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ONDE OS FRACOS NÃO TEM VEZ


ONDE OS FRACOS NÃO TEM VEZ (No country for old men, 2007, Paramount Vantage, 122min) Direção: Ethan Coen, Joel Coen. Roteiro: Ethan Coen, Joel Coen, romance de Cormac McCarthy. Fotografia: Roger Deakins. Montagem: Roderick Jaynes. Música: Carter Burwell. Figurino: Mary Zophres. Direção de arte/cenários: Jess Gonchor/Nancy Haigh. Produção executiva: Robert Graf, Mark Roybal. Produção: Ethan Coen, Joel Coen, Scott Rudin. Elenco: Tommy Lee Jones, Josh Brolin, Javier Bardem, Woody Harrelson, Kelly McDonald. Estreia: 19/5/07 (Festival de Cannes)

8 indicações ao Oscar: Melhor Filme, Direção (Ethan Coen, Joel Coen), Ator Coadjuvante (Javier Bardem), Roteiro Adaptado, Fotografia, Montagem, Som, Edição de Som
Vencedor de 4 Oscar: Melhor Filme, Direção (Ethan Coen, Joel Coen), Ator Coadjuvante (Javier Bardem), Roteiro Adaptado
Vencedor de 2 Golden Globes: Ator Coadjuvante (Javier Bardem), Roteiro

Queridinhos da crítica e dos fãs de cinema independente desde sua estreia com o hoje cultuado "Gosto de sangue", de 1984, os irmãos Coen assinaram seu nome na história do cinema com produções que equilibram roteiros intrincados, personagens marginais em diferentes níveis, uma direção criativa e atores sempre em estado de graça. Mas, com exceção de seu "Fargo" - que levou os Oscar de roteiro original e atriz (Frances McDormand) em 1997 - seus filmes nunca tiveram a bênção máxima da Academia. Com o lançamento de "Onde os fracos não tem vez", porém, os conservadores eleitores tiveram que dar o braço a torcer: seria difícil ignorar os prêmios que a perturbadora mistura de western/policial/suspense baseada no romance de Cormac McCarthy arrebatou na temporada 2007. Aplaudida e premiada pelos críticos de Boston, Chicago, Londres, Nova York, Las Vegas e Dallas, laureada pelos sindicatos de direção e roteiro e escolhida como a melhor do ano pelo National Board of Review chegou na cerimônia de entrega do Oscar cheio de moral e não deu outra: quatro estatuetas, incluindo filme, diretor e roteiro - além de um justíssimo e esperado prêmio para o coadjuvante Javier Bardem.

Normalmente donos do próprio material - com raras exceções, como a adaptação não oficial de "Odisséia", de Homero em "E aí, meu irmão, cadê você?" ou a refilmagem de "Matadores de velhinhas" - Joel e Ethan Coen acertaram em cheio ao escolher o romance seco e melancólico de McCarthy para ser seu trabalho seguinte à pouco compreendida comédia estrelada por Tom Hanks. Repleta dos elementos que sempre fizeram a glória dos cineastas (violência, humor negro, personagens bizarros e uma imprevisibilidade à toda prova), a história do escritor norte-americano que também escreveu "A estrada" - que viraria filme com Viggo Mortensen poucos anos depois - também tem um ingrediente essencial à filmografia de seus realizadores: inteligência. Junto com crueldade e a tensão expostas pelos cineastas, existe, em "Onde os fracos não tem vez" uma ironia e uma verdade que deixam tudo com um sabor ainda mais especial. Afinal de contas, não é sempre que o cinema americano apresenta um protagonista que foge dos padrões pré-estabelecidos de honestidade como o Llewelyn Moss vivido com intensidade por Josh Brolin.


Vivendo uma fase de ouro na carreira - que começou na adolescência, como o irmão mais velho em "Os Goonies" - Brolin emendou um trabalho sensacional como um policial corrupto em "O gângster" com sua atuação no filme dos Coen. Seu Llewelyn é um homem simples e comum diante de uma tentação rara: vivendo na zona rural do Texas do início dos anos 80 com a esposa (Kelly MacDonald, de "Trainspotting"), ele encontra uma maleta com dois milhões de dólares, resultado de uma aparente negociação de drogas que deu errado. Decidido a ficar com o dinheiro mesmo sabendo que não é o mais correto moralmente, ele entra na mira do psicótico Anton Chigurh (Javier Bardem, espetacular), que pretende recuperar a grana a mando de seu chefe. A perseguição ainda envolve o velho xerife Ed Tom Bell (Tommy Lee Jones), que, mesmo cansado e desiludido com a maneira com que as coisas andam na sua profissão, não vê a hora de aposentar-se.

É a visão de Bell quem dá o tom a "Onde os fracos não tem vez": seu ponto de vista triste, cansado e decepcionado conduz o espectador a um jogo de gato e rato empolgante e que foge do padrão esperado de um filme que se apresenta como uma miscelânea de gêneros gratos ao imaginário ianque. Sem medo de criar polêmica com seu modo seco e crítico de retratar suas personagens - como já haviam feito com propriedade e graça em "Fargo" - os irmãos Coen criam uma pequena obra-prima que funciona em todos os quesitos. A fotografia e a edição são impecáveis (especialmente a edição, feita pelos cineastas com o pseudônimo de Roderick Jaynes), o roteiro utiliza com sabedoria elipses e silêncios, as atuações são nada menos do que sensacionais (em especial as de Josh Brolin e Javier Bardem, assustador como Chigurh, dono das melhores e mais tensas sequências do filme). É notável a maneira com que os Coen abdicam da trilha sonora em momentos cruciais, deixando toda a tensão nos ombros capazes de seus atores - que transmitem com perfeição todos os sentimentos de suas personagens (com exceção de Bardem, propositalmente frio e inatingível emocionalmente).

"Onde os fracos não tem vez" foi muito criticado por fãs ocasionais de cinema, que não viram nele as qualidades suficientes para torná-lo um ganhador do Oscar. Mas eles precisam rever sua opinião. É um belo e maduro trabalho, muito superior à média e que, mesmo não fazendo concessões ao comercial - e acabando sem deixar as coisas totalmente às claras - é forte o bastante para ser inesquecível.

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