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segunda-feira
LADRÃO DE CASACA
LADRÃO DE CASACA (To catch a thief, 1955, Paramount Pictures, 106min) Direção e produção: Alfred Hitchcock. Roteiro: John Michael Hayes, baseado em um romance de David Dodge. Fotografia: Robert Burks. Montagem: George Tomasini. Música: Lyn Murray. Figurino: Edith Head. Elenco: Cary Grant, Grace Kelly, Jessie Royce Landis, John Williams, Brigitte Aubert. Estreia: 03/8/55
3 indicações ao Oscar: Fotografia, Direção de Arte e Figurino
Vencedor do Oscar de Fotografia (Cores)
Em uma cena de "Ladrão de casaca", de Alfred Hitchcock, a atriz francesa Brigitte Aubert, na pele de sua personagem Danielle Foussard, em um ataque de ciúmes em relação ao homem por quem é apaixonada, faz piadas em relação ao fato de ser bem mais jovem do que sua rival (a estonteante Grace Kelly). A grande ironia da cena nem advém do fato de que seu objeto de desejo, Cary Grant, tinha 50 anos quando fez a personagem (que tinha 35) mas sim da verdadeira idade de Aubert durante as filmagens: apesar de sua aparência jovial, ela era mais velha que Kelly. Pouco mais velha, é verdade (pouco mais de um ano), mas o suficiente para que essa pequena anedota de bastidores ficasse registrada como mais uma das ironias que marcaram a última colaboração de Kelly com o cineasta inglês.
Baseado em um romance de David Dodge, "Ladrão de casaca" é talvez um dos filmes mais leves e inconsequentes de Hitchcock, deixando de lado implicações psicológicas e /ou religiosas que o cineasta vinha utilizando em seus trabalhos imediatamente anteriores. Provavelmente o fato de ter sido filmado nas belíssimas paisagens da Riviera Francesa (lindamente fotografadas pelo habitual colaborador do diretor Robert Burks, que levou o Oscar da categoria) tenha ajudado no objetivo de sair dos claustrofóbicos "Disque M para matar" e "Janela indiscreta" para algo mais arejado, divertido e quase fútil. "Ladrão de casaca", ao contrário do que normalmente se esperaria de uma obra de Hitchcock, é menos um filme de suspense e mais uma aventura romântica com toques de mistério. Não é por acaso que suas melhores cenas sejam justamente aquelas em que Cary Grant e Grace Kelly estão juntos, com uma química invejável, a despeito de sua considerável diferença de idade.
Quando fez "Ladrão de casaca", Grant estava voltando ao cinema, depois de um voluntário exílio (em parte por achar-se anacrônico em um panorama cinematográfico que estava maravilhado com o "método" de atores como Marlon Brando e em parte por sentir-se ultrajado pela maneira com que Hollywood havia tratado Charlie Chaplin - este havia sido praticamente expulso dos EUA por suspeitas de simpatia ao comunismo). No filme, ele vive John Robie, também conhecido pela alcunha de "O Gato", um ladrão de jóias aposentado que volta a sofrer pressão da polícia depois que vários outros roubos cometidos com seu "modus operandi" voltam a acontecer. Para provar sua inocência ele decide investigar por conta própria, antecipando-se ao criminoso e contando com a ajuda de H.H. Hughson (John Williams, sempre ótimo), que, no papel de investigador de uma companhia de seguros, tem uma lista dos mais prováveis alvos do gatuno. Em Cannes, Robie conhece uma dessas potenciais vítimas, a excêntrica americana Jessie Stevens (Jessie Royce Landis) e sua jovem filha Frances (Grace Kelly). Enquanto tenta descobrir a identidade do ladrão, ele é assediado tanto pela bela Frances quanto por Danielle Foussard (Brigitte Aubert), filha de um de seus antigos comparsas.
Assim como normalmente acontece na filmografia de Hitchcock, a história - ou a identidade verdadeira do criminoso - é o que menos conta. O que interessa é a maneira como se chega até o final da história. Aqui, o mestre opta por um tom bem menos sombrio e grave, possibilitando ao espectador deliciar-se com a beleza natural de Cannes e de Kelly, com os diálogos saborosos de John Michael Hayes, com o charme imbatível de Cary Grant e com 106 minutos de uma diversão despretensiosa e ligeira. Isso não o impede, no entanto, de proporcionar algumas cenas que beiram o genial. Um exemplo? Na cena em que as personagens de Kelly e Grant estão assistindo a uma explosão de fogos de artifício pela janela do hotel onde estão hospedados, só o que é iluminado na atriz é seu pescoço, ornado por um enorme colar de diamantes. Enquanto ela fala, fica impossível desviar os olhos da jóia, como se o público estivesse vendo através de John Robie. Golpe de mestre!
"Ladrão de casaca" pode não ser tão bom quanto "Janela indiscreta" - ou alguns de seus filmes posteriores - mas é difícil resistir ao apelo de tantos ingredientes sofisticados. É, sem dúvida, o mais chique dentre todos os Hitchcocks.
PS - Outra das ironias presentes no histórico de "Ladrão de casaca" não deixa de ser trágica: a estrada onde foi rodada a perseguição automobilística em que Robie e Frances escapam da polícia é a mesma estrada onde, em 1982, a atriz sofreu seu fatal acidente de carro. E foi durante as filmagens de "Ladrão" que ela conheceu o Príncipe Rainier de Mônaco, com quem se casaria em breve, abandonando o cinema.
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2 comentários:
Sempre tive uma queda por "Ladrão de Casaca", e acho que é nele que há a aparição de Hitchcock, que mais me agrada.Talvez não seja tão criativa como outras,mas é a minha preferida.Cary Grant desfila alegância, coisa que seria improvável no violento cinema atual.Eles agora parecem ter que mostrar atrocidades até um não limite que levará esse mesmo cinema a uma armadilha certeira.Grace Kelly está linda, assim como em "Janela Indiscreta."Não sabia que Cary já se sentia ultrapassado.E dizer, segundo consta, que teria sido chamado para James Bond, isso já por volta de 1960, calculo.Eu queria, novamente,roteiros assim, até suaves, mas com uma certa ordenação simples.Já basta a ficção caótica de nossas próprias mentes.Ficção por ficção,prefiro a desses filmes que acabam com um"casamento"o qual, ainda bem, é so uma ficção e não se concretiza.
Concordo em gênero, número e grau. Obrigado pela visita e pelo comentário, Abraços.
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