autor do roteiro pouco inventivo - e que foi premiado com o Framboesa de Ouro da categoria -, "Cocktail"se enquadra nos tradicionais dramas românticos de fundo moralista que tanto fizeram sucesso na década de 1980, mas que, valorizado por uma embalagem atraente (belas locações na Jamaica, trilha sonora de hits, elenco de jovens astros em ascensão) o levou a arrecadar polpudos 170 milhões de dólares ao redor do mundo. Uma prova inconteste do apelo de Cruise junto ao público, o filme do neozelandês Roger Donaldson - vindo do ótimo "Sem saída" (1987), que deu a Kevin Costner um de seus melhores papéis no cinema - o coloca novamente ao lado de um ator veterano como forma de contraste entre duas gerações. Se em "A cor do dinheiro" (1986) a dupla era com Paul Newman (que ganhou o Oscar por seu desempenho), e em "Rain Man" (lançado pouco meses depois de "Cocktail") o encontro foi com Dustin Hoffman (igualmente oscarizado por seu trabalho), o filme de Donaldson promove o encontro de Cruise com o australiano Bryan Brown - que pouco tem a fazer com um personagem atolado em clichês.
A trama é simples e inspirada na própria experiência do roteirista por trás dos balcões de bares: Brian Flanagan (interpretado por Cruise) é um jovem ambicioso que abandona sua pequena cidade natal com o objetivo de vencer no mercado financeiro de Nova York. Seus planos logo se mostram mais complicados do que pareciam, e ele se vê trabalhando como bartender ao lado do experiente Douglas Coughlin (Bryan Brown), que lhe serve como mentor e melhor amigo. Aos poucos, esbanjando carisma e dedicação, Brian se torna um dos mais conhecidos profissionais do ramo e, mudando o rumo de seus desejos de sucesso, se une a Douglas no objetivo de abrir um negócio próprio. As coisas não saem como planejado e, depois de abandonar Manhattan - culpa de uma briga com seu futuro sócio -, o rapaz começa uma vida nova na Jamaica, onde novamente se destaca com suas coreografias elaboradas e seu sorriso cativante. É lá que ele conhece a jovem Jordan (Elisabeth Shue), com quem inicia um apaixonado romance. Mais uma vez, no entanto, tudo vira do avesso em sua vida quando Douglas reaparece, rico, bem casado e disposto a apagar as rusgas do passado - o que pode ameaçar o nascente relacionamento com a doce Jordan.
Apesar de depender quase unicamente do sorriso e do carisma de Cruise - algo que o então jovem galã não economizava, para alegria dos fãs -, "Cocktail" nem sempre teve tal trunfo em mãos. Antes que Cruise acertasse sua participação no filme, atores de vários tipos físicos, idades e perfis foram cotados para liderar o elenco - um forte indício da falta de personalidade de um projeto que, segundo o próprio Heywood Gould, deu origem a 40 diferentes versões do roteiro. Dessa forma, nomes como Robin Williams, Charlie Sheen, John Travolta, Rob Lowe, Jeff Bridges, Matthew Broderick e Mel Gibson chegaram a ser pensados - Keanu Reeves, Tom Hanks e Bill Murray só foram deixados de lado por conflitos com outros compromissos. Da mesma forma, o papel do mentor do protagonista também teve sua lista de possíveis intérpretes, que iam de Paul Newman e Dustin Hoffman (que voltariam a contracenar com Cruise) a Jack Nicholson, Harrison Ford, Tommy Lee Jones, Joe Pesci e Michael Caine (que pulou fora do barco para integrar o elenco do hilário "Os safados", ao lado de Steve Martin. E até mesmo a atriz para viver a doce heroína do filme, Jordan, foi objeto de discussão, com Elisabeth Shue batendo nomes fortes como Demi Moore, Jennifer Jason Leigh, Jennifer Grey, Sarah Jessica Parker, Daryl Hannah e, pasmem, Jodie Foster.
É inegável que, sob a luz da nostalgia, "Cocktail" é uma sessão da tarde deliciosa, descompromissada, leve e agradável. Como cinema, porém, é apenas um veículo para explorar a popularidade de Tom Cruise - e sob esse ponto de vista, o filme é um sucesso. A bilheteria expressiva ajudou o estúdio (a Touchstone Pictures), a ascensão do astro (que em breve focaria a carreira em produções mais sérias) e o público, que lotou salas de exibição para acompanhar uma história quase maniqueísta, fotografada de forma tão solar e romântica que mal deixava vislumbrar seu moralismo quase ingênuo. No frigir dos ovos, a química entre Cruise, Brown e Shue - somada à trilha sonora que incluía até mesmo uma canção original dos Beach Boys - foi o suficiente para as plateias menos exigentes e serviu para reafirmar a posição de seu astro como um dos nomes mais fortes do cinema hollywoodiano dos então vindouros anos 1990.
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